O ARAYARA Amazon Climate Hub recebeu, na tarde desta terça-feira (11), uma essencial roda de conversa sobre o Direito à Consulta e ao Consentimento Livre, Prévio e Informado (CCPLI) e o papel estratégico dos Protocolos de Consulta. O debate, aberto ao público, reuniu pesquisadoras indígenas do IDGlobal e o Observatório dos Protocolos de Consulta, destacando que a consulta não é mera formalidade, mas um processo político fundamental para a autodeterminação dos povos.
O CCPLI é regulamentado pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), em vigor no Brasil desde 2003, e exige que toda medida legislativa ou administrativa – pública ou privada – que possa afetar povos indígenas, quilombolas e demais comunidades tradicionais seja submetida a uma consulta.
Protocolos de Consulta: Um Mecanismo de Autonomia Comunitária
As pesquisadoras do IDGlobal, que são também representantes de suas comunidades, trouxeram a perspectiva de quem vive a realidade dos impactos. Aíla Monteiro de Oliveira, pesquisadora indígena pernambucana, enfatizou a importância dos Protocolos de Consulta como um instrumento de defesa comunitária.
“As comunidades precisam ser consultadas independente desse protocolo, mas no nosso país os protocolos são um mecanismo para que a própria comunidade coloque as normas que devem ser respeitadas dentro desse território,” explicou Aíla.
Ela reforçou que o Protocolo de Consulta é um documento construído pela própria comunidade – em português ou língua nativa –, que define as regras e os modos de vida que devem ser respeitados pelos empreendimentos e governos. A iniciativa e as decisões sobre o formato e conteúdo devem ser sempre das comunidades.
O Desafio de Traduzir o Direito “Branco”
A complexidade de aplicar o direito ocidental nas realidades coletivas dos povos tradicionais foi um ponto central na fala de Amirele Porto Machado, pesquisadora do povo Guarani Kaiowá e Terena (MS) pelo IDGlobal.
Amirele apresentou o projeto “Língua Indígena Viva no Direito”, que traduz a Constituição Federal para três línguas indígenas (Tikuna, Kaingang e Guarani Kaiowá), utilizando a consulta prévia para guiar o processo.
“A comunidade em si trouxe o questionamento de como traduzir o direito branco para que fizesse sentido na língua indígena,” relatou Amirele.
Ela trouxe o exemplo da língua Guarani, onde a palavra terra possui um significado muito mais amplo do que no português, evidenciando as lacunas do direito individualista que se choca com a lógica coletiva dos territórios.
Consulta e Justiça Energética na Amazônia
Júlia Soares, também pesquisadora do IDGlobal, trouxe exemplos de como a ausência ou falha na consulta prévia está diretamente ligada à justiça energética. Ela citou o programa de Universalização Energética, como o “Luz Para Todos”, na região do Xingu.
Segundo Júlia, muitas vezes a chegada das concessionárias e do governo federal aos territórios ocorre com uma comunicação falha. Isso resulta em instalações que não respeitam os costumes locais, equipamentos sem manutenção e, crucialmente, endividamento em massa das famílias por falta de compreensão sobre a política pública.
A pesquisadora destacou que o monitoramento do programa “Luz Para Todos” no Xingu levou 16 povos a elaborarem uma carta conjunta, denunciando o não cumprimento do seu Protocolo de Consulta e exigindo que suas demandas fossem atendidas.
O encontro reforçou a necessidade de enfrentar a não observância dos protocolos por parte de empresas e governos, fortalecendo o protagonismo indígena nas decisões que impactam seus territórios e modos de vida, em linha com a missão do ARAYARA Amazon Climate Hub de promover soluções para a crise climática a partir dos saberes tradicionais.














