Ministério Público, indígenas e ONGs defendem compromisso mais ambicioso pelo fim dos fósseis
Exploração da Margem Equatorial foi alvo de protestos desta terça (11) durante reunião diplomática
Belém (PA) e Rio de Janeiro
Durante discursos na COP30 (a conferência sobre mudança climática das Nações Unidas), o presidente Lula (PT) defendeu o fim dos combustíveis fósseis. Grupos que defendem a medida pretendem usar a projeção internacional do evento para enfatizar o que consideram uma contradição do governo brasileiro no tema.
Isso porque há menos de um mês a gestão petista abriu uma nova frente de exploração de petróleo na Foz do Amazonas.
Foi o que aconteceu, por exemplo, nesta terça-feira (11), quando o Ministério Público Federal (MPF) organizou uma discussão sobre a exploração de petróleo na Margem Equatorial (onde fica a Foz do Amazonas). O evento contou com a participação do cacique Raoni, uma das principais lideranças indígenas do mundo.
O debate, também teve a participação de procuradores, pesquisadores e representantes de diversos povos, foi repleto de críticas ao presidente.
“Sei que Lula está falando sobre isso [exploração de petróleo] para todo mundo, mas quero dizer que não podemos permitir que isso aconteça”, afirmou Raoni, que subiu a rampa do Palácio do Planalto junto ao presidente no primeiro dia do terceiro mandato do petista.
As lideranças reclamaram da falta de consulta aos povos indígenas, como previsto na convenção 69 da OIT (Organização Internacional do Trabalho).
“É muito triste a liberação da licença [ambiental] sem ouvir os povos indígenas. Estamos sendo apagados”, disse Luene Karipuna, liderança indígena amapaense, também no evento.
No protesto que entrou na zona diplomática da COP30 na noite desta terça-feira (11) e foi expulso pela polícia da ONU, parte dos manifestantes gritou palavras de ordem contra a exploração de petróleo e carregou faixas criticando o governo Lula por liberar o empreendimento na Foz.
Desde o início do ano, o governo Lula se preocupava com a possibilidade da licença para a exploração do bloco 59 de Foz do Amazonas acabar sendo assinada muito perto da conferência climática.
O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) e o próprio petista chegaram a criticar publicamente a demora para a emissão do documento.
No fim, o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) concedeu a autorização para a Petrobras seguir com o empreendimento em 20 de outubro. A COP30 começou na segunda, dia 10 de novembro.
Em entrevista à Folha no final de outubro, o presidente do instituto, Rodrigo Agostinho, reiterou que a decisão obedeceu critérios técnicos e afirmou que seria hipocrisia esperar a conferência para, só depois, publicar a licença.
Ele lembrou, inclusive, que o governo de Jair Bolsonaro (PL) adiou a divulgação de dados negativos sobre desmatamento, justamente por receio de isso impactar a imagem do Brasil na COP.
Agora, grupos da sociedade civil tenta aproveitar a visibilidade da conferência para promover suas críticas ao empreendimento.
“Eu espero que o efeito prático desse debate seja uma conscientização para que se veja que os impactos da exploração são muito mais danosos do que aquilo que foi propagado até agora”, afirma o procurador regional da República Felício Pontes Jr.
O evento do MPF aconteceu na Green Zone, espaço oficial da COP30 para que empresas e a sociedade civil promovam debates, mas que não integra a agenda oficial de negociações diplomáticas da conferência.
Essa acontece na Blue Zone, na qual países podem promover suas pautas e onde acontecem as discussões sobre os temas formais da conferência.
Nessa área não há eventos oficiais para discutir a Foz do Amazonas, uma vez que o tema é uma questão interna do Brasil.
Mesmo assim, ONGs tentam encontrar brechas para pautar o assunto e pressionar o governo brasileiro.
Nesta terça, o Instituto Arayara participou de uma entrevista coletiva sobre os recursos que impulsionam a exploração de petróleo na América Latina e no Caribe, e de um evento paralelo acerca do financiamento para países em desenvolvimento reduzirem o uso de fósseis.
Em ambas as situações, a organização aproveitou para falar sobre o tema.
Nicole Oliveira, diretora-executiva do instituto, disse que o objetivo é “mostrar a incoerência do discurso do Lula com relação ao que ele falou sobre os fósseis e o que ele tem feito na política doméstica” e conseguir conseguir apoio de países.
Ela cita, por exemplo, França, Costa Rica e as nações insulares como sensíveis ao tema. Defende que o Fundo de Florestas para Sempre tenha mecanismos para impedir o financiamento de projetos sobrepostos a poços de petróleo. Lula é um dos principais defensores do fundo.
“Queremos que exista uma pressão diplomática e política para que o governo se comprometa num texto, num acordo que fale de combustíveis fósseis que não seja algo para reduzir lentamente, mas um compromisso real”, afirmou ela.
Fonte: Folha de São Paulo
Foto: Reprodução / Pablo Porciuncula / AFP














