por Comunicação Arayara | 03, dez, 2024 | Fracking |
Uma decisão da Justiça Federal condenou, nesta segunda-feira (02), a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) a proibir licitações ou concessões para extração de xisto, mineral amplamente explorado na produção de combustíveis no Brasil, por meio da técnica de fraturamento hidráulico, conhecida como fracking, no Recôncavo baiano.
Matéria publicada no Bahia Notícias em 02/12/2024
A ação, movida pelo Ministério Público Federal (MPF), visa evitar os efeitos decorrentes de uma série de licitações promovidas pela ANP em 2013, que disponibilizou 50 blocos na Bacia do Recôncavo, mas foi suspensa por medida liminar obtida pelo MPF no mesmo processo. A 12ª Rodada de Licitações de Blocos Exploratórios, como foi chamada, fica agora anulada, assim como qualquer concessão de área para exploração de xisto por fracking na região.
O fracking é uma técica de extração mineral que utiliza perfurações de até mais de 3,2km de profundidade no solo. Na decisão, a Justiça Federal compreendeu que a técnica impõe riscos eminentes ao meio ambiente, além de que a prática não é regulamentada pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) e as regiões afetadas não possuem Avaliação Ambiental de Áreas Sedimentares (AAAS).
O parecer técnico do Grupo de Trabalho Interinstitucional de Atividades de Exploração e Produção de Óleo e Gás do Ministério do Meio Ambiente (GTPEG) alertou que esse tipo de exploração pode gerar vários danos, como contaminação das reservas de água potável e do solo, possibilidade de ocorrência de tremores de terra, emprego de excessiva quantidade de água para o fraturamento hidráulico, entre outros. E o MPF ressaltou que a técnica é proibida na Itália, Áustria, França, Dinamarca e Alemanha. Nos Estados Unidos, onde foi amplamente utilizada, a situação é considerada preocupante devido ao aumento de pontos de contaminação.
“Torna-se imperiosa e premente a necessidade de políticas públicas que evitem a ocorrência de danos ambientais, mesmo diante da incerteza científica, como é o caso da técnica destrutiva de rochas e veios sedimentares — fratura na rocha ou fracking — que uma agência estatal brasileira, de modo intempestivo e precipitado, ousou colocar em mesa de negociação, visando auferir receitas advindas da exploração do gás xisto, para desgosto dos que defendem cautela e parcimônia com o meio ambiente ecologicamente equilibrado”, destaca a decisão judicial.
Foto: Reprodução / MPF-BA/ Oleo Jørgen Bratland/Statoi
por Comunicação Arayara | 03, jul, 2024 | Defensores Ambientais |
A companheira que nos deixa, Lídia Lucaski, tem longa trajetória de lutas na defesa do meio ambiente e o mérito incontestável desta premiação no seio da comunidade paranaense, com o reconhecimento de todos e todas que acompanham sua história à frente da Ong AMAR, mantida com independência.
Por Juliano Bueno de Araújo*
A antropóloga e ambientalista Lídia Lucaski dedicou toda a sua vida ao ativismo político, em prol da justiça social e da defesa do meio ambiente. Na juventude, participou ativamente do movimento estudantil paranaense contra a ditadura militar.
Indiciada por atividades subversivas, juntamente com outras lideranças estudantis, em Inquérito Policial Militar instaurado pela 5a. Região Militar do Exército, no início de 1969, refugiou-se no Rio de Janeiro.
Com a ajuda de rede de apoio a perseguidos pela ditadura, liderada por Branca Moreira Alves (mãe do deputado Márcio Moreira Alves, autor do célebre discurso que pregava o boicote ao desfile de 7 de setembro de 1968 e que detonou o Ato Institucional número 5), Lídia fugiu para o Uruguai, e em seguida obteve asilo político no Chile.
Antes do golpe militar que derrubou o presidente chileno Salvador Allende, foi obrigada a fugir, juntamente com outros companheiros, para a Bolívia.
Com o golpe militar na Bolívia, exilou-se no Peru, onde estudou Antropologia (Universidade de Lima). Naquele país, alistou-se como voluntária para ajudar as vítimas do terremoto de Áncash, em 1970, um dos desastres naturais mais devastadores do Peru, que matou cerca de 100 mil pessoas e deixou mais de 3 milhões de feridos.
Foi somente com a anistia no Brasil que Lídia pôde deixar o Peru, mas ao chegar à cidade de Araucária para encontrar seus familiares, viu-se diante de uma situação trágica: os níveis de aplicação de agrotóxicos e da poluição das fábricas recém-instaladas na região eram tão altos e descontrolados que muitas crianças nasciam com anencefalia e hidrocefalia. O grau da contaminação química em Araucária, já naquela época, era pior do que Cubatão, cidade que ficou mundialmente conhecida pela gravidade da poluição causada pelas fábricas.
Lídia juntou-se ao grupo de ambientalistas de Araucária que, em 1983, liderado pelo engenheiro agrônomo Reinaldo Onofre Skalisz, havia fundado a AMAR – Associação de Defesa do Meio Ambiente de Araucária, e a partir dali tornou-se uma das ambientalistas mais respeitáveis do Brasil. Também participou da fundação do Fórum Verde, em 1990, da FEPAM – Federação Paranaense das Entidades Ambientalistas, em 1992, e mais recentemente do Fórum do Movimento Ambientalista do Paraná, em 2010.
Atuou também defendendo os interesses da sociedade civil em importantes colegiados, câmaras técnicas e conselhos municipais e estaduais de meio ambiente. Lídia presidia a AMAR quando esta foi eleita pelas ONGs da Região Sul do Brasil para o CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente, para o período de 2011-2012.
Sua dedicação à causa ambiental nunca teve relação com qualquer modismo ecológico. Assim como a AMAR, Lídia sempre se pautou pela questão da sobrevivência humana e pelo respeito aos direitos da Natureza, e foi sempre com esse espírito que seus novos companheiros da AMAR a elegeram presidente daquela instituição que, por si só, é um marco na história paranaense. Combatente ambiental obsessiva, foi sucessivamente reeleita por quase 20 anos.
No comando da Amar, e sempre atuando de forma voluntária, praticamente sem nenhum apoio governamental ou da própria sociedade paranaense, Lídia estendeu a atuação da entidade não só no estado do Paraná, mas ao norte de Santa Catarina e sul de São Paulo, sempre atendendo aos pedidos da população carente atingida pelas terríveis consequências dos danos ambientais denunciados.
A dedicação incansável da presidente Lídia Lucaski fez da AMAR, com quase 36 anos de existência, uma de mais importantes ONGs ativistas do estado do Paraná e da região Sul do Brasil.
A AMAR foi autora de cerca de uma centena de ações civis públicas contra crimes ambientais, impetradas isolada ou conjuntamente com entidades congêneres ou com o Ministério Público, e de mais de três mil denúncias de crimes ambientais encaminhadas ao Ministério Público e a outros órgãos governamentais, sempre fundamentadas tecnicamente após vistoria no local do dano.
Além disso, Lídia Lucaski, juntamente com outros ambientalistas paranaenses como Juliano Bueno de Araújo, Pedro Guimarães, Osvaldo Cardoso, Henrique Schimidlin, Paulo Pizzi, Cloves Borges e Teresa Urban participaram da fundação da UNEAP – União de Entidades Ambientalistas do Paraná.
Por sua coragem e atuação política coerente e obstinada, e por seu trabalho apaixonado e incansável em defesa da justiça ambiental, Lídia Lucaski é, seguramente, uma das mais importantes ambientalistas brasileiras, uma pessoa que incontestavelmente desperta o orgulho das comunidades a quem ela sempre atendeu nas horas mais difíceis, que traz inspiração a todos os ambientalistas deste estado e para com quem a sociedade paranaense tem uma grande dívida de gratidão.
*Juliano Bueno de Araújo é diretor-presidente do Instituto Internacional Arayara, secretário do Fórum do Movimento Ambientalista do Paraná, e conselheiro do CMMA – Conselho municipal de Meio Ambiente de Curitiba e do CEMA – Conselho Estadual do Meio Ambiente do Paraná.
por Nicole Oliveira | 08, jan, 2020 | Brasil, Notícias |
O Ministério Público Federal (MPF) propôs uma ação apontando a inconstitucionalidade do Decreto 9.806/2019, que alterou a composição e o funcionamento do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). Entre as mudanças, a norma publicada em maio reduziu o número de vagas destinadas à sociedade civil, enquanto, proporcionalmente, ampliou a presença do governo federal no colegiado. As ONGs ambientalistas tiveram seus mandatos cindidos à metade, e passaram a ser escolhidas por meio de sorteio.
A Arguição de Descumprimento por Preceito Fundamental (ADPF) 623 deriva de uma representação feita à Procuradoria-Geral da República (PGR) pelos procuradores regionais da 3ª Região, José Leonidas Bellem de Lima e Fátima Borghi, em conjunto com entidades ambientalistas. Ajuizada em setembro último no Supremo Tribunal Federal (STF), encontra-se sob a relatoria da ministra Rosa Weber. O MPF indica diversos pontos da nova regulamentação que ferem preceitos constitucionais, sobretudo no que diz respeito aos princípios da participação popular direta da sociedade, da igualdade e da vedação do retrocesso socioambiental. Além disso, a norma poderá deixar desprotegidos os direitos fundamentais ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, à saúde e à vida.
O decreto, assinado conjuntamente pelo presidente da República e pelo ministro do Meio Ambiente, cortou de 11 para quatro o número de assentos reservados às organizações ambientalistas. Por outro lado, foi ampliada a presença do bloco governamental, que, agora com 17 assentos, passa a deter 74% dos votos no conselho. Além disso, foi excluída a representação de órgãos federais mais afetos à temática do meio ambiente e de outros direitos fundamentais conexos, de que são exemplos a Agência Nacional de Águas (ANA), o Instituto Chico Mendes da Biodiversidade (ICMBio) e o Ministério da Saúde não têm mais vaga no conselho. Ao mesmo tempo, deu-se assento cativo no Conama ao Ministério de Minas e Energia e ao Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (Mapa), pastas naturalmente estranhas aos propósitos de proteção e preservação ambientais. Apesar de sucessivas alterações ao longo de sua história, em nenhuma reforma anterior “o Conama sofreu retrocessos tão acentuados em termos de pluralidade e amplitude da participação popular e do controle social”, afirmam os procuradores regionais autores da representação à PGR.
Mandato e escolha por sorteio – A nova regulamentação também determina que a escolha das entidades ambientalistas para compor o Conama, antes feita democraticamente por meio de eleição, seja realizada por sorteio. O MPF argumenta que essa alteração atenta contra o direito de participação direta da sociedade na formulação das políticas públicas ambientais, retirando das ONGs seu poder de auto-organização e impedindo que elas escolham por critérios objetivos os representantes mais aptos para atuar no conselho. Com a mudança, os procuradores alertam que são grandes as chances de que entidades sem condições estruturais para representar o bloco sejam as selecionadas. Eles também observam que ao substituir o sufrágio pela pura aleatoriedade como técnica de seleção, o decreto não violou apenas o direito de autonomia de um segmento, mas acabou por condenar a população ao risco de ver totalmente neutralizada a sua capacidade de participação no Conama.
Outra alteração foi a duração do mandato das ONGs, que passou de dois para apenas um ano, sem direito a recondução. Os procuradores que assinaram a representação, com experiência de atuação naquele colegiado como representantes do Ministério Público Federal junto ao Conama desde 2012, afirmam que o prazo reduzido dificulta o desenvolvimento de um trabalho consistente no Conselho. “Um frenético giro na troca das cadeiras não propiciará em nada o aprimoramento dos trabalhos no Conama; ao contrário, impedirá um mais adequado aprofundamento no conhecimento da matéria”, sustentam. Para o MPF, a reforma do Conama ocorre em um contexto de eliminação na máxima extensão possível das instâncias de participação da sociedade civil na formação de ações do Poder Público e de um desmonte de todo o aparato organizacional do Estado brasileiro para proteção e preservação ambiental. O Conama representa uma interseção de ambas tendências.
Falta de paridade – Os procuradores regionais afirmam sempre ter havido um desequilíbrio de forças no Conama. De um lado, segundo eles, sempre se conferiu uma grande maioria de assentos a órgãos e entidades que ali estão para defender interesses próprios, que apesar de terem naturezas variadas (governamental, econômica e corporativa), tendem a se unir e a se antagonizar aos propósitos de proteção do meio ambiente e de outros bens relacionados. Do outro lado, portanto, restaria uma ínfima minoria de vagas às ONGs ambientalistas, representantes da sociedade civil tidos como os mais legitimados para a defesa exclusiva dos direitos fundamentais ali em jogo, o que as torna incapazes de fazer prevalecer sua posição, limitando até mesmo seu poder de influenciar nos procedimentos e no resultado das decisões colegiadas.
Nesse sentido, sustentam que, por estar o Conama “vinculado constitucional e legalmente ao cumprimento de sua finalidade de proteção ambiental”, deveria, portanto, ser conferida a maioria de assentos justamente a essas ONGs ambientalistas. A disparidade na composição do Conama reflete inclusive na qualidade protetiva das normas que edita. Exemplo disso é a Resolução 491, publicada pelo colegiado em novembro de 2018, e que estabeleceu novos padrões nacionais de qualidade do ar sem prazos de progressão e com valores iniciais muito mais permissivos que aqueles recomendados pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Essa norma também está sendo questionada no Supremo, por meio de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 6.148), proposta pela Procuradoria-Geral da República, e baseada em representação dos mesmos procuradores regionais, em conjunto com entidades ambientalistas. Naquela ocasião, já haviam apontado para o déficit democrático existente no Conama, com composição ainda anterior à da reforma.
Os autores da representação sustentam, por fim, que a não correção dessas disparidades (existentes também em colegiados participativos estaduais e locais) continuará dando ensejo a desastres ambientais e humanos como os de Mariana e Brumadinho, em Minas Gerais. Afirmam que a supressão da sociedade civil e a prevalência de interesses estranhos, e até mesmo avessos, à proteção ambiental tende a resultar na desconsideração de preceitos básicos do direito ambiental, como os princípios da prevenção e da precaução, que devem reger toda e qualquer decisão nessa área.
Íntegra da ADPF 623 (inicial)
Íntegra da representação
Fonte: Assessoria de Comunicação Social da Procuradoria Regional da República da 3ª Região