Alvo de vários debates sobre a sua continuidade ou não, a usina de Candiota 3 verificou recentemente o acréscimo de mais um elemento que pode definir o seu destino. Sentença proferida pela juíza federal em Porto Alegre, Rafaela Santos Martins da Rosa, condena o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) a suspender a Licença de Operação (LO) da termelétrica a carvão gaúcha por inobservância às diretrizes da Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC) e ao decreto estadual 56.347/2022, que trata sobre mudanças climáticas.
A determinação da Justiça inclui condicionantes climáticas na licença da usina levando em consideração toda a cadeia de valor de emissões do empreendimento. Além disso, a sentença condena a Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) a suspender a Licença de Operação da Mina de Candiota, que pertence à estatal Companhia Riograndense de Mineração (CRM) e fornece o carvão para Candiota 3.
Os desdobramentos são resultados da Ação Civil Pública Nº 5050920-75.2023.4.04.7100/RS, que teve como autores o Instituto Preservar, a Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan) e o Núcleo Amigos da Terra Brasil. O tema ainda é passível de recurso, mas já causou divergências de interpretações sobre a possibilidade da manutenção da operação da termelétrica.
Para a prefeitura de Candiota e para a Associação Brasileira do Carbono Sustentável (ABCS), a sentença não significaria necessariamente a interrupção iminente da atividade da planta. No entanto, a advogada Marina Dermmam, que representa os autores da ação, discorda dessa posição e considera que a usina precisa ser paralisada de forma imediata.
Conforme o presidente da ABCS, Fernando Zancan, a sentença não deixa claro que precisa parar a operação da térmica. Para o dirigente, a determinação judicial incorpora algumas condicionantes no processo de licenciamento da usina. “Mas, no futuro”, avalia Zancan. O representante da ABCS reforça que a perspectiva é que a termelétrica continue funcionando, apesar dele admitir que a questão será motivo de uma grande discussão jurídica. “Na verdade, é um processo de litigância climática como tem em vários lugares do planeta”, diz Zancan.
Já no entendimento da advogada dos autores da ação, se Candiota 3 persistir em manter sua operação, ela estará atuando irregularmente. “Não ter uma licença de operação significa, consequentemente, que não pode operar”, argumenta Marina. Procurado pela reportagem do Jornal do Comércio (JC), o departamento de Comunicação Social da Justiça Federal informou que a juíza Rafaela está em viagem para um evento em Minas Gerais e São Paulo e, no momento, não se manifestará sobre a sentença. No entanto, a assessoria confirmou que a determinação é pela suspensão imediata da operação da usina.
Marina lembra que a ação foi ingressada em 2023 pelas entidades ambientais. Os réus abrangidos são a União, Ibama, Fepam, Eletrobras CGT Eletrosul (antiga controladora da usina, antes dela ser vendida para a Âmbar Energia), Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Estado do Rio Grande do Sul e CRM.
Por sua vez, o prefeito de Candiota, Luiz Carlos Folador, comenta que nesta segunda-feira (25) a usina não estava produzindo por uma situação de preço de energia, mas não por uma questão relacionada ao imbróglio judicial. O empreendimento, que desde o começo do ano está sem um contrato de longo prazo firmado, vem atuando no mercado spot (de curto prazo). Segundo o prefeito, a expectativa é que a unidade volte a operar em breve com a melhora das condições de venda de energia.
Apesar de reforçar que Candiota 3 ainda está funcionando, Folador assinala que a discussão judicial gera muita insegurança na comunidade local. “Isso acaba assustando a população”, aponta o dirigente. O prefeito lamenta ainda que as críticas à planta gaúcha vêm em um momento em que o Operador Nacional do Sistema (ONS) defende o acionamento das termelétricas para aumentar a segurança do fornecimento elétrico no Brasil. Ele cita também que a região tem dificuldades econômicas e a usina proporciona relevantes postos de trabalho.
Em nota, a Âmbar Energia, atual proprietária da termelétrica, afirma que “recebeu com surpresa e indignação a decisão judicial, proferida apesar do cumprimento integral de todas as exigências legais e da posse de todas as licenças necessárias para a operação da usina”. O comunicado acrescenta que “a medida contraria autorizações já concedidas, fere a segurança jurídica e ameaça a confiabilidade do sistema energético em um momento em que a contribuição das usinas termelétricas é essencial para garantir o fornecimento de energia ao País.” Já sobre a mina de Candiota, a questão está sendo tratada pela Procuradoria-Geral do Estado (PGE-RS), que informa que “está ciente da decisão e avalia as medidas judiciais cabíveis”.
A iniciativa do Instituto Preservar, da Agapan e do Núcleo Amigos da Terra Brasil não é a única a questionar a operação de Candiota 3. Em julho deste ano, o Instituto Internacional Arayara protocolou uma Ação Civil Pública contra as operadoras da térmica exigindo a paralisação imediata e definitiva das atividades da unidade. O engenheiro ambiental do Instituto Arayara, John Fernando de Farias Wurdig, relata que ainda é esperado um desfecho na Justiça sobre essa movimentação.
Fonte: Jornal do Comércio
Foto: reprodução/ Jornal do Comércio/Tatiana Gappmayer/Divulgação/JC