por Comunicação Arayara | ago 31, 2023 | Mar Sem Petróleo, Participação Social, Pescadores Artesanais, Petróleo e Gás, Racismo Ambiental, Salve a Costa Amazônica |
Episódio ocorrido em 2019 chega a mais um ano sem a devida responsabilização
Em 30 de agosto de 2019, o país assistia aquele que seria um marco na desastrosa atuação ambiental do governo passado. Nesta data, chegou à costa da Paraíba diversas manchas de petróleo. O composto afetou a fauna e a flora local, contaminando diversas espécies. De carona, a economia e a saúde da população também foi prejudicada.
O óleo, que atingiu 130 municípios espalhados por 11 estados costeiros, contaminou mais de mil localidades. Entre elas, estavam mais de 50 unidades de conservação ambiental. Na ocasião, estava no comando do Ministério do Meio Ambiente o atual deputado federal Ricardo Salles (PL). Ele é quem queria “passar a boiada” dos assuntos ambientais enquanto a mídia estava preocupada com o Covid-19 e na última segunda-feira, 28, o ex-ministro de Bolsonaro se tornou réu, através de uma denúncia do Ministério Público Federal, acusado de ser parte de uma organização criminosa com um “grave esquema de facilitação ao contrabando de produtos florestais”. Além de Salles, o ex-presidente do IBAMA, Eduardo Bim, e outras 21 pessoas também são rés.
Para investigar os responsáveis pelo derramamento de petróleo, instaurou-se a CPI do Óleo ainda em 2019. A comissão foi interrompida devido à pandemia do Coronavírus e foi retomada apenas em 2021, quando foi encerrada sem um relatório final que definisse os culpados. Neste ano, deputados apresentaram um pedido de prorrogação da CPI, mas a base governista da época do derramamento se articulou para que ela não avançasse.
Em dezembro de 2021, a Polícia Federal apontou o navio petroleiro grego Bouboulina, da empresa Delta Tanker, como o culpado pelo derramamento. Os donos da empresa, o capitão e o chefe de máquinas da embarcação, foram acusados dos delitos de poluição, descumprimento de obrigação ambiental e dano a unidades de conservação.
O descaso da atuação do governo para conter o agravamento do problema foi evidente. Houve um grande atraso para acionar o Plano Nacional de Contingência de Incidentes com Óleo (PNC). Depois dos primeiros relatos de aparecimento de petróleo nas praias da Paraíba, a cronologia foi a seguinte:
- 25 de setembro de 2019: IBAMA emite a primeira nota oficial sobre as manchas. Até então, 108 localidades já haviam sido afetadas.
- 05 de outubro de 2019: Ricardo Salles, por rede social, faz sua primeira menção ao caso.
- 11 de outubro de 2019: O coordenador operacional é acionado por Salles para acompanhar a situação, este é o primeiro ato do PNC. Acumulavam-se 155 locais atingidos.
- 14 de outubro de 2019: Primeira menção ao Grupo de Acompanhamento e Avaliação (GAA). Sendo composto por Ibama, Marinha e ANP.
A negligência e atraso na reação foi tão grande, que a população, junto com organizações da sociedade civil, tiveram que se mobilizar para limpar os resíduos tóxicos nas praias e protestar. Muitas famílias e negócios que têm sua subsistência dependente da costa – como pesqueiros e marisqueiros – trabalharam nisso, pois estavam com suas existências ameaçadas.
O turismo foi duramente afetado com a poluição. As pessoas não tinham os mínimos Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) para auxiliar no trabalho. Segundo o IBAMA, a saúde de 144 mil pescadores artesanais do Nordeste estava em risco. Fora desses dados, ainda havia os estados do Espírito Santo e Rio de Janeiro, que também foram afetados.
O contato direto com petróleo bruto pode causar problemas de pele, de respiração, dores de cabeça e vômitos. O Conselho Federal de Química apontou em nota oficial que:
“Os hidrocarbonetos poliaromáticos (HPA) presentes no petróleo bruto e seus derivados pertencem a um grupo de composto orgânicos semivoláteis que estão entre os compostos mais tóxicos do óleo nesse estado e podem causar problemas sérios de saúde, como câncer”.
Nesses quatro anos, a situação ainda não tem respostas definitivas. A tragédia deixou grandes consequências para a população costeira e para a fauna e flora do Brasil. Além disso, a Polícia Federal estimou R$525,3 milhões de danos causados pelo vazamento de óleo.
O Instituto Internacional ARAYARA e demais organizações da sociedade civil se uniram para auxiliar as comunidades afetadas. Ainda hoje, estudos estão sendo feitos e divulgados em diversas revistas científicas para dimensionar as consequências do derramamento. Enquanto não houver a devida responsabilização de petroleiras e uma séria análise sobre a redução da utilização de petróleo e gás no mundo, situações como a vista em 2019 seguem acontecendo.
No ano seguinte à tragédia na costa nordestina, a ARAYARA se juntou a mais de 120 organizações demandando o cancelamento de um leilão de áreas de exploração de petróleo e gás no Brasil. Os leilões promovidos pela ANP continuam ofertando áreas sensíveis até hoje. Estão ampliando suas ofertas ignorando completamente as audiências públicas, argumentos científicos e protestos de pessoas que têm suas vidas colocadas em risco. A ARAYARA já conseguiu retirar, através de Ações Civis Públicas (ACP’s), centenas de blocos desses leilões, mas a luta continua!
Atualmente, há pressão para iniciar a exploração de petróleo na foz do rio Amazonas, inclusive com um parecer favorável da Advocacia-Geral da União (AGU) às atividades. O IBAMA e o Ministério do Meio Ambiente já declararam que sem a realização da Avaliação Ambiental de Área Sedimentar – AAAS – a licença de operação não será concedida. O Instituto Internacional ARAYARA segue lutando para que os blocos de petróleo da costa amazônica não possam ser explorados, além de diversas áreas sensíveis de norte a sul, como as paradisíacas Fernando de Noronha e Florianópolis.
A ARAYARA reforça que o lugar do petróleo é debaixo da terra, não podemos permitir que situações como a de 2019 se repitam, pois além da poluição visível, o planeta sofre com a crise climática agravada pela queima de combustíveis fósseis. O que o Brasil precisa é uma Transição Energética Justa para substituir gradualmente as fontes poluidoras e tornar o país um modelo de desenvolvimento sustentável. Assista aqui o vídeo publicado pela ARAYARA para relembrar o caso.
por Comunicação Arayara | maio 30, 2023 | Petróleo e Gás, Press Release |
A Costa Amazônica, uma das regiões mais sensíveis e ricas em biodiversidade do planeta, está sob ameaça.
Apesar de abrigar uma grande variedade de espécies costeiras e marinhas, muitas delas que ainda são desconhecidas pela ciência, e ser um importante berçário da pesca, fonte de subsistência para as comunidades locais, a exploração de petróleo e gás na região pode colocar em risco todo esse ecossistema e as populações que dele dependem. A falta de planos para evitar, conter e comunicar os riscos de vazamentos e acidentes não pode ser atropelada por decisões políticas, pois os impactos socioambientais seriam irreversíveis.
Por isso, convidamos você a participar da Audiência Pública da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados e mostrar sua preocupação com a exploração de petróleo e gás na Costa Amazônica. Sua participação online ou presencial é fundamental para pressionar os parlamentares a tomarem medidas concretas para proteger a região.
Juntos, podemos garantir que a AAAS (Avaliação de Área Sedimentar) seja implementada antes de qualquer empreendimento de petróleo e gás para as novas fronteiras de exploração na Margem Equatorial e assim, preservar um futuro realmente sustentável para a Costa Amazônica e as comunidades que dela dependem. Participe da Audiência Pública da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, quarta-feira, 31/05 às 10h pela TV Câmara e também no Youtube. Façamos as nossas vozes serem ouvidas!
Proponentes:
Deputado Ivan Valente (PSOL/SP)
José Priante (MDB/PA)
Nilto Tatto (PT/SP)
Socorro Neri (PP/AC)
Convidados:
– Representante do Ministério do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas – MMA;
– Rodrigo Agostinho Presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA;
– Daniele Zaneti Puelker – presença confirmada – Gerente Geral de Licenciamento e Conformidade Ambiental da Petrobras;
– José Umberto Arnaud Borges – presença confirmada – Gerente Geral de Construção, Avaliação e Abandono de Poços Exploratórios da Petrobrás;
– Representante Ministério de Minas e Energia – MME;
– Rodolfo Henrique De Saboia – Diretor-Geral da Agência Nacional de Petróleo – ANP;
– Mauro O´de Almeida – presença confirmada (REMOTO) – Secretário de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará – SEMAS/PA;
– Roberto Ardenghy – presença confirmada – Presidente do Instituto Brasileiro de Petróleo – IBP;
– Ticiana De Oliveira Alvares – presença confirmada – Diretora Técnica do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás e Biocombustíveis – Ineep;
– Deyvid Bacelar – presença confirmada – Coordenador-geral da Federação Única dos Petroleiros – FUP;
– Carlos Eduardo Rezende – presença confirmada (REMOTO) – Professor da Universidade Estadual do Norte Fluminense;
– Suely Araújo – Especialista sênior em políticas públicas do Observatório do Clima – presença confirmada;
por Comunicação Arayara | maio 10, 2023 | Amazônia |
RIO DE JANEIRO (AP) – Após sua cerimônia de posse em 1º de janeiro, Luiz Inácio Lula da Silva, do Brasil, subiu a rampa do palácio presidencial de braços dados com o líder indígena Raoni Metuktire, instantaneamente reconhecido por sua cobertura amarela e placa de lábio de madeira
Orinalmente publicado em AP News em 07/05/2023
Mas uma grande ferrovia que aceleraria o desmatamento na terra ancestral de Metuktire pode azedar as relações entre o líder de esquerda e o chefe do povo Kayapó. E é apenas um dos vários mega projetos que ativistas e especialistas dizem que devastariam o mundo natural – e prejudicariam seriamente a nova imagem de Lula como defensor do meio ambiente – se forem adiante.
Outros incluem um projeto de perfuração de petróleo perto da foz do Rio Amazonas; uma rodovia que cortaria algumas das áreas mais protegidas da floresta amazônica; e a renovação da licença de uma grande represa hidrelétrica.
“Lula está falando sobre meio ambiente, mostrando preocupação com mineração ilegal, demarcando territórios indígenas. Ele já aprendeu muito, mas precisa aprender mais. Ainda estamos muito preocupados”, disse Alessandra Korap, líder indígena do povo Munduruku, que recentemente ganhou o Prêmio Ambiental Goldman por um trabalho que incluiu a luta contra a mineração ilegal.
Sob o antecessor de Lula, Jair Bolsonaro, o desmatamento atingiu um pico de 15 anos e as restrições ambientais foram enfraquecidas. O líder de extrema direita preencheu posições-chave em agências ambientais com aliados do agronegócio e oficiais militares. Os direitos dos povos indígenas foram pisoteados.
Após derrotar Bolsonaro por uma margem estreita nas eleições do ano passado, Lula se esforçou para colocar a proteção ambiental e o respeito pelos direitos dos povos indígenas no cerne de seu terceiro mandato. Ele retomou a bem-sucedida busca de doações internacionais para o Fundo Amazônia que combate o desmatamento, lançou uma campanha militar para expulsar mineradores ilegais do território Yanomami, comprometeu-se a acabar com todo o desmatamento ilegal até 2030 e reiniciou a demarcação de áreas indígenas.
Mas Lula enfrenta testes difíceis nos grandes projetos de infraestrutura. Enquanto os oponentes os consideram catastróficos, alguns membros do Partido dos Trabalhadores de Lula continuam a vê-los como essenciais para fornecer empregos e promover o crescimento. E o Brasil, uma nação em desenvolvimento, tem uma grande demanda por benefícios socioeconômicos.
O PROJETO DE PERFURAÇÃO DE PETRÓLEO
O Ibama, agência ambiental do Brasil, decidirá nos próximos meses se concederá licença para perfuração em um setor próximo à foz do Amazonas. A aprovação certamente levaria à perfuração em toda a região, disse Suely Araújo, ex-chefe do Ibama e agora especialista em políticas públicas do Observatório do Clima, uma rede de organizações sem fins lucrativos.
“É uma questão de coerência. Os discursos de Lula sobre proteção ambiental e crise climática são perfeitos. Mas se a exploração de petróleo for intensificada, significará a expansão dos combustíveis fósseis. Haveria uma inconsistência”, disse Araújo.
Durante os primeiros mandatos de Lula, grandes descobertas offshore tornaram-se um meio de financiar programas de saúde, educação e assistência social.
“Em grande parte, essa visão permanece, o que significa que será muito difícil persuadir o governo a abandonar projetos estratégicos, mesmo quando há riscos socioambientais significativos”, disse Maiara Folly, diretora do CIPÓ, um think tank focado em clima e relações internacionais.
Com a produção existente prestes a atingir o pico nos próximos anos, há um forte interesse em garantir mais produção na costa norte do Brasil. É uma localização única e biodiversa, lar de extensas áreas de manguezais pouco estudados e de um recife de coral.
Araújo disse que o projeto corre o risco de vazamentos que seriam carregados por fortes correntezas para outras áreas.
A Petrobras, gigante estatal de petróleo, reservou quase metade de seu orçamento de exploração de US$ 6 bilhões para cinco anos na área. O CEO Jean Paul Prates disse que o primeiro poço será temporário e que a empresa nunca registrou um vazamento em perfurações offshore.
O ministro da Energia, Alexandre Silveira, disse em março que a área é o “passaporte para o futuro” do desenvolvimento nas regiões do norte do Brasil. Lula usou o mesmo termo para descrever as descobertas de petróleo offshore anteriores.
Oitenta organizações da sociedade civil e ambientais, WWF Brasil e Greenpeace, pediram que a licença fosse recusada até que seja realizada uma análise aprofundada.
A USINA HIDRELÉTRICA
A usina hidrelétrica de Belo Monte, um colosso de concreto no rio Xingu, foi planejada sob Lula e construída por sua sucessora, Dilma Rousseff. Os apoiadores viram isso como uma maneira de gerar empregos e adicionar energia à rede do Brasil.
Populações indígenas e ambientalistas se opuseram fortemente a isso, e estudos mostram que seus impactos foram desastrosos. Organizações da sociedade civil estimam que dezenas de milhares de pessoas foram deslocadas, e especialistas atribuem um aumento local de violência à perda de empregos. Uma área de preocupação é a Volta Grande do Xingu, que perdeu grande parte de sua água. Isso causou o desaparecimento de peixes – a base de subsistência de muitas populações indígenas.
Belo Monte está de volta à agenda de Lula, com o Ibama avaliando se deve renovar sua licença. A agência relatou no verão passado que a Norte Energia, proprietária da usina, não havia respeitado muitas das condições de sua licença original.
A mídia local disse que a Norte Energia propôs distribuir 20 mil reais (cerca de US$ 4.000) em compensação para quase 2.000 pescadores.
Em janeiro, pesquisadores da região publicaram uma carta no site de jornalismo ambiental Sumauma pedindo que Lula e sua administração investiguem e punam crimes e injustiças em torno da usina.
“Qualquer governo realmente comprometido em conservar a Amazônia e combater a crise climática é obrigado a reconhecer os problemas causados por Belo Monte e a corrigir os danos e impactos causados”, dizia a carta.
As populações locais exigem que a licença seja renovada apenas se a Norte Energia concordar em usar a água de forma a permitir a vida no e ao redor do rio.
A licença foi originalmente emitida sob forte pressão do governo de Rousseff, disse Folly. Em uma entrevista em março ao Sumauma, a ministra do Meio Ambiente de Lula, Marina Silva, prometeu que desta vez, “ninguém será coagido, como antes, e isso representa uma mudança total”.
por Comunicação Arayara | abr 30, 2023 | Mar Sem Petróleo |
Parecer técnico afirma que pedido da Petrobras é inviável do ponto de vista ambiental, mas a decisão depende de Rodrigo Agostinho, presidente do órgão
Publicado por: Sumaúma Jornalismo
Um parecer técnico do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) recomenda que seja negado o pedido da Petrobras para furar um poço em busca de petróleo no chamado bloco 59, na bacia da foz do Amazonas, a cerca de 160 quilômetros da costa do Oiapoque, no Amapá. Segundo SUMAÚMA apurou, o documento, de acesso restrito por envolver a etapa de conclusão do caso, foi protocolado no dia 20 de abril. Ele afirma que o empreendimento é inviável do ponto de vista ambiental e pede o indeferimento da licença e o arquivamento do processo de licenciamento da prospecção no bloco 59, que já se arrasta há nove anos.
Assinado por toda a equipe técnica encarregada do licenciamento do bloco 59, o parecer é um dos documentos que vai embasar uma decisão do presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, sobre a concessão ou não da licença de operação à Petrobras. O texto cita lacunas na previsão dos impactos da atividade nas três terras indígenas da região do Oiapoque e incertezas no plano apresentado pela estatal para atendimento à fauna, em caso de acidente com derrame de óleo – numa área em que há espécies endêmicas ameaçadas e correntes marítimas particularmente fortes. Lembra também que o empreendimento é cercado por insegurança técnica e jurídica por não ter sido feita uma avaliação mais ampla da compatibilidade entre a indústria petrolífera e todo o contexto social e ambiental da região, com a utilização de instrumentos como a Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS), que foi estabelecida em portaria de 2012 dos ministérios do Meio Ambiente e Minas e Energia.
A perfuração de um poço na bacia da foz do Amazonas, onde há mais oito blocos em processo de licenciamento, teria o potencial de abrir uma nova fronteira de exploração petrolífera na margem equatorial do Brasil, que vai do Rio Grande do Norte ao Amapá. A região inclui 80% dos mangues do país e um sistema de recifes ainda pouco estudado, considerado fundamental para a atividade pesqueira. Além disso, conhecimentos escassos sobre a dinâmica das correntes marinhas locais tornam difícil prever o que aconteceria em caso de eventual vazamento de óleo e como atuar para conter seus efeitos.

Mapa da posição do bloco 59 da Petrobras. Infográfico: Rodolfo Almeida/SUMAÚMA
No total, há ainda 47 blocos na margem equatorial em “oferta permanente” pela Agência Nacional de Petróleo (ANP) e 157 em estudo para serem levados a leilão. Em carta enviada em meados de abril a autoridades do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, 80 organizações da sociedade civil, incluindo ONGs ambientalistas e associações indígenas, de pescadores e de comunidades extrativistas da Amazônia pediram a realização de uma Avaliação Ambiental de Área Sedimentar antes de qualquer decisão sobre o bloco 59. Argumentaram também que a abertura de uma nova fronteira petrolífera é “incoerente” com a necessidade de uma “transição energética justa e inclusiva” e com os “compromissos socioambientais assumidos pelo governo brasileiro”.
A exploração da margem equatorial foi considerada prioritária pela Petrobras no plano estratégico para o período de 2024 a 2027, lançado em 2022, ainda no governo do extremista de direita Jair Bolsonaro. Indicado já no governo Lula, o atual presidente da empresa, Jean Paul Prates, reiterou essa prioridade, afirmando que a busca de petróleo na região é fundamental para a manutenção dos negócios da estatal em óleo e gás, “mesmo num panorama de transição energética”. Mais recentemente, Prates disse que cabe à “sociedade” decidir sobre a exploração na margem equatorial. “Estamos preparados para explorar novas reservas se assim a sociedade decidir”, afirmou ele em vídeo.
O parecer técnico publicado no último dia 20 pelo Ibama lembra que a Petrobras, a pedido do órgão ambiental, atualizou a chamada “modelagem” – um estudo feito em computador que faz a previsão de cenários de dispersão do petróleo em caso de acidente. A modelagem também embasa o chamado Plano de Emergência Individual (PEI), que é parte fundamental do processo de licenciamento. Ainda assim, diz o texto, a construção de uma base hidrodinâmica que representasse melhor a dinâmica costeira da margem equatorial ainda não foi concluída, o que aumenta a possibilidade de erros, considerada a intensidade das correntes e ventos na área do bloco 59. Para ter uma ideia, a Corrente Norte do Brasil, a principal da região, tem em média três nós de velocidade contra um nó na Corrente do Brasil, predominante no litoral do Sudeste. O documento lembra mais uma vez que os cenários da Petrobras não preveem a chegada de óleo na costa em um eventual vazamento, embora haja relatos de objetos que alcançaram o litoral do Oiapoque vindos do alto-mar, como estágios de um foguete lançado em 2014 do Centro Espacial de Kourou, na vizinha Guiana Francesa.

RESTOS DE FOGUETE ENCONTRADOS NO PARQUE NACIONAL DO CABO ORANGE, NA REGIÃO DO OIAPOQUE: INDÍCIO DE QUE CORRENTE PODERIA TRAZER MANCHA DE ÓLEO PARA O BRASIL. FOTO: DIVULGAÇÃO/ICMBIO
No que diz respeito ao impacto nas terras indígenas, onde vivem cerca de 8 mil pessoas, o parecer cita que apenas em fevereiro deste ano, em reunião com o Conselho de Caciques dos Povos Indígenas do Oiapoque (CCPIO) e outras entidades, a Petrobras reconheceu que os voos de helicóptero entre o aeroporto da cidade e o navio-sonda que mantém na área do bloco 59 desde agosto do ano passado já estavam afetando os povos originários, afugentando a fauna de que as aldeias precisam para sua sobrevivência. Na ocasião, a estatal se comprometeu a alterar a altitude desses voos. No entanto, de acordo com o documento, um aumento estimado de 3.000% do tráfego aéreo durante a atividade de prospecção de petróleo exigiria a elaboração de uma nova Avaliação de Impacto Ambiental para o caso específico das terras indígenas, que a Petrobras considerou não ser necessária.
Por último, o parecer técnico do Ibama analisa o Plano de Proteção à Fauna (PPAF) apresentado pela estatal como parte do Plano de Emergência Individual (PEI). O documento rejeita o PPAF da Petrobras, e portanto não recomenda a realização da Avaliação Pré-Operacional, uma simulação de resposta a acidentes que é a última etapa do processo de licenciamento. De acordo com o texto, todas as alternativas propostas pela empresa para o resgate e transporte dos animais afetados por um eventual vazamento preveem um tempo muito longo para esse socorro e não levam em conta a possibilidade de mudanças abruptas nas condições climáticas na área do bloco 59, que afetariam o tempo e a viabilidade da navegação e dos voos. O parecer lembra que, dadas as especificidades da costa do Oiapoque, que não permitem o atracamento de navios de grande porte, toda a estrutura marítima de suporte às atividades da Petrobras estaria baseada em Belém, a 830 quilômetros do poço – distância percorrida em 43 horas em média por embarcações. Mesmo com lanchas rápidas, o deslocamento da capital paraense até o bloco 59 seria de no mínimo 26 horas.
O parecer assinado por dez técnicos foi endossado pelo coordenador de Licenciamento da Exploração de Petróleo e Gás Offshore (Coexp) do Ibama, Ivan Werneck Sánchez Bassères, e pelo coordenador geral de Licenciamento de Empreendimentos Marinhos e Costeiros (CGMac), Itagyba Alvarenga Neto. Porém, segundo SUMAÚMA apurou, o atual diretor substituto de Licenciamento do Ibama, Régis Fontana Pinto, discordou parcialmente do parecer – Rodrigo Agostinho, o presidente do instituto que assumiu no governo Lula, ainda não nomeou o novo titular desse cargo.
Em despacho enviado a Agostinho, Fontana Pinto diz que as considerações sobre os impactos em terras indígenas e sobre a realização prévia da Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS) não representam condicionantes para a emissão da licença de operação. Em relação às dificuldades logísticas para a implementação bem-sucedida do Plano de Proteção à Fauna (PPAF), ele sugere que a Petrobras tenha a oportunidade de melhorar o projeto e de provar que ele pode ser viável com a realização da Avaliação Pré-Operacional (APO). Essa simulação de acidente chegou a ser pré-marcada para 20 de março, mas acabou não sendo confirmada por causa do tempo necessário para a análise, pelo Ibama, das respostas enviadas pela estatal a suas observações sobre o Plano de Proteção à Fauna e a relação com os povos originários.
Em seu despacho, protocolado no dia 27, o diretor substituto de Licenciamento reconhece o peso de uma decisão que pode levar à abertura de uma nova fronteira petrolífera, mas diz que essa avaliação não cabe ao Ibama, e sim a instâncias superiores que definem a política ambiental e energética do país.
SUMAÚMA buscou contato com o presidente do Ibama, mas até a publicação deste texto ele ainda não havia comentado o parecer técnico do seu instituto nem a opinião de Régis Fontana.
O que diz a Petrobras
Em nota enviada a SUMAÚMA depois da publicação desta reportagem, a Petrobras diz que “aguarda posicionamento do governo” sobre o pedido para verificar a existência ou não de jazida petrolífera no bloco 59, e destaca que o poço em si fica “a uma distância de 175 quilômetros da costa do Amapá e a mais de 500 quilômetros” da foz do rio Amazonas. “A companhia vem conduzindo diligentemente seu processo de licenciamento ambiental, atendendo todas as exigências definidas pelos órgãos ambientais, e reforça que acatará qualquer decisão, seja liberando a perfuração ou optando por aprofundamento de estudos para avaliação da viabilidade de execução de uma campanha na bacia”, informa a estatal.
A companhia diz ainda que só depois da perfuração do poço se confirmará o potencial do ativo, a existência e o perfil de eventual jazida. “Cumprimos todas as exigências e estamos aguardando a decisão do governo. Não queremos atropelo e, ao contrário de algumas notícias veiculadas na imprensa, não há qualquer tipo de pressão da parte da Petrobras. Estamos prontos tecnicamente, esperando o posicionamento oficial sobre a nossa campanha de perfuração na região”, afirma o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, de acordo com a nota.
A empresa apontou que cada bacia da margem equatorial tem características diferentes. “A companhia acredita que a margem equatorial é a nova fronteira para um grande plano energético do Brasil, envolvendo a atividade de exploração e produção e recursos eólicos offshore”, diz o texto. “A Petrobras tem como valor o respeito à vida, às pessoas e ao meio ambiente e continuará executando todas as suas operações seguindo rigorosamente as normas de segurança operacional e as melhores práticas referentes a responsabilidade social e ambiental”, conclui.
por Comunicação Arayara | out 24, 2021 | América Latina |
A intrigante declaração de Gerardo Amarilla nas redes sociais, no último dia 14 de outubro, com fotos do seu encontro com Jair Bolsonaro repercutiu muito negativamente na mídia Uruguaia. A mensagem do sub-secretário do Ministério do Meio Ambiente, dizia: “Belo encontro com o presidente do Brasil, um líder valente que reconhece Deus e respeita a Constituição”.
A crítica, publicada no jornal ‘Semanario Voces’, é literal e mostra como é preocupante aos uruguaios e assim como aos demais países latinoamericanos, os rumos das decisões do governo brasileiro, não somente nas pautas de proteção socioambiental, como demais posicionamentos que expõe internacionalmente a face de um Brasil retrógrado e violento. Leia um trecho a seguir de Eduardo Gudynas, pesquisador e ambientalista:
“Bolsonaro, que seria um “líder valente” segundo Amarilla, é na verdade uma pessoa que incentiva o uso de armas, celebra a violência, é repetidamente machista e racista, briga com a ciência e lança todo tipo de falsos dizeres. Nestes tempos, argumentou que a pandemia Covid19 era uma “gripe”, face às mortes pelo vírus, respondeu que “temos de deixar de ser um país de maricas”; Um pouco antes ele disse “sou a favor da tortura”, “se eu vir dois homens se beijando na rua eu vou bater neles” e “os pobres só têm uma utilidade em nosso país: votar”. As evidências sobre isso são esmagadoras e têm sido confirmadas há anos, portanto, não adiciono outros exemplos.
Amarilla também escreveu que o presidente brasileiro “respeita a Constituição”, mas no mundo real isso não acontece. O próprio Bolsonaro diz abertamente que não pode cumprir a Constituição e, para enfatizar isso, disse que pode fazê-lo porque “ninguém é mais macho do que ninguém aqui”.
Além de tudo isso, é dramático que justamente o número dois do Ministério do Meio Ambiente do Uruguai elogie um regime caracterizado por ser estritamente antiecológico. No governo de Bolsonaro, por um lado, os controles ambientais foram cortados e, por outro, seu financiamento foi reduzido. Com efeito, os controles do Ministério do Meio Ambiente e dos órgãos ambientais federais foram cortados, e o controle dos infratores foi limitado, atingindo um nível que foi descrito pelos analistas como “tenebroso”. No último mês de abril, 600 funcionários do órgão ambiental federal (Ibama) assinaram ofício avisando que a fiscalização estava comprometida e paralisada. Ao mesmo tempo, o governo reduziu o orçamento ambiental (de R $ 3 bilhões em 2020, para R $ 2,1 bilhões em 2021). A consequência disso é um desastre ambiental.
Ao mesmo tempo, Bolsonaro ataca a ciência. Ele fez isso repetidamente com o manejo da pandemia, qualificando-a como uma gripe, e faz o mesmo com a questão ambiental. Quando ficou conhecido o desmatamento revelado pelas fotos de satélite, Bolsonaro acusou os responsáveis de serem mentirosos e destituiu o diretor do instituto encarregado dessas avaliações. Persegue cientistas que alertam sobre os mais diversos assuntos, e isso leva alguns de seus militantes a ameaçá-los e até persegui-los.
(…)
Não importa se Amarilla realmente acredita que Bolsonaro é um líder a ser parabenizado, ou se ele está muito desinformado sobre o que está acontecendo no Brasil e sobre as reações internacionais. O que é preocupante é se essas palavras anunciam uma mudança do herrerismo para um conservadorismo de estilo bolsonarista, e se isso arrastará o resto da coalizão. São palavras que afetam também especialmente o Partido Colorado, já que o ministro do meio ambiente vem dessas lojas. Todos os tipos de perguntas surgem sobre o que esperar. Bolsonaro será imitado na liberalização do uso de armas pessoais em face da crise de segurança? O Ministério do Meio Ambiente vai desmantelar gradativamente os controles ambientais? Vamos nos afastar da ciência? Todas as questões estão abertas.”
Fonte: Semanario Voces
http://semanariovoces.com/el-viceministro-que-alaba-a-bolsonaro-por-eduardo-gudynas/