+55 (41) 9 8445 0000 arayara@arayara.org

Opinião: PL da Devastação deve acelerar empreendimentos fósseis no Brasil

A PL da Devastação (PL 2.159/2021), aprovada pelo Congresso Nacional, representa um grave retrocesso na política ambiental brasileira ao modificar profundamente o licenciamento ambiental, fragilizando instrumentos de controle, fiscalização e participação social. Embora o mecanismo de Licenciamento por Adesão e Compromisso (LAC) — conhecido como autolicenciamento — tenha recebido maior atenção crítica, a proposta legislativa contempla outras formas de flexibilização que afetam diretamente todos os tipos de empreendimentos sujeitos a licenciamento, inclusive os de grande porte e alto impacto.

Com a nova lei, atividades como blocos exploratórios de petróleo e gás, termelétricas a gás ou carvão, gasodutos, dutos de escoamento, terminais de GNL, polos de processamento de gás natural e empreendimentos minerários em fase de exploração ou lavra passam a encontrar um ambiente institucional mais permissivo. A legislação possibilita que, a depender da regulamentação infralegal, estudos técnicos robustos (como o EIA/RIMA) e audiências públicas sejam dispensados, mesmo em contextos ambiental e socialmente sensíveis.

O autolicenciamento poderá ser aplicado quando o órgão licenciador considerar que a atividade possui baixo impacto ambiental, conforme critérios definidos por resoluções específicas. No entanto, a falta de parâmetros objetivos claros e a ausência de obrigatoriedade de parecer técnico prévio levantam preocupações quanto à aplicação indevida desse instrumento a empreendimentos com impactos cumulativos e significativos.

A PL também promove a descentralização e despadronização de procedimentos ao atribuir a estados e municípios a competência para estabelecer modalidades e critérios próprios, o que abre margem para interpretações divergentes, enfraquecendo a uniformidade e segurança jurídica do processo de licenciamento.

Essa nova arquitetura normativa beneficia diretamente setores ligados à expansão da fronteira fóssil e extrativa, permitindo maior celeridade na instalação de grandes projetos, inclusive em áreas da Amazônia Legal, da Margem Equatorial brasileira e de zonas urbanas densamente povoadas. Tal flexibilização ocorre em descompasso com os compromissos climáticos assumidos pelo Brasil, como a Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) no âmbito do Acordo de Paris, e compromete a governança ambiental em um momento de acelerada crise climática e ecológica.

Entre os projetos fósseis em expansão, são mapeados pelo Instituto:

  • Mais de 130 projetos de termelétricas a gás natural ou carvão mineral em expansão;
  • 22 projetos de terminais de regaseificação de Gás Natural Liquefeito (GNL), em fase de pré-instalação;
  • 21 projetos indicativos de pólos de processamento de gás natural;
  • Cerca de 13 mil km de gasodutos de transporte e 5 mil km de dutos de escoamento planejados para expansão;
  • Blocos exploratórios de petróleo e gás:
    • 417 blocos sob contrato, com atividades de sísmica e perfuração de poços exploratórios em andamento;
    • 34 blocos da 5ª Oferta Permanente de Concessão (OPC), em etapa de assinatura de contratos;
    • 311 blocos incluídos na Oferta Permanente (modalidades de Concessão e Partilha);
    • 1.687 blocos em estudo para ingresso na Oferta Permanente;
  • Aproximadamente 300 processos minerários ativos em fase prévia à concessão de lavra.

Considerando a gravidade do atual cenário, que tende a ser agravada caso o PL 2159/2021 seja sancionado, o Instituto ARAYARA reforça o pedido para que o presidente Lula vete integralmente o texto, em consonância com o artigo 225 da Constituição Federal, que garante o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado. Para garantir um futuro mínimo viável para as atuais e próximas gerações, Lula só tem uma opção – vetar o PL da devastação.

 

George Mendes
Gerente de Geociências do Instituto Internacional Arayara
Engenheiro ambiental e sanitarista

 

Compartilhe

Share on whatsapp
WhatsApp
Share on facebook
Facebook
Share on twitter
Twitter
Share on linkedin
LinkedIn

Enviar Comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Redes Sociais

Posts Recentes

Receba as atualizações mais recentes

Faça parte da nossa rede

Sem spam, notificações apenas sobre novidades, campanhas, atualizações.

Leia também

Posts relacionados

ARAYARA na Mídia: Brazil’s Congress defies Lula to push through “devastation bill” on COP30’s heels

NGOs say the new environmental licensing rules to fast-track mining, energy and infrastructure projects will sweep away existing safeguards, undermining the country’s climate pledges in Belém Brazil’s Congress has pushed through legislation to weaken environmental safeguards for mining, infrastructure and agricultural projects, overriding a partial presidential veto just days after the end of COP30 and setting the stage for a possible showdown

Leia Mais »

Leilão de áreas do Pré-Sal expõe contradição da política energética brasileira e afasta Petrobras da transição energética justa

Leilão de áreas do Pré-Sal pela PPSA ignora tendência global de queda do petróleo e compromete estratégia climática brasileira São Paulo, 04 de dezembro de 2025 – O Primeiro Leilão de Áreas Não Contratadas do Pré-Sal representa mais um passo na contramão da transição energética que o Brasil afirma liderar, ampliando a entrega de recursos estratégicos a empresas privadas nacionais

Leia Mais »

ARAYARA na Mídia: Licença especial acelera licenciamento para empreendimentos que vão do agro à exploração de petróleo na Amazônia

Por Fábio Bispo – InfoAmazônia Parte central de medida provisória aprovada pela Câmara nesta terça-feira (3), a nova Licença Ambiental Especial (LAE) prevê o prazo máximo de até 1 ano para licenciar projetos considerados ‘estratégicos’ pelo governo. Especialistas alertam para afrouxamento de regras para grandes projetos da agropecuária extensiva, mineração e exploração de petróleo. Um relatório redigido e alterado seis

Leia Mais »

Licenciamento especial vai à sanção e ONGs prometem judicializar

Organizações ambientais prometem judicialização de alterações no licenciamento de grandes projetos no Brasil Por Nayara Machado – Eixos NESTA EDIÇÃO. Senado aprova MP do licenciamento especial em votação simbólica. Texto vai à sanção. ONGs classificam mudanças na lei como retrocesso ambiental e prometem levar à Justiça. Em uma votação simbólica na tarde desta quarta (3/12), o Senado aprovou a conversão em

Leia Mais »