Organizações criticam inclusão de UTEs a carvão no LRCAP: alto impacto ambiental e baixa eficiência
A previsão de contratação de usinas a carvão no leilão de reserva de capacidade (LRCAP) reacendeu a discussão sobre o papel — e os custos — dessa fonte fóssil na matriz elétrica brasileira, que é marcada por alta renovabilidade.
Organizações da indústria e ambientais criticam a insistência política na prorrogação do prazo do carvão na geração de energia, enquanto o setor carbonífero — concentrado na região Sul — defende que a descontinuidade do fóssil depende de planos concretos para uma transição justa.
O leilão, cujo edital foi publicado para consulta pública na última sexta (22/8), vai contratar termelétricas existentes a carvão e gás natural, além de usinas novas a gás, e a ampliação de usinas hidrelétricas. Os projetos precisam entrar em operação entre 2026 e 2030.
É a segunda versão da proposta do governo. A primeira, previa a realização do certame em junho, mas foi cancelada após judicializações.
A inclusão das térmicas a carvão e retirada dos biocombustíveis da concorrência acenderam o alerta na Associação Nacional dos Consumidores de Energia (Aanace).
Em nota, a organização que representa indústrias que consomem 10 mil MW médios de energia e 1 milhão de m3 por dia de gás, aponta custo elevado, alto impacto ambiental e baixa eficiência na contratação das usinas.
E questiona a flexibilidade — um dos objetivos do leilão — nesse tipo de contratação.
“As usinas a carvão mineral disponíveis para participar do leilão têm prazos de entrada e saída de operação muito longos, não atendendo o principal requisito desse processo competitivo, que é o atendimento à demanda de potência flexível”, diz em nota.
Vale dizer: o MME propõe que a flexibilidade seja tanto um critério de habilitação das térmicas, como um fator de decisão dos lances vencedores.
Ao incluir o carvão, defende se tratar de uma opção por utilizar todos os recursos disponíveis no país para atender a rampa de carga — o entra-e-sai diário das renováveis.
A Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) se soma às críticas à inclusão de usinas a carvão e defende prioridade para “fontes rápidas e limpas” que garantam flexibilidade e segurança ao sistema elétrico.
“O leilão deve priorizar tecnologias capazes de fornecer agilidade operacional, como hidrelétricas reversíveis, sistemas de armazenamento em baterias e programas de Resposta da Demanda (RDV). Essas soluções conseguem despachar energia em segundos, enquanto uma térmica a carvão pode levar horas ou até um dia para atingir plena operação”, diz em nota.
Transição energética
Termelétricas aumentaram emissões por GWh em 2023, com maior uso de carvão
O caso Candiota
Instalada em Candiota, no Rio Grande do Sul, com 350 MW instalados, a usina termelétrica Candiota III é uma forte candidata ao leilão.
Seu contrato para fornecimento no mercado brasileiro venceu em 31 de dezembro de 2024 e, no momento, a UTE da J&F (Âmbar Energia) está despachando no mercado spot.
Para ambientalistas, a usina gaúcha é a principal beneficiada pelo novo edital. Isso porque o Complexo Termelétrico Jorge Lacerda, em Santa Catarina, já tem contratação prevista para entrar em vigor em 1º de janeiro de 2026, no Programa de Transição Energética Justa (TEJ) sancionado por Jair Bolsonaro em 2022.
“O Brasil não tem novos projetos de licenciamento ambiental de usinas a carvão em andamento, pois a UTE Nova Seival já teve o processo encerrado pelo Ibama, e a UTE Ouro Negro está sendo arquivada. Essa inclusão parece uma manobra para contemplar a UTE Candiota III”, comenta o gerente de transição energética da Arayara, John Wurdig.
A ONG ambiental aponta que entre junho e julho deste ano, mais de R$ 26 milhões foram repassados à Âmbar Energia, responsável pela UTE, pela Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), paga pelos consumidores. Mas esta energia está indo para os vizinhos do Brasil.
Também na sexta, a Arayara conseguiu na Justiça a derrubada da licença de operação de Candiota e determinação de uma série de ações climáticas. Veja a sentença (.pdf). Para participar da licitação, é preciso reverter a decisão.
Apesar desse movimento, a Associação Brasileira do Carbono Sustentável (ABCS) afirma que toda a cadeia produtiva do carvão segue funcionando, com todas as suas licenças e de acordo com todos os parâmetros legais.
“A ABCS reforça também seu compromisso com uma transição energética justa, inclusiva e responsável do ponto de vista ambiental, social e econômico”, diz o presidente da associação, Fernando Luiz Zancan, em nota.
Fonte: Eixos
Foto: reprodução/ Eixos/ CGT Eletrosul