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Leilão de áreas do Pré-Sal expõe contradição da política energética brasileira e afasta Petrobras da transição energética justa

Leilão de áreas do Pré-Sal pela PPSA ignora tendência global de queda do petróleo e compromete estratégia climática brasileira

São Paulo, 04 de dezembro de 2025 –

O Primeiro Leilão de Áreas Não Contratadas do Pré-Sal representa mais um passo na contramão da transição energética que o Brasil afirma liderar, ampliando a entrega de recursos estratégicos a empresas privadas nacionais e estrangeiras. Enquanto o mundo se prepara para a queda da demanda por petróleo a partir de 2030, a União opta por vender sua parcela em jazidas essenciais, aprofundando a dependência de combustíveis fósseis justamente quando deveria acelerar sua substituição.

A participação da Petrobrás na produção nacional diminui a cada ano, resultado de privatizações e leilões que fortalecem o controle estrangeiro sobre o setor. Essa lógica privatista e entreguista afasta o país de qualquer projeto de transição energética justa, que exige respeito às comunidades e aos trabalhadores do setor fóssil.

O certame envolve participações da União nos campos de Mero, Tupi e Atapu, áreas altamente produtivas que são oferecidas ao mercado num momento em que a Petrobrás, peça-chave para o futuro energético do país, deveria estar reorientando seu portfólio para fontes renováveis e tecnologias limpas. Ao abrir mão de direitos públicos sobre parte da produção futura, o governo, por meio da PPSA, reforça uma estratégia de curto prazo que fragiliza a soberania energética e reduz a capacidade do Brasil de planejar sua transição para além dos combustíveis fósseis com base em recursos próprios.

A iniciativa tampouco se alinha às metas climáticas brasileiras. O leilão contraria o compromisso de reduzir entre 59% e 67% das emissões até 2035; ignora a necessidade de limitar o aquecimento global a 1,5°C; e se afasta das diretrizes da Estratégia Nacional de Mitigação, que prevê a substituição progressiva dos combustíveis fósseis por energias limpas.

Esse desalinhamento é ainda mais grave diante das tendências do mercado global. A demanda por petróleo deve começar a cair já na próxima década. Ao mesmo tempo, países com petróleo mais barato disputarão o mercado remanescente, ampliando a vulnerabilidade do Brasil. Enquanto isso, royalties e dividendos continuam sendo usados sem estratégia — e não para financiar a transição, como se promete.

A incoerência entre discurso e prática se evidencia também na estratégia da Petrobrás. Mesmo sendo uma das petroleiras mais lucrativas do mundo, a empresa continua priorizando exploração e produção fósseis, enquanto seus investimentos em energia de baixo carbono seguem insuficientes para cumprir o Acordo de Paris – como mostra o novo Plano de Negócios 2026-2030 da empresa, que reduziu as previsões financeiras para transição energética.

Para que o país avance é urgente direcionar recursos para pesquisa, biorrefino, hidrogênio de baixo carbono, biocombustíveis tradicionais bem como a busca para seu desenvolvimento como biocombustíveis avançados e eletrificação. Também é essencial estabelecer regras claras para a redução da demanda interna por derivados e estruturar salvaguardas socioambientais robustas para a bioenergia.

O leilão não representa desenvolvimento nem modernização. É uma aposta cara num modelo ultrapassado e cada vez mais dominado por interesses estrangeiros. Se o Brasil quer se afirmar como potência ambiental e energética, precisa de uma Petrobras comprometida com o futuro — estatal, pública e orientada às necessidades da população, não ao lucro de acionistas.

Trabalhadoras e trabalhadores do setor, sociedade civil e comunidades tradicionais denunciam há décadas a falta de uma política nacional — e popular — capaz de garantir soberania energética e uma transição justa. O leilão apenas aprofunda esse vazio, reforçando um caminho que posterga o futuro e compromete o presente.

Assinam a nota:

Articulação dos Povos Indígenas do Amapá e Norte do Pará (APOIANP)
Arayara
Instituto ClimaInfo
Observatório do Clima
Sindipetro-RJ

 

Comentários de especialistas:

Luene Karipuna – Coordenadora da Articulação dos Povos Indígenas do Amapá e Norte do Pará (APOIANP).
“Temos reforçado em diversos espaços que a transição energética precisa ser coerente entre discurso e prática. O Brasil tem caminhado na contramão do que seria necessário para avançarmos rumo ao abandono dos combustíveis fósseis. As novas fronteiras de exploração que vêm sendo propostas representam um grande erro — não apenas para o país, mas para o mundo — diante da emergência climática que vivemos.
Se o Brasil quer liderar esse processo, precisa assumir uma transição energética que respeite os direitos dos povos, os territórios e, sobretudo, o direito à vida, que é o que está em jogo quando se abre uma nova fronteira de exploração fóssil. É fundamental que a Petrobras assuma, de forma concreta, o compromisso que apresenta em suas propagandas e caminhe, de fato, para uma transição energética justa e acessível.
Não podemos mais ser uma população que não acessa os benefícios da energia, que tem seus territórios impactados e que é continuamente marginalizada por megaprojetos. Precisamos ser parte da transição. E não existe transição energética verdadeira sem diálogo e sem ouvir os povos indígenas e as comunidades tradicionais.”

Sueli Araújo – Coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima
Em vez de priorizar a venda de reservas de petróleo com o único objetivo de fazer caixa, o governo deveria focar no desenvolvimento de um plano de transição energética, prometido há dois anos, mas que sequer está no papel. É mais uma ação no sentido de tentar monetizar rapidamente o petróleo brasileiro sem contabilizar o custo climático e ambiental dessa medida.

Carolina Marçal – Coordenadora de Projetos ClimaInfo
“Ao vender a parcela de petróleo que pertence à União, o governo abre mão de um ativo estratégico e fragiliza a soberania energética do país. Esse leilão não é um passo para o futuro — é a reafirmação de um modelo ultrapassado que ameaça nossa transição energética, já que os recursos financeiros dessa produção poderiam ser revertidos para a expansão de fontes renováveis e combustíveis de baixo carbono, reduzindo a dependência de petróleo e gás.”

Antony Devalle – Sindipetro-RJ.

“Não existe transição energética justa quando o Estado abre mão do controle das reservas e submete os trabalhadores à lógica exclusiva do lucro. A transição só é possível com planejamento, participação social e uma Petrobras estatal a serviço do povo brasileiro.”

Nicole Oliveira – diretora executiva do Instituto Internacional ARAYARA
“Os princípios da transição energética justa deixam evidente que não existe transição energética justa sem governança pública e popular da cadeia do petróleo, inclusão dos trabalhadores e redução planejada das fronteiras fósseis. O leilão de hoje faz exatamente o contrário: amplia riscos, desmonta a soberania e posterga o descomissionamento necessário.”

Renata Prata – Coordenadora de Advocacy e Projetos do Instituto Internacional ARAYARA
“Muito se fala de insegurança energética como desculpa para abrir novas fronteiras. Entretanto, quem defende a segurança energética do país deve se lembrar que novos poços estão sendo descobertos no próprio pré-sal, possibilitando o abastecimento nacional, bem como se opor a leilões e exportações. Soberania energética e climática do Brasil depende do não investimento em novas fronteiras e do esforço pelo planejamento público e popular da transição energética justa.”

 

Fonte: SindipetroRJ

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