+55 (41) 9 8445 0000 arayara@arayara.org

O Brasil na presidência da COP30: entre o protagonismo climático e as contradições internas  

Em 2025, o Brasil terá, pela primeira vez, a missão de liderar a principal conferência climática do planeta: a COP30, que acontecerá em Belém do Pará, no coração da Amazônia. A escolha é carregada de simbolismo — sediar o evento no maior bioma tropical do mundo é um reconhecimento da importância estratégica do país no enfrentamento da crise climática. No entanto, as contradições internas ameaçam minar a legitimidade brasileira como liderança global nesta pauta.

Assumir a presidência da COP não é apenas um gesto diplomático. É uma posição estratégica, que exige coerência entre o discurso e a prática. E é justamente nesse ponto que o Brasil tropeça.

Apesar de defender uma transição energética justa nos fóruns internacionais, o país segue apostando em políticas que reforcem a dependência de combustíveis fósseis. O governo mantém a agenda de leilões de petróleo e gás na margem equatorial — região de elevada sensibilidade socioambiental — e continua investindo em termelétricas. Essa escolha representa um retrocesso diante das alternativas renováveis cada vez mais competitivas e urgentes.

“Leilões de petróleo e gás são escolhas determinantes: ou persistimos em um modelo destrutivo, ou optamos por um novo caminho baseado na vida, na recuperação e na renovação do meio ambiente. O futuro será consequência direta das escolhas que fizermos agora”, alerta Nicole Figueiredo, diretora executiva do Instituto Internacional ARAYARA.

A incoerência vai além da energia. A força do agronegócio segue como um dos principais obstáculos para metas mais firmes de desmatamento zero, enquanto pressiona políticas que priorizam o lucro imediato em detrimento da conservação florestal. Tudo isso enfraquece a imagem do Brasil como articulador de uma agenda climática robusta e comprometida com o futuro.

O financiamento climático será um dos temas centrais da COP30. Países em desenvolvimento precisarão, juntos, de cerca de US$ 2,4 trilhões por ano até 2030 para cumprir suas metas climáticas. O Brasil poderá, sim, cobrar os países ricos por mais recursos — mas também precisará mostrar que esses fundos serão investidos de forma coerente, em soluções sustentáveis, e não para alimentar a expansão de cadeias fósseis dentro de suas próprias fronteiras.

“É inaceitável que, em pleno agravamento da crise climática, bilhões de dólares sigam sendo destinados à expansão de infraestruturas de petróleo, gás e carvão. Falar em ‘transição energética justa’ enquanto se mantém subsídios aos combustíveis fósseis é, no mínimo, contraditório”, critica Figueiredo.

Ela também aponta que uma transição verdadeira precisa redirecionar recursos para energias limpas, com controle social e impactos reais e positivos para as populações mais vulneráveis. “Continuar a investir no passado é negligenciar o futuro”, afirma.

O desafio do Brasil não é pequeno. Envolve romper com interesses extrativistas enraizados na política nacional, enfrentar o lobby de setores poluentes e construir uma nova narrativa de desenvolvimento — uma que coloque a vida e a justiça climática no centro das decisões.

A COP30 representa uma oportunidade histórica de o Brasil se posicionar como um líder global na luta climática. Mas, para isso, será preciso provar, com ações concretas, que a transição energética começa em casa — com o fim dos subsídios aos fósseis, o bloqueio de novos leilões de petróleo e o investimento em soluções baseadas na natureza, na bioeconomia e na geração de empregos sustentáveis.

O que está em jogo vai muito além das duas semanas de negociações em Belém: trata-se do futuro da Amazônia, da capacidade de atrair investimentos verdes e da legitimidade do Brasil como articulador climático global.

No fim, a presidência brasileira da COP30 será julgada não pelo que for dito nos discursos, mas pelo que for feito no território nacional. E essa cobrança precisa começar agora.

Por: Avenida Comunicação

Foto: reprodução/ Creative Commons

Compartilhe

Share on whatsapp
WhatsApp
Share on facebook
Facebook
Share on twitter
Twitter
Share on linkedin
LinkedIn

Enviar Comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Redes Sociais

Posts Recentes

Receba as atualizações mais recentes

Faça parte da nossa rede

Sem spam, notificações apenas sobre novidades, campanhas, atualizações.

Leia também

Posts relacionados

ARAYARA na Mídia: Blick auf COP30: Studie benennt Geldgeber für Extraktivismus in Lateinamerika

Urgewald nennt Banken und Investoren hinter neuen Öl- und Gasprojekten. 138,5 Milliarden Dollar Kredite seit 2022. 92 Prozent aus dem Ausland. Banco Santander vorn, Deutsche Bank mit 3,4 Milliarden Das Titelbild der neuen Studie der Umweltorganisation Urgewald vor der COP30 Berlin/Belém. Fünf Wochen vor dem UN-Klimagipfel in Belém (COP30) zeigt eine neue Studie der deutschen NGO Urgewald das Ausmaß der Öl-

Leia Mais »

ARAYARA na Mídia: Pemex y Petrobras encabezan la expansión petrolera en América Latina

América Latina y el Caribe atraviesan una etapa de acelerada expansión en proyectos de petróleo y gas, liderada tanto por compañías internacionales como por empresas estatales emblemáticas de la región, como Pemex en México y Petrobras en Brasil. Sin embargo, esta tendencia avanza en dirección contraria a los compromisos climáticos internacionales y representa serios costos ambientales y sociales, de acuerdo con el informe “El rastro

Leia Mais »

ARAYARA na Mídia: ¿Qué bancos financian la expansión petrolera en ecosistemas clave de América Latina y el Caribe?

Un informe de Amazon Watch y aliados detalla cómo los grandes bancos internacionales financian empresas que realizan obras gasíferas y petroleras en la Amazonía y sitios centrales de los océanos Atlántico y Pacífico. El estudio explica que los bancos contradicen sus propias políticas para proteger la Amazonía. Fuente: Mongabay, 1 de octubre de 2025. Entre 2022 y 2024, 298 bancos

Leia Mais »

Audiência pública no Congresso discutirá impactos socioeconômicos da exploração do petróleo

Na próxima quarta-feira (09/10), às 10h, a Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados realiza a audiência pública “Impactos da exploração do petróleo no desenvolvimento socioeconômico”, no Anexo II, Plenário 03 da Câmara dos Deputados. O Instituto Internacional ARAYARA estará presente ao lado de outros representantes da sociedade civil, organizações socioambientais e comunidades diretamente afetadas pela indústria petrolífera.

Leia Mais »