Há indícios de que os bilionários passivos ambientais foram um dos motivos da venda a fundo de investimento, diz presidente do Instituto ARAYARA
Em Fato Relevante distribuído ao mercado, para cumprir a legislação das empresas de capital aberto, a Engie Brasil Energia anunciou nesta segunda (30), à noite, a venda das usinas termelétricas de Jorge Lacerda (com 857MW de capacidade), ao fundo de gestão capitais Capital Energy II Fundo de Investimento em Participações Multiestratégia – FRAM, como o fundo é conhecido no mercado.
Nem a Engie, nem a FRAM, fundo sediado em São Paulo (SP), revelaram o cronograma de desembolsos dos R$ 325 milhões a serem pagos pelas sete usinas termelétricas que compõem o complexo, localizado no município catarinense de Capivari de Baixo (com 25 mil habitantes).
O anúncio conclui a verdadeira novela em que se transformou a negociação de alienação das ultrapassadas usinas de produção de energia movidas a carvão. A Engie manifestou publicamente pela primeira vez há quatro anos a sua intenção de se livrar de Jorge Lacerda – e assim termina mais uma etapa da empreitada de exploração econômica do carvão brasileiro, de baixa capacidade de geração de calor, mas de enorme produção de problemas sociais e ambientais.
O complexo Jorge Lacerda foi inicialmente comcebido pelo Governo Federal na década de 1960. destinava-se a aproveitar o carvão mineral da região sul de Santa Catarina e terminou por produzir um dos maiores passivos sociais e ambientais de todo o Brasil.
Segundo o Fato Relevante, dos R$ 325 milhões totais da venda, R$ 210 milhões serão pagos na conclusão da operação e outros R$ 115, quando forem cumpridas condições definidas entre a Engie e a FRAM.
De acordo com o site da própria empresa, a ENGIE Brasil “é a maior produtora privada de energia elétrica do Brasil, com capacidade instalada própria de 10.791MW em 72 usinas, o que representa cerca de 6% da capacidade do país.
A empresa possui quase 90% de sua capacidade instalada no país proveniente de fontes renováveis e com baixas emissões de GEE (cases do Efeito Estufa, que causam mudanças no clima do planeta), como usinas hidrelétricas, eólicas, solares e biomassa.
Em outras palavras: ao contrário do que acontece em Capivari de Baixo, a Engie explora o mercado de energia, em outras partes do Brasil, com alternativas técnicas que emitem menos os perigosos GEE.
A ENGIE, também informa a própria empresa, teve em 2020 um faturamento de R$ 13,3 bilhões e, ao vender Jorge Lacerda, livra-se de importante ativo, cuja autorização de funcionamento expira em setembro de 2027.
Mas, a alienação do controle de Jorge Lacerda ao FRAM – um fundo que visa a maximizar o lucro de seus ativos – não faz desaparecer as responsabilidades da Engie sobre o complexo termelétrico.
“Judicialização do passivo”
“Esse é um novo imbróglio que será judicializado pelo Instituto Internacional ARAYARA e pelo Observatório do Carvão Mineral. Há fortes indícios de que os bilionários passivos ambientais deixados pela Engie foi um dos motivos dos quais esta empresa tenha tentado se livrar”, disse o presidente do Instituto Internacional ARAYARA, Julio Bueno de Araújo.
“Todo o passivo ambiental, tóxico, precisa ser documentado por auditoria externa, em que a sociedade civil e os ministérios públicos federal e estadual, além da comunidade científica, façam uma análise consistente da responsabilidade cível e criminal que a Engie tenta passar adiante com uma venda temerosa ao erário do povo catarinense”, completou Araújo.
Segundo Araújo, “a venda do complexo de Jorge Lacerda é mais um ato do pesadelo da indústria carbonífera. Por décadas, as mineradoras trazem danos sociais, ambientais, econômicos e à saúde de milhares de catarinenses que ainda são contaminados diariamente por metais pesados”.
Para ele, essa indústria do século 19 ainda tenta ser ressuscitada por uma política pública federal equivocada, que tenta substituir energia renovável, solar, eólica e biomassa, justa e barata – por uma energia cara e lesiva de todo mundo que consome energia elétrica.
Araújo se refere à inclusão da extensão do subsídio à geração termelétrica no projeto de lei aprovado no Congresso e sob avaliação do Palácio do Planalto.
“Uma pesquisa técnica que vem sendo realizada por engenheiros, químicos, geógrafos e outros profissionais do Instituto ARAYARA comprova que a contaminação química tóxica permanece ceifando vidas”, observa Araújo.
Ee também informou que técnicos do Instituto ARAYARA estão produzindo um documentário que contextualiza a realidade pela qual passa as comunidades que vivem sobre os rejeitos da indústria carbonífera.
“A Engie tem corresponsabilidade, porque ela sempre soube dos passivos ambientais do carvão que ela comprou e queimou, produzindo gases do efeito estufa”, completou.
- Conflitos socioambientais e os impactos nas comunidades originárias é tema de destaque no II Seminário de Sustentabilidade da UFPI
- Arayara na mídia | No ritmo da destruição: a exploração de Petróleo e The Rolling Stones
- Barril com substâncias tóxicas encontrado no litoral de Alagoas preocupa comunidades locais
- Arayara na mídia: As mega barragens brasileiras prometiam um futuro verde. Então veio a mudança climática
- Relatório da CliDef expõe os perigos enfrentados por defensores do clima