Cinco dias antes do início da COP 29 (29a Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas – CQNUMC/ UNFCCC), a Diretoria Executiva da Petrobrás aprovou uma medida esperada há anos: a Petrobrás Biocombustível S.A. (PBio) não será vendida tão cedo. A decisão atende ao pleito de trabalhadores do setor de energia que se mobilizam nas últimas décadas em defesa da PBio.
Artigo de Opinião
Por Renata de Loyola Prata – advogada, assistente da Diretoria Executiva da ARAYARA
A PBio foi fundada em 2008 como subsidiária integral da Petrobrás e, desde então, houve sucessivas iniciativas de minguar a empresa, sempre resistidas pelos trabalhadores da PBio e petroleiros. Os trabalhadores da subsidiária, assim como da Transpetro, se organizam nos Sindipetros, tendo em vista que a atividade econômica preponderante da empresa matriz é a exploração, produção, refino e transporte de petróleo e gás. Em 2021, houve uma greve nacional contra a privatização da PBio, chegando à adesão, na Bahia, de 100% dos trabalhadores da usina. A Federação Nacional dos Petroleiros (FNP) ingressou com uma ação popular contra a tentativa de privatização. Além disso, o Sindipetro/MG, Sindipetro/BA, Sindipetro CE/PI, em convergência, propuseram uma ação civil pública. No bojo dessa ação judicial, o Ministério Público Federal apresentou parecer favorável à suspensão do processo de concessão.
Atualmente, a PBio é proprietária de três usinas de biodiesel: duas em funcionamento localizadas na Bahia e em Minas Gerais e uma hibernada no Ceará. Segundo a Associação dos Engenheiros da Petrobrás (AEPET), a subsidiária foi pioneira no desenvolvimento de tecnologias e da produção de biodiesel no Brasil, atingindo a colocação de maior produtora de biodiesel no país, também atuando na produção de etanol. Entretanto, em 2023, a subsidiária produziu o menor resultado em toda sua história: apenas 91 mil m³ de biodiesel.
De acordo com a cartilhaapresentada na COP 27, desenvolvida pelo Instituto Internacional ARAYARA, Sindipetro-RJ entre outras organizações de ensino e pesquisa e da sociedade civil, a empresa de economia mista é uma das melhores apostas para o Estado brasileiro de fato promover uma transição energética justa no país, mesmo após sua abertura para o investimento privado nos anos noventa, e o início dos leilões, possibilitando a venda de blocos de petróleo e gás para empresas privadas explorarem. Embora longe do cenário ideal, a empresa ainda é controlada pela União e, no início deste ano, o Estado detinha diretamente mais 50,26% de suas ações ordinárias.
A emergência climática é assunto de caráter público e coletivo, tendo em vista que gera danos para toda a população e perpetua injustiças sociais, raciais e de gênero. A necessidade de abandonar o petróleo, gás e carvão e zerar o desmatamento, como premissas para reduzir drasticamente as emissões de gases de efeito estufa, impõe tarefas transversais, coordenadas, robustas e que, necessariamente, reduzirão a margem de lucro do setor de combustíveis fósseis e da agropecuária insustentável e irresponsável. Inclusive, após anos de letargia desde o Rio 92, finalmente na COP do ano passado, constou no acordo aprovado no final da conferência, pela primeira vez na história da CQNUMC/ UNFCCC, que é necessária a “transição em direção ao fim dos combustíveis fósseis”. Devido a sua natureza, essas tarefas dificilmente serão orquestradas por outro ator senão o Estado imbuído de participação popular sobretudo de comunidades já afetadas pelo caos climático e poluição gerada por esses setores.
Por isso, a reversão de privatizações no setor elétrico é mais comum mundo afora. Em junho do ano passado, a França concluiu a reestatização da Électricité de France (EDF), geradora de energia. Desde o ano 2000, a Alemanha reestatizou 284 empresas do setor de energia, a Austrália 13, a Holanda 6, a Espanha 19, o Reino Unido 15 e os Estados Unidos 11. Nesse sentido, a luta dos trabalhadores da PBio e petroleiros continua, tendo em vista que o horizonte é mais ambicioso do que retirar a subsidiária do rol de privatizações. A demanda é para que os empregados da PBio sejam incorporados ao Sistema Petrobrás, havendo um plano de cargos único e firmando acordos coletivos unitários, assim valorizando os trabalhadores e fortalecendo a atividade.
Medidas como essa, que trazem maior potência à PBio contribuem para que o país aprimore sua estrutura institucional na mitigação climática. A nova NDC (Contribição Nacionalmente Determinada) que a delegação brasileira apresentou na COP hoje em curso, está longe de prever todas as medidas que de fato nos afastem do precipício climático e social. Entretanto, o destaque que o Brasil dotou aos biocombustíveis é um importante passo e precisa ser materializado em uma agenda de fortalecimento da PBio, dando continuidade às boas novas sobre a subsidiária. Essa tarefa, evidentemente, deve ser trilhada com salvaguardas, compreendendo que a indústria de biocombustíveis deve ser fortalecida para a mitigação climática e justiça ambiental.
Nesse sentido, conforme idealizado desde seu início, o Programa Nacional de Biodiesel, a produção de biocombustíveis deve ser integrada à agricultura familiar, priorizando pequenos fornecedores locais produtores de óleos (mamona, macaúba, caroço de algodão, entre outras), evitando monoculturas, gerando emprego e renda, fortalecendo uma cadeia de suprimentos sustentável e estimulando uma economia regenerativa. Aliado a isso, deve haver um firme compromisso da Petrobrás para afastar definitivamente de sua política a possibilidade de privatizar a PBio e que a subsidiária, bem como a Petrobrás sejam 100% estatais.
As soluções para a mitigação climática devem ser articuladas com ampla participação de comunidades atingidas e das categorias laborais mais próximas aos setores geradores de gases de efeito estufa. Essa troca mútua historicamente rendeu bons frutos, conforme argumenta Stefania Barca em “Workers of the Earth: Labour, Ecology and Reproduction in the Age of Climate Change” (2024). Recentemente no Brasil, experiências como as mobilizações contra os leilões de petróleo e gás da oferta permanente são escolas de ação climática, agitadas por quilombolas, indígenas, trabalhadores do Sindipetro-RJ e organizações da sociedade civil. Muito também nos ensina a luta vitoriosa dos petroleiros contra a privatização da PBio.
Em um momento decisivo para o futuro ambiental do planeta, enquanto a Ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima participa da COP29, a Amazônia perde mais uma batalha contra a indústria fóssil. A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) anunciou esta semana a atualização do cronograma do 4º Ciclo da Oferta Permanente de Concessão (OPC) para três blocos na Bacia do Amazonas, que estavam suspensos devido a ações judiciais.
A Agência Nacional do Petróleo (ANP) assinou o contrato para a área de acumulação marginal de Japiim – um campo com prospecção passada e com potencial de existência de petróleo – anteriormente suspensa por liminar, com o consórcio formado por Eneva (80%) e Atem Participações (20%).
Outras áreas, como os blocos AM-T-63, AM-T-64 e AM-T-107, arrematados pela Atem, também foram liberadas pela Justiça e receberam novos cronogramas, com entrega de documentação prevista para 20 de dezembro de 2024 e assinatura de contratos até 28 de fevereiro de 2025. Já os blocos AM-T-133 e PAR-T-335 permanecem com prazos suspensos devido a ações judiciais, algumas das quais movidas pelo Instituto Internacional Arayara em parceria com a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB).
Litígios e defesa do meio ambiente
O Instituto Internacional Arayara tem sido um dos maiores defensores da preservação ambiental na região. Em parceria com a APIB, a maior ong de litigância da América Latina entrou com ações judiciais contra 77 blocos de exploração ofertados no leilão da ANP de 2023.
Segundo o diretor presidente do Instituto Internacional Arayara e da COESUS, Juliano Bueno de Araújo, os bloqueios judiciais, embora temporários, são uma resposta direta aos impactos irreversíveis que a exploração de petróleo e gás pode causar. “Mais de sete ações movidas pela ARAYARA motivaram mudanças nas diretrizes da ANP, com a adoção de novos critérios socioambientais para a inclusão de blocos, porém essa é uma batalha contínua”, pontuou Araújo.
Com base em estudos da ARAYARA apresentados à ANP, 10 blocos foram totalmente excluídos do 4º ciclo da Oferta Permanente, como resultado de conflitos com unidades de conservação e a presença de Terras Indígenas. No total, 79 blocos da Consulta Pública nº 02/2024 sofreram recortes, com uma redução de 24 mil km² na área ofertada.
Araújo destaca com preocupação que a luta contra a exploração de petróleo na Amazônia ainda está longe de ser vencida. Dados do Caderno Técnico Leilão do Fim do Mundo revelam que 66 blocos ofertados continuam sem atender às salvaguardas mínimas exigidas pela própria ANP. “Embora ajustes no mapeamento tenham eliminado sobreposições com Terras Indígenas, muitos desses blocos ainda impactam diretamente assentamentos e ecossistemas críticos, abrigando fauna e flora ameaçadas de extinção”, alerta o diretor da ARAYARA.
Ele ainda ressalta a gravidade da situação: “Estamos falando de 31 blocos propostos na Amazônia Legal, 47 na Costa Amazônica e 2 que invadem áreas de Unidades de Conservação. Isso representa uma ameaça iminente à preservação desses territórios sensíveis e à biodiversidade que eles protegem.”
Mapa de Localização Atualização do Cronograma do 4° Ciclo de Oferta Permanente de Concessão – Bacia do Amazonas – Fonte: Instituto Internacional ARAYARA
Resistência e proteção de territórios
Os blocos AM-T-107, adquiridos pela Atem Participações, ocupam a Área de Influência Direta (AID) da Sissaíma e outras terras indígenas dos Mura, o que legalmente dá a esse povo o direito à consulta prévia livre e informada. Os Mura, recentemente, promoveram o VII Encontro do Povo Mura da Resistência, na aldeia Moyray, em Autazes (AM). O evento reuniu lideranças indígenas e organizações parceiras para debater as crescentes ameaças ambientais e as pressões sobre seus territórios, intensificadas por projetos de mineração e mudanças climáticas.
Embora a mineração de potássio seja o principal foco de preocupação, a exploração de petróleo também representa uma ameaça significativa, com a proximidade de blocos que podem impactar diretamente as terras indígenas. Durante o encontro, a ARAYARA apresentou dados alarmantes sobre os efeitos do fracking e da exploração de petróleo na Amazônia, alertando para a contaminação do solo, ar e lençóis freáticos. A extração de petróleo, além de danificar fauna e flora, desrespeita os direitos dos povos indígenas à consulta, conforme prevê a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Coalizão contra os combustíveis fósseis na Amazônia
A ARAYARA esteve presente na COP16, realizada no mês passado na Colômbia, participando da primeira audiência pública da Frente Parlamentar Global pelo Futuro Livre de Combustíveis Fósseis. Composta por mais de 800 legisladores de 95 países, a Frente tem como missão reduzir a dependência global de combustíveis fósseis e acelerar a transição para energias renováveis.
Durante o evento, parlamentares de 11 países apresentaram uma carta aberta exigindo novos compromissos internacionais para complementar o Acordo de Paris e frear a expansão da exploração de petróleo, gás e carvão.
Vinícius Nora, gerente-geral do Instituto ARAYARA, destacou a urgência de uma transição energética na Amazônia, ressaltando os graves impactos da exploração de combustíveis fósseis na biodiversidade e nas comunidades costeiras. Ele também apresentou dados do Monitor Oceano, uma ferramenta desenvolvida pela ARAYARA para acompanhar os impactos da exploração petrolífera nos ecossistemas marinhos brasileiros.
Fundo Amazônia em Jogo
No mesmo mês, a diretora executiva da ARAYARA, Nicole Oliveira, liderou uma série de reuniões na Alemanha e Noruega, em parceria com a Fundação Urgewald. O objetivo foi expor as contradições entre o discurso ambiental do governo brasileiro e a concessão de licenças para exploração de petróleo na Amazônia. As reuniões, que incluíram gestores do Fundo Amazônia e parlamentares europeus, teve o objetivo de pressionar os principais doadores a condicionar futuras contribuições à implementação de políticas ambientais mais consistentes por parte do Brasil.
Consequência das mudanças climáticas, elevação do nível do mar na região provoca suspensão de jogos e competições, além de enchentes, erosão do solo e deslocamentos forçados
Por Rodrigo Lois — Rio de Janeiro
Jordi Tasip tem o sonho de jogar a Copa do Mundo. Ele é o camisa 10 da modesta seleção de Vanuatu, país no Oceano Pacífico formado por cerca de 80 ilhas. Só que esse desejo se desenrola em meio à dura realidade de problemas que a nação enfrenta — e a região no geral. O mais grave é o risco de desaparecer do mapa, por causa da elevação do mar.
As eliminatórias da Oceania começaram para valer em outubro, com a fase de grupos, e têm nova rodada nesta semana. A confederação de futebol da região (OFC) é composta por 11 federações: Samoa, Samoa Americana, Ilhas Cook, Fiji, Caledônia, Nova Zelândia, Papua Nova Guiné, Ilhas Salomão, Taiti, Tonga e Vanuatu.
É a primeira vez na história da Copa do Mundo que a região da Oceania tem garantida pelo menos uma representante. Há chance de outra entrar pela repescagem. Só a Nova Zelândia já participou do torneio. A Austrália fica na Oceania, mas disputa as eliminatórias asiáticas.
Foi em Tonga que o secretário-geral das Nações Unidas (ONU), António Guterres, emitiu em agosto um alerta por causa da rápida elevação do Oceano Pacífico: “Catástrofe em escala mundial”. As temperaturas nos mares da região estão subindo muito mais rápido do que as médias globais.
Águas sobem, países desaparecem
As nações do Pacífico são formadas por ilhas de baixa altitude em relação ao nível do mar. A elevação média é de até dois metros.Essas ilhas estão mais expostas às mudanças climáticas e eventos extremos. Cerca de 90% da população vive a 5 km da costa, e metade da infraestrutura está a 500 metros do mar. O futebol não está imune a isso.
— Mais ciclones, cada vez mais poderosos. Também enfrentamos erupções vulcânicas e tsunamis. Enchentes nas Ilhas Salomão e no Taiti. O impacto é óbvio, às casas e à infraestrutura do futebol. Quando isso acontece, não dá para você organizar mais competições. Não tem um campo para praticar. No fim, a comunidade é cada vez mais afetada, não tem como pensar em futebol — comentou o secretário-geral da confederação da Oceania, Franck Castillo, em entrevista ao ge.
A temperatura média do Oceano aumentou muito nos últimos anos, reflexo do aquecimento global — Foto: Climate Change Institute, Universidade de Maine
O aquecimento global, provocado pela humanidade — principalmente pela emissão dos chamados gases do efeito estufa —, leva ao derretimento das calotas polares e geleiras, aumenta o calor no mar e expande o volume da água. Aí temos o avanço dos oceanos.
— O Pacífico já vive com mudanças climáticas, o aumento do nível do mar é um deles. É um processo cíclico, entrelaçado. Há 18 meses os oceanos quebram recordes de temperatura, e não conseguimos baixar isso. Esses lugares são excepcionalmente vulneráveis pela sua condição baixa de litoral — explicou Vinicius Nora, gerente de Oceanos e Clima no Instituto Internacional Arayara.
De acordo com relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), o aumento de 1,5°C da temperatura média da Terra significará que 4% da área terrestre ficarão submersos, afetando drasticamente a sobrevivência na região do Pacífico. A humanidade já provocou o aquecimento global de 1,1°C.
Para manter esse aumento abaixo de 1,5°C, é necessário reduzir as emissões dos gases de efeito estufa pela metade até 2030.
Os impactos no futebol do Pacífico
Devido à erosão do solo, as Ilhas Salomão perderam praias em que havia campos de futebol para as comunidades rurais. Ligas em diferentes países foram interrompidas por enchentes, maremotos e elevação do mar. Instalações da federação de Fiji serviram de abrigo durante um ciclone, em 2021.
— Nós tivemos uma piora do tempo adverso, em termos de aumento de temperatura, impactos que nunca tínhamos visto. Temos mais intervalos para hidratação durante os jogos. O custo de levar água ao campo aumentou também. Nosso país é o primeiro a ter refugiados por mudanças climáticas — contou o secretário-geral da federação de Nova Guiné, Gordon Manub.
As federações se veem obrigadas a elevar os campos, reforçar edifícios e estádios, mudar materiais, repensar o sistema de água. Tonga estabeleceu que suas instalações de futebol podem ser usadas como centros de evacuação em caso de desastre.
— Nosso país é uma nação insular, que tem cerca de 999 ilhas. Um dos desafios em relação às mudanças climáticas é a erosão da terra, por causa do aumento do nível do mar. Perdemos muitas praias, em especial aquelas em que construímos campos de futebol para as comunidades rurais. Isso realmente afetou o desenvolvimento do futebol — comentou Leonard Paia, diretor geral da federação de futebol da Samoa, à Fifa.
A Federação de Vanuatu conseguiu isenção do governo local para a importação de materiais para o Estádio Freshwater.
A confederação de futebol da Oceania (OFC) lançou em 2014, em parceria com a Unicef, o programa de emergência “Just Play”, para dar apoio a crianças traumatizadas por eventos climáticos extremos. A intenção é fazer uma iniciativa semelhante de prevenção.
Entre 2009 e 2016, 32 desastres naturais afetaram as ilhas do Pacífico. Em um ano (2015), Vanuatu e Fiji foram atingidas por dois ciclones de categoria 5, alterando a vida de 1 milhão de pessoas, sendo quase metade disso crianças. Elas foram depois ensinadas a lidar com situações de emergência.
— Através do programa eu conheci várias crianças afetadas pelos ciclones. Muitas perderam escolas, casas, pertences… Não se sentiam mais seguras. Durante o programa, muitas se sentiam aliviadas por estarem fora do estresse de recuperação — contou Salaseini, coordenadora do programa em Fiji.
A Fifa informou que investiu US$ 21 milhões no desenvolvimento da infraestrutura do futebol na Oceania, desde 2016. A entidade promoveu em abril deste ano um workshop sobre infraestrutura e manutenção de instalações, em Papa Nova Guiné, no qual esteve em foco o combate às mudanças climáticas. A crise do clima foi tratada como a maior ameaça a todos os países do Pacífico.
Resumidamente, o aquecimento global é provocado pelos gases de efeito estufa, principalmente o dióxido de carbono (CO2), que são lançados pela homem na atmosfera, através da geração de energia, fábricas, transporte, desmatamento e queimadas, entre outros.
As nações insulares do Pacífico respondem por só 0,02% das emissões dos gases do efeito estufa no mundo.
Cenário se repete no Brasil e deve piorar
O aumento do nível do oceano não se deu apenas no Pacífico (acima da média). Esse é um problema global. As consequências disso já são sentidas no Brasil, onde 55% da população mora a 150km do litoral.
— O oceano “com febre” nos leva a mais eventos extremos, como vimos no litoral de São Paulo, Rio de Janeiro, Alagoas, Bahia, Pernambuco… Esses eventos extremos, que têm levado ao cancelamento de jogos no Reino Unido, no Pacífico, vários lugares, serão cada vez mais comuns. Chuvas, dias de extremo calor. Isso é impacto associado à mudança do clima, a um oceano mais quente — comentou Ronaldo Christofoletti, professor na Instituto do Mar (UNIFESP).
Quando Magda Chambriard assumiu a presidência da Petrobras, o imbróglio sobre a Margem Equatorial dentro do governo já durava um ano e a executiva, na presença de Silveira e do presidente Lula, deixou clara sua posição. “Precisamos ter autorização para explorar. Vamos ter de conversar com o MMA para mostrar o que a Petrobras está ofertando, que é muito mais do que a lei demanda. O MMA precisa ser mais esclarecido sobre a necessidade de a Petrobras e o País explorarem petróleo e gás, até para liderar a transição energética”, afirmou à época. Passados mais seis meses, parece que essa conversa não aconteceu, e o tom na Petrobras já é de declarada impaciência. “A Margem Equatorial, assim como outras novas fronteiras exploratórias, é essencial para a reposição das reservas do País. mas é preciso agilidade. O desenvolvimento da produção em águas profundas exige antecedência, demora muito”, diz Chambriard. Ela faz um alerta: “As necessidades do Brasil de reposição de reservas são sérias”.
Uma linha de crítica mais contundente foi adotada pela diretora de Exploração e Produção da Petrobras, Sylvia Anjos, em debates acadêmicos e seminários da indústria de óleo e gás nas últimas semanas: “Estamos lutando para obter a licença e seguindo todas as exigências do Ibama. Até 2030 a produção começará a cair. Este é o momento de fazer uma nova descoberta, senão o Brasil poderá precisar importar petróleo”. Anjos minimiza as preocupações dos ambientalistas: “A área que vamos perfurar na Margem Equatorial tem 2,8 mil metros de profundidade, a 500 quilômetros da Foz do Amazonas e a 175 quilômetros da costa. As correntes da região não se dirigem ao litoral. Estamos confiantes de que não haverá impacto”. A diretora chegou a qualificar como “fake news científica” a informação difundida por biólogos de que a exploração de petróleo iria prejudicar os recifes de corais na Foz do Amazonas: “Lá existem rochas calcárias, mas não são corais, são rochas antigas”.
Entre os ambientalistas, o pedido é de cautela. “Toda atividade de petróleo tem um risco muito alto e aquela é uma região com uma biodiversidade muito pouco conhecida, extremamente importante e que certamente cumpre um papel ecológico neste momento de colapso climático”, afirma Pedro Graça Aranha, articulador da Coalizão Pelo Clima. O maior problema, acrescenta o especialista, é o fato de o governo brasileiro, que afirma seu compromisso com o enfrentamento às mudanças climáticas, apostar ainda na indústria do petróleo como modelo de desenvolvimento econômico: “É um equívoco profundo. O governo Lula é de um negacionismo sutil porque reconhece as mudanças climáticas, tem políticas para fazer o enfrentamento, mas ainda aposta na economia verde e outras falsas soluções que não vão diminuir o aquecimento do planeta. Já chegamos a um ponto no qual a redução da temperatura será muito pequena”.
Outra questão diz respeito aos impactos socioambientais da exploração próxima à Foz do Amazonas, alerta Sila Mesquita, coordenadora da rede Grupo de Trabalho Amazônico, que congrega centenas de organizações da região: “A exploração viola a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, que prevê o consentimento prévio das comunidades e povos envolvidos, mesmo que de forma indireta, com o projeto. Outra questão são os riscos para a biodiversidade, já apontados até mesmo em estudos oficiais”. No que depender das organizações do movimento socioambiental, a pressão contra a exploração da Margem Equatorial só vai crescer até a COP–30 que acontecerá em Belém: “Essa disputa vai refletir-se na articulação amazônica, e mesmo panamazônica, que tem cada vez mais o foco em uma Amazônia livre da exploração de petróleo e gás. Vai haver mobilização e alerta sobre o tema, mesmo com todo apelo econômico usado pelo governo”.
Professor do Instituto Oceanográfico da USP e coordenador da cátedra da Unesco para a Sustentabilidade do Oceano, Alexander Turra alerta que a informação disponível para basear qualquer discussão sobre a Margem Equatorial não é muito grande, mas afirma que o risco associado à atividade de exploração de petróleo precisa ser considerado: “Temos ali ambientes bastante importantes do ponto de vista ecológico e econômico, que são a base de toda produção pesqueira que ocorre na região. A vulnerabilidade à qual a comunidade local dos três estados da Foz do Amazonas poderá acabar sendo exposta é o aspecto central, considerando todos os elementos ecológicos que estão no meio do caminho”.
Sobre apolêmica dos corais, Turra afirma que a discussão vai além da questão meramente semântica: “Estamos falando de um sistema recifal construído basicamente por esponjas e algas calcárias. Não é exatamente um recife de coral como vemos no Nordeste, mas isso não diminui a sua importância. Esse sistema é a base da atividade pesqueira da região”. A importância dos manguezais também é ressaltada pelo especialista: “Os manguezais são fundamentais para as pessoas poderem viver, se alimentar e desenvolver novas atividades econômicas ou perspectivas como o pagamento por serviços ambientais, sequestro de carbono, turismo ecológico de base comunitária e coisas assim. Esses ambientes precisam ser resguardados, e é isso que o Ibama precisa observar”.
Já a questão das correntes marítimas na região, emenda Turra, é controversa: “O efeito das correntes mais profundas ainda não é totalmente conhecido. Na medida em que parte do óleo afunda, há correntes que acabam tendo outros sentidos em maiores profundidades e têm o potencial de levar esse óleo de volta ao território brasileiro e, eventualmente, para a costa. Em princípio, não é zero essa possibilidade”.
Um estudo publicado pelo Instituto Arayara analisou cinco espécies de pescados importantes para a região e identificou que todas têm suas áreas de pesca afetadas, com previsão de aumento progressivo de restrições à medida que a fronteira do petróleo se estabelece e cresce a infraestrutura necessária à sua instalação. Oceanógrafa da entidade, Kerlem Carvalho ressalta o prejuízo econômico, uma vez que a indústria pesqueira desempenha grande papel na balança comercial brasileira e movimenta toneladas de produtos para distribuição nacional e exportação para países das Américas, Ásia e Europa: “Além de perdas econômicas, os impactos da exploração de petróleo na pesca podem afetar a segurança alimentar de milhares de pessoas que dependem desse recurso para sua subsistência. É importante ressaltar que a instalação da indústria de petróleo e gás trará uma série de consequências adicionais, incluindo desmatamento, intensificação das atividades portuárias e mudanças socioeconômicas e culturais que afetarão diretamente as comunidades tradicionais, comprometendo sua soberania e segurança alimentar”.
Por ora, a Petrobras procura avançar onde pode em relação à exploração da Margem Equatorial, que, segundo Chambriard, tem reservas potenciais de 10 bilhões de barris de petróleo e investimentos previstos em 280 bilhões de reais. Em dezembro, se completará um ano desde que a empresa, autorizada pelo Ibama, perfurou o poço de Pitu Oeste, a 53 quilômetros da costa do Rio Grande do Norte. No mês passado a Petrobras anunciou a descoberta de uma “importante acumulação de petróleo”, o poço de Anhangá, localizado em uma profundidade de 2,1 mil metros e a 78 quilômetros da costa potiguar. Indagada pela reportagem sobre os resultados de Pitu Oeste e as expectativas em relação aos novos poços, a direção da Petrobras não respondeu até o fechamento desta edição.
Em recente encontro com investidores da Margem Equatorial, que, segundo Chambriard, tem reservas potenciais de 10 bilhões de barris de petróleo e investimentos previstos em 280 bilhões de reais. Em dezembro, se completará um ano desde que a empresa, autorizada pelo Ibama, perfurou o poço de Pitu Oeste, a 53 quilômetros da costa do Rio Grande do Norte. No mês passado a Petrobras anunciou a descoberta de uma “importante acumulação de petróleo”, o poço de Anhangá, localizado em uma profundidade de 2,1 mil metros e a 78 quilômetros da costa potiguar. Indagada pela reportagem sobre os resultados de Pitu Oeste e as expectativas em relação aos novos poços, a direção da Petrobras não respondeu até o fechamento desta edição.
Em recente encontro com investidores sauditas do setor petrolífero, Lula defendeu a exploração. “Na hora em que começarmos a explorar a Margem Equatorial, vamos dar um salto de qualidade extraordinário. Queremos fazer tudo de forma legal e respeitando o meio ambiente, mas não vamos desperdiçar nenhuma oportunidade de crescer”, disse. Para acelerar o processo, o presidente conta com a Advocacia-Geral da União (AGU), órgão que em setembro emitiu mais um parecer favorável à Petrobras ao determinar que não cabe ao Ibama, e sim ao governo do Amapá, conceder licença de funcionamento ao Aeroporto de Oiapoque, que será usado como base se a produção de óleo e gás for de fato iniciada.
Em documento assinado pelo titular da pasta, Jorge Messias, a AGU afirma “não constituir fundamentação adequada para análise do pedido de reconsideração do licenciamento do bloco a verificação de impacto do tráfego aéreo do Aeroporto de Oiapoque sobre as comunidades indígenas do entorno”. A AGU também concluiu pelo indeferimento da participação da Funai, solicitada pelo Ibama no processo de licenciamento: “A atuação do Ibama carece de previsão regulamentar ou mesmo de razoabilidade ao criar uma etapa procedimental não prevista na norma e que põe em risco o prosseguimento do licenciamento ambiental do bloco”.
Enquanto o imbróglio sobre a Margem Equatorial não se define, segue a pressão interna. “Estou convicto de que o Ibama dará essa licença. Vamos avançar com responsabilidade, cumprindo todos os critérios ambientais, mas sem abrir mão da nossa soberania. Não vamos deixar de virar exportadores de petróleo para virar importadores”, diz Silveira.
O aumento de temperatura esperado para o fim do século será de 3,1°C caso as contribuições nacionais para reduzir emissões de CO2 não atinjam níveis mais ambiciosos
A tragédia provocada pelas chuvas no Rio Grande do Sul é um dos efeitos das mudanças climáticas e seus impactos no cotidiano – (crédito: Marinha do Brasil )
O planeta se aproxima de chegar ao fim do século 3,1°C mais quente do que na era pré-industrial, alcançando temperaturas incompatíveis com a vida. O alerta é do relatório Lacuna das Emissões do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), lançado ontem em Cali, na Colômbia, durante a Conferência das Partes da Convenção sobre Biodiversidade (COP15). A pouco mais de um mês da COP29, do clima, sediada no Azerbaijão, o documento destaca que, tecnicamente, ainda é possível atingir a meta de 1,5°C. Mas, para isso, é preciso uma mobilização massiva, que leve ao corte de 42% das emissões globais até 2030 e 57% até 2035.
Com as políticas atuais de contenção dos gases de efeito estufa, o mundo alcançará um aumento considerado catastrófico na temperatura. Mesmo que os compromissos já assumidos nas COPs anteriores fossem cumpridos — e não estão —, o planeta chegaria a 2100 entre 2,6°C-2,8°C mais quente do que o século 19.
No próximo ano, na COP de Belém, no Brasil, haverá uma nova rodada das chamadas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) – compromissos que cada país signatário do Acordo de Paris apresenta na conferência, para ajudar a reduzir as emissões. A ONU adverte que essas metas terão de ser mais ambiciosas do que nunca. “O relatório de hoje (ontem) sobre a Lacuna de Emissões é claro: estamos brincando com fogo; não podemos mais ganhar tempo”, ressaltou o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, em uma mensagem em vídeo. “Estamos sem tempo. Fechar a lacuna de emissões significa fechar a lacuna de ambição, a lacuna de implementação e a lacuna financeira. Começando na COP29.”
As projeções científicas apresentadas no relatório, de um mundo 2,6 °C mais quente, baseiam-se no cenário de implementação total das NDCs e têm uma probabilidade de 66% de acontecerem. O problema é que nem essas promessas estão sendo cumpridas; nenhum país está no caminho de alcançar as contribuições apresentadas em 2022, a atualização mais recente. Se todas fossem batidas, ainda seria necessário acrescentar contribuições de zero líquido para limitar o aquecimento a 1,9 °C. O relatório, porém, ressalta que há pouca confiança, hoje, nas estratégias que têm como objetivo contrabalancear as emissões com a captura de carbono.
“A lacuna de emissões não é uma noção abstrata”, reforçou Guterres. “Há uma ligação direta entre o aumento das emissões e desastres climáticos cada vez mais frequentes e intensos. Em todo o mundo, as pessoas estão pagando um preço terrível. Emissões recordes significam temperaturas recordes do mar sobrecarregando furacões monstruosos; calor recorde está transformando florestas em caixas de pólvora e cidades em saunas; chuvas recordes estão resultando em inundações bíblicas.”
Alexandre Prado, líder em Mudanças Climáticas do WWF-Brasil, destaca tragédias climáticas brasileiras recentes. “A tragédia no Sul, a maior seca da história e as queimadas na Amazônia e no Pantanal nos mostraram que da forma como está, já era”, avalia. Prado lembra que a origem das mudanças climáticas são os combustíveis fósseis, cuja queima resulta na formação dos gases de efeito estufa. “Sabemos o que fazer, sabemos como fazer e sabemos das dificuldades e desafios, mas temos que ter lideranças para enfrentá-los.”
Para limitar o aumento da temperatura, o relatório da ONU destaca que as emissões devem cair 28% até 2030 e 37% dos níveis de 2019 até 2035. “Precisamos de mobilização global em uma escala e ritmo nunca vistos antes — começando agora mesmo. Peço a todas as nações: chega de conversa fiada”, discursou Inger Andersen, diretora-executiva do Pnuma. A COP29 é considerada uma conferência intermediária, pois as novas NDCs serão assumidas na 30ª edição. Andersen afirmou que o encontro em Baku, no Azerbaijão, é a oportunidade para elevar, agora, o nível de ambição para “entrar em um caminho de 1,5°C”.
O relatório destaca que, em vez de redução nas emissões, desde 2019, o que se vê é um aumento na liberação de gases de efeito estufa, chegando ao recorde de 57,1 gigatoneladas no ano passado. O atraso no cumprimento das metas significa que, até 2035, será preciso cortar, anualmente, 7,5% do CO2.
Embora muito pouco provável, o cenário do Acordo de Paris, de 1,5°C acima dos índices pré-industriais, é tecnicamente possível. Para isso, os países devem cortar até 31 gigatoneladas de CO2 equivalente em 2030 – ou 52% do que foi emitido em 2023, e 41 gigatoneladas até 2035. O custo previsto desses cortes é estimado em menos de US$ 200 por tonelada de carbono.
Segundo o relatório, o aumento da implantação de tecnologias solares fotovoltaicas e energia eólica poderia fornecer 27% do potencial total de redução em 2030 e 38% em 2035. A ação sobre florestas pode contribuir com 20% nos dois anos. Outras opções promissoras incluem medidas de eficiência, eletrificação e troca de combustível nos setores de edifícios, transporte e indústria.
“Apesar de estar em situação mais favorável, segundo a análise apresentada, o Brasil pode não conseguir alcançar suas metas climáticas nas NDCs, se não mudar as políticas atuais, o mesmo acontecendo com países como Estados Unidos e União Europeia”, reforça Juliano Bueno de Araújo, doutor em Riscos e Emergências Ambientais e diretor técnico do Instituto Internacional Arayara. “As ações implementadas são consideradas insuficientes e a transição para uma economia sustentável está lenta. Sem uma revisão e intensificação das estratégias, esses países comprometem seu futuro ambiental e sua posição no combate às mudanças climáticas.”
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