por Comunicação Arayara | 19, dez, 2024 | Carvão Mineral |
Câmara ressuscitou “jabutis” da privatização da Eletrobras e assegurou a contratação, até 2050, de termelétricas movidas a gás e carvão. Governo estuda veto
Originalmente publicado em O Eco, por Ellen Nemitz em 19/12/2024.
O urgente projeto de tornar o setor elétrico brasileiro mais verde sofreu um importante revés no Congresso Nacional. O Projeto de Lei n. 576/2021, que traz uma esperada regulamentação da outorga de autorizações para aproveitamento de potencial energético offshore (em alto mar), foi aprovado com um grande “jabuti” – o incentivo às termelétricas à carvão e gás até 2050.
O Marco Regulatório das Eólicas em Alto-Mar, de autoria do senador Jean-Paul Prates (PT/RN), delimita regras para o aproveitamento das águas marinhas brasileiras para a instalação de usinas de captação da energia dos ventos na costa. O texto veda, por exemplo, a instalação das plantas em rotas de navegação, áreas protegidas pela legislação ambiental e áreas tombadas como paisagem cultural e natural, além de restringir o conflito de interesses econômicos em regiões já utilizadas pela indústria offshore de petróleo e gás.
No entanto, a redação final aprovada pelo Senado na última quinta-feira (12), e que segue para sanção presidencial, é um substitutivo na Câmara dos Deputados que reedita os jabutis da privatização da Eletrobras pela Lei 14.182/2021 e insere obrigatoriedades em relação à produção de energia termelétrica de fontes sujas, como gás e carvão.
O texto assegura a contratação de reserva de capacidade de termelétricas com efetividade até 31 de dezembro de 2050, além da contratação de energia oriunda de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), de hidrogênio líquido gerado a partir de etanol e da produção de parques eólicos. A matéria passou pela Comissão de Serviços de Infraestrutura (CI) no início do mês, onde recebeu relatoria favorável do senador Weverton Rocha (PDT-MA), e foi a votação em plenário a toque de caixa.
De acordo com o gerente de projetos do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA), Ricardo Lacerda Baitello, esta versão do “jabuti” é ainda mais preocupante, porque, embora reduza a obrigatoriedade de contratação de 8 GW para 4,25 GW, aumenta as chances de sucesso nos leilões futuros ao ajustar o preço teto, tornando o investimento mais atraente para empresas – um dos motivos que fizeram leilões anteriores serem fracassados foi o fato de o texto da Lei de Privatização da Eletrobras prever a instalação das usinas em regiões do país sem infraestrutura de gasodutos, uma estratégia para fomentar o desenvolvimento, mas que encarece os custos dos empreendimentos. “Outro fator é a extensão da vida útil das térmicas a carvão, que já estava em 2040 e vai para 2050″, acrescenta Baitello.
De acordo com estimativa feita pela Frente Nacional dos Consumidores de Energia, a mudança proposta pela matéria pode representar um aumento de 9% no custo da energia e uma despesa anual de R$21 bilhões em subsídios até 2050. Além disso, o Instituto Arayara, que classificou o substitutivo como “o maior retrocesso para a transição energética justa e sustentável no Brasil”, destaca que as emendas pró-gás natural e carvão mineral adicionadas ao projeto têm o potencial de gerar 274,4 milhões de toneladas de CO2 equivalente ao longo dos próximos 25 anos – um volume comparável às emissões anuais combinadas do setor de transportes e da produção de combustíveis fósseis no Brasil. “Esse retrocesso ambiental ameaça neutralizar os avanços obtidos com a redução do desmatamento da Amazônia entre 2022 e 2023, comprometendo os esforços do país no combate às mudanças climáticas”, afirma a nota do Arayara.
Na votação, o texto substitutivo teve 40 votos favoráveis e 28 contrários. De acordo com a Coalizão Energia Limpa, em análise prévia à aprovação do texto em plenário, os senadores governistas Otto Alencar (PSD/BA) e Jaques Wagner (PT/BA) haviam sinalizado que a decisão ainda pode ser revertida por veto presidencial, mas que o caminho é bastante incerto. Baitello também avalia que é difícil prever, neste momento, se o governo vai vetar os jabutis e aprovar o marco regulatório em sua versão original.
O Instituto Arayara destaca ainda que esta não é a primeira tentativa da indústria do carvão de fazer lobby em prol da energia suja dentro de projetos que deveriam tratar da transição para uma matriz mais sustentável, e que a aprovação do substitutivo com os jabutis entra em contradição com outro projeto votado na mesma semana: o PL 327/2021, que institui o Programa de Aceleração da Transição Energética (PATEN), cujo objetivo é justamente incentivar a substituição de matrizes poluentes por fontes renováveis.
O panorama da energia eólica offshore
Atualmente o Ibama tem mais de 100 pedidos de licenciamento ambiental protocolados, em um dos filões econômicos mais visados pela indústria de olho no potencial eólico do país. A produção de hidrogênio verde – tipo de combustível catalisado pela energia renovável dos ventos – é o carro-chefe de boa parte dos empreendimentos e consta nos projetos de transição energética do governo brasileiro.
Vale lembrar, contudo, que a mera aprovação de um marco regulatório, embora muito aguardada pelos setores que acompanham a transição energética, não garante a sustentabilidade do setor. Devido à complexidade destes empreendimentos, os quais impactam diretamente um delicado ecossistema marinho, é necessário que os estudos técnicos e relatórios de impacto ambiental (EIA/RIMA), previstos no PL 576/2021, sejam levados a cabo pelas empresas e devidamente exigidos pelos órgãos ambientais competentes, como já mostrou esta reportagem de ((o))eco.
“A gente precisaria de um processo mais amplo. No IEMA a gente tem discutido a possibilidade de revisão deste processo no qual muita pressão é colocada sobre o licenciamento, sobre um órgão ambiental [o Ibama] para fazer a discussão com a sociedade e os [setores e pessoas] impactados. A gente defende uma revisão para um processo mais estrutural em que se possa discutir os projetos antes de eles serem leiloados ou arrematados”, explica Ricardo Baitello.
por Comunicação Arayara | 10, dez, 2024 | Arayara na mídia |
Impacto é de ao menos 7,5% na tarifa de energia dos brasileiros; antes mesmo de ser votado emcomissão, texto já está na pauta do plenário da Casa
Matéria publicada originalmente na Folha de São Paulo – Alexa Salomão.
Faltando duas semanas para o recesso, o Senado sinaliza que antes de ir para o descanso de final deano quer aprovar o PL (Projeto de Lei) PL 576/21, mais conhecido como PL das eólicas offshore. O texto embute custosextras de R$ 440 bilhões em subsídios para os consumidores de energia pagarem até 2050. Segundo dadosda consultoria PSR, especializada em energia, na média, serão R$ 17,5 bilhões por ano a mais na tarifa,provocando um aumento de 7,5% na conta de luz nesse período. A pancada adicional está em um conjunto de jabutis —como são chamadas as medidas sem nenhuma relaçãocom o texto legislativo original, que são inseridas aleatoriamente. O pacote favorece até carvão em plenomomento de combate ao aquecimento global
Estimativa da Abrace, que reúne grandes consumidores, mostra que a conta de luz de uma família no Pará,por exemplo, vai subir de uma média mensal de R$ 216 por mês para R$ 232 —sem contar o reajuste anual dadistribuidora, que vai se sobrepor ao aumento provocado pelo PL. Ou seja, anualmente, a conta de luz vai encostar em R$ 2.800 só para ajudar apagar subsídios.
No Rio, a conta de luz média se estabelece acima dos R$ 200 por mês, indo a R$ 2.600 por ano. Em MinasGerais, a tarifa média sobe de R$ 182 para R$ 197, quase R$ 2.400 por ano. Em São Paulo, em média, passa deR$ 153 para R$ 165, quase R$ 2.000 por ano de conta de luz.
Uma queda de braço segurou o PL na Comissão de Infraestrutura do Senado. Esta semana começa, porém,com uma sinalização incomum. O texto já está na pauta da votação no plenário de quarta-feira (11), sempedido de urgência para furar a fila por lá. Ou seja, dá como certa a aprovação na comissão. O setor deenergia entendeu o recado: a pressão política do lobby subiu o tom na reta final do ano.
Basicamente, o texto prorroga subsídios para alguns investidores de térmicas a gás e a carvão, mas tambémestende benefícios a energias renováveis que não precisam mais de ajuda financeira, como a minigeração de energia solar ou a prorrogação de benefícios dentro do Proinfa (Programa de Incentivo às FontesAlternativas de Energia Elétrica).
O entendimento é que as medidas criam custos adicionais e desnecessários para o orçamento das famílias eo caixa das empresas, ajudando a elevar a inflação. Por isso, vem sendo fortemente combatido por 12entidades que representam segmentos de geração e consumidores, entre elas a União pela Energia, quecongrega 70 associações da indústria brasileira.
“Passamos o ano num trabalho permanente para mostrar aos senadores que essas medidas adicionais sãouma insanidade”, afirma Luiz Eduardo Barata, presidente da Frente Nacional de Consumidores de Energia.
“O Brasil precisa da regulamentação para que, em cinco ou sete anos, empreendimentos de eólicas off shorepossam estar entrando em operação , mas o PL precisa ser aprovado sem esses jabutis.”
Nesta segunda (9), a entidade enviou carta aos senadores com novo alerta. Na quinta-feira (5), já haviaremetido carta ao ministro de Minas e Energia Alexandre Silveira pedindo mais empenho oficial da pastapela retirada dos jabutis. Procurada pela reportagem para comentar, o ministério não se pronunciou até apublicação deste texto.
Outros segmentos do governo federal identificaram os risco do PL para a economia e atuam para retirar osartigos em que os jabutis estão alojados. A Secretaria de Relações Institucionais tentou demover os senadores. O Ministério da Fazenda publicou uma nota técnica recomentando que os artigos onde estão osjabutis sejam limados (leia abaixo o ponto a ponto).
“Nosso esforço é mostrar ao senadores que os prejuízos das medidas superam em muito qualquer eventualbenefício, porque o PL prejudica a economia do Brasil —encarece não apenas a conta de luz, mas a cadeia deprodução. A nota técnica da Fazenda deixa isso claro”, afirma Paulo Pedrosa, presidente da Abrace, aentidade que reúne os grandes consumidores industriais de energia.
O esfoço contra o PL tem apoio de ambientalistas, preocupados com as emissões. Cálculos do InstitutoInternacional Arayara, Instituto ClimaInfo e Iema (Instituto de Energia e Meio Ambiente), com dados da EPE(Empresa de Pesquisa Energética), apontam que os projetos apoiados pelo PL vão elevar em 25% as emissõesde gases de efeito estufa do setor elétrico brasileiro.
Redigido no Senado, o primeiro texto PL 576/21 sobre as eólicas no mar tinha foco. Tratava apenas do temaque dá nome à proposta. Na Câmara, recebeu a leva de jabutis no final de 2023, que encareciam o custo daenergia. Havia a perspectiva que, na volta à Casa original, os jabutis cairiam —tanto que o projeto ficou o anotodo numa gaveta. Reapareceu apenas agora, nas últimas semanas do ano.
Em seu parecer, divulgado em 2 de dezembro, o senador Weverton Rocha (PDT-MA), relator do projeto,defendeu a permanência dos benefícios . Um pedido de vistas coletivo, porém, transferiu a votação para esta semana.
PONTO DA PONTO DO MINISTÉRIO DA FAZENDA
Após análise do PL, pasta redigiu nota técnica indicando a necessidade de suspender dispositivos queampliam subsídios e impõem custo excessivo aos consumidores
Artigo 21
— Postergação do prazo para entrada em operação de fontes renováveis de energiaO PL prevê a ampliação de descontos nas tarifas de uso dos sistemas de distribuição e transmissão paranovos grupos de fontes renováveis -térmicas a biomassa, biogás, biometano e resíduos sólidos urbanoscomo fonte de combustível), bem como a prorrogação de prazo para obter o benefício (mais 36 mesespara a entrada em operação comercial de quem solicitou outorga na corrida do ouro).Argumento para a supressão da medida: o aumento das tarifas de energia elétrica terá impactos sobrea competitividade da indústria e do poder de compra dos consumidores.
Artigo 22
— Contratação de reserva de capacidadeO PL determina a contratação de geração termelétrica movida a gás natural seja reduzida de 8.000 MWpara 4.250 MW. Determina ainda a contratação de 4.900 MW proveniente de centrais hidrelétricas deaté 50 MW e 300 MW de energia proveniente de empreendimentos eólicos localizados no Rio Grande do Sul, até o segundo semestre de 2025, e de 250 MW de energia proveniente do hidrogênio líquido a partirdo etanol na região Nordeste, até o segundo semestre de 2024.
Argumento para supressão da medida: o Fazenda alega que o planejamento do setor elétrico deve sertécnico e baseado em estudos especializados. As análises preliminares da Consultoria PSR apontam queo hidrogênio não tem eficiência para a geração de energia elétrica que justifique o subsídio. A maiorparte dos projetos de gás natural a serem contratados, por sua vez, estão localizados em regiões semsuprimento de gás, o que, portanto, pode significar aumento dos custos decorrentes da instalaçãodessas usinas, tanto para transportar do insumo até as usinas, quanto para escoar a energia por elasgerada até os grandes centros de consumo
— Prorrogação do Proinfa
O PL estabelece a possibilidade de prorrogação por 20 anos dos contratos do Proinfa, promovendooutras alterações nas regras que oneram os consumidoresArgumento para suspensão da medida: estudo realizado pela Aneel demonstra que até é vantagemprorrogar 54 usinas do Proinfa, mas o PL prevê a renovação para todas as 81 usinas que manifestaraminteresse pela prorrogação; o texto também retira a renúncia da correção dos contratos existentes aoIGP-M de 2020 para 2021 (fortemente impactado pela pandemia), e a substituição pelo IPCA e emrelação ao item; o preço-base da fonte PCH passa de R$ 225/MWh para R$ 285,00/MWh, da fonte Eólicasobe de R$ 173,47/MWh para R$ 192/MWh.
Art. 23
Contratação de usinas a carvão como reserva de capacidadeObriga a contratação de térmicas a carvãoArgumento para suspensão da medida: Fazenda cita ofício da Aneel mostrando que o PL envolve acontratação compulsória das térmicas Candiota 3, Jorge Lacerda e Figueira. Afirma ainda que o Brasilcaminha no sentido da energia de baixo carbono, e a energia elétrica de carvão mineral não estáalinhada com os atuais esforços do país, não se justificando o custo adicional aos consumidores
Art. 24
— Prazo para início da injeção de energia de minigeradores solaresO PL expande os subsídios a minigeradores que solicitaram parecer de acesso até 7 janeiro de 2023, quetem direito a compensar energia em todos os componentes da tarifa até 2046. Esses tinham 12 mesespara entrar em operação, e o PL expande esse prazo para 24 meses.
Argumento para suspensão da medida: a pasta mostra o “subsidiômetro” desenvolvido pela Aneel paramostrar o peso dos subsídios na conta de energia. Em 2023, foram R$ 40,32 bilhões, dos quais, R$ 7,14bilhões foram relacionados à micro e à minigeração distribuída. Em 2024, até 4 de julho, o total desubsídios embutidos nas tarifas de energia elétrica era de R$ 17,09 bilhões, dos quais R$ 5,37 bilhõesdecorrentes da micro e da minigeração distribuída. Ou seja, em aproximadamente seis meses de 2024, osubsídio relacionado à micro e à minigeração distribuída já representa 75% do subsídio registrado noano anterior para a mesma rubrica, indicando aumento expressivo em relação a 2023. Cita ainda ofícioda agência que estimou o impacto até 2045 em R$ 24 bilhões adicional a serem custeados pelas tarifasdos consumidores, via CDE (Conta de Desenvolvimento Energético
por Comunicação Arayara | 03, dez, 2024 | Carvão Mineral |
Senador Weverton Rocha (PDT-MA) ignora apelos e apresenta relatório que amplia benefícios para usinas a carvão e gás; pedido de vista adia votação para a próxima semana
Matéria publicada originalmente na Folha de São Paulo em 03/12/2024
O senador Weverton Rocha (PDT-MA), relator do projeto de lei que pretende ser o novo marco regulatório das eólicas em alto-mar, decidiu manter no PL uma série de emendas parlamentares sem nenhuma relação com o texto original, atendendo aos anseios da indústria do carvão mineral e do gás fóssil.
Nesta terça-feira (2), o parecer sobre o PL 576/21 é lido pelo senador na Comissão de Infraestrutura do Senado. Após um pedido de vista coletivo, porém, o presidente da comissão, senador Confúcio Moura (MDB-RO), acatou a solicitação e a votação do projeto foi repassada para a próxima semana.
No texto que chega ao Senado, Weverton Rocha mantém todos os pontos polêmicos que têm sido duramente criticados por todo o setor elétrico, com exceção daqueles que estão sendo diretamente atendidos pelas medidas.
Na semana passada, o texto chegou a entrar na pauta da comissão, mas após forte pressão no parlamento, Weverton retirou de pauta. A Folha tem insistido em falar com o parlamentar sobre o tema, mas não tem retorno.
Originado no Senado, o PL 576/21 chegou a ter apoio do setor elétrico em sua versão original, mas ganhou emendas jabutis na Câmara, o que desfigurou a versão original. Com a nova redação, houve aumento do prazo de geração de usinas a carvão de 2028 até 2050, além da obrigação de contratação de usinas a gás fóssil, com exigência de funcionarem até 70% dos dias do ano.
Nos cálculos da Frente Nacional dos Consumidores de Energia, se a proposta avançar como está, tem potencial de elevar em 25% as emissões de gases de efeito estufa oriundos do setor. As emendas obrigarão o país a emitir cerca de 252 milhões de toneladas (Mt) de CO2, ou o equivalente à média de 10 Mt de CO2 por ano, até 2050, ano em que o Brasil planeja atingir a neutralidade climática.
O cálculo foi elaborado com base em cálculos do Instituto Internacional Arayara, Instituto ClimaInfo, Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema) e dados da Empresa de Pesquisa Energética (EPE).
Além do impacto ambiental, a emenda relativa à contratação obrigatória do gás traria um custo adicional de R$ 155 bilhões a serem cobrados na conta de luz dos consumidores de energia. Já o jabuti do carvão obrigará os brasileiros a bancar a emissão média de 4,7 MtCO²e por ano pelos próximos 25 anos, com um custo total de R$ 92 bilhões.
Segundo Suely Araújo, coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima, a manutenção da proposta simboliza o negacionismo climático que tem marcado a maior parte das decisões do parlamento.
“O texto apresentado pelo relator no Senado mantém os jabutis que buscam fomentar carvão mineral e gás fóssil. É o Congresso, na prática, demonstrando mais uma vez o seu negacionismo climático. Aproveitam um processo necessário, a regulação das eólicas offshore, e consolidam equívocos graves, que colidem frontalmente com a perspectiva de descarbonização”, disse Araújo à Folha. “Esperamos que o poder executivo entre verdadeiramente na luta contra esse absurdo, com empenho.”
Duas emendas incluídas no texto determinam a contratação compulsória de 4,2 gigawatts de termelétricas a gás natural com funcionamento ininterrupto (inflexíveis), além da prorrogação e expansão de subsídios a usinas térmicas a carvão para os próximos 25 anos.
Somadas às outras seis emendas aprovadas por ampla maioria na Câmara dos Deputados, o impacto econômico total do PL 576/21 pode chegar a R$ 658 bilhões, ou R$ 25 bilhões por ano. Isso representa um aumento de 11% na conta de energia dos brasileiros.
“As imposições ao planejamento do setor elétrico vão encarecer a conta de energia para os brasileiros, aumentar o preço de tudo o que é produzido no país e ainda carbonizar as emissões do Brasil”, disse à Folha o presidente da Abrace (Associação Brasileira dos Consumidores de Energia), Paulo Pedrosa.
Há expectativa sobre como o governo, afinal, vai se comportar sobre o assunto. Dentro do setor elétrico, a leitura é que o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, tem dado sinais trocados sobre qual é a posição oficial da pasta sobre o assunto.
Pela tramitação do texto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode vetar o PL ou parte dele, mas isso também pode ser objeto de um novo projeto do Congresso, para derrubar o veto, como já ocorreu em outras ocasiões.
por Comunicação Arayara | 15, out, 2024 | Energia limpa |
Apesar do papel crucial na transição energética do país, um projeto de lei brasileiro que regulamenta a energia eólica offshore está paralisado por emendas relacionadas a usinas termelétricas movidas a combustíveis fósseis, atrasando investimentos e negligenciando impactos socioambientais.
Originalmente publicado em gasoutlook.com por Amanda Magnani 14.10.2024
Um dos países com a matriz elétrica mais descarbonizada do mundo, o Brasil caminha para o acordo global de triplicar a produção de energia renovável até 2030, tendo ativado 13 novas usinas solares fotovoltaicas e 25 parques eólicos somente em 2023.
Na América Latina, a capacidade eólica instalada em 2022 ultrapassou 44,7 GW , e o Brasil tem papel de liderança. Embora o continente seja atualmente responsável por pouco mais de 5% da produção global de energia eólica, o país está entre os dez primeiros do mundo em capacidade instalada.
Os 316 MW de energia eólica adicionados em 2023, no entanto, são apenas a ponta do potencial iceberg eólico offshore. De acordo com um estudo do World Bank Group, ele ultrapassa 1.200 GW no país. O mesmo estudo estima que, até 2050, a indústria de energia eólica pode gerar mais de 516.000 empregos e render pelo menos R$ 900 bilhões para a economia brasileira.
Apesar de ser uma indústria fundamental para a transição energética, a produção de energia eólica também traz impactos e conflitos socioambientais. Questões como contratos de ocupação de terras que afetam comunidades tradicionais, ameaças à vida selvagem e desmatamento são alguns exemplos.
A exploração offshore ainda não ocorreu no país, que atualmente discute seu arcabouço regulatório. No entanto, minimizar os impactos socioambientais dessa indústria não é o foco do debate legislativo.
Aprovado pelo Senado e encaminhado à Câmara dos Deputados em agosto de 2022, o Projeto de Lei 576/2021 , conhecido como Projeto de Lei da Eólica Offshore, ainda está longe de alcançar consenso para ratificação.
Conforme tramitava na Câmara dos Deputados, a proposta original para regulamentar a alocação de áreas para exploração de energia offshore recebeu as chamadas emendas “jabuti” — termo usado no Brasil para se referir a propostas incluídas em um projeto de lei que não têm relação com o tópico principal. Na maioria das vezes, procedimentos legislativos importantes são usados para contornar decisões impopulares ou controversas.
“Nosso parlamento tende a aproveitar projetos de lei e anexar questões não relacionadas, os chamados jabutis, para que sejam aprovados em conjunto”, disse Anton Schwyter, gerente de energia do Instituto Arayara, ao Gas Outlook .
Entre as mudanças aprovadas na Câmara está a contratação obrigatória de 4,2 GW de termelétricas movidas a combustíveis fósseis. Inflexíveis, essas usinas estariam em operação por pelo menos 70% das horas do ano, independentemente da demanda.
Esta proposta é consequência das emendas do “jabuti” que foram aprovadas juntamente com a Lei nº 14.182 de 2021, que privatizou a Eletrobras, a maior empresa de energia da América Latina. O principal ponto de controvérsia na lei era a exigência de contratação de 8 GW produzidos por termelétricas a gás inflexível.
Risco para a saúde
O texto também inclui a contratação obrigatória de 4,9 GW de pequenas centrais hidrelétricas, além de estender de 2028 a 2050 os contratos com termelétricas a carvão, a fonte de energia mais poluente e ineficiente disponível.
“Entre os minerais fósseis, o carvão é o mais prejudicial. Além da alta quantidade de gases de efeito estufa emitidos e seus efeitos ambientais e climáticos, nosso carvão nacional contém muita fuligem, que é altamente prejudicial à saúde humana”, disse Schwyter.
Ele explica que essa fonte de energia também é mais cara e menos competitiva, exigindo subsídios para sua geração. Em um contexto de crescimento de fontes renováveis, isso torna o carvão uma opção “ainda mais anacrônica”, acrescentou.
Além de prejudiciais em termos ambientais, as emendas do “jabuti” ao projeto de lei causarão atrasos em sua aprovação e, consequentemente, perda de investimentos . “O arcabouço legal para parques eólicos offshore é extremamente importante para o setor, pois dá segurança para os investidores alocarem recursos de forma eficaz”, disse Edlayan Passos, especialista em transição energética do Instituto E+, à Gas Outlook .
As emendas do “jabuti” também “reduzem a competitividade e o potencial de descarbonização da indústria brasileira, dificultando o potencial do Brasil de se firmar como fornecedor global de produtos de baixa emissão de carbono”, disse Passos.
Um debate sequestrado
Embora o Projeto de Lei da Eólica Offshore tenha sido listado como prioridade no pacto de transformação ecológica firmado pelos Três Poderes, desde a inclusão das emendas do “jabuti” pela Câmara dos Deputados, a energia eólica em si é o tema menos discutido , apesar de seu papel crucial na transição energética nacional.
Em fevereiro, a estatal Petrobras, uma das maiores empresas de óleo e gás do mundo, anunciou que aguardava uma definição da legislação para iniciar investimentos em parques eólicos offshore, um dos pilares da transição energética da empresa. Em julho, representantes do setor elétrico criticaram as emendas do “jabuti” no projeto de lei.
Até o Ministério de Minas e Energia, que continua defendendo a exploração de petróleo , apoia o veto às emendas relacionadas aos combustíveis fósseis.
“Chegamos a uma situação rara em que, durante fóruns e audiências públicas, até mesmo stakeholders do setor de gás concordaram que a proposta de contratação de termelétricas inflexíveis não faz sentido”, disse Ricardo Baitelo, gerente de projetos do Instituto de Energia e Meio Ambiente, ao Gas Outlook .
Baitelo explicou que, em termos numéricos, não há déficit energético. “Na verdade, atualmente há mais contratos de venda do que consumo real, a ponto de parte da energia produzida acabar sendo desperdiçada. No entanto, há, sim, momentos específicos em que ocorre uma lacuna.”
É nesses momentos, em situações de emergência, que as termoelétricas representam uma solução. “Mas elas devem operar como um seguro de carro”, explicou Schwyter. “Elas devem permanecer em standby e, assim como acontece com o seguro, esperamos não ter que usá-las.”
Ele acrescentou que, com o avanço da geração por fontes renováveis, o sistema energético do país está mudando, junto com a necessidade do dito “seguro”.
Além disso, como Baitelo explicou, a energia produzida por usinas termelétricas é muito mais cara do que a de fontes hidrelétricas, solares ou eólicas. Se as emendas “jabuti” ao Projeto de Lei da Energia Eólica Offshore forem aprovadas, os custos operacionais podem ultrapassar 650 bilhões de reais (US$ 117 bilhões) até 2050.
“Isso representa um aumento de 11% nas contas de luz brasileiras, impactando diretamente o orçamento doméstico das famílias e as cadeias produtivas do país”, disse Carlos Faria, presidente da Associação Nacional dos Consumidores de Energia, à Gas Outlook . “Não podemos ter representantes cujas decisões favoreçam lobbies específicos do setor energético e vão completamente contra os interesses dos consumidores.”
Transição energética inclusiva
O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) já tem 96 pedidos de licenciamento para projetos de parques eólicos offshore, totalizando 234 GW.
“Os pedidos de licenciamento representam quase a mesma quantidade de energia que o Brasil produz hoje. Essa equação não fecha”, disse Cristina Amorim, coordenadora do Projeto Nordeste Potência, à Gas Outlook . “Enquanto isso, muito pouca atenção é dada aos impactos ambientais dos próprios parques eólicos offshore e ao que eles significam para as comunidades e seus territórios.”
Da construção à operação, os parques eólicos representam ameaças , especialmente para aves e ecossistemas marinhos. Suas linhas de transmissão, múltiplas e mais dispersas que as de grandes hidrelétricas, também impactam um número maior de comunidades.
Além disso, o projeto de lei propõe licenciamento separado para o que acontece offshore, sob a jurisdição do Ibama, e para as áreas costeiras, tipicamente sob jurisdição estadual ou municipal. “É importante entender que há um continuum; é tudo uma coisa só”, diz Amorim.
Em termos sociais, um dos principais impactos ocorre entre comunidades tradicionais de pescadores no nordeste do Brasil — onde a maioria das usinas eólicas offshore são construídas — onde as pessoas usam veleiros em vez de motorizados. Dependendo das correntes de vento, os pescadores tradicionais se encontram à mercê do raio de segurança ao redor das turbinas.
“Muitas vezes, quando o raio de duas ou mais turbinas se sobrepõe, cria-se uma barreira que os pescadores não conseguem atravessar para sua própria segurança”, explicou Amorim. “Mas o que acontece se as áreas onde a pesca é melhor estiverem além dessa barreira?”
Ela observou que, mesmo em estados onde ainda não existem parques eólicos offshore, os conflitos territoriais e a violência contra as comunidades já aumentaram. À luz disso, organizações como a Pastoral dos Pescadores, uma associação religiosa que apoia pescadores artesanais por justiça social, já se posicionaram contra esses projetos, acrescentou.
“O que precisamos é que a transição energética, e este projeto de lei como parte dela, seja uma transição para um modelo diferente de geração de energia que seja justo, inclusivo e popular”, diz ela.
Esta história foi produzida como parte do Programa de Indústrias Verdes do Climate Tracker.
por Comunicação Arayara | 21, ago, 2024 | Arayara na mídia |
Em matéria da contex.news, plataforma de notícias da Fundação Thomson Reuters, diretor-presidente do Instituto Internacional Arayara aponta ambiguidades da política climática brasileira: Estado almeja ser um grande exportador global de combustível de baixo carbono e, ao mesmo tempo, de petróleo e gás, apostando simultaneamente nas duas agendas – porém mais em petróleo e gás.
RIO DE JANEIRO – O Brasil está se posicionando como líder na transição global para energia limpa, com a hidrelétrica como sua principal fonte de eletricidade, o rápido crescimento da energia eólica e solar, e os renováveis representando um quarto do transporte. No entanto, o Brasil também investiu pesadamente em combustíveis fósseis, e o governo planeja transformar o país de sétimo maior produtor de petróleo do mundo para o quarto até 2030.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que sediará a cúpula climática das Nações Unidas, COP30, no próximo ano, assinou neste mês uma nova lei que regula a indústria de hidrogênio verde do país. “Qual país pode competir com o nosso em termos de transição energética?” perguntou ele durante a cerimônia de assinatura. Lula afirmou que pretende transformar o Brasil em um exportador global de combustível de baixo carbono e fazer do país a “Arábia Saudita das energias renováveis em 10 anos”.
No entanto, as ambições verdes do Brasil podem ser prejudicadas por propostas para aumentar a perfuração de combustíveis fósseis, inclusive perto da foz do Rio Amazonas, e pela construção de mais termelétricas, principalmente movidas a gás natural poluente. O governo afirma que o Brasil precisa produzir petróleo e gás para garantir sua segurança energética.
Por outro lado, ambientalistas argumentam que as exportações de energia verde do Brasil não trarão ganhos reais para o clima se o excedente de energia do país for alcançado queimando mais combustíveis fósseis. “Se seguirmos o caminho da expansão das termelétricas… nossa própria matriz energética terá uma pegada de carbono maior”, disse Cássio Cardoso Carvalho, pesquisador do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).
O Ministério de Minas e Energia do Brasil afirmou que o gás natural tem a menor pegada de carbono em comparação com outros combustíveis fósseis, como diesel e carvão, e que sua produção e uso estão “totalmente alinhados com os planos do país de alcançar a neutralidade de carbono em 2050”.
Subsídios aos fósseis
Entre 2018 e 2022, o governo federal subsidiou combustíveis fósseis com 335 bilhões de reais (US$ 58 bilhões) – mais de cinco vezes mais do que os renováveis, segundo o Inesc. Carvalho disse que o potencial de energia verde do Brasil deveria permitir ao país prescindir do gás natural, mas ele não viu uma mudança significativa nos subsídios desde que Lula retornou ao poder em 2023.
No total, o Brasil está destinando 472 bilhões de reais para petróleo, gás natural e biocombustíveis entre 2024 e 2027, segundo uma análise do Inesc, mas apenas 0,2% desse montante está indo para o programa de transição energética.
O Ministério de Minas e Energia afirmou em um e-mail que ainda haverá demanda por petróleo e gás “pelo menos até 2050”, e que o país se tornaria um importador líquido de petróleo na década de 2030, a menos que continuasse a explorar suas próprias reservas. Felipe Peixoto, secretário de Energia do estado do Rio de Janeiro, que é o maior produtor de petróleo e gás do país, disse que os combustíveis fósseis são “fundamentais para o desenvolvimento econômico do estado. Dependemos deles para royalties, empresas e empregos”.
O Brasil está construindo 15 novas usinas movidas a gás, o que, segundo o Instituto Internacional Arayara, uma organização não governamental, deve aumentar a capacidade de geração de gás natural do Brasil em pelo menos 30%.
Elementos inconstantes
Líderes da indústria petrolífera afirmam que outro motivo para a necessidade de combustíveis fósseis é a variabilidade do fornecimento de energia renovável. Queimar gás natural “tornou-se uma necessidade diária quando o sol se põe ou o vento varia”, disse Mauricio Tolmasquim, diretor de transição energética da Petrobras, a maior produtora de petróleo e gás do país. Usinas a petróleo, gás natural e carvão representaram 7,5% da energia gerada no Brasil em 2023, segundo dados da Empresa de Pesquisa Energética do Brasil, enquanto cerca de 60% foi gerada por usinas hidrelétricas.
Mas quando há escassez de água, o Brasil queima mais combustíveis fósseis. Em 2021, quando uma severa seca atingiu os reservatórios hidrelétricos, 19% da energia do país foi gerada por termelétricas a combustíveis fósseis. Isso levou a um aumento nos preços da eletricidade, bem como nas emissões de carbono, algo que ambientalistas dizem que pode se tornar mais frequente à medida que o volume de chuvas do país se torna mais volátil devido às mudanças climáticas, que são um produto das emissões.
Neste mês, uma grave seca na Amazônia pelo segundo ano consecutivo forçou uma mudança de política para o uso de mais fontes térmicas na região norte do Brasil, disseram as autoridades. Mas Juliano Araújo, diretor do Arayara, afirmou que a geração a gás natural pode agravar a escassez de água em épocas de seca. “A maioria das termelétricas a gás natural consome grandes quantidades de água”, disse ele.
Com os preços do gás natural muitas vezes superiores aos dos renováveis, Araújo afirmou que o Brasil deveria direcionar fundos dos combustíveis fósseis para expandir a geração solar e eólica e preservar suas reservas de hidrocarbonetos.”Não é verdade que o gás natural seja uma fonte de energia segura e firme”, disse ele.
Fonte: Fundação Reuters | Reportagem de Andre Cabette Fabio; Edição de Jon Hemming e Jack Graham
Tradução: Instituto Internacional Arayara