por Comunicação Arayara | 03, dez, 2024 | Carvão Mineral |
Senador Weverton Rocha (PDT-MA) ignora apelos e apresenta relatório que amplia benefícios para usinas a carvão e gás; pedido de vista adia votação para a próxima semana
Matéria publicada originalmente na Folha de São Paulo em 03/12/2024
O senador Weverton Rocha (PDT-MA), relator do projeto de lei que pretende ser o novo marco regulatório das eólicas em alto-mar, decidiu manter no PL uma série de emendas parlamentares sem nenhuma relação com o texto original, atendendo aos anseios da indústria do carvão mineral e do gás fóssil.
Nesta terça-feira (2), o parecer sobre o PL 576/21 é lido pelo senador na Comissão de Infraestrutura do Senado. Após um pedido de vista coletivo, porém, o presidente da comissão, senador Confúcio Moura (MDB-RO), acatou a solicitação e a votação do projeto foi repassada para a próxima semana.
No texto que chega ao Senado, Weverton Rocha mantém todos os pontos polêmicos que têm sido duramente criticados por todo o setor elétrico, com exceção daqueles que estão sendo diretamente atendidos pelas medidas.
Na semana passada, o texto chegou a entrar na pauta da comissão, mas após forte pressão no parlamento, Weverton retirou de pauta. A Folha tem insistido em falar com o parlamentar sobre o tema, mas não tem retorno.
Originado no Senado, o PL 576/21 chegou a ter apoio do setor elétrico em sua versão original, mas ganhou emendas jabutis na Câmara, o que desfigurou a versão original. Com a nova redação, houve aumento do prazo de geração de usinas a carvão de 2028 até 2050, além da obrigação de contratação de usinas a gás fóssil, com exigência de funcionarem até 70% dos dias do ano.
Nos cálculos da Frente Nacional dos Consumidores de Energia, se a proposta avançar como está, tem potencial de elevar em 25% as emissões de gases de efeito estufa oriundos do setor. As emendas obrigarão o país a emitir cerca de 252 milhões de toneladas (Mt) de CO2, ou o equivalente à média de 10 Mt de CO2 por ano, até 2050, ano em que o Brasil planeja atingir a neutralidade climática.
O cálculo foi elaborado com base em cálculos do Instituto Internacional Arayara, Instituto ClimaInfo, Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema) e dados da Empresa de Pesquisa Energética (EPE).
Além do impacto ambiental, a emenda relativa à contratação obrigatória do gás traria um custo adicional de R$ 155 bilhões a serem cobrados na conta de luz dos consumidores de energia. Já o jabuti do carvão obrigará os brasileiros a bancar a emissão média de 4,7 MtCO²e por ano pelos próximos 25 anos, com um custo total de R$ 92 bilhões.
Segundo Suely Araújo, coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima, a manutenção da proposta simboliza o negacionismo climático que tem marcado a maior parte das decisões do parlamento.
“O texto apresentado pelo relator no Senado mantém os jabutis que buscam fomentar carvão mineral e gás fóssil. É o Congresso, na prática, demonstrando mais uma vez o seu negacionismo climático. Aproveitam um processo necessário, a regulação das eólicas offshore, e consolidam equívocos graves, que colidem frontalmente com a perspectiva de descarbonização”, disse Araújo à Folha. “Esperamos que o poder executivo entre verdadeiramente na luta contra esse absurdo, com empenho.”
Duas emendas incluídas no texto determinam a contratação compulsória de 4,2 gigawatts de termelétricas a gás natural com funcionamento ininterrupto (inflexíveis), além da prorrogação e expansão de subsídios a usinas térmicas a carvão para os próximos 25 anos.
Somadas às outras seis emendas aprovadas por ampla maioria na Câmara dos Deputados, o impacto econômico total do PL 576/21 pode chegar a R$ 658 bilhões, ou R$ 25 bilhões por ano. Isso representa um aumento de 11% na conta de energia dos brasileiros.
“As imposições ao planejamento do setor elétrico vão encarecer a conta de energia para os brasileiros, aumentar o preço de tudo o que é produzido no país e ainda carbonizar as emissões do Brasil”, disse à Folha o presidente da Abrace (Associação Brasileira dos Consumidores de Energia), Paulo Pedrosa.
Há expectativa sobre como o governo, afinal, vai se comportar sobre o assunto. Dentro do setor elétrico, a leitura é que o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, tem dado sinais trocados sobre qual é a posição oficial da pasta sobre o assunto.
Pela tramitação do texto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode vetar o PL ou parte dele, mas isso também pode ser objeto de um novo projeto do Congresso, para derrubar o veto, como já ocorreu em outras ocasiões.
por Comunicação Arayara | 26, nov, 2024 | Termoelétrica |
A intenção é levar o tema já à votação no plenário da Casa no mesmo dia, segundo pessoas que acompanham a discussão
ANDRÉ BORGES
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)
O Senado pode votar nesta terça-feira (26) o texto que trata do marco regulatório das eólicas em alto-mar, que tem potencial de elevar em 25% as emissões de gases de efeito estufa do setor elétrico.
O impacto ambiental, calculado pela Frente Nacional dos Consumidores de Energia, se deve a emendas sem relação com o tema que foram incluídas pelos deputados ao analisar o texto, os chamados jabutis. A proposta está pautada para análise na Comissão de Infraestrutura do Senado.
A intenção é levar o tema já à votação no plenário da Casa no mesmo dia, segundo pessoas que acompanham a discussão. Se aprovado, o projeto vai para sanção presidencial.
O senador Weverton Rocha (PDT-MA), relator do projeto, não divulgou seu relatório sobre o PL. A votação, portanto, pode ocorrer sem uma discussão mais aprofundada sobre o tema. A reportagem entrou em contato com o parlamentar por diversas vezes, mas não obteve resposta sobre o pedido de entrevista.
Originado no Senado, o PL 576/21 teve apoio do setor elétrico em sua versão original, mas ganhou emendas jabutis na Câmara, o que desfigurou a versão original. Com a nova redação, houve aumento do prazo de geração de usinas a carvão de 2028 até 2050, além da obrigação de contratação de usinas a gás fóssil, com exigência de funcionarem até 70% dos dias do ano.
A reação contrária do setor elétrico à nova proposta foi ampla, unindo geradores, distribuidores, transmissores e consumidores de energia. Dentro do Congresso, porém, o tema já é tratado como certo de aprovação.
Duas emendas incluídas no texto determinam a contratação compulsória de 4,2 gigawatts de termelétricas a gás natural com funcionamento ininterrupto (inflexíveis), além da prorrogação e expansão de subsídios a usinas térmicas a carvão para os próximos 25 anos.
Se forem aprovadas, afirma a Frente do Setor Elétrico, essas emendas obrigarão o país a emitir cerca de 252 milhões de toneladas (Mt) de CO2, ou o equivalente à média de 10 Mt de CO2 por ano, até 2050, ano em que o Brasil planeja atingir a neutralidade climática.
O cálculo foi elaborado com base em cálculos do Instituto Internacional Arayara, Instituto ClimaInfo, Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema) e dados da Empresa de Pesquisa Energética (EPE).
Além do impacto ambiental, a emenda relativa à contratação obrigatória do gás traria um custo adicional de R$ 155 bilhões a serem cobrados na conta de luz dos consumidores de energia. Já o jabuti do carvão obrigará os brasileiros a bancar a emissão média de 4,7 MtCO²e por ano pelos próximos 25 anos, com um custo total de R$ 92 bilhões.
Somadas às outras seis emendas aprovadas por ampla maioria na Câmara dos Deputados, o impacto econômico total do PL 576/21 pode chegar a R$ 658 bilhões, ou R$ 25 bilhões por ano. Isso representa um aumento de 11% na conta de energia dos brasileiros.
“Nossa preocupação é que seja aprovado um PL e levado a plenário sem que conheçamos o seu relatório. Queremos participar dessa decisão. Estão virando as costas para os consumidores de energia, esquecendo que eles também são também eleitores”, diz Luiz Eduardo Barata, presidente da Frente Nacional dos Consumidores e ex-diretor do ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico).
Barata diz que a frente procurou o relator do PL no Senado, mas não obteve retorno. “Essa proposta atende a interesses particulares e nada republicanos. Faz um ano que estamos contra essa batalha no Congresso. Esse PL nasceu como uma boa proposta no Senado, mas recebeåu oito emendas na Câmara que trazem um conjunto de fontes desnecessárias, caras e que agridem o meio ambiente.”
Paulo Pedrosa, presidente da Abrace (Associação Brasileira dos Consumidores de Energia Elétrica), também faz duras críticas ao PL e ao rito de tramitação no Congresso.
“A aprovação dessas várias emendas que descaracterizaram o projeto das eólicas offshore é muito ruim, porque vai aumentar o custo da energia e carbonizar o setor elétrico brasileiro”, disse Pedrosa. “Isso vai retirar dinheiro das pessoas, aumentando a conta de luz e de tudo que é feito no Brasil. O brasileiro vai sentir isso no preço do supermercado.”
Pedrosa disse que confia na movimentação do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, que já criticou publicamente os jabutis, para que defenda os consumidores e reafirme o compromisso com a redução do custo de energia no país.
Dentro do Senado, porém, o governo dá sinais de pouca resistência para que o PL avance e seja votado.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode vetar o PL ou parte dele, mas isso também pode ser objeto de um novo projeto do Congresso, para derrubar o veto, como já ocorreu em outras ocasiões.
por Nicole Oliveira | 09, fev, 2020 | Carvão Mineral, Mudanças Climáticas, Mundo |
A prosperidade material de um país ainda está intimamente relacionada a seu consumo de energia. E, como cerca de 80% do fornecimento global de energia ainda se baseia em combustíveis fósseis, um alto nível de prosperidade, medido pelo Produto Interno Bruto (PIB), tende a ser associado ao alto consumo de energia per capita.
E essa situação continuará assim, explicou Eric Heymann, analista do Deutsche Bank para indústria, política climática e tráfego, em entrevista à DW. Ele é autor do estudo Reiches Land – hoher CO2-Ausstoss (País rico – alta emissão de CO2), que analisou os países do G20, em especial os Estados Unidos.
Ele frisa que, na situação atual, a neutralidade climática, como almeja a União Europeia até 2050, só poderá ser alcançada se houver uma mudança maciça nos hábitos de produção e consumo: “E isso seria difícil de alcançar politicamente nas democracias. Como podemos ver neste momento, estamos apenas no início do debate sobre os custos da proteção climática, e ele já está sendo explorado por certas forças políticas.”
DW: Por que a prosperidade ainda está tão intimamente ligada às emissões de dióxido de carbono de um país?
Eric Heymann: Via de regra, prosperidade implica consumirmos relativamente muita energia. E, em nível global, cerca de 80% do consumo de energia ainda é baseado em combustíveis fósseis. Nesse sentido, existe uma conexão direta entre o nível de prosperidade e as emissões de CO2.
Quais países foram focados em seu estudo?
Nós analisamos os países do G20 como um todo para determinar essa conexão e, nesse grupo, nós nos concentramos em alguns países como os Estados Unidos, a nação com o nível de bem-estar mais alto. Lá também as emissões estão acima da média. É verdade que os EUA fizeram progressos nos últimos anos, por exemplo, através de jazidas de gás não convencionais, como o gás de xisto, e a frota de veículos no país se tornou mais eficiente ao longo dos anos.
Ainda assim, os EUA ainda são uma economia com alta emissão CO2: os carros nas ruas ainda consomem mais combustível do que na Europa, e há uma atitude diferente em relação às viagens aéreas, já que voar lá é muito mais parte do dia a dia do que em outros países. Dessa forma, a participação relativamente pequena da indústria transformadora, de pouco mais de 10% no Produto Interno Bruto (PIB) dos EUA, não é tão significativa nas emissões de CO2. Porém, isso é mais do que compensado devido ao alto consumo diário.
O senhor acaba de mencionar a participação da indústria que ainda é muito alta num país como Alemanha. O que isso significa para as emissões de CO2?
Talvez possamos fazer uma comparação direta com França ou Reino Unido. Na Alemanha, a participação da indústria transformadora no valor agregado bruto total ainda é superior a 21%. Na França e Reino Unido, ela é de apenas 10%, e essa é uma das razões por que temos emissões per capita significativamente mais altas na Alemanha do que no Reino Unido ou França. Mas essa é apenas uma razão.
Devido à alta participação da indústria na economia alemã, temos também um volume relativamente alto de tráfego de mercadorias. Ao contrário de França ou Reino Unido, temos uma estrutura econômica muito policêntrica: as indústrias não estão concentradas numa região, como Paris ou Londres, mas espalhadas por todo o país. Por causa da nossa própria fragmentação da indústria, temos um volume de tráfego muito grande. E – parece relativamente banal – uma necessidade de calefação maior do que nos países do sul da Europa.
Esses são fatores que implicam termos emissões de CO2 per capita elevadas. Além disso, o lignito, uma fonte de eletricidade com grande emissão de CO2, desempenha ainda um papel importante no setor elétrico alemão.
A Alemanha não é o único país com uma participação industrial elevada: isso também se aplica à China. Qual é a situação nesse país asiático?
A China registrou um forte crescimento das emissões per capita nos últimos anos. Isso se deve ao fato de o país ter se industrializado fortemente. Uma guinada importante foi a adesão da China à Organização Mundial do Comércio (OMC), no fim de 2001. Desde então, aumentou acentuadamente o consumo de energia, e portanto das emissões de CO2, mas também a integração do país na cadeia de valor global.
Na China o carvão ainda tem uma participação elevada no consumo primário de energia. As energias renováveis também cresceram fortemente na China nos últimos anos, mas o carvão ainda domina. E devido a suas elevadas exportações, a China, em certo sentido, também exporta CO2 para outros países onde seus produtos são consumidos. As emissões per capita chinesas estão aproximadamente entre as da Alemanha e do Reino Unido. O país alcançou as emissões per capita dos países industrializados ocidentais, portanto a previsão é relativamente clara: ele continuará crescendo e, com isso, o consumo de energia.
Por mais negativa que essa mensagem seja para o clima, a China terá provavelmente que continuar dependendo do carvão. Pois somente com a expansão das energias renováveis, que progride fortemente no país, não será possível satisfazer a demanda energética.
Até que ponto é realista esperar que países mais desenvolvidos, como Alemanha ou EUA, possam compensar as emissões adicionais de CO2 da China e Índia, decorrentes da prosperidade crescente?
No Acordo de Paris, a China prometeu que suas emissões de CO2 iam atingir o pico por volta de 2030. Parece que ela conseguirá, pois ainda há um potencial relativamente grande de eficiência energética com a substituição de centrais ineficientes por outras melhores, mais eficientes.
Nesse aspecto a China já está relativamente avançada e atingiu um nível em que se pode argumentar que as emissões não precisarão aumentar por muito mais tempo, enquanto muitos outros países – onde a população é, em média, mais pobre – ainda têm que recuperar seu atraso. E onde grande parte do fornecimento de energia ainda provém de combustíveis fósseis, isso resulta em as emissões de CO2 seguirem crescendo, em nível global. É o que dizem as previsões da Agência Internacional de Energia (AIE).
As emissões de CO2, porém, não aumentarão mais tão acentuadamente quanto nos anos 2000 ou nos últimos 30 a 40 anos. O aumento é desacelerado devido ao avanço técnico, por uma maior eficiência e também por energias renováveis. Mas teremos que estar preparados para as emissões de CO2 continuarem aumentando, por enquanto.
A dependência mundial de combustíveis fósseis, de 80%, ainda é imensa. Mesmo na Alemanha, onde trabalhamos há 20 anos na transição energética, temos ainda uma dependência de combustíveis fósseis de quase 80% quando se trata de consumo primário de energia.
A respeito de neutralidade climática: quão realista é o objetivo da nova Comissão Europeia, sob a presidência de Ursula von der Leyen, de que a Europa atinja a neutralidade climática até 2050?
Na situação atual, a neutralidade climática não é possível sem uma mudança maciça nos hábitos de produção e consumo. E isso seria difícil de alcançar politicamente nas democracias. Como podemos ver neste momento, estamos apenas no início do debate sobre os custos da proteção climática, e ele já está sendo instrumentalizado por certas forças políticas. Nesse sentido, com as tecnologias disponíveis hoje e o atual nível de consumo, a neutralidade climática é uma ilusão.
Fonte: Deutsche Welle