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MME promove workshops sobre futuro do setor de óleo e gás, mas reforça dependência de combustíveis fósseis

MME promove workshops sobre futuro do setor de óleo e gás, mas reforça dependência de combustíveis fósseis

O Ministério de Minas e Energia (MME) está conduzindo uma série de workshops intitulada “Próximos Passos: Combustível do Futuro e Novas Políticas do Setor de Óleo e Gás”, entre 31 de outubro e 10 de dezembro, com o objetivo de debater estratégias para o setor no contexto da transição energética. Os eventos reúnem autoridades, especialistas e representantes da indústria de óleo e gás, com destaque para temas como biocombustíveis, gás natural e tecnologias de descarbonização.

Embora o governo ressalte o compromisso com a sustentabilidade e a redução de emissões, críticos apontam que a iniciativa reflete uma contradição: enquanto o mundo discute a necessidade urgente de reduzir a produção de combustíveis fósseis, o Brasil mantém sua aposta na expansão do setor.

Avanços limitados em sustentabilidade

O workshop realizado nesta terça-feira (26), intitulado “Potencializa E&P”, abordou questões como novas fronteiras exploratórias e a descarbonização do setor. Pietro Mendes, Secretário de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis, destacou a necessidade de continuar explorando petróleo, argumentando que o Brasil ainda não atingiu o pico de demanda por combustíveis fósseis e que as tecnologias nacionais têm uma menor pegada de carbono.

Mendes também defendeu a exploração da Margem Equatorial, área ambientalmente sensível e cuja exploração é amplamente criticada por ambientalistas devido aos riscos à biodiversidade e às comunidades tradicionais. “Não faz sentido importarmos gás não convencional e não realizarmos essa atividade aqui no Brasil”, afirmou Mendes, referindo-se ao acordo para importar gás argentino, proveniente do fracking, de Vaca Muerta.

Publicado em Reviews on Environmental Health, os pesquisadores do Center for Environmental Health (CEH), da Universidade do Missouri e do Institute for Health and the Environment fornecem evidências de que a exposição a produtos químicos associados ao fracking durante a infância e idade adulta pode resultar em sérios efeitos na saúde reprodutiva e no desenvolvimento em humanos.

A Margem Equatorial em debate


A Margem Equatorial foi tema central das discussões, com representantes da Petrobras destacando avanços no processo de licenciamento ambiental junto ao Ibama. Entretanto, especialistas alertam para a falta de dados robustos sobre a região, como apontou o Instituto Nacional de Pesquisas Oceânicas (INPO). “A exploração sem informações adequadas é um convite ao desastre ambiental”, alertou uma fonte ligada ao setor.

Apesar das ressalvas técnicas e ambientais, o MME tratou a exploração como uma questão de segurança energética nacional. Allan Kardec, da Amazônia Azul, chegou a evocar a soberania nacional como justificativa para avançar com os projetos na região.

Críticas à dependência de fósseis


Organizações ambientais e especialistas questionam o alinhamento do governo brasileiro com a indústria fóssil, mesmo em um momento em que cresce a pressão internacional por medidas mais firmes para mitigar as mudanças climáticas. Segundo Juliano Bueno de Araújo, diretor-presidente do Instituto Internacional Arayara, o Brasil está “indo na contramão das exigências globais de descarbonização ao expandir a fronteira de exploração de combustíveis fósseis”.

As promessas de redução de emissões feitas durante o evento também foram criticadas como insuficientes. A Agência Nacional de Petróleo (ANP) apresentou medidas como a eliminação de flaring (queima de gás em plataformas) e venting (liberação de gases na atmosfera) e o uso de tecnologias de captura e armazenamento de carbono (CCS). No entanto, especialistas apontam que tais iniciativas apenas mitigam os danos do setor, sem endereçar a questão central: a dependência do petróleo.

Transição energética ou atraso estratégico?

Os workshops destacam iniciativas promissoras, como o programa “Gás Para Todos” e discussões sobre biocombustíveis, mas críticos argumentam que essas ações são minoria em meio a um esforço concentrado para expandir a exploração de petróleo e gás.

“Ainda que o Brasil tenha um potencial imenso para liderar a transição energética global, eventos como esses mostram que o país continua preso a um modelo ultrapassado de desenvolvimento”, afirma Araújo.

Dois times, duas medidas

Dois times, duas medidas

Na semana passada, o Brasil apresentou sua nova meta climática, a famosa NDC, na Conferência do Clima que está ocorrendo em Baku, no Azerbaijão. A delegação está sendo liderada pelo vice-presidente Geraldo Alckmin, na ausência do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o que levanta questionamentos sobre o compromisso do governo com a agenda climática. Apesar de ter reduzido com sucesso o desmatamento na Amazônia, este é também o governo que defende a exploração de petróleo na Margem Equatorial. E a regra é clara: o atleta não pode jogar cada tempo do jogo por um dos times.

Aos fatos: a nova Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) do Brasil, divulgada na noite da última sexta-feira, dia 8 de novembro, em Brasília, prevê uma redução das emissões líquidas de gases de efeito estufa entre 59% e 67% até 2035, em comparação com os níveis de 2005. Esse compromisso foi anunciado discretamente, apenas por meio de uma nota no site oficial do Planalto, sem entrevistas ou explicações detalhadas. É como se o treinador de um time terminasse a partida sem passar pela coletiva de imprensa. A falta de transparência e de informações específicas têm gerado dúvidas na sociedade civil

“O Brasil segue ampliando projetos baseados em combustíveis fósseis, o que contraria os objetivos de redução”, diz Nicole Oliveira

Nesta semana, o Observatório do Clima circulou uma nota, na COP, apontando uma disparidade entre o discurso do governo e as ações necessárias para alcançar a meta de limitar o aquecimento global a 1,5°C, conforme previsto no Acordo de Paris. Para a organização, as metas brasileiras precisam de um alcance mais robusto para contribuir de maneira significativa no esforço climático global. (Verdade seja dita, as metas dos países desenvolvidos são igualmente fracas, como também apontou o OC).

A diretora executiva do Instituto Internacional Arayara, Nicole Figueiredo de Oliveira, classificou como decepcionante a nova NDC apresentada pelo Brasil, ressaltando que o plano nem sequer inclui a meta de desmatamento zero. “Nos preocupa também a expansão projetada pelo Ministério de Minas e Energia no PDE 2034 de 13 gigawatts de novas termelétricas. Além de estabelecer uma meta muito aquém da ambição necessária, o Brasil continua ampliando projetos baseados em combustíveis fósseis, o que contraria os objetivos de redução de emissões e transição para uma economia de baixo carbono”, ressaltou Oliveira.

Incertezas do Plano Clima e outras contradições

Plano Clima do governo federal, que será a principal estratégia para a implementação das metas até 2035, ainda está em desenvolvimento, com conclusão prevista para 2025. A falta de detalhes e de planejamento específico levanta preocupações sobre a capacidade de executar as metas com eficiência. O governo tem apostado em instrumentos financeiros como o Fundo Clima, do BNDES, e Títulos Soberanos Sustentáveis, do Tesouro Nacional, para financiar as metas, mas a dependência de recursos externos pode limitar a eficácia das ações.

Outra contradição notável é a concessão de licenças para a exploração de petróleo na Amazônia. O Instituto Internacional Arayara, juntamente com a Fundação Urgewald, se reuniram recentemente com os gestores e financiadores estrangeiros do Fundo Amazônia. Foi sugerido que as futuras contribuições de países como Noruega e Alemanha sejam feitas com a condição de haver uma mudança nas políticas ambientais do governo brasileiro, assumindo um compromisso de não expandir a fronteira de petróleo e gás neste bioma. Segundo estudos da Arayara, 101 projetos financiados pelo Fundo Amazônia estão em áreas de projetos de exploração de petróleo e gás, sendo 77 deles na Amazônia Legal, ameaçando diretamente a preservação e colocando em risco os avanços ambientais do fundo.

As metas anunciadas pelo Brasil na COP-29 representam um desafio crucial: a necessidade de alinhar discurso e prática com políticas concretas e inclusivas. “Para assumir uma posição de liderança ambiental global, o país precisará demonstrar mais do que compromissos ambiciosos; será necessário implementar medidas que realmente atendam à preservação e às demandas das comunidades tradicionais”, completou Nicole Oliveira. Se o governo quiser mesmo se comprometer com a proteção da Amazônia, ele precisa parar de pressionar o Ibama para liberar novas licenças de exploração petrolífera na região. Não se vence uma partida jogando pelos dois times.

Fonte: Central da COP

Arayara na Mídia | Terra deve chegar ao fim do século 3,1ºC mais quente

Arayara na Mídia | Terra deve chegar ao fim do século 3,1ºC mais quente

O aumento de temperatura esperado para o fim do século será de 3,1°C caso as contribuições nacionais para reduzir emissões de CO2 não atinjam níveis mais ambiciosos

 

Por Paloma Oliveto para o Correio Braziliense 

A tragédia provocada pelas chuvas no Rio Grande do Sul é um dos efeitos das mudanças climáticas e seus impactos no cotidiano – (crédito: Marinha do Brasil )

 

O planeta se aproxima de chegar ao fim do século 3,1°C mais quente do que na era pré-industrial, alcançando temperaturas incompatíveis com a vida. O alerta é do relatório Lacuna das Emissões do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), lançado ontem em Cali, na Colômbia, durante a Conferência das Partes da Convenção sobre Biodiversidade (COP15). A pouco mais de um mês da COP29, do clima, sediada no Azerbaijão, o documento destaca que, tecnicamente, ainda é possível atingir a meta de  1,5°C. Mas, para isso, é preciso uma mobilização massiva, que leve ao corte de 42% das emissões globais até 2030 e 57% até 2035.

Com as políticas atuais de contenção dos gases de efeito estufa, o mundo alcançará um aumento considerado catastrófico na temperatura. Mesmo que os compromissos já assumidos nas COPs anteriores fossem cumpridos — e não estão —, o planeta chegaria a 2100 entre 2,6°C-2,8°C mais quente do que o século 19.

No próximo ano, na COP de Belém, no Brasil, haverá uma nova rodada das chamadas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) – compromissos que cada país signatário do Acordo de Paris apresenta na conferência, para ajudar a reduzir as emissões. A ONU adverte que essas metas terão de ser mais ambiciosas do que nunca. “O relatório de hoje (ontem) sobre a Lacuna de Emissões é claro: estamos brincando com fogo; não podemos mais ganhar tempo”, ressaltou o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, em uma mensagem em vídeo. “Estamos sem tempo. Fechar a lacuna de emissões significa fechar a lacuna de ambição, a lacuna de implementação e a lacuna financeira. Começando na COP29.”

As projeções científicas apresentadas no relatório, de um mundo 2,6 °C mais quente, baseiam-se no cenário de implementação total das NDCs e têm uma probabilidade de 66% de acontecerem. O problema é que nem essas promessas estão sendo cumpridas; nenhum país está no caminho de alcançar as contribuições apresentadas em 2022, a atualização mais recente. Se todas fossem batidas, ainda seria necessário acrescentar contribuições de zero líquido para limitar o aquecimento a 1,9 °C. O relatório, porém, ressalta que há pouca confiança, hoje, nas estratégias que têm como objetivo contrabalancear as emissões com a captura de carbono.

“A lacuna de emissões não é uma noção abstrata”, reforçou Guterres. “Há uma ligação direta entre o aumento das emissões e desastres climáticos cada vez mais frequentes e intensos. Em todo o mundo, as pessoas estão pagando um preço terrível. Emissões recordes significam temperaturas recordes do mar sobrecarregando furacões monstruosos; calor recorde está transformando florestas em caixas de pólvora e cidades em saunas; chuvas recordes estão resultando em inundações bíblicas.”

Alexandre Prado, líder em Mudanças Climáticas do WWF-Brasil, destaca tragédias climáticas brasileiras recentes. “A tragédia no Sul, a maior seca da história e as queimadas na Amazônia e no Pantanal nos mostraram que da forma como está, já era”, avalia. Prado lembra que a origem das mudanças climáticas são os combustíveis fósseis, cuja queima resulta na formação dos gases de efeito estufa. “Sabemos o que fazer, sabemos como fazer e sabemos das dificuldades e desafios, mas temos que ter lideranças para enfrentá-los.”

Para limitar o aumento da temperatura, o relatório da ONU destaca que as emissões devem cair 28% até 2030 e 37% dos níveis de 2019 até 2035. “Precisamos de mobilização global em uma escala e ritmo nunca vistos antes — começando agora mesmo. Peço a todas as nações: chega de conversa fiada”, discursou Inger Andersen, diretora-executiva do Pnuma. A COP29 é considerada uma conferência intermediária, pois as novas NDCs serão assumidas na 30ª edição. Andersen afirmou que o encontro em Baku, no Azerbaijão, é a oportunidade para elevar, agora, o nível de ambição para “entrar em um caminho de 1,5°C”.

O relatório destaca que, em vez de redução nas emissões, desde 2019, o que se vê é um aumento na liberação de gases de efeito estufa, chegando ao recorde de 57,1 gigatoneladas no ano passado. O atraso no cumprimento das metas significa que, até 2035, será preciso cortar, anualmente, 7,5% do CO2.

Embora muito pouco provável, o cenário do Acordo de Paris, de 1,5°C acima dos índices pré-industriais, é tecnicamente possível. Para isso, os países devem cortar até 31 gigatoneladas de CO2 equivalente em 2030  –  ou 52% do que foi emitido em 2023, e 41 gigatoneladas até 2035. O custo previsto desses cortes é estimado em menos de US$ 200 por tonelada de carbono.

Segundo o relatório, o aumento da implantação de tecnologias solares fotovoltaicas e energia eólica poderia fornecer 27% do potencial total de redução em 2030 e 38% em 2035. A ação sobre florestas pode contribuir com 20% nos dois anos. Outras opções promissoras incluem medidas de eficiência, eletrificação e troca de combustível nos setores de edifícios, transporte e indústria.

“Apesar de estar em situação mais favorável, segundo a análise apresentada, o Brasil pode não conseguir alcançar suas metas climáticas nas NDCs, se não mudar as políticas atuais, o mesmo acontecendo com países como Estados Unidos e União Europeia”, reforça Juliano Bueno de Araújo, doutor em Riscos e Emergências Ambientais e diretor técnico do Instituto Internacional Arayara. “As ações implementadas são consideradas insuficientes e a transição para uma economia sustentável está lenta. Sem uma revisão e intensificação das estratégias, esses países comprometem seu futuro ambiental e sua posição no combate às mudanças climáticas.”

Colaborou Isabella Almeida 

ARAYARA NA MÍDIA | Sequestrado pelo carvão e gás, debate sobre energia eólica offshore no Brasil omite elementos-chave

ARAYARA NA MÍDIA | Sequestrado pelo carvão e gás, debate sobre energia eólica offshore no Brasil omite elementos-chave

Apesar do papel crucial na transição energética do país, um projeto de lei brasileiro que regulamenta a energia eólica offshore está paralisado por emendas relacionadas a usinas termelétricas movidas a combustíveis fósseis, atrasando investimentos e negligenciando impactos socioambientais.

 

Originalmente publicado em gasoutlook.com por Amanda Magnani 14.10.2024

Um dos países com a matriz elétrica mais descarbonizada do mundo, o Brasil caminha para o acordo global de triplicar a produção de energia renovável até 2030, tendo ativado 13 novas usinas solares fotovoltaicas e 25 parques eólicos somente em 2023.

Na América Latina, a capacidade eólica instalada em 2022 ultrapassou 44,7 GW , e o Brasil tem papel de liderança. Embora o continente seja atualmente responsável por pouco mais de 5% da produção global de energia eólica, o país está entre os dez primeiros do mundo em capacidade instalada.

Os 316 MW de energia eólica adicionados em 2023, no entanto, são apenas a ponta do potencial iceberg eólico offshore. De acordo com um estudo do World Bank Group, ele ultrapassa 1.200 GW no país. O mesmo estudo estima que, até 2050, a indústria de energia eólica pode gerar mais de 516.000 empregos e render pelo menos R$ 900 bilhões para a economia brasileira.

Apesar de ser uma indústria fundamental para a transição energética, a produção de energia eólica também traz impactos e conflitos socioambientais. Questões como contratos de ocupação de terras que afetam comunidades tradicionais, ameaças à vida selvagem e desmatamento são alguns exemplos.

A exploração offshore ainda não ocorreu no país, que atualmente discute seu arcabouço regulatório. No entanto, minimizar os impactos socioambientais dessa indústria não é o foco do debate legislativo.

Aprovado pelo Senado e encaminhado à Câmara dos Deputados em agosto de 2022, o Projeto de Lei 576/2021 , conhecido como Projeto de Lei da Eólica Offshore, ainda está longe de alcançar consenso para ratificação.

Conforme tramitava na Câmara dos Deputados, a proposta original para regulamentar a alocação de áreas para exploração de energia offshore recebeu as chamadas emendas “jabuti” — termo usado no Brasil para se referir a propostas incluídas em um projeto de lei que não têm relação com o tópico principal. Na maioria das vezes, procedimentos legislativos importantes são usados ​​para contornar decisões impopulares ou controversas.

“Nosso parlamento tende a aproveitar projetos de lei e anexar questões não relacionadas, os chamados jabutis, para que sejam aprovados em conjunto”, disse Anton Schwyter, gerente de energia do Instituto Arayara, ao Gas Outlook .

Entre as mudanças aprovadas na Câmara está a contratação obrigatória de 4,2 GW de termelétricas movidas a combustíveis fósseis. Inflexíveis, essas usinas estariam em operação por pelo menos 70% das horas do ano, independentemente da demanda.

Esta proposta é consequência das emendas do “jabuti” que foram aprovadas juntamente com a Lei nº 14.182 de 2021, que privatizou a Eletrobras, a maior empresa de energia da América Latina. O principal ponto de controvérsia na lei era a exigência de contratação de 8 GW produzidos por termelétricas a gás inflexível.

Risco para a saúde

O texto também inclui a contratação obrigatória de 4,9 GW de pequenas centrais hidrelétricas, além de estender de 2028 a 2050 os contratos com termelétricas a carvão, a fonte de energia mais poluente e ineficiente disponível.

“Entre os minerais fósseis, o carvão é o mais prejudicial. Além da alta quantidade de gases de efeito estufa emitidos e seus efeitos ambientais e climáticos, nosso carvão nacional contém muita fuligem, que é altamente prejudicial à saúde humana”, disse Schwyter.

Ele explica que essa fonte de energia também é mais cara e menos competitiva, exigindo subsídios para sua geração. Em um contexto de crescimento de fontes renováveis, isso torna o carvão uma opção “ainda mais anacrônica”, acrescentou.

Além de prejudiciais em termos ambientais, as emendas do “jabuti” ao projeto de lei causarão atrasos em sua aprovação e, consequentemente, perda de investimentos . “O arcabouço legal para parques eólicos offshore é extremamente importante para o setor, pois dá segurança para os investidores alocarem recursos de forma eficaz”, disse Edlayan Passos, especialista em transição energética do Instituto E+, à Gas Outlook .

As emendas do “jabuti” também “reduzem a competitividade e o potencial de descarbonização da indústria brasileira, dificultando o potencial do Brasil de se firmar como fornecedor global de produtos de baixa emissão de carbono”, disse Passos.

Um debate sequestrado

Embora o Projeto de Lei da Eólica Offshore tenha sido listado como prioridade no pacto de transformação ecológica firmado pelos Três Poderes, desde a inclusão das emendas do “jabuti” pela Câmara dos Deputados, a energia eólica em si é o tema menos discutido , apesar de seu papel crucial na transição energética nacional.

Em fevereiro, a estatal Petrobras, uma das maiores empresas de óleo e gás do mundo, anunciou que aguardava uma definição da legislação para iniciar investimentos em parques eólicos offshore, um dos pilares da transição energética da empresa. Em julho, representantes do setor elétrico criticaram as emendas do “jabuti” no projeto de lei.

Até o Ministério de Minas e Energia, que continua defendendo a exploração de petróleo , apoia o veto às emendas relacionadas aos combustíveis fósseis.

“Chegamos a uma situação rara em que, durante fóruns e audiências públicas, até mesmo stakeholders do setor de gás concordaram que a proposta de contratação de termelétricas inflexíveis não faz sentido”, disse Ricardo Baitelo, gerente de projetos do Instituto de Energia e Meio Ambiente, ao Gas Outlook .

Baitelo explicou que, em termos numéricos, não há déficit energético. “Na verdade, atualmente há mais contratos de venda do que consumo real, a ponto de parte da energia produzida acabar sendo desperdiçada. No entanto, há, sim, momentos específicos em que ocorre uma lacuna.”

É nesses momentos, em situações de emergência, que as termoelétricas representam uma solução. “Mas elas devem operar como um seguro de carro”, explicou Schwyter. “Elas devem permanecer em standby e, assim como acontece com o seguro, esperamos não ter que usá-las.”

Ele acrescentou que, com o avanço da geração por fontes renováveis, o sistema energético do país está mudando, junto com a necessidade do dito “seguro”.

Além disso, como Baitelo explicou, a energia produzida por usinas termelétricas é muito mais cara do que a de fontes hidrelétricas, solares ou eólicas. Se as emendas “jabuti” ao Projeto de Lei da Energia Eólica Offshore forem aprovadas, os custos operacionais podem ultrapassar 650 bilhões de reais (US$ 117 bilhões) até 2050.

“Isso representa um aumento de 11% nas contas de luz brasileiras, impactando diretamente o orçamento doméstico das famílias e as cadeias produtivas do país”, disse Carlos Faria, presidente da Associação Nacional dos Consumidores de Energia, à Gas Outlook . “Não podemos ter representantes cujas decisões favoreçam lobbies específicos do setor energético e vão completamente contra os interesses dos consumidores.”

Transição energética inclusiva

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) já tem 96 pedidos de licenciamento para projetos de parques eólicos offshore, totalizando 234 GW.

“Os pedidos de licenciamento representam quase a mesma quantidade de energia que o Brasil produz hoje. Essa equação não fecha”, disse Cristina Amorim, coordenadora do Projeto Nordeste Potência, à Gas Outlook . “Enquanto isso, muito pouca atenção é dada aos impactos ambientais dos próprios parques eólicos offshore e ao que eles significam para as comunidades e seus territórios.”

Da construção à operação, os parques eólicos representam ameaças , especialmente para aves e ecossistemas marinhos. Suas linhas de transmissão, múltiplas e mais dispersas que as de grandes hidrelétricas, também impactam um número maior de comunidades.

Além disso, o projeto de lei propõe licenciamento separado para o que acontece offshore, sob a jurisdição do Ibama, e para as áreas costeiras, tipicamente sob jurisdição estadual ou municipal. “É importante entender que há um continuum; é tudo uma coisa só”, diz Amorim.

Em termos sociais, um dos principais impactos ocorre entre comunidades tradicionais de pescadores no nordeste do Brasil — onde a maioria das usinas eólicas offshore são construídas — onde as pessoas usam veleiros em vez de motorizados. Dependendo das correntes de vento, os pescadores tradicionais se encontram à mercê do raio de segurança ao redor das turbinas.

“Muitas vezes, quando o raio de duas ou mais turbinas se sobrepõe, cria-se uma barreira que os pescadores não conseguem atravessar para sua própria segurança”, explicou Amorim. “Mas o que acontece se as áreas onde a pesca é melhor estiverem além dessa barreira?”

Ela observou que, mesmo em estados onde ainda não existem parques eólicos offshore, os conflitos territoriais e a violência contra as comunidades já aumentaram. À luz disso, organizações como a Pastoral dos Pescadores, uma associação religiosa que apoia pescadores artesanais por justiça social, já se posicionaram contra esses projetos, acrescentou.

“O que precisamos é que a transição energética, e este projeto de lei como parte dela, seja uma transição para um modelo diferente de geração de energia que seja justo, inclusivo e popular”, diz ela.

 

Esta história foi produzida como parte do Programa de Indústrias Verdes do Climate Tracker.

 

Arayara na mídia: As mega barragens brasileiras prometiam um futuro verde. Então veio a mudança climática

Arayara na mídia: As mega barragens brasileiras prometiam um futuro verde. Então veio a mudança climática

Matéria originalmente publicada em contextnews.com em 26/09/2024.
Por: André Cabette Fabio

Qual é o contexto?

O presidente Lula apostou alto em mega barragens nos anos 2000 para expandir a energia limpa. Agora, a mudança climática está prejudicando as ambições verdes do Brasil.

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  • • Mega barragens na Amazônia operam bem abaixo da capacidade devido à baixa nos níveis dos rios
  • • O baixo desempenho não é novidade, mas foi agravado pela seca recorde
  • • Brasil recorre a combustíveis fósseis poluentes e gás natural

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Santo Antônio é uma das três mega usinas hidrelétricas localizadas nas profundezas da exuberante floresta amazônica brasileira que já foram consideradas o futuro da produção de energia verde do país.

As megabarragens “a fio d’água” — cujas turbinas são movidas pelo fluxo natural dos rios e não pela água que cai de reservatórios imponentes — foram a aposta do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em um futuro verde quando assumiu o poder pela primeira vez, na década de 2000.

Santo Antônio, Jirau e Belo Monte foram construídas na floresta amazônica apesar da forte oposição de grupos ambientais e se tornaram uma das cinco maiores represas do país. Belo Monte, que começou a operar em 2016, tem a quarta maior capacidade do mundo.

Mas as megabarragens estão operando bem abaixo da capacidade, à medida que os níveis dos rios diminuem devido a uma seca recorde na Amazônia, destacando como as mudanças climáticas estão se tornando um desafio crescente para a ambição verde do Brasil.

“Ao contrário das antigas usinas hidrelétricas, o rio é quem manda. Se ficar muito seco, ele para de funcionar”, disse um guia que levou turistas pela represa de Santo Antônio no início deste ano.

Santo Antônio teve que desativar 43 de suas 50 turbinas no início de setembro, quando os níveis dos rios se aproximaram de uma mínima recorde devido à seca, tendo que fechar completamente pelo mesmo motivo por duas semanas em outubro de 2023.

As três megabarragens operaram com apenas uma fração de sua capacidade total em setembro, exacerbando uma tendência em que as empresas hidrelétricas têm consistentemente falhado em atingir a produção de “energia mínima garantida” estabelecida em seus contratos com o governo.

Localização das Hidrelétricas - Mapa por Andre Cabette Fabio - OpenMapTiles

Localização das Hidrelétricas – Mapa por Andre Cabette Fabio – OpenMapTiles

 

Santo Antônio só trabalhou com menos de 10% de sua capacidade nos primeiros 20 dias de setembro, Jirau com 5% e Belo Monte com menos de 3% de seu potencial total, de acordo com dados do governo. Em comparação, Santo Antônio e Jirau trabalharam com cerca do dobro da capacidade no período equivalente de 2021, um ano em que a Amazônia brasileira lutou contra chuvas pesadas.

Especialistas dizem que a situação provavelmente piorará à medida que as secas se tornarem mais regulares no futuro.

“Estudos indicam que períodos de seca severa se tornarão mais frequentes em todas as regiões do Brasil”, disse à Context a Norte Energia, empresa que opera Belo Monte.

Um relatório de 2015 encomendado pelo governo previu que o potencial energético dos fluxos naturais dos rios no Brasil cairá entre 7% e 30% até 2030.

O Ministério de Minas e Energia do Brasil recusou o pedido de comentário da Context.

 

Histórico de baixo desempenho

A energia hidrelétrica responde por 47% da capacidade energética do Brasil, tornando-se a pedra angular da ambição de Lula de transformar o país em um exportador líquido de energia verde ou, como ele mesmo disse, a ” Arábia Saudita da energia renovável em 10 anos “. A Arábia Saudita é a maior exportadora de petróleo bruto do mundo.

A aposta de Lula em barragens “a fio d’água” visava garantir energia barata e com menor impacto ao meio ambiente do que as barragens tradicionais que criam grandes reservatórios.

Mas o baixo desempenho das megabarragens da Amazônia não é novidade, o que coloca em questão a estratégia verde do governo, dizem especialistas.

Santo Antônio, Jirau e Belo Monte não entregaram a “energia mínima assegurada” prevista em contratos entre empresas hidrelétricas e o governo federal em nenhum ano desde que começaram a produzir na década de 2010, de acordo com a análise de dados da Context do Operador Nacional do Sistema Elétrico.

A “energia mínima assegurada” refere-se à quantidade mínima de eletricidade que as usinas elétricas se comprometem a fornecer ao sistema elétrico nacional com base nos padrões históricos de fluxo dos rios.

Mas a história não tem sido muito indicativa dos níveis futuros dos rios, pois o clima vem mudando, disse Celio Bermann, professor do Instituto de Energia e Meio Ambiente da Universidade de São Paulo.

A Eletrobras, empresa que opera Santo Antônio, disse ao Context que a produção mínima de energia assegurada de Santo Antônio, de 2,31 Gigawatts, foi baseada em níveis históricos dos rios que “não refletiam as alterações extremas observadas nos últimos anos”.

À medida que os níveis dos rios caem, as empresas hidrelétricas são forçadas a comprar eletricidade de outros produtores no mercado à vista, muitas vezes com altos custos financeiros, para cumprir com suas obrigações contratuais.

Se o nível das águas não subir nos próximos anos, “essas usinas (da Amazônia) vão falir”, disse Mário Daher, consultor do setor energético.

Jirau tem uma produção mínima de energia assegurada de 2,1 Gigawatts, e Belo Monte, de 4,41 Gigawatts , segundo dados da Agência Nacional de Energia Elétrica.

Alternativas?

À medida que a produção de eletricidade das megabarragens da Amazônia caiu, as autoridades recorreram a combustíveis fósseis poluentes e caros .

Atualmente, o governo está construindo 15 usinas adicionais movidas a gás, o que, segundo o Instituto Internacional Arayara, sem fins lucrativos, deve aumentar a capacidade de geração de gás natural do Brasil em pelo menos 30%, aumentando assim as emissões de carbono do país.

Enquanto isso, um relatório de agosto, coautorado pelo Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA), uma organização sem fins lucrativos, propõe o uso de energia solar e eólica para ajudar a converter barragens hidrelétricas menores em “barragens hidrelétricas de armazenamento bombeado”.

A ideia é usar energia solar e eólica quando o tempo estiver ensolarado e ventoso para ajudar a encher reservatórios de água que mais tarde poderão ser usados ​​para gerar eletricidade quando o sol se põe e o vento diminui.

A eletricidade solar e eólica vem crescendo rapidamente nos últimos cinco anos no Brasil e agora responde por 29,4% da capacidade energética do país, de acordo com dados da Empresa de Pesquisa Energética.

A produção de Santo Antônio, Jirau e Belo Monte também poderia ser impulsionada pela construção de mais barragens ao longo do rio, conforme planejado originalmente, disse Vinícius Oliveira da Silva, pesquisador do Instituto de Energia e Meio Ambiente, uma organização sem fins lucrativos.

Mas isso seria controverso dada a oposição às barragens originais e seu histórico decepcionante.

Ambientalistas dizem que a construção contribuiu para o desmatamento, a perda de biodiversidade e o deslocamento de dezenas de milhares de brasileiros.

“De que adiantou matar o rio, a floresta… e os animais?”, questionou Ana Barbosa, coordenadora do movimento Xingu Vivo, que se opõe a Belo Monte e outras barragens no rio Xingu.

“Você simplesmente coloca um monumento no meio do rio para que os homens possam dizer que foram capazes de construí-lo, mesmo que isso não produza nada além de sangue e desastre.”

O novo governo de Lula, no entanto, reacendeu as negociações com a Bolívia para construir uma nova megabarragem no rio Madeira, na fronteira entre os dois países, desde que ele retornou ao poder em 2023.

Isso seria benéfico para seu governo, pois ajudaria a aumentar a produção em Jirau e Santo Antônio, ambas localizadas no rio Madeira, enquanto o impacto ambiental deverá ser maior na Bolívia, de acordo com Oliveira da Silva.

“Parece ser o momento certo para fazer essa barragem acontecer”, disse ele.

(Reportagem de Andre Cabette Fabio; Edição de Jack Graham e Ana Nicolaci da Costa.)