Programa “Defensores dos Defensores”, desenvolvido pelo Instituto Internacional ARAYARA busca fortalecer a proteção de ambientalistas ameaçados
Após o lançamento oficial em Brasília, o Programa Defensores dos Defensores, do Instituto Internacional ARAYARA, foi apresentado em São Paulo, na última terça-feira (25/3), na sede da Defensoria Pública da União na cidade de São Paulo. A iniciativa busca oferecer suporte jurídico, humanitário e psicológico a defensores climáticos ameaçados no Brasil e na América Latina, além de atuar na prevenção de ameaças e no fortalecimento de redes de proteção.
Em seu discurso, a diretora da ARAYARA enfatizou a importância do programa: “O Estado deveria garantir a segurança dessas pessoas, mas, muitas vezes, é ele próprio quem promove ou se omite diante das violações. Nosso programa surge para oferecer o suporte necessário, permitindo que os ativistas continuem lutando por seus direitos, seus territórios, suas famílias e suas vidas”, afirmou Nicole Figueiredo de Oliveira.
Mesa de debate reúne especialistas e lideranças
O evento contou com um debate impactante entre especialistas e lideranças sobre a proteção de defensores de direitos humanos e do meio ambiente. Entre os participantes estavam Claudelice Silva Santos, coordenadora do Instituto Zé Cláudio e Maria, que atua na proteção de ativistas e avanço de políticas públicas para defensores na região do Pará; Beatriz Lourenço, Diretora de Incidência Política e Litigância Estratégica do Instituto de Referência Negra Peregum; o Cacique Awatenondegua, liderança Tupi Guarani e coordenador geral da Articulação dos Povos Indígenas da Região Sudeste – ARPIN SUDESTE; e o defensor público Murillo Martins, representante da Defensoria Regional de Direitos Humanos em São Paulo.
A mediação ficou a cargo de Ana Cláudia Mielke, coordenadora do Coletivo Intervozes. A professora Marijane Vieira Lisboa abordou sua experiência como relatora especial para Direitos do Meio Ambiente na Plataforma DHESCA e alertou sobre os riscos da litigância estratégica contra a participação pública (LEPP). Ela defendeu a criação de uma lei anti-LEPP no Brasil, para impedir a judicialização abusiva contra ativistas.
Já Claudelice Silva Santos, reforçou a necessidade de ampliar os programas de proteção e garantir mecanismos que fortaleçam a autoproteção de defensores e comunidades, de forma dialógica e adaptada às realidades locais.
Integrante da equipe do Programa Defensores dos Defensores, Heloisa Simão, celebrou. “Ficamos contentes com a participação ativa de todos os convidados, foi um encontro riquíssimo, marcado por falas contundentes e análises aprofundadas sobre os desafios enfrentados pelos defensores e perspectivas de uma proteção mais efetiva a estas pessoas”.
Proteção multidisciplinar e ação coletiva
Segundo Figueiredo, o programa adota uma abordagem multidisciplinar e interseccional, integrando diferentes áreas do conhecimento para garantir proteção efetiva. Durante o evento, especialistas discutiram a importância do acolhimento psicológico, social e comunitário, além da necessidade de fortalecer a articulação entre instituições e movimentos sociais.
A coordenadora do Instituto Zé Claudio e Maria, Claudelice Silva Santos, reforçou a necessidade de auto-organização dos defensores: “Não basta apenas oferecer proteção individual, é essencial garantir a segurança coletiva e fortalecer as redes de defesa que já atuam na linha de frente”, pontuou.
Confira as fotos do lançamento oficial do programa em SP
Povos indígenas e quilombolas em luta por seus direitos
O evento também deu destaque à luta dos povos indígenas e quilombolas no estado de São Paulo. O cacique Awatenondegua enfatizou a importância do reconhecimento das tecnologias ancestrais e da resistência indígena. “Os povos indígenas protegem a natureza há séculos, mas continuam sendo ameaçados. Precisamos viabilizar essa luta e garantir direitos territoriais para impedir novas violações”, afirmou.
Ivo Santos Rosa e Oriel Rodrigues de Morais, lideranças quilombolas do Vale do Ribeira, denunciaram ameaças constantes, como a falta de regularização fundiária e os impactos de empreendimentos energéticos e agropecuários em seus territórios. Foram mencionados os assassinatos da Ialorixá Mãe Bernadette do Quilombo Pitanga dos Palmares, na região metropolitana de Salvador, além de Laurindo Gomes, agente comunitário de saúde e expressiva liderança do Quilombo de Praia Grande, em São Paulo, reforçando a urgência da proteção a defensores quilombolas.
Na região do Vale do Ribeira, onde estão localizados os quilombos Sapatu e Ivaporunduva, projetos de hidrelétricas já foram barrados pela mobilização quilombola. No entanto, novas ameaças surgem com outros empreendimentos energéticos, o que mantém a luta das comunidades ativa.
Outro ponto abordado foi a necessidade de uma transição energética justa, levantando o questionamento sobre para quem essa energia é produzida e quem arca com seus impactos. A iniciativa de dar voz aos quilombolas foi elogiada, assim como a participação de organizações que se somam à luta pela proteção dos defensores dos direitos dessas comunidades.
Justiça climática e racismo ambiental
A diretora do Instituto Peregum, Beatriz Lourenço, destacou que a luta pela justiça climática está diretamente ligada ao combate ao racismo ambiental. Segundo ela, “é impossível falar sobre proteção de defensores sem considerar a realidade da população negra e periférica, que sofre os maiores impactos da crise climática”.
O evento reforçou o compromisso do Programa Defensores dos Defensores em atuar de forma estruturada e permanente, expandindo suas atividades para todo o Brasil e América Latina.
A presença de mandatos parlamentares, como da vereadora Keit Lima, e dos deputados Eduardo Suplicy e Guilherme Cortez, evidenciou a relevância do tema no debate político. Organizações como o Instituto Futuro, Instituto de Conservação Costeira, Oxfam e Comissão Pró-Indio também marcaram presença, fortalecendo a articulação entre diferentes setores da sociedade.
Para a diretora da ARAYARA, o evento evidenciou a urgência de ações concretas para garantir a segurança e a continuidade do trabalho dos defensores, ressaltando o papel fundamental da sociedade civil e das instituições na defesa dos direitos humanos e ambientais.
“O lançamento do programa foi marcado por discursos impactantes, trocas de experiências e a reafirmação da necessidade de proteger aqueles que dedicam suas vidas à luta pelo meio ambiente e pelos direitos humanos. Como disse o Cacique Awatenondegua: ‘A esperança virá quando superarmos a doença do homem branco quer ter e passarmos a viver com base no quer viver, o bem viver’”, concluiu Figueiredo.