Na manhã desta sexta-feira (5), o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) derrubou a decisão que havia suspendido a Licença de Operação da Usina Termelétrica Candiota III e da Mina de Carvão Candiota em 22 de agosto. O desembargador Marcos Roberto Araújo dos Santos argumenta que a suspensão das licenças não se justifica e “não é recomendável, dado os gravíssimos prejuízos daí decorrentes à empresa e à coletividade”. Entidades ambientalistas signatárias da Ação Civil Pública que acarretou na suspensão das licenças, no entanto, apontam que a nova decisão desconsiderou os danos ambientais causados pela usina e pela mina.
A ação foi movida pelas organizações Núcleo Amigos da Terra Brasil, Instituto Preservar e pela Instituição Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), às quais se juntou posteriormente o Instituto Internacional Arayara. Presidente da Agapan, Heverton Lacerda afirma que a decisão não é definitiva e cabe recurso: “Vamos recorrer. [O desembargador] não analisou o mérito do processo”.
A decisão original determinava que o Ibama suspendesse a Licença de Operação da Usina Candiota III, por descumprimento da Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC) e da Política Gaúcha sobre Mudanças Climáticas (PGMC). O órgão deveria incluir condicionantes climáticas na licença, levando em consideração toda a cadeia de valor de emissões do empreendimento e de seu descomissionamento. Do mesmo modo, a Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) também foi condenada a suspender a Licença de Operação da Mina de Candiota.
Essa parte da sentença original continua em voga, uma vez que o desembargador deferiu parcialmente o pedido de
concessão de efeito suspensivo. Ou seja: a suspensão das licenças foi derrubada, mas Ibama e Fepam ainda precisam adequar as licenças às políticas nacional e gaúcha sobre mudanças climáticas.
“Esperamos que as demais determinações da sentença sejam devidamente cumpridas pelos réus, tendo em vista que seguem vigentes e impõem medidas urgentes para que o Estado do RS e a União cumpram o que está previsto na PGMC e PNMC”, afirma o presidente da Agapan. “Aguardamos sensibilidade do poder judiciário para considerar as irregularidades apontadas e encaminhar em defesa da sociedade, que já está enfrentando as consequências iniciais das mudanças climáticas”.
O Instituto Arayara relembra que a Usina Candiota III figura entre as maiores fontes de poluição do ar no Sul do Brasil. Estudos técnicos do Instituto apontam que, apenas nos anos de 2019 e 2021, a usina ultrapassou mais de 6.000 vezes os limites de emissão de poluentes atmosféricos previstos na Licença de Operação, incluindo dióxido de enxofre (SO₂), óxidos de nitrogênio (NOx) e material particulado (MP).
A empresa Âmbar Sul Energia interpôs recurso à decisão de suspender as licenças, alegando que a medida suspensiva ora acarreta-lhe o prejuízo de R$ 2 milhões por dia (equivalente a R$ 60 milhões por mês) no faturamento, compromete o abastecimento energético nacional, bem como dificulta a manutenção de aproximadamente 1.500os empregos diretos no município de Candiota.
Ao acatar esse argumento para derrubar a suspensão das licenças, segundo o Instituto Arayara, o Judiciário deixou de ponderar com o “periculum in mora” ambiental: os riscos sérios e irreversíveis à saúde e ao meio ambiente. Na prática, houve inversão do ônus argumentativo: aceitou-se de imediato o discurso econômico da empresa, mas não se enfrentaram as evidências de violações ambientais e climáticas já amplamente reconhecidas em primeira instância.
O Instituto traz dados do IBGE de 2022 para indicar que Candiota tem uma população total de 10.710 pessoas, das quais 2.894 ocupam postos de trabalho formais. Nos autos do processo, não há qualquer evidência de que aproximadamente 70% da população da cidade trabalhe diretamente na usina ou na mina de carvão.
Fonte: Sul21
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