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ARAYARA na Mídia: Especialista adverte – “A vida sob ataque: os riscos jurídicos e sociais do PL da Devastação ambiental”

O Senado Federal aprovou, com apoio da maioria de seus membros e liberação da bancada do governo, o Projeto de Lei nº 2159/2021 — chamado por ambientalistas de “PL da Devastação”. A proposta, que já havia sido aprovada pela Câmara dos Deputados, retornou à casa iniciadora para análise de destaques e emendas de redação. A depender do desfecho, o Brasil poderá institucionalizar um dos maiores retrocessos ambientais desde a promulgação da Constituição de 1988.

O texto aprovado revoga, na prática, a estrutura do licenciamento ambiental como é hoje conhecida. Entre as mudanças mais críticas está a Emenda nº 120, que altera o artigo 10 do projeto e estabelece procedimentos “simplificados” para empreendimentos de saneamento e energia considerados estratégicos. A exigência de Estudo de Impacto Ambiental (EIA), nesses casos, passa a ser prevista apenas como exceção, a ser “devidamente justificada” pela autoridade licenciadora.

Na prática, isso significa que grandes projetos energéticos — como termelétricas a gás, gasodutos, oleodutos, usinas hidrelétricas e até extensas fazendas solares ou eólicas — poderão dispensar análise prévia dos impactos sociais e ambientais que provocam.

É importante lembrar que tais empreendimentos, pela sua natureza, geram transformações profundas nos territórios: remoções forçadas de comunidades, poluição de rios e mares, emissões de gases de efeito estufa, fragmentação de habitats e riscos cumulativos de degradação ambiental. Ao eliminar a exigência de estudos prévios, o PL compromete não apenas a integridade dos ecossistemas e o direito das populações afetadas, mas também a segurança jurídica de todo o setor.

Do ponto de vista jurídico, a proposta viola frontalmente o artigo 225 da Constituição Federal, que consagra o direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e impõe ao Estado o dever de exigir, por lei, estudo de impacto ambiental para atividades potencialmente poluidoras. Além disso, o texto entra em colisão com tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário — como a Convenção da Diversidade Biológica, ratificada por meio do Decreto Federal nº 2.519/1998, que determina a avaliação de impactos ambientais com participação pública em projetos que afetem a biodiversidade.

Se sancionado, o PL estará sujeito a duas frentes de contestação judicial: ações diretas de inconstitucionalidade e pedidos indenizatórios por conta de danos ocasionados por empreendimentos que necessitavam de estudos ambientais. O resultado será um ambiente de elevada instabilidade jurídica, o que afeta também a previsibilidade necessária aos próprios investidores e operadores do setor energético.

É preciso também combater um dos principais argumentos usados por defensores do projeto: a ideia de que o licenciamento ambiental “trava” o desenvolvimento nacional. O que, de fato, provoca morosidade nos processos não é o rito do licenciamento em si, mas a precarização dos órgãos ambientais. Em 2024, por exemplo, o IBAMA operava com apenas 49,2% de seu quadro efetivo de servidores especialistas em meio ambiente. Sem recomposição de pessoal e valorização das carreiras técnicas, o tempo de análise dos projetos tende a se arrastar — o que, ironicamente, o próprio PL não resolve.

A qualidade de vida da população depende tanto do acesso à energia quanto da preservação dos recursos naturais. Ar puro, água limpa e estabilidade climática não são obstáculos à prosperidade, mas seus alicerces. Sem eles, não há vida digna — nem consumo de energia.

Diante da baixa expectativa de reversão do projeto na Câmara e da provável fragilidade dos vetos presidenciais frente a um Congresso conservador, resta à sociedade civil ampliar sua mobilização e ao Judiciário cumprir seu papel como guardião da Constituição.

Não se trata de aperfeiçoamento regulatório ou modernização. O que se vê é o desmantelamento de um dos pilares da política ambiental brasileira.

Renata Prata – Coordenadora de Advocacy e Projetos do Instituto ARAYARA e Juliano Bueno – Doutor em Riscos e Emergências Ambientais, Phd em Energia e diretor técnico do Instituto Internacional ARAYARA*

Fonte: Revista Nordeste

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