Ministério de Minas e Energia (MME) abre consultas públicas que preveem a contratação de termelétricas fósseis, consideradas as mais poluentes. Anúncio marca a volta do carvão à agenda de leilões de energia no Brasil após 11 anos
Faltando 76 dias para a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), em Belém (PA), o governo federal reacendeu uma polêmica no setor energético ao publicar novas diretrizes para o Leilão de Reserva de Capacidade (LRCAP) 2026. A medida, oficializada, na última sexta-feira (22/8) pelo Ministério de Minas e Energia (MME), prevê a contratação de potência elétrica a partir de usinas movidas a gás natural, carvão mineral e óleo diesel, consideradas fontes fósseis de alta emissão de gases de efeito estufa. A COP30 acontece de 10 a 21 de novembro.
O anúncio marca a volta do carvão à agenda de leilões de energia no Brasil após 11 anos. De acordo com dados do Instituto Internacional Arayara, a última contratação de uma térmica a carvão ocorreu em 2014, com a Usina Pampa Sul, em Candiota (RS). Desde então, o país vinha reduzindo gradualmente a participação dessa fonte na matriz elétrica por causa de seus impactos ambientais. A decisão do MME surpreendeu ambientalistas justamente em um momento em que o Brasil tenta se firmar como liderança global na transição energética.
O LRCAP 2025, que estava programado para acontecer em abril passado foi cancelado pela Justiça, após gerar forte reação de organizações de proteção ambiental, que levantaram questionamentos sobre os riscos e irregularidades no processo. Segundo o gerente de transição energética do Instituto Internacional Arayara, John Wurdig, aquele edital projetava emissões de até 1,11 gigatoneladas de CO2 até 2050, caso as usinas cadastradas entrassem em operação.
“Agora, com o LRCAP 2026, o cenário se torna ainda mais preocupante, uma vez que o edital inclui não apenas térmicas a carvão mineral, mas também aquelas a óleo diesel, o que dificulta até mesmo estimar o volume total de emissões adicionais”, afirmou.
Entre os críticos, a percepção é de que o novo leilão beneficia diretamente a UTE Candiota III, localizada no Rio Grande do Sul. O empreendimento acumula mais de R$ 200 milhões em multas aplicadas pelo Ibama, enfrenta questionamentos na Justiça Federal e chegou a ter a operação suspensa pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) em 2024, devido a falhas técnicas e ambientais.
Apesar desse histórico, a usina voltou a receber repasses milionários da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), recurso pago pelos consumidores brasileiros. Somente em junho e julho deste ano, mais de R$ 26 milhões foram transferidos à empresa Âmbar Energia, controlada pelo grupo J&F Investimentos, para manter a produção e a comercialização de energia.
Wurdig denuncia que a inclusão da consulta aponta para um beneficiamento direto da UTE Candiota. “O Brasil não tem novos projetos de licenciamento ambiental de usinas a carvão em andamento. Essa inclusão parece uma manobra para contemplar a UTE Candiota III”, alertou.
O Correio procurou o Ministério de Minas e Energia e a Âmbar Energia, pertencente ao grupo J&F Investimentos, controladora também do grupo JBS, mas até a publicação desta matéria não obteve retorno. O espaço segue aberto para manifestação.
Por Vanilson Oliveira
Fonte : Correio Braziliense
Foto: ARAYARA