Fechando o ciclo de quatro anos do pior governo ambiental para o país, metas ambientais internas estão longe de serem atingidas
O Brasil se tornou um pária ambiental sob o governo Bolsonaro. Próximo a ter esse ciclo fechado, o país vai à Conferência das Partes (COP27), no Egito, com a missão de apresentar compromissos mais objetivos. Internamente e externamente, metas do Acordo de Paris, firmadas em 2015, e as criadas e reforçadas em 2021 estão longe de serem atingidas. Na COP26, o país apresentou as mesmas ambições firmadas anteriormente, já consideradas por especialistas como insuficientes para conter o aquecimento de 1,5ºc.
O evento foi marcado por uma presença desproporcional de empresas, que pautaram compromissos sob o guarda-chuva de seus interesses. O resultado final das duas semanas de discussão com os principais atores e responsáveis pela crise climática foi o documento pouco ambicioso: o Pacto de Glasgow. Dias antes do evento, uma Ação Civil Pública (ACP) feita pelo Observatório do Clima pressionou o governo para discutir a urgência da redução das emissões brasileiras de Gases do Efeito Estufa (GEEs). A ação olha para a Lei nº 12.187/2009 – o Plano Nacional de Mudança Climática – que é regulado pelo Decreto nº 9.578/2018 e o Decreto 9.073/17, que foca nos compromissos firmados no Acordo de Paris. Porém, a ação ainda está em primeira instância.
Este é um exemplo dos mecanismos políticos dispostos nas leis brasileiras que não saem do papel. Outro exemplo da inércia brasileira é o Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima que, desde sua criação, só teve como única ação concreta a mudança do nome, para Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima e Crescimento Verde (CIMV). A função do Comitê é de facilitar o planejamento, a execução e o monitoramento de resultados, além de criar e consolidar “critérios verdes”, levando em consideração as unicidades dos biomas brasileiros. O Comitê não teve nenhuma reunião nos últimos meses.
Em abril de 2022, o governo Bolsonaro expôs a segunda atualização das NDCs brasileiras (Contribuição Nacionalmente Determinada), que foi considerada uma “pedalada climática”. Como o nome sugere, as NDCs são compromissos de metas internas para mitigação e redução das emissões que cada país signatário do Acordo de Paris deve criar e comunicar. Deve-se, também, atualizar as contribuições de 5 em 5 anos, como proposto pelo Global Stocktake – um componente fundamental do Acordo de Paris. Assim, com a ajuda deste mecanismo, os países conseguem apresentar o que já conseguiram implementar das NDCs propostas, identificar o que precisa ser feito a seguir e analisar as formas possíveis de chegar a estas metas em nível nacional.
E por que a atualização das NDCs brasileiras foram classificadas assim? Na versão original, o Brasil se comprometeu a reduzir suas emissões em 37% até 2025, em relação a 2005, e 43% até 2030. Na nova, os números são parecidos: 37% para 2025, 50% até 2030. Porém, a mudança está na base de cálculo, que agora é diferente. Em nota, o Observatório do Clima apontou que, nessa diferença, o país poderá emitir 73 milhões de toneladas de CO2 equivalente (MtCO2e) a mais em 2030 do que o prometido em 2015.
Já se sabe que nem a NDC original, nem a atual, são suficientes para que o Brasil se alinhe às necessidades do Acordo de Paris. Logo, o executivo brasileiro precisa se comprometer com metas mais ambiciosas. O aumento do desmatamento foi uma marca do Governo Bolsonaro. Especialistas da Universidade de Oxford, do Instituto Internacional de Análise de Sistemas Aplicados (IIASA) e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) projetam que este número deve continuar em alta caso haja reeleição. O Brasil é o 6º maior emissor de GEEs do mundo e 4º emissor histórico, se considerado suas emissões de uso da terra.
A saída de Bolsonaro do poder pode resultar na queda de 90% do desmatamento da Amazônia, evitando a perda de quase 76 mil km² até 2030 – um tamanho de 63 cidades do Rio de Janeiro. O Forest Trend apontou, em seu relatório de 2021, que o Brasil foi bem sucedido em conter o desmatamento até 2012 e, em seu melhor desempenho, evitou a emissão de 1,3 Gt de CO2eq por ano. A exemplo de comparação, em seu melhor desempenho, Estados Unidos, Japão e União Europeia não alcançaram nem ¼ deste valor.
O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) ressalta que as políticas climáticas adotadas até 2020 levam a Terra a aquecer 3,2ºC no fim do século. Logo, é imprescindível que o Governo Brasileiro se movimente para ajustar suas NDCs para não só estarem em consonância com o Acordo de Paris, mas também para estarem a par com a necessidade de refrear a crise climática.
Na COP26, o Brasil ratificou 12 compromissos, sendo duas alianças, quatro declarações, três ferramentas e três iniciativas. Veja a seguir alguns pontos sobre planejamento energético, combustíveis fósseis e energia limpa, suas propostas e problemáticas:
1. Acordo de Colaboração: Mission Innovation y Breakthrough Energy
O objetivo geral deste plano é de “Acelerar o investimento em tecnologias de energia limpa e estimular a colaboração entre os setores público e privado”. Um dos grandes desafios e obstáculos para o cumprimento das metas do Acordo de Paris está no prazo de execução. Neste caso, como em diversos outros, não há prazo definido. Há também a falta de fundos, o que compromete a viabilidade da meta.
2. Declaração: Clean Energy Ministerial’s Super-Efficient Equipment and Appliance Deployment (SEAD)
O objetivo geral deste plano é de “criar uma base técnica comum que permita que os governos adotem mais facilmente políticas e programas de eficiência econômica para aparelhos que consomem energia”. O objetivo específico é de reduzir as emissões de dióxido de carbono (CO2) em 11.000 milhões de toneladas métricas nas próximas décadas. Não há fundos comprometidos.
3. Iniciativa: Clean Energy Ministerial’s Electric Vehicle Initiative
Na pauta de transporte, a iniciativa tem o objetivo de “acelerar a introdução e adoção de veículos elétricos em todo o mundo”. Não existem detalhamentos sobre, como objetivo específico de redução; indicador para medir a redução; fundos comprometidos; ano base do objetivo de redução e prazo de execução. Em suma: um grande vazio.
4. Iniciativa: Global Methane Pledge
A meta geral dessa iniciativa é de “alcançar o objetivo coletivo de reduzir as emissões globais de metano e avançar no uso das melhores metodologias de inventário disponíveis”. Essa já está mais estruturada, tendo como objetivo específico de redução “reduzir as emissões mundiais de metano no mínimo de 30%”, com prazo de execução até 2030. Entre um dos compromissos está: “adaptar as metodologias de inventário de boas práticas do IPCC”, no qual, como mostramos aqui, o Brasil está distante.