No dia 14 de novembro, o Arayara Amazon Climate Hub sediou a mesa-redonda “Territórios indígenas na mira de grandes empreendimentos: do petróleo à mineração”, organizada por organizações de base indígena de diversas regiões e biomas do Brasil.
O encontro reuniu lideranças de diferentes regiões do país para debater os impactos de empreendimentos de desenvolvimento — como mineração, petróleo, gás, hidrelétricas e infraestrutura — sobre territórios indígenas e estratégias de defesa desses espaços.
Lilia Aparecida Eloy Henrique, do povo Terena, representante do bioma Sudeste pelo território Araribá e pela ARPINSUDESTE, trouxe a voz de caciques, lideranças, pajés e mulheres para denunciar os impactos sofridos pelo Cerrado e Mata Atlântica.
“A crise é climática, e os empreendimentos têm afetado profundamente nossos territórios. Estão tentando tirar a nossa terra e a de nossos parentes, e para nós o território é sagrado. Não é questão de dinheiro, é questão de cultura, de saúde e de resistência. Temos sofrido demais”, afirmou.
Ela destacou que, embora a Amazônia seja reconhecida como o coração do mundo, a Mata Atlântica também sofre com pressões externas. “Precisamos ser ouvidos. O agronegócio tem avançado sobre nossos territórios, nossos rios estão secando e isso nos preocupa, porque vivemos da terra — e ela já não produz como antes”, completou.
José Benites, da APIB, denunciou o avanço da fronteira extrativista, impulsionada pela mineração e pelo agronegócio, como principal vetor de destruição territorial e violação de direitos indígenas. Ele alertou para a ausência de consulta prévia, livre e informada e para a falta de participação efetiva da sociedade nas decisões que afetam os territórios.
Mauricio Terena, destacou as crescentes ameaças ambientais e pressões sobre as terras Mura, agravadas por projetos de mineração e pela crise climática. “Os povos indígenas continuam resistindo, mesmo enquanto são retratados — nas negociações oficiais e nas redes sociais — como obstáculos ao progresso”, afirmou.
Ele criticou a restrição de espaços de participação na COP, que excluem os povos diretamente afetados pelas decisões globais. “Não podemos criminalizar os indígenas que se mobilizam”, disse, citando o exemplo dos indígenas que avançaram sobre os portões da área restrita da COP30, numa tentativa de chamar a atenção do governo e da ONU que estão nesse espaço para que suas lutas pudessem ser ouvidas.
Mauricio enfatizou ainda a importância de ocupar espaços de poder e desbancar falsas narrativas: “O fortalecimento institucional não significa abrir mão da nossa identidade, mas usar ferramentas, como a advocacia indígena, para transformar processos desde dentro, respeitando nossa orientação e cosmovisão.” Ele criticou a condução dos protocolos de consulta prévia, que ignoram o tempo necessário dos povos, com suas especificidades e desafios para avaliar impactos de empreendimentos.
Valcelio Terena, do Conselho do Povo Terena, ressaltou que a percepção internacional sobre a situação indígena no Brasil está distorcida pelos meios de comunicação. “Muitas vezes, outros países acham que aqui está tudo bem, mas não é verdade. Perdemos nascentes e fontes de água, enquanto somos massacrados por empreendimentos que avançam sem considerar nossas vidas e modos de existir. Precisamos de políticas públicas que obriguem essas empresas a reconhecer o valor humano e social da região”, disse.
Ele alertou para os impactos do agronegócio no Pantanal do Mato Grosso do Sul e destacou a importância de preservar ciclos naturais: “Antes, acompanhávamos o tempo pelos pássaros, pela lua; hoje tudo mudou. A humanidade precisa entender que depende de nós para o futuro.”
Heloísa Simão, pesquisadora da ARAYARA, reforçou a importância de dar visibilidade às narrativas indígenas e à litigância como instrumento de defesa de direitos e resistência aos impactos ambientais: “Trazer a realidade dos territórios e a luta jurídica travada pelos povos originários revela a dimensão das violências e fortalece estratégias de proteção”.
Milena Mura, representante da Organização Indígena das Mulheres Mura, denunciou a violação de protocolos de consulta e a atuação de lideranças cooptadas. “Mesmo dividindo nosso povo, continuamos resistindo. A Potássio do Brasil, empresa de fertilizantes que abastece o agronegócio, ameaça nossos territórios e modos de vida. Estamos levantando nossas trincheiras para defender nosso planeta e garantir um futuro. Somente com parceria poderemos preservar a vida, a água e a floresta. A mudança climática é a Mãe Terra dizendo que precisamos lutar. Hoje, nós mulheres indígenas assumimos a linha de frente da luta, junto aos guerreiros, para defender nossas terras e nossos corpos. Fora Potássio do Brasil, fora agronegócio!”, afirmou.
Kretã Kaingang, da ARPINSUL, enfatizou a necessidade de não repetirmos erros de COPs anteriores, financiadas por mineradoras, petroleiras e empresas que exploram territórios indígenas há décadas. Ele destacou a importância da mobilização e da implementação de protocolos de consulta livres, prévia e informados, sem interferência do governo. “Precisamos agir juntos, independentemente de política partidária , e ter coragem para enfrentar esses desafios. Essa COP30 precisa trazer resultados concretos para nós, povos indígenas, e precisamos cobrar para que isso aconteça”, afirmou.
Juliano Bueno, diretor técnico do Instituto Internacional Arayara, lembrou que, além da mineração de potássio, diversos blocos de exploração de petróleo ameaçam sobrepor-se a territórios indígenas. “Diante dos impactos da mineração de potássio e dos conflitos internos que ela gera, é essencial barrar esses empreendimentos antes que causem danos ainda mais profundos. A expansão das fronteiras de exploração de petróleo e gás representa uma ameaça crescente aos territórios indígenas no Brasil, intensificada pelos leilões da ANP, que comprometem ecossistemas frágeis e culturas ancestrais que dependem desse equilíbrio”, alertou.










