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COP30 Debate Bioeconomia Azul Contra Ameaça de Exploração de Petróleo na Amazônia Costeira

A Amazônia não é apenas verde. É também azul e alagada. Foi com essa premissa que o ARAYARA Amazon Climate Hub sediou o evento “Amazônia Costeira em Alerta: Petróleo, Pesca Artesanal e o Futuro da Alimentação” nesta quarta-feira (12), reunindo pesquisadores e lideranças dos territórios para debater o papel estratégico das águas amazônicas para a segurança alimentar e a biodiversidade.

O encontro, que teve a participação do Instituto Internacional ARAYARA, do Instituto Mapinguari e do ICMBIO, além da representação de comunidade indígena, evidenciou como a negligência histórica com a zona costeira está sendo cobrada, especialmente com o avanço da exploração de petróleo na região.

A Fronteira Fóssil e o Impacto na Pesca

A costa amazônica, que engloba o encontro do rio, do mar e da floresta, é uma área imensa, estratégica para o clima global por abrigar carbono azul e, economicamente, pela pesca artesanal. Contudo, essa região enfrenta uma fronteira imensa de exploração de petróleo, conforme alertou Kerlem Carvalho, coordenadora de Oceano e Águas do Instituto Internacional ARAYARA.

Kerlem explicou que o impacto do petróleo vai muito além do risco de vazamento: ele começa na fase inicial da exploração, a sísmica.

“A sísmica é a atividade que mapeia o fundo marinho para ver em quais locais existem poços viáveis para a exploração massiva,” disse. “Não falamos apenas do bloco 59, mas de 44 blocos que existem na costa amazônica. Uma área que atravessa Amapá, Pará e Maranhão.”

A sísmica gera zonas de exclusão para os pescadores e risco de rompimento de equipamentos de pesca, cujos prejuízos não são ressarcidos. A ARAYARA apresentou dois estudos que mapeiam como o petróleo impacta diretamente a pesca, transformando a discussão em uma questão de risco e impactos em cadeia, do mar à mesa do consumidor.

Oiapoque e a Invasão da Pesca Industrial

O impacto direto da pressão extrativista foi relatado por José Damaceno, vice-cacique da aldeia do Açaizal, da etnia Karipuna, em Oiapoque (AP). Ele testemunhou a chegada da Petrobras e as consequências imediatas para a segurança alimentar de sua comunidade.

A instalação de plataformas petrolíferas reduziu drasticamente o espaço dos pescadores, gerando uma reação em cadeia perigosa.

“Acontece invasão dos pescadores no nosso rio, porque eles não têm onde pescar, então invadem o rio na terra indígena,” relatou.

Além do conflito territorial e da invasão de barcos de pesca maiores, o cacique Karipuna trouxe a vulnerabilidade da subsistência. A mandioca, que era o “banco” da comunidade para alimentação e comércio, foi afetada por doenças, forçando a compra de farinha na cidade.

O líder indígena expressou desconfiança sobre as promessas de segurança das empresas: “Uma conversa com um representante da Petrobras afirmou que caso haja um acidente de vazamento, não pode nos atingir. Mas se nós mesmos sabemos que a maré sobe e desce e chega na nossa terra. Então sabemos que um impacto forte vai prejudicar a gente.”

O Manguezal, a Bioeconomia Azul e o Protagonismo Feminino

Gabriele Soeiro, do ICMBio, coordenadora do CNPT, corroborou a visão de que a Amazônia “verde” recebe mais visibilidade, enquanto a “Amazônia azul” fica sub-representada.

“A fala do cacique resume muito do que a gente acredita, e traz à tona o que é a verdadeira luta das comunidades tradicionais costeiras,” afirmou.

Ela destacou que a costa amazônica abriga o maior contínuo de manguezais do mundo e que o ICMBio trabalha para fortalecer o protagonismo dos povos em unidades de conservação. A saída passa pelo investimento na bioeconomia azul, que apoia o manejo sustentável da pesca.

Gabriele ressaltou ainda o papel fundamental das mulheres neste cenário: “As coisas começam com as mulheres, à frente das tomadas de decisões, chefes de família, então investimos em fortalecimento de gênero e no amanhã, investimos em juventude”.

O painel concluiu que não há como construir uma transição justa e garantir a segurança alimentar sem a escuta ativa das comunidades e a incorporação de seus conhecimentos – como o Livro dos Marcadores do Tempo do povo Karipuna, que registra as percepções indígenas sobre as mudanças climáticas e o manejo do território.

Fotos: Odaraê Filmes

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