Termelétricas e fracking promovem grande impacto e geram escassez hídrica
O Instituto Arayara realizou na terça-feira (22), o Dia Mundial da Água, a live “Vampiros Hídricos – como a água sofre ameaças com o uso de combustíveis fósseis”. O debate abordou como as termelétricas “sugam” recursos hídricos, produzindo escassez e induzindo conflitos sociais em áreas onde a falta d’água já é uma realidade. A perfuração de poços para obtenção de gás, mais conhecido como fracking, também ameaça os mananciais.
Participaram da live o professor de direito ambiental e urbanístico, presidente da Comissão de Meio Ambiente da OAB do Ceará João Alfredo Telles Melo, o presidente do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA) André Luis Ferreira e a diretora da Arayara Nicole Figueiredo de Oliveira. A mediação foi da jornalista Sílvia Marcuzzo.
O presidente do IEMA destacou que o Brasil tem apostado de forma equivocada na expansão da termeletricidade. Além das usinas já em operação, pelos menos outras 100 já estão licenciadas ou em processo de licenciamento.
Ineficiência energética
“Nas termelétricas, quase metade da energia contida no combustível não vira eletricidade. Há outras em que 70% da toda energia vira poluição”, explicou Ferreira.
Ou seja, além de emitir gases do efeito estufa e poluentes atmosféricos, os empreendimentos fazem mal uso da água em um processo de geração de energia altamente ineficiente.
Para expelir essa grande quantidade de calor, as usinas fazem utilização massiva de água com o objetivo de resfriar a estrutura. “Uma usina de mil megawatts a gás vai consumir água equivalente a uma população de 150 mil habitantes. Com o agravante de que 70% da água captada evapora e não retorna à bacia em que ela está”, disse.
Nas usinas a carvão, segundo Melo, a situação é ainda pior. “Em uma térmica de mil megawatts, a captação de água equivale a uma população de 450 mil habitantes”. Então a usina tira a água da bacia, e essa água não é devolvida. Ela é evaporada pelo sistema de resfriamento”, pontuou Ferreira.
“Vampiros hídricos” em regiões de seca
Telles Melo apontou que os “vampiros hídricos” produzem ainda mais impactos em áreas que passam pela escassez de recursos hídricos. É o caso do estado do Ceará, localizado no semi-árido mais habitado do planeta. No nordeste brasileiro, vivem mais de 20 milhões de pessoas, em meio ao clima seco e à baixa ocorrência de aquíferos.
O Ceará, porém, apostou na criação do terminal portuário Pecém, que gerou grande interesse industrial, pela facilidade de escoamento da produção.
“Os governos cearenses criaram condições para trazer essas indústrias mesmo não havendo água suficiente”, afirmou.
Atraído pelo desconto de 50% na tarifa de água, o bilionário Eike Batista foi um dos grandes empresários dos interessados. Com o grupo MPX, ele construiu duas termelétricas na região. “Ambas têm outorga de 750 litros de água por segundo. E temos uma siderúrgica autorizada a usar mil litros por segundo”, afirmou.
Com infraestrutura hídrica insuficiente, o resultado foi o desabastecimento de comunidades indígenas do povo Anacé, que habitam a região desde o século XVI. “Eles foram desalojados em benefício dessas grandes indústrias e temem perder sua água que foi roubada”, afirmou.
“Os vampiros hídricos estão nas siderúrgicas, termelétricas, no agronegócio e na mineração. Mas tem resistência. Essas lutas têm tido muita força e muito enfrentamento. Nós temos o vampirismo, mas temos também os que lutam contra os vampiros”, ressaltou o professor, com mestrado e doutorado na Universidade Federal do Ceará.
Arayara convida à mobilização
Mesmo diante de gigantes do roubo da água, é possível lutar para impedir o avanço dos empreendimentos. Para o presidente do IEMA, cidadãos e cidadãs devem participar e questionar o processo de expansão da geração termelétrica, especialmente no que diz respeito ao uso da água.
“É preciso pressionar as agências ambientais e as agências de água que fazem a outorga. Por outro lado, deve-se cobrar Aneel [Agência Nacional de Energia Elétrica], que faz o edital dos leilões. Nesses leilões, devem ser vetadas usinas que utilizam água em áreas críticas”, disse.
Representando a Arayara no debate, Nicole Figueiredo de Oliveira reafirmou que o Instituto está ao lado da população na luta contra os vampiros hídricos. “Fizemos audiências públicas na Assembleia Legislativa do Ceará a respeito do ICMS da água para o complexo do Pecém. E estamos fazendo audiências públicas a respeito da exploração do carvão”m lembrou.
Além da participação em audiências públicas, Oliveira destaca que é possível se mobilizar cobrando políticos eleitos, acompanhando a formação de políticas públicas e participando das discussões do orçamento participativo, entre outros meios.
“E se você não puder fazer nada disso, temos formas de fazer pressão digital. Temos petições para que o carvão não seja estendido por mais 20 anos no Brasil e para que as fronteiras petrolíferas não sejam expandidas. Estão todos e todas convidados para se engajar nesse movimento conosco”, disse a diretora da Arayara.
Confira a live: