Câmara ressuscitou “jabutis” da privatização da Eletrobras e assegurou a contratação, até 2050, de termelétricas movidas a gás e carvão. Governo estuda veto
O urgente projeto de tornar o setor elétrico brasileiro mais verde sofreu um importante revés no Congresso Nacional. O Projeto de Lei n. 576/2021, que traz uma esperada regulamentação da outorga de autorizações para aproveitamento de potencial energético offshore (em alto mar), foi aprovado com um grande “jabuti” – o incentivo às termelétricas à carvão e gás até 2050.
O Marco Regulatório das Eólicas em Alto-Mar, de autoria do senador Jean-Paul Prates (PT/RN), delimita regras para o aproveitamento das águas marinhas brasileiras para a instalação de usinas de captação da energia dos ventos na costa. O texto veda, por exemplo, a instalação das plantas em rotas de navegação, áreas protegidas pela legislação ambiental e áreas tombadas como paisagem cultural e natural, além de restringir o conflito de interesses econômicos em regiões já utilizadas pela indústria offshore de petróleo e gás.
No entanto, a redação final aprovada pelo Senado na última quinta-feira (12), e que segue para sanção presidencial, é um substitutivo na Câmara dos Deputados que reedita os jabutis da privatização da Eletrobras pela Lei 14.182/2021 e insere obrigatoriedades em relação à produção de energia termelétrica de fontes sujas, como gás e carvão.
O texto assegura a contratação de reserva de capacidade de termelétricas com efetividade até 31 de dezembro de 2050, além da contratação de energia oriunda de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), de hidrogênio líquido gerado a partir de etanol e da produção de parques eólicos. A matéria passou pela Comissão de Serviços de Infraestrutura (CI) no início do mês, onde recebeu relatoria favorável do senador Weverton Rocha (PDT-MA), e foi a votação em plenário a toque de caixa.
De acordo com o gerente de projetos do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA), Ricardo Lacerda Baitello, esta versão do “jabuti” é ainda mais preocupante, porque, embora reduza a obrigatoriedade de contratação de 8 GW para 4,25 GW, aumenta as chances de sucesso nos leilões futuros ao ajustar o preço teto, tornando o investimento mais atraente para empresas – um dos motivos que fizeram leilões anteriores serem fracassados foi o fato de o texto da Lei de Privatização da Eletrobras prever a instalação das usinas em regiões do país sem infraestrutura de gasodutos, uma estratégia para fomentar o desenvolvimento, mas que encarece os custos dos empreendimentos. “Outro fator é a extensão da vida útil das térmicas a carvão, que já estava em 2040 e vai para 2050″, acrescenta Baitello.
De acordo com estimativa feita pela Frente Nacional dos Consumidores de Energia, a mudança proposta pela matéria pode representar um aumento de 9% no custo da energia e uma despesa anual de R$21 bilhões em subsídios até 2050. Além disso, o Instituto Arayara, que classificou o substitutivo como “o maior retrocesso para a transição energética justa e sustentável no Brasil”, destaca que as emendas pró-gás natural e carvão mineral adicionadas ao projeto têm o potencial de gerar 274,4 milhões de toneladas de CO2 equivalente ao longo dos próximos 25 anos – um volume comparável às emissões anuais combinadas do setor de transportes e da produção de combustíveis fósseis no Brasil. “Esse retrocesso ambiental ameaça neutralizar os avanços obtidos com a redução do desmatamento da Amazônia entre 2022 e 2023, comprometendo os esforços do país no combate às mudanças climáticas”, afirma a nota do Arayara.
Na votação, o texto substitutivo teve 40 votos favoráveis e 28 contrários. De acordo com a Coalizão Energia Limpa, em análise prévia à aprovação do texto em plenário, os senadores governistas Otto Alencar (PSD/BA) e Jaques Wagner (PT/BA) haviam sinalizado que a decisão ainda pode ser revertida por veto presidencial, mas que o caminho é bastante incerto. Baitello também avalia que é difícil prever, neste momento, se o governo vai vetar os jabutis e aprovar o marco regulatório em sua versão original.
O Instituto Arayara destaca ainda que esta não é a primeira tentativa da indústria do carvão de fazer lobby em prol da energia suja dentro de projetos que deveriam tratar da transição para uma matriz mais sustentável, e que a aprovação do substitutivo com os jabutis entra em contradição com outro projeto votado na mesma semana: o PL 327/2021, que institui o Programa de Aceleração da Transição Energética (PATEN), cujo objetivo é justamente incentivar a substituição de matrizes poluentes por fontes renováveis.
O panorama da energia eólica offshore
Atualmente o Ibama tem mais de 100 pedidos de licenciamento ambiental protocolados, em um dos filões econômicos mais visados pela indústria de olho no potencial eólico do país. A produção de hidrogênio verde – tipo de combustível catalisado pela energia renovável dos ventos – é o carro-chefe de boa parte dos empreendimentos e consta nos projetos de transição energética do governo brasileiro.
Vale lembrar, contudo, que a mera aprovação de um marco regulatório, embora muito aguardada pelos setores que acompanham a transição energética, não garante a sustentabilidade do setor. Devido à complexidade destes empreendimentos, os quais impactam diretamente um delicado ecossistema marinho, é necessário que os estudos técnicos e relatórios de impacto ambiental (EIA/RIMA), previstos no PL 576/2021, sejam levados a cabo pelas empresas e devidamente exigidos pelos órgãos ambientais competentes, como já mostrou esta reportagem de ((o))eco.
“A gente precisaria de um processo mais amplo. No IEMA a gente tem discutido a possibilidade de revisão deste processo no qual muita pressão é colocada sobre o licenciamento, sobre um órgão ambiental [o Ibama] para fazer a discussão com a sociedade e os [setores e pessoas] impactados. A gente defende uma revisão para um processo mais estrutural em que se possa discutir os projetos antes de eles serem leiloados ou arrematados”, explica Ricardo Baitello.
O PL 576/21, que deveria regulamentar as Eólicas Offshore, representa o maior retrocesso para a transição energética justa e sustentável no Brasil, pois dentre os benefícios concedidos ao setor dos combustíveis fósseis, garante subsídios até 2050 para as usinas termelétricas a carvão mineral da Região Sul — as maiores emissoras de gases de efeito estufa na geração de energia elétrica no país.
Por meio desta nota, o Instituto Internacional ARAYARA repudia a aprovação do Projeto de Lei (PL) 576/2021 pelo Senado Federal em 12 de dezembro de 2024. Inicialmente concebido para regulamentar a energia eólica offshore no Brasil, o texto foi alterado para incluir uma série de emendas “jabutis” que incentivam a geração de energia a partir de fontes altamente poluentes, como carvão mineral e gás natural, enquanto impõem custos bilionários aos consumidores de energia elétrica.
O PL 576/21, que agora aguarda sanção presidencial, é acompanhado pela expectativa de que os “jabutis” relacionados aos subsídios para combustíveis fósseis até 2050 sejam vetados. É importante destacar que os artigos relacionados à geração offshore foram aprovados em votação simbólica, enquanto as emendas desconexas ao tema principal, como as previstas no Artigo 21, foram submetidas a uma votação separada, recebendo 40 votos favoráveis e 28 contrários no plenário do Senado.
Reiteramos que o Projeto de Lei 576/21, originalmente concebido para impulsionar fontes renováveis, foi distorcido por “jabutis” inseridos pelo lobby dos combustíveis fósseis. As emendas pró-gás natural e carvão mineral adicionadas ao projeto têm o potencial de gerar 274,4 milhões de toneladas de CO2 equivalente ao longo dos próximos 25 anos — um volume comparável às emissões anuais combinadas do setor de transportes e da produção de combustíveis fósseis no Brasil. Esse retrocesso ambiental ameaça neutralizar os avanços obtidos com a redução do desmatamento da Amazônia entre 2022 e 2023, comprometendo os esforços do país no combate às mudanças climáticas.
“O Brasil assumiu o compromisso de liderar a transição energética global, mas a aprovação deste projeto, da forma como foi elaborado, vai na contramão desse objetivo. Ele enfraquece o desenvolvimento de fontes renováveis, polui a matriz energética do país, subsidia equivocadamente o setor fóssil e compromete metas climáticas”, declara o diretor técnico do Instituto Internacional ARAYARA e doutor em Riscos e Emergências Ambientais , Juliano Bueno de Araújo.
O PL também mantém a previsão de contratação de usinas termelétricas a gás natural em leilões, conforme estabelecido por legislação anterior, mas redefine parâmetros como preços, volumes e as localidades específicas onde essas usinas deverão ser instaladas.
Além disso, foram inseridas obrigações de contratação de energia proveniente de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), de hidrogênio líquido produzido a partir do etanol no Nordeste, e de energia gerada por parques eólicos localizados na região Sul do país.
Impactos devastadores para o clima e para os consumidores
Araújo destaca que a aprovação do Projeto de Lei (PL) 576/21 pelo Senado Federal autoriza a extensão de custos elevados de geração de energia elétrica para os consumidores até 2050.
De acordo com Araújo, um estudo da Frente Nacional de Consumidores, da qual a ARAYARA é membro, aponta que os custos relacionados à geração térmica a carvão podem ultrapassar R$90 bilhões até 2050, representando um ônus significativo para as tarifas finais de energia.
Quem ganha com o Lobby do carvão?
John Wurdig, gerente de transição energética e clima da ARAYARA, denuncia que esta é a terceira tentativa do lobby do carvão mineral no Sul do Brasil de inserir “jabutis” em Projetos de Lei. “Um exemplo emblemático foi a Lei nº 14.299, de 2022, que deveria implementar o Programa de Transição Energética Justa (TEJ) em Santa Catarina, mas acabou priorizando subsídios financeiros ao Complexo Termelétrico Jorge Lacerda, que consome mais de R$ 1 bilhão por ano em recursos públicos”, destaca.
Segundo Wurdig, a Lei do Programa de Transição Energética Justa teve origem no PL 712/2019, inicialmente direcionado a subvenções para pequenas concessionárias de energia. Contudo, a proposta foi desviada de seu propósito original devido à pressão do lobby da indústria de carvão catarinense. Com a previsão de expiração dos subsídios da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) em 2028, o projeto foi aprovado de forma acelerada em 2021, incorporando dispositivos que beneficiam empreendimentos baseados em combustíveis fósseis”, detalha Wurdig.
Agora, o mesmo cenário se repete com o PL 576/2021, que deveria regulamentar exclusivamente as eólicas offshore, mas foi alterado na Câmara dos Deputados para incluir uma “Criação de Jabutis” destinada a beneficiar empreendimentos fósseis. O Projeto de Lei aprovado hoje em 12.12.2024 prevê subsídios que podem ultrapassar R$440 bilhões até 2050, com destaque para a termelétrica Candiota III, no Rio Grande do Sul (RS).
Candiota III, maior emissora de gases de efeito estufa do RS, será diretamente beneficiada, junto com a Companhia Riograndense de Mineração (CRM), estatal gaúcha que fornece carvão para a usina. Wurdig ressalta que essas iniciativas vão na contramão dos compromissos climáticos assumidos pelo Brasil.
Conflitos de pautas aprovadas pelo Senado Federal
A ARAYARA destaca o grave conflito de interesse evidenciado pela aprovação do PL 576/21 pelo Senado Federal em 12 de dezembro. Este projeto, que deveria focar exclusivamente na regulamentação da energia eólica offshore, foi alterado para incluir “jabutis” que destinam subsídios bilionários a usinas termelétricas fósseis para geração de energia elétrica. A decisão entra em contradição com outro projeto aprovado pelos senadores nesta mesma semana (10 de dezembro), o PL 327/2021, que institui o Programa de Aceleração da Transição Energética (PATEN), voltado a incentivar a substituição de matrizes poluentes por fontes renováveis (PL 327/2021).
De acordo com o texto do PL 327/21, as empresas que aderirem ao programa poderão acessar recursos do Fundo Nacional sobre Mudança do Clima (FNMC) e negociar dívidas com a União por meio de uma transação condicionada ao investimento em projetos de desenvolvimento sustentável. Essa transação envolve a negociação entre a União e credores que possuem dívidas de difícil recuperação. Em nota, a Agência do Senado informou que são elegíveis para o PATEN propostas de obras de infraestrutura, expansão ou implantação de parques de produção de energia com matriz sustentável, além de projetos de pesquisa e desenvolvimento tecnológico que ofereçam benefícios socioambientais ou contribuam para a mitigação dos impactos ambientais.
Há um claro conflito de interesses na agenda de transição energética no Senado Federal. “Conceder subsídios a termelétricas a carvão mineral e gás sem reduzir as emissões de gases de efeito estufa e sem implementar um plano de descarbonização contraria as metas do Acordo de Paris”, pontua Wurdig. Ele ressalta que, além disso, é essencial a criação de um plano de Transição Energética Justa e Sustentável, que preveja o encerramento gradual dessas usinas fósseis, com a reintegração dos trabalhadores, utilizando os recursos públicos de forma mais eficaz, em vez de destiná-los à compra e queima de carvão mineral na Região Sul do Brasil.
Litigância Climática
O diretor-presidente da ARAYARA reforça o apelo para que o Presidente da República do Brasil vete o Artigo 21 do PL 576/2021 em sua forma atual. Durante a votação, o senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), líder do governo no Congresso Nacional, afirmou que o governo pretende vetar o artigo, que inclui os “jabutis”. No entanto, a ARAYARA alerta que, mesmo com o veto, o Congresso poderá derrubá-lo nos próximos meses de 2025.
Araújo destaca que a ARAYARA tomará todas as medidas legais cabíveis para contestar a futura legislação. “Caso seja sancionada sem o veto aos subsídios para combustíveis fósseis na geração de energia, o Brasil estará cometendo um crime de greenwashing, especialmente no ano da 30ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP30), que ocorrerá em Belém, no Pará”, alerta.
O Instituto Internacional Arayara prestigiou a primeira edição do Festival Favela Sustentável: Favela no Centro das Soluções, que reuniu mais de 1.300 moradores de 90 favelas do Grande Rio, além de atrair o público de toda a cidade.
O evento, promovido pela Rede Favela Sustentável, ocorreu na Fundição Progresso, em frente aos icônicos Arcos da Lapa, e contou com mais de 100 atividades, incluindo intervenções artísticas, oficinas, rodas de conversa, exibições de filmes, exposições, estandes e terapias.
Criada em 2017, a Rede Favela Sustentável (RFS) é formada por 700 integrantes, entre mobilizadores comunitários de mais de 300 favelas e aliados técnicos. A rede tem como objetivo promover a justiça climática, transformando as favelas em modelos de comunidades sustentáveis.
Com uma forte presença cultural, o festival destacou danças e cantos de matriz afro, capoeira, além de uma feira de artesanato focada em organizações de mulheres das favelas. A gastronomia afro-brasileira também foi destaque, fortalecendo o aspecto diverso e inclusivo do evento.
Entre as atividades, oficinas e debates sobre audiovisual abordaram temas como favelas e negritude, promovendo sessões de cinema seguidas por discussões sobre documentários. “O evento foi muito bem organizado, proporcionando um espaço de trocas culturais e institucionais extremamente positivo”, comentou Luíza Machado, Coordenadora do Departamento de Florestas, Comunidades, Clima e Restauro Ecológico do Instituto Internacional Arayara.
Também foram realizadas oficinas apresentando instrumentos de pesquisa. Luíza participou de uma delas sobre o Kobo Toolbox, um aplicativo que permite a criação de questionários sem a necessidade de conexão à internet. “Essa ferramenta é extremamente útil em regiões com instabilidade de rede, potencializando as pesquisas comunitárias e trazendo autonomia às comunidades”, completou.
Justiça climática e comunidades sustentáveis
Em maio deste ano, integrantes da Rede Favela Sustentável levaram o tema “Justiça Energética” ao Congresso Nacional, em Brasília, durante a Semana Mundial da Energia. O objetivo foi promover o diálogo sobre a transição energética com justiça socioambiental no Brasil, além de abordar o enfrentamento do racismo ambiental. O Instituto Internacional Arayara, apoiador da iniciativa, esteve ativamente envolvido na mobilização, debates e no engajamento nacional em defesa de uma energia limpa e justa.
Em 2023, a RFS divulgou o estudo “Eficiência Energética nas Favelas”, fruto de uma pesquisa realizada ao longo do ano, com entrevistas a 1.156 famílias de 15 comunidades. O estudo foi desenvolvido no âmbito do curso ‘Pesquisando e Monitorando a Justiça Energética e Hídrica nas Favelas’, promovido pela RFS em parceria com o Painel Unificador de Favelas (PUF).
A pesquisa revelou que 55% das famílias entrevistadas vivem abaixo da linha da pobreza, enquanto 31% são consideradas em situação de pobreza energética, gastando uma parcela significativa de seu orçamento com a conta de luz. Outro dado alarmante é que 68,7% dos entrevistados desconhecem a Tarifa Social, embora 59,55% cumpram os critérios de renda para acessar o benefício.
A falta de transparência nas emissões de gases de efeito estufa do setor militar é questionada durante encontro.O setor é responsável por 5,5% das emissões globais.
Na última quinta-feira (17), em Brasília, o embaixador André Corrêa do Lago, secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores, e Ana Toni, secretária nacional de Mudança do Clima, participaram de um briefing sobre a participação do Brasil na COP29, com foco nos principais temas discutidos na Pré-COP de Baku. O evento reuniu diplomatas, representantes do Ministério do Meio Ambiente e contou com a participação ativa da sociedade civil.
A mesa foi composta por diplomatas brasileiros e representantes do Ministério do Meio Ambiente, que apresentaram suas expectativas para a COP29. Após as exposições, houve ampla oportunidade para que a sociedade civil fizesse perguntas e participasse ativamente do debate.
Durante o encontro, Renata Prata, assistente da diretoria executiva do Instituto Internacional Arayara, questionou a falta de transparência nas emissões de gases de efeito estufa do setor militar. A ausência desses dados, segundo ela, distorce os cálculos nacionais e globais de emissões, comprometendo as negociações e compromissos climáticos nas COPs. “O tema é de suma importância, tendo em vista as diversas guerras e violações de direitos humanos que estão em curso e, especificamente no que concerne ao Brasil, devido a sua tradição da política externa de se posicionar como um mediador”, ressaltou.
De acordo com um estudo do Observatório de Conflitos e Meio Ambiente (CEOBS), ONG britânica focada nas consequências ambientais e humanitárias de conflitos e atividades militares, as forças armadas e suas cadeias de suprimento são responsáveis por 5,5% das emissões globais de gases de efeito estufa. Devido à falta de transparência nos dados militares, essas emissões muitas vezes passam despercebidas. O relatório destaca ainda que, se o setor militar global fosse considerado um país, teria a quarta maior pegada de carbono do mundo, superando até as emissões totais da Rússia.
Confira a transmissão do evento:
Acordo de Paris
O Acordo de Paris determina que os países desenvolvidos deverão investir 100 bilhões de dólares por ano em medidas de combate à mudança do clima e adaptação em países em desenvolvimento. O acordo foi fechado durante a COP21, em 2015, e aprovado pelos 195 países que participaram do evento.
“No caso da COP de Baku, a grande atenção mundial está voltada para a questão do financiamento no contexto do Acordo de Paris, que é a nova etapa daqueles US$ 100 bilhões por ano, que era um compromisso dos países desenvolvidos e que, do nosso ponto de vista e da maioria dos analistas, não foi cumprido ao longo desses cinco anos”, afirmou o embaixador André Corrêa do Lago.
A secretária Nacional de Mudança do Clima, destacou cinco temas cruciais ainda pendentes de consenso: transparência, valor do fundo, contribuições, duração e destino dos recursos. “Essas questões são essenciais para as negociações das COPs futuras”, pontuou Ana Toni.
Ao abordar o tema da Adaptação, Ana Toni destacou a sua importância para o Brasil e antecipou que as discussões e os acordos alcançados no Azerbaijão deverão orientar as decisões que serão tomadas na COP30, que acontecerá no próximo ano em Belém (PA).
O Plano Nacional de Adaptação do Brasil, parte do Plano Clima, busca soluções para reduzir emissões de forma eficiente e econômica, focando em áreas como agropecuária de baixo carbono, eficiência energética, hidrogênio verde, combustíveis de baixa emissão, e gestão de resíduos sólidos. Ana Toni destacou a importância desse tema para o Brasil e espera avanços nas discussões na COP de Baku, mencionando que apenas 47 dos mais de 194 países membros da Convenção da ONU sobre Mudanças Climáticas possuem planos nacionais de adaptação.
NDC – Nationally Determined Contribution
O NDC ou, Contribuição Nacionalmente Determinada, refere-se a um plano de ação climática que cada país deve apresentar para reduzir as emissões de gases de efeito estufa.
O governo brasileiro se comprometeu em sua última NDC a reduzir as emissões de gases de efeito estufa em 48% até 2025 e em 53% até 2030, em relação às emissões de 2005. Desta forma, o Brasil se compromete com metas graduais mais robustas de redução de emissões com vistas a alcançar a emissão líquida zero em 2050.
Juliano Bueno de Araújo, diretor presidente da ARAYARA destaca que a “nova velha NDC” representa basicamente uma retomada da versão original, sendo um avanço apenas em relação ao desmonte socioambiental promovido pelo Executivo no episódio conhecido como “passar a boiada”. “A gestão anterior havia reduzido a ambição da NDC brasileira, desrespeitando a obrigatoriedade de progressividade estabelecida no Artigo 3º do Acordo de Paris, portanto, retomar em termos absolutos a NDC de 2015 é um tímido avanço“, completou.
O embaixador afirmou que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o secretário-geral da ONU, António Guterres, trabalharão juntos para que as NDC’s sejam fortalecidas no cenário internacional.
Outro tema destacado para Baku foi o mercado de carbono. “Enquanto no Congresso ainda discutimos a implementação do mercado de carbono nacional, que aguarda votação, o cenário internacional avança de forma mais rápida”, afirmou a secretária nacional de Mudança do Clima, Ana Toni. Segundo ela, o mercado de carbono é um tema de grande relevância para o Brasil, com a possibilidade de se chegar a um acordo até o final da COP29.
Por outro lado, o Instituto Internacional Arayara expressa preocupação com o avanço das soluções de mercado para enfrentar a crise climática. “Frequentemente, essas iniciativas ameaçam os direitos territoriais de povos e comunidades tradicionais e mostram-se pouco eficazes na redução real das emissões de gases de efeito estufa, constituindo o que chamamos de falsas soluções”, alertou Bueno.
Além dos possíveis impactos ao meio ambiente, comunidades do município paranaense e região correm sérios riscos com as altas concentrações radioativas emitidas pela usina termelétrica de Figueira, que ultrapassam as médias mundiais
O Instituto Internacional Arayara acaba de protocolar uma ação civil pública contra a Usina Termelétrica (UTE) Figueira, uma das mais antigas do Brasil, localizada em Figueira, Paraná. A ação denuncia irregularidades no licenciamento ambiental da usina e possíveis impactos à saúde pública e ao meio ambiente após mais de seis décadas de operação. O processo nº: 5015788-26.2024.4.04.7001 será julgado pelo Juízo Federal da 3ª VF de Londrina.
A ACP contra a UTE Figueira foi protocolada na manhã desta terça-feira (20), enquanto acontecia a audiência pública no Senado para debater o projeto de lei sobre o aproveitamento de potencial energético offshore (PL 576/2021). Durante a sessão, o presidente da Frente Nacional dos Consumidores de Energia, Luiz Barata, apresentou estudos de diagnóstico do Instituto Arayara sobre os impactos do carvão mineral no Brasil.
Dados da PSR Energy Consulting indicam que a aprovação de emendas ao projeto pode aumentar a conta de energia dos brasileiros em 11%, representando um custo de R$ 658 bilhões até 2050, impactando o poder de compra e a competitividade industrial. O estudo foi encomendado pelo Movimento Transição Energética Justa, coalizão que reúne diversas entidades do setor energético e ambiental.
Barata defendeu a aprovação do PL das Eólicas Offshore em seu formato original, com todas as emendas rejeitadas pelo Senado, ressaltando a importância de um marco regulatório para evitar a expansão desordenada da atividade.
ACP contra aUTE de Figueira
A UTE Figueira operou de 2002 a 2019 com uma licença com validade prevista para o ano de 2001, evidenciando possíveis falhas do Instituto Água e Terra (IAT), que não emitiu um parecer final sobre a renovação durante quase duas décadas. Em 2019, a usina recebeu uma nova licença de operação durante um período de “modernização”, que na prática, envolveu a construção de uma nova usina. Esta nova instalação foi realizada a partir de autorizações ambientais, ao invés de passar por todas as etapas exigidas de licenciamento (LP, LI e LO) e realização de EIA/RIMA, como deveria ocorrer legalmente, o que levanta questões sobre a regularidade do processo.
Apesar da outorga da UTE ter vencido em 2019, a ANEEL autorizou sua operação por meio de despachos, enquanto a COPEL, responsável pela usina, não cumpriu integralmente os requisitos para restabelecer a operação comercial, incluindo a obtenção de uma licença de operação válida. Em particular, a COPEL não atendeu a condicionante 7 da licença, que exigia a comunicação ao IAT sobre a finalização da obra. O não cumprimento das condicionantes, conforme estabelecido na condicionante 2, poderia resultar no cancelamento da licença e, consequentemente, na operação ilegal da usina.
Descumprimento da Lei de Acesso à Informação
O descumprimento da Lei de Acesso à Informação por parte do Instituto Água e Terra (IAT) é uma questão preocupante que compromete a transparência e a accountability da instituição. Essa legislação, fundamental para assegurar o direito dos cidadãos ao acesso a dados públicos, estabelece que órgãos governamentais devem disponibilizar informações de forma clara e acessível.
No entanto, o IAT tem falhado em atender a essas exigências, seja pela não disponibilização das informações solicitadas ou pela criação de obstáculos burocráticos que dificultam o acesso. Dr. Renato Santa Ritta, gerente de Compliance e Governança do Instituto Arayara, alerta que essa falta de conformidade com a norma legal pode resultar em sanções e comprometer a integridade e legitimidade das ações do IAT. Ele destaca a necessidade urgente de medidas corretivas para garantir o cumprimento pleno da lei.
Impactos Ambientais e à Saúde da população
De acordo com o Estudo Diagnóstico – Usina Termelétrica Figueira: Impactos da queima do Carvão Mineral em Figueira- PR , o carvão utilizado na UTE Figueira contém concentrações elevadas de metais pesados, como arsênio, cádmio e mercúrio, em níveis muito superiores aos encontrados no carvão de Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Esses elementos são conhecidos por seus efeitos tóxicos, podendo causar sérios danos à saúde humana e ao meio ambiente.
Para o gerente de Energia, Clima e Geociências do Instituto Arayara, a ação pública movida serve como restabelecimento do que já deveria ter sido corrigido há muito tempo. “É uma usina de pequeno porte e o seu fechamento não produz nenhum impacto no suprimento de energia do Sistema Interligado Nacional (SIN)”, explica Anton Schwyter.
A queima desse carvão resulta na liberação de elementos radioativos, como tório e urânio, em concentrações acima das médias mundiais. A disposição inadequada dos resíduos da mineração e das cinzas provenientes da combustão do carvão tem contaminado o solo e as águas superficiais e subterrâneas da região, colocando em risco, por exemplo, o rio Laranjinha, assim como a saúde de trabalhadores e moradores.
“A melhor opção é a interrupção do uso do carvão na UTE Figueira. A sua utilização prejudica o meio ambiente, desde a fase de mineração, até posterior a fase da queima, com produção de uma enorme quantidade de resíduos, além das cinzas, contribuindo para a contaminação do solo, corpos hídricos e também do ar”, ressalta Schwyter.
População em Risco
Segundo os dados do Relatório State of Global Air de 2020 (HEI, 2020), a poluição do ar foi identificada como o quarto principal fator de risco para mortalidade em todo o mundo, acarretando em aproximadamente 6,7 milhões de mortes no ano de 2019, sendo 20% destas, causadas por doenças respiratórias crônicas, como a pneumoconiose causada pela exposição fugitiva a poeiras minerais.
A população que vive em um raio de até 5 km da usina enfrenta um risco aumentado de doenças respiratórias e cardíacas, devido à alta exposição aos poluentes atmosféricos. Em estudos realizados, o município de Figueira apresentou níveis de chuva ácida superiores aos de grandes cidades como São Paulo, provavelmente em decorrência das emissões da UTE. Além disso, trabalhadores podem estar expostos a níveis perigosos de radônio, um gás radioativo gerado a partir da combustão do carvão de Figueira.
Pedido de compensação e transição econômica
A economia da população local está direta ou indiretamente ligada às atividades carboníferas. Isso significa que uma parte significativa da comunidade apoia a operação da UTE, embora o empreendimento represente riscos graves e duradouros à saúde e ao meio ambiente.
O Instituto Arayara, maior ONG de litigância técnica ambiental do Brasil, exige que a Companhia Paranaense de Energia (COPEL), responsável pela UTE Figueira, compense os danos causados à saúde da população e ao meio ambiente. A organização também defende a criação de um fundo para apoiar a transição econômica do município de forma justa e planejada, preparando a região para um futuro sem a dependência das atividades carboníferas.
“Os projetos de lei atuais preveem subsídios para o carvão mineral até 2040, podendo se estender até 2050. Portanto, se o planejamento de transição econômica não for implementado logo, ao final dos subsídios, o município ficará sem fontes de receita e com grandes passivos ambientais”, alerta Juliano Araújo Bueno, diretor técnico do Instituto Arayara.
Um dos advogados que assina a ação, pontua que a Arayara discorda também do acordo que foi feito para compensação das emissões acima dos limites. “O valor é muito pequeno diante do tempo de operação da usina, bem como das unidades de monitoramento do ar que serão instaladas em Curitiba, e não em Figueira, o que é um contrassenso”, declara Luiz Ormay.
De acordo com Ormay, se a Arayara ganhar integralmente a ação, os passivos ambientais deverão ser reparados ou indenizados, e o empreendimento só poderá funcionar novamente com licenciamento ambiental adequado.
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