O Instituto Internacional ARAYARA realizou, na noite de ontem (29), uma reunião de capacitação para tratar dos riscos da exploração de petróleo em Fernando de Noronha. O especialista em oceanografia e gerente de operações da ARAYARA, Vinicius Nora, e a geógrafa e chefe do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) da região, Lilian Hangae, demonstraram os perigos que Noronha sofre com a oferta de 16 blocos da Bacia Potiguar para exploração de petróleo no leilão do 5º Ciclo da Oferta Permanente de Concessão (5OPC) da Agência Nacional de Petróleo (ANP), agendado para o dia 17 de junho no Rio de Janeiro.
O evento lotou o auditório do Centro de Visitantes do ICMBio e reuniu empresários, empreendedores e ambientalistas de Noronha. A reunião aconteceu um dia após o Instituto Internacional ARAYARA ajuizar uma Ação Civil Pública, com pedido liminar, para suspender a oferta de 16 blocos de petróleo na Bacia Potiguar prevista na 5ª rodada da Oferta Permanente da ANP. Os blocos estão próximos ou sobrepostos à Cadeia de Montes Submarinos de Fernando de Noronha e ao Atol das Rocas, áreas reconhecidas internacionalmente por sua biodiversidade.
De acordo com Nora, os blocos estão situados em uma região de altíssima sensibilidade socioambiental, inclusive sobrepostos a ecossistemas recifais únicos que abrigam espécies marinhas endêmicas e vulneráveis fundamentais para o equilíbrio ecológico. “A exploração de petróleo em uma região reconhecida internacionalmente por sua biodiversidade, destino turístico de brasileiros e estrangeiros, pode resultar em um grande desastre ambiental, com prejuízos tanto para os ecossistemas marinhos quanto para as populações vulneráveis”, aponta Vinicius Nora. Ele também destaca a importância do diálogo permanente entre cientistas e comunidade. “A ciência está aqui, investindo horas em pesquisas e dialogando com a população para educar, sensibilizar, mobilizar e evitar mais uma tragédia por falta de responsabilidade do poder público”, afirma o biólogo.
O Grupo de Trabalho Interinstitucional de Atividades de Exploração e Produção de Óleo e Gás (GTPEG), vinculado ao governo federal, já recomendou duas vezes a exclusão integral dos blocos devido à alta sensibilidade ambiental. Em termos jurídicos, a ARAYARA aponta que a oferta dos blocos pela ANP baseia-se em uma Manifestação Conjunta de 2020 entre Ministério de Minas e Energia (MME) e Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), que expira em 18 de junho de 2025, um dia após o leilão, o que fere a legalidade do processo.
Do ponto de vista técnico, um estudo que acaba de ser lançado pela ARAYARA demonstra que os 16 blocos incluídos no 5OPC sobrepõem-se a estruturas submarinas de alta relevância ecológica. Eles estão localizados sobre os montes oceânicos Sirius, Guará e o Platô do Ceará. Essas áreas em profundidades iguais ou inferiores a 500 metros abrangem uma extensão aproximada de 1.405 km² — o equivalente a mais de seis vezes a área da cidade do Recife (PE). Além disso, a região abrange montes submarinos de origem vulcânica, ecossistemas recifais e corredores ecológicos fundamentais à biodiversidade marinha, cujos impactos potenciais não foram devidamente considerados pela ANP.
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Segundo a ARAYARA, a exploração de petróleo nesses locais contraria princípios constitucionais como o da precaução e do desenvolvimento sustentável, além de comprometer a resiliência climática do país em plena crise ambiental global. A organização alerta ainda para os riscos de vazamentos e proliferação de espécies invasoras, como o coral-sol, que podem causar impactos irreversíveis à biodiversidade e ao turismo da região Nordeste.
Riscos à biodiversidade e populações tradicionais
De acordo com a oceanógrafa Kerlem Carvalho, da equipe técnica da ARAYARA, esses ecossistemas recifais também sustentam atividades econômicas como a pesca e o turismo sustentável. Ela explica que a exploração nessas áreas representa risco direto à biodiversidade, podendo causar perturbações acústicas e físicas, favorecer a proliferação de espécies invasoras como o coral-sol (Tubastraea spp.) e aumentar a possibilidade de acidentes ambientais.
“É inaceitável ameaçar ecossistemas de valor global como Fernando de Noronha e o Atol das Rocas”, alerta Carvalho. “Sem uma Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS) transparente e concluída, não é possível mensurar os impactos da exploração de petróleo. A AAAS é essencial para garantir que apenas áreas realmente seguras e ambientalmente viáveis sejam ofertadas para concessão. Exploração sem esse critério é retrocesso”, completa.
A diretora executiva da ARAYARA, Nicole Figueiredo de Oliveira, lembra que a Ação Civil Pública ajuizada solicita a suspensão imediata da oferta dos blocos na Bacia Potiguar, a anulação definitiva da licitação desses blocos e o reconhecimento da ilegalidade da Manifestação Conjunta usada, além de solicitar o respeito aos pareceres técnicos e às normas socioambientais. “Estamos diante de um possível desastre climático em um paraíso como Fernando de Noronha. A gravidade da situação nos impele a entrar na justiça e solicitar a suspensão imediata da oferta dos 16 blocos da Bacia de Potiguar. A população já está consciente, mobilizada e irá resistir a mais uma tentativa de exploração de petróleo na região”, pontua Nicole.
Na manhã desta sexta-feira (30), na Cacimba do Padre, aconteceu o ato SALVE NORONHA – NÃO AO PETRÓLEO. O Instituto Internacional ARAYARA também convida a comunidade a assinar a Petição Popular em Defesa de Fernando de Noronha e Contra a Exploração de Petróleo no site https://salvenoronha.arayara.org/.
Comunicação ARAYARA- Luz Dorneles