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Comissão de Meio Ambiente do Senado Discute Margem Equatorial em Audiência Pública

Comissão de Meio Ambiente do Senado Discute Margem Equatorial em Audiência Pública

Audiência Pública foi convocada pelo senador Beto Faro (PT-PA), e contou com a participação da Petrobras, do IBAMA, da Federação Única dos Petroleiros (FUP), do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP) e do secretário de planejamento do Amapá.


Arayara participou com Incidência Direta, pedindo que o país não abra mais fronteiras de exploração de combustíveis fósseis, os principais responsáveis pelas emissões de gases de efeito estufa que promovem o aquecimento e a desestabilidade climática mundial.

Na manhã desta quinta-feira (25), a Comissão de Meio Ambiente (CMA) do Senado Federal realizou importante debate sobre a abertura de novas fronteiras de exploração de óleo e gás na Margem Equatorial brasileira, região que vai do Rio Grande do Norte ao Amapá e que apresenta possibilidades promissoras de reservas de petróleo em águas profundas, como constatado recentemente no Suriname e na Guiana Francesa, em território litorâneo imediatamente acima dos limites brasileiros.

Após as descobertas, Guiana, Suriname e Trinidad e Tobago já perfuraram mais de 150 poços na intenção de explorar esses recursos energéticos, tendo a Guiana contabilizado em sua reserva marinha 11 milhões de barris de petróleo – cerca de toda a quantidade da produção brasileira. Indústria petrolífera no país vizinho se consolidou rapidamente em volta desta reserva energética que, a despeito dos números robustos, promove uma atividade de grande impacto ambiental e altamente poluidora, o que incita um debate acalorado no que tange ao licenciamento ambiental.

Novas fronteiras para o Petróleo e a Transição Energética

Segundo o Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), Brasil passará de exportador a importador de Petróleo quando as reservas do pré-sal já não estiverem produzindo quase nada em 2050. Mesma opinião é compartilhada pela Petrobras: “O petróleo ocupa posição importante na balança comercial brasileira, e voltaremos a ser importadores se não abrirmos novas fronteiras, tanto na Margem Equatorial como, quem sabe, em Pelotas também”, afirmou Joelson Falcão, diretor de Exploração e Produção da Petrobras.

Porém, para ecologistas, o potencial das bacias petrolíferas brasileiras já conhecidas assegura a produção nacional até que a demanda por petróleo no mundo comece a declinar. De acordo com a Agência Internacional de Energia (AIE), o pico da demanda de petróleo ocorrerá no final da década.

O diretor do Instituto Internacional Arayara, Juliano Araújo, defende que as projeções do setor petrolífero ignoram as mudanças esperadas no consumo nos próximos anos, com o aumento do uso de biocombustíveis. Com isso, Araújo defende: “o potencial das descobertas ocorridas nos últimos anos com os blocos já leiloados pela ANP eliminam a necessidade de abertura de novas fronteiras na margem equatorial ou na Amazônia profunda”.

Na Audiência Pública, Joelson Falcão também citou índice de pobreza energética (Brasil é o 119ª posição do ranking), principalmente percebida nas regiões norte e nordeste, como fator importante para expandir a produção energética fóssil. “Hoje nós temos uma base muito boa de energia renovável para que a gente continue a aumentar um pouquinho o nosso consumo energético”, comentou.

Ao lado da colega Daniela Lomba, gerente-geral de licenciamento e meio ambiente da Petrobras, Joelson defendeu a ideia de criação de leis para converter os tributos advindos da exploração da indústria petrolífera em benefícios aos estados da Margem Equatorial, e também em benefício da transição energética.

“Novas fronteiras são essenciais para segurança e soberania energética nacional no contexto de transição e diversificação energética. Por isso a importância da Petrobras liderar esse movimento no país, para financiar a transição mas também para financiar a floresta em pé, pois esses recursos advindos da exploração podem ser canalizados para reduzir o desmatamento e alocados em investimentos sociais na região”, afirmou Lomba. 

A gerente da Petrobras ainda pontuou que Margem Equatorial é uma das últimas fronteiras exploratórias do país: “A gente precisa conhecer, pesquisar. O licenciamento ambiental que estamos pedindo é para isso”. 

Ibama, licenciamentos e pesquisa na Margem Equatorial

Segundo Beto Faro, senador que convocou e presidiu a Audiência Pública, “a expectativa é grande em torno dessa região”.

Presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, reforçou que há excitação pela Margem Equatorial, mas lembrou que “para o licenciamento ambiental, é uma região nova – houveram tentativas de exploração no Rio Grande do Norte antes, mas em águas rasas, não deu certo. Então a gente precisa de mais informação. Não dá para trabalhar sem informação”.

Agostinho comentou que Petrobras é quem tem apresentado os melhores planos de pesquisa e exploração, mas justificou o indeferimento que deu ao pedido de licenciamento ambiental enviado pela Petrobras para o bloco FZAM59, o “bloco 59”, localizado no Amapá: “o tempo de resposta a eventuais acidentes está muito longo: 43-48 horas para chegar ao local do acidente, de lancha rápida, partindo da base designada a eventuais acidentes até a área de exploração; são 800km”. 

Nesse processo de licenciamento, Ibama também destacou a grande proximidade do aeroporto que seria utilizado nas atividades petrolíferas a uma Terra Indígena local, além de outros impactos que não foram considerados no plano de mitigação da empresa.

“Atualmente, Margem Equatorial inteira está sendo estudada em relação a pesquisas sísmicas. Quem autoriza é o Ibama e temos autorizado, não temos negado a pesquisa sísmica nessa região”, comentou Agostinho. “Não é o Ibama quem vai fazer política energética, mas notadamente o tema das mudanças climáticas é muito relevante. Daqui para a frente a preocupação será com os Gases de Efeito Estufa; isso vai ter que ser incluído nos processos de licenciamento ambiental”. 

Secretário de Planejamento do Amapá, Lucas Abrahão, comentou: “se, por ventura, vier a ter uma produção, em uma fase pós-exploratória, o Amapá precisa organizar uma governança para que não se repitam os mesmos erros que aconteceram em outros lugares”. “Caso seja uma decisão de Estado que a Margem Equatorial seja primeiramente estudada, queremos dar apoio nesse pesquisa; todo o povo quer saber o que tem de potencialidade”, pontuou.

Lucas Abrahão compartilhou dados positivos de conservação do seu estado: “são mais de 90% de sua cobertura vegetal primária intacta; estado carbono negativo: mais captura carbono do que emite à atmosfera; mais de 70% de suas áreas são protegidas; é o primeiro estado a demarcar todos os territórios indígenas, e não temos conflitos fundiários”. 

Porém destacou que grande parte da população ainda vive na pobreza, cerca de 50% da população, “e isso ocorreu pela lacuna de um projeto nacional de desenvolvimento para a Amazônia. O modelo que o Estado brasileiro sempre tentou implementar se utiliza de metodologias que não forneceram ao Amapá um desenvolvimento justo ao nosso povo”, destacou. “Debaixo dessas áreas protegidas há populações que têm sonhos, que não abrem mão da sustentabilidade, mas que querem ter a oportunidade de construir junto esse debate”. 

O desenvolvimento sustentável da Amazônia e a criação de um fundo nacional para financiar a diversificação da matriz e possibilitar a Transição Energética são dois fatores que muito têm sido defendidos pela indústria de Petróleo e Gás em suas argumentações em defesa da abertura de novas fronteiras de exploração, além da preocupação do país começar a precisar importar petróleo.

Para a diretora-executiva do Instituto Internacional Arayara, Nicole Oliveira, “É imprescindível para a descarbonização das economias que não sejam abertas mais frentes de produção, e é uma boa notícia conferir que esse modelo de negócio tem sido rechaçado, de modo geral, em todo o mundo. Porém, sabemos que há um lobby no Brasil que leva à flexibilização de leis para que se aumente a produção de energia via combustíveis fósseis em casos de situações extremas no âmbito climático”. E aponta: “O Presidente Lula tem uma oportunidade única para tornar o Brasil em um líder climático que pratica o que fala, honra compromissos ambientais firmados e, assim, preparar bem o país para a COP 30 no ano que vem, em Belém”.

Assista à Audiência Pública na íntegra aqui:

Artigo de Opinião | Um Dia é Insuficiente para celebrarmos o planeta que chamamos de ‘mãe’

Artigo de Opinião | Um Dia é Insuficiente para celebrarmos o planeta que chamamos de ‘mãe’

O planeta já existia antes de elegermos este o seu dia. Não temos como afirmar, nestes mais de quatro bilhões de anos de existência, a data em que de fato nasceu a Terra, a hora, o momento exato de sua criação.

Assim, ainda que pensemos apenas nos 200 mil anos de existência da nossa espécie, um dia é insuficiente para celebrarmos o planeta que chamamos de ‘mãe’, ou mesmo para agirmos por ele, em especial, frente aos impactos que geramos, em nossa história mais recente.

Já passa da hora de agirmos de forma contínua contra empresas que matam nossos rios, contra empreendimentos que colocam em xeque nossa segurança hídrica e contra ações de governos que ferem os direitos daqueles que defendem as florestas.

 

Por Luiza Machado – Analista Ambiental e Florestas do Instituto Arayara

 

Em 22 de Abril de 2009, o Dia da Mãe Terra, ou Dia da Terra, foi estabelecido pela Organização das Nações Unidas (ONU) como um momento para trocarmos reflexões sobre nossos impactos e a necessidade de se viver em harmonia com a natureza. Os debates giram em torno da crescente degradação ambiental e do esgotamento dos recursos naturais, resultantes dos padrões insustentáveis de consumo e produção. Tais padrões já trazem consequências severas tanto para a Terra quanto para a saúde e o bem-estar da humanidade. Nesse sentido, dentre as diversas reflexões que a data abrange, é de suma importância incluirmos a organização em que nossa sociedade se apresenta: Quem é privilegiado, nesse sistema? Quem é desfavorecido? E por quê?

O dia 22 de abril também marca a chegada dos colonizadores no Brasil. De descobrimento, a data nada tem, mas a partir daí, diversas descobertas vieram. Os colonizadores descobriram terras férteis para os seus cultivares, sustentados pela exploração, e, posteriormente, o ouro e a prata. As imigrações se reduziram no decorrer do século XX, mas o Brasil seguiu/segue na posição de território colonizado a ser explorado, em especial, com o advento do capitalismo. Assim, também foram descobertos o cobre, o petróleo, a silvinita, o gás natural e, mais recentemente, o gás de xisto.

Já os povos que aqui viviam antes de 1500, descobriram o projeto genocida dos invasores, iniciado na colonização, mas que se perpetua até os dias de hoje. Enquanto os exploradores, passados e atuais, sob o incentivo do governo, buscam novas descobertas sob e sobre a terra, os povos indígenas seguem vivendo no ponto cego da perspectiva desenvolvimentista, protegendo e celebrando a terra da qual dependem, hoje e todos os dias.

Mas e nós? Os demais brasileiros e brasileiras que não somos indígenas, tampouco europeus ou grandes empresários? Neste dia de reflexão, devemos apoiar essas explorações ou devemos zelar pelo meio ambiente? onde queremos ver nosso país chegar? Nossa Terra? Diversos povos têm suas respostas para essas perguntas, a exemplo do povo Yanomami. Destaca-se um trecho do livro A queda do céu, em que Davi Kopenawa trata sobre o tema:

 

“Tudo o que cresce e se desloca na floresta ou sob as águas e também todos os xapiri e os humanos têm um valor importante demais para todas as mercadorias e o dinheiro dos brancos. Nada é forte o bastante para poder restituir o valor da floresta doente. Nenhuma mercadoria poderá comprar todos os Yanomami devorados pelas fumaças de epidemia. Nenhum dinheiro poderá devolver aos espíritos o valor de seus pais mortos!”

 

A maior parte de nós não vive nas florestas, mas todas e todos, sem exceção, dependem dos serviços ecossistêmicos prestados pelas áreas naturais deste continente, que, além dos aspectos ambientais, trazem benefícios econômicos e sociais, relativos ao bem-estar humano. A Floresta Amazônica tem papel fundamental nos ciclos das chuvas que sustentam a nossa agricultura, que mantém nossa segurança hídrica e a estabilidade climática do país. A Floresta Amazônica também condiciona a existência de outros biomas brasileiros, que desempenham papel semelhante. Ademais, áreas bem preservadas e ambientalmente equilibradas impedem a proliferação de doenças, como dengue, zika e chikungunya.

Temos tantos outros exemplos de benefícios advindos das áreas naturais deste país, mas, apenas para o que foi aqui citado, não há mercadorias que os compensem. Os Yanomami têm razão, não há dinheiro capaz de pagar pela nossa segurança alimentar, pela água que bebemos ou pela saúde de nossas famílias, tudo isso é grande e pesado demais e tem valor, não preço.

No entanto, o país nasceu e se desenvolveu sobre uma grande inversão de princípios, onde o lucro do empresário é priorizado, em detrimento do bem-estar social e da preservação ambiental. Questão essa explícita em casos como Brumadinho, Mariana, Maceió e no avanço das fronteiras de exploração de petróleo e gás. Os leilões de concessão da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) realizam, regularmente, ofertas de blocos de exploração offshore (no mar) e onshore (em terra), sobre e às margens das Terras Indígenas e territórios tradicionais, aumentando conflitos e a pressão sobre os territórios e colocando em risco ecossistemas aquáticos e terrestres.

Ao mesmo tempo em que os projetos exploradores avançam, são aprovados projetos de lei que anulam a proteção de territórios indígenas, como o PL 490/2007. Nos últimos 38 anos, as Terras Indígenas, demarcadas ou não, foram as áreas protegidas mais preservadas do país, como apontam estudos, de 2022, do MapBiomas, ainda assim o governo insiste em medidas que desfavorecem, justamente, essas populações. Nesse contexto, se observa que, mais do que pequenas ações pessoais, devemos agir coletivamente contra os verdadeiros devastadores, contra os exploradores contemporâneos, que tratam nosso país como uma despensa a ser exaurida, às custas de todas, todos e tudo o que aqui vive. Mais do que isso, devemos nos mobilizar em conjunto e em apoio àquelas pessoas e comunidades que dedicam suas vidas à defesa da vida e da floresta. 

O planeta já existia antes de elegermos este o seu dia. Não temos como afirmar, nestes mais de quatro bilhões de anos de existência, a data em que de fato nasceu a Terra, a hora, o momento exato de sua criação. Assim, ainda que pensemos apenas nos 200 mil anos de existência da nossa espécie, um dia é insuficiente para celebrarmos o planeta que chamamos de ‘mãe’, ou mesmo para agirmos por ele, em especial frente aos impactos que geramos, em nossa história mais recente. Já passa da hora de agirmos de forma contínua contra empresas que matam nossos rios, contra empreendimentos que colocam em xeque nossa segurança hídrica e contra ações de governos que ferem os direitos daqueles que defendem as florestas.

O que desejo para o ‘aniversário’ da Terra, é que a presente data seja um marco, uma virada nas nossas ações e mobilizações. Com isso, concluo com uma boa reflexão de Bertolt Brecht, através de uma tradução adaptada: “Há quem lute um dia e é bom, há quem lute um ano e é melhor, há aqueles que lutam vários anos e são muito bons, mas há quem lute por toda a vida, esses são os imprescindíveis.”

Arayara e Arpinsul fomentam debate sobre combustíveis fósseis e os impactos às populações indígenas do Brasil no ATL 2024

Arayara e Arpinsul fomentam debate sobre combustíveis fósseis e os impactos às populações indígenas do Brasil no ATL 2024

O Acampamento Terra Livre deste ano acontece entre 22 e 26 de abril, sob o tema: “Nosso marco é ancestral. Sempre estivemos aqui”.

O evento é organizado pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e suas sete organizações regionais de base, como a ArpinSul – parceira do Instituto Internacional Arayara.

A 20ª edição do Acampamento Terra Livre (ATL) acontece nesta semana, entre 22 e 26 de abril, na Fundação Nacional das Artes (Funarte) em Brasília. Cerca de 8 mil indígenas do Brasil são esperados no evento, a maior celebração do “Abril indígena”.

O tema deste ano, “Nosso marco é ancestral. Sempre estivemos aqui”, questiona a tese do Marco Temporal e enfatiza a luta pelas demarcações das terras indígenas. Na Fundação Nacional dos Indígenas (Funai) constam 736 Terras Indígenas registradas e cerca de 490 pedidos de análise.

ATL 2024 e os combustíveis fósseis

Em duas décadas de ATLs, o movimento indigenista no Brasil se organiza na capital federal para cobrar a demarcação de terras, a fiscalização das já demarcadas, além de reivindicar direitos civis, como o amplo acesso à saúde, à educação e à assistência social.

No #ATL2024, o Instituto Internacional Arayara participa de atividades promovidas nas tendas das organizações regionais que debatem o tema dos combustíveis fósseis e os impactos às populações indígenas do Brasil.

Em entrevista à ARAYARA.org, Kretã Kaigang, da coordenação executiva da Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (ArpinSul), relembrou os impactos do último leilão de blocos de exploração de petróleo e gás promovido pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP): “No ano passado, em dezembro, na Oferta Permanente, 5 terras indígenas foram afetadas no leilão da ANP que ofertou mais de 600 blocos de exploração”.

Kaigang aponta que outras terras indígenas seguem ameaçadas nesse processo: “40% das Terras Indígenas ainda estão ameaçadas por esses blocos. É importante que a gente comece a se preocupar, pois muitos dos povos ameaçados são povos isolados, e muitos desses territórios ainda não tem um processo demarcatório e assim ficam vulneráveis à exploração desse tipo”.

Os eventos deste ano vão desde mesas de debate e exibição de filmes até atos de manifestação cobrando políticas públicas. Segundo a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), no início do acampamento será divulgada uma carta com as reivindicações do movimento.

Confira a programação completa do Acampamento Terra Livre 2024 aqui.

Assista ao recado do Kretã Kaigang, da ArpinSul, sobre o ATL 2024:

Fracking em Alagoinhas/BA | Audiência Pública debateu perigos e necessidade de lei Anti-Fracking para região

Fracking em Alagoinhas/BA | Audiência Pública debateu perigos e necessidade de lei Anti-Fracking para região

Em Audiência Pública na Câmara dos Vereadores, Alagoinhas discutiu o método de exploração de gás de xisto via fraturamento hidráulico.

O Fracking utiliza substâncias tóxicas que contaminam lençóis freáticos, portanto um risco para a cidade que possui uma das águas mais puras do Brasil, conhecida por sua indústria de bebidas.

Estiveram presentes representantes sindicais; representantes de associações de moradores; empresários da indústria cervejeira e alimentícia; representantes da Vigilância em Saúde/Secretaria Municipal da Saúde; alunos de ensino médio e de universidades, como a Universidade Estadual da Bahia (UNEB); o deputado federal Jorge Solla (PT), um articulador da campanha Anti-Fracking em Brasília; e representantes do Instituto Internacional Arayara e da Coalizão Não Fracking Brasil (COESUS).

Além dos recursos hídricos abundantes e das fábricas de bebidas que, beneficiadas pela qualidade da água, se consolidaram aos montes na cidade, Alagoinhas também abriga uma área petrolífera e conta com atividades da indústria do petróleo e gás (P&G). Três localidades em Alagoinhas possuem campos de exploração de petróleo: Buracica, distrito de Alagoinhas a 15km do Centro; Conceição, a 33 km; e Estevão, a 10km. 

Audiência Pública realizada na última segunda-feira (15) teve como objetivo debater com a população os riscos associados ao método, chamado Fracking, de extração de gás de uma rocha sedimentar específica conhecida como xisto (o xisto pirobetubinoso). Foram analisados casos de países que implementaram a técnica, como Estados Unidos e Argentina, onde o Fracking desocupou cidades e deixou infértil muitos hectares de terra. Nessas localizações, estudos comprovaram aumento de casos de doenças respiratórias, cardiovasculares, abortos, má-formação de fetos e cânceres raros. 

Para Juliano Araújo, diretor-presidente do Instituto Internacional Arayara, o Fracking em Alagoinhas comprometeria não apenas “os 169 poços artesianos da cidade que abastecem com água casas e instituições de serviço importantes como hospitais e escolhas”, mas todo o lençol freático que muni com água subterrânea a indústria cervejeira, de bebidas e alimentícia local. 

Segundo últimos dados do IBGE, Alagoinhas é o 15º maior PIB da Bahia, de uma lista de 417 municípios. A indústria alimentícia produziu, em 2022, aproximadamente 25 toneladas de produtos agrícolas, enquanto a indústria de bebidas produziu 1 bilhão e meio de litros de produtos, em 2021. “Essa indústria representa 30, 40% da arrecadação do município”, alerta Juliano, analisando os impactos econômicos do Fracking, para além das questões socioambientais. “Não vale a pena. Começa-se a explorar; 4 anos depois, terminou a exploração, e a cidade fica com os rejeitos tóxicos por dezenas de anos; no caso dos radioativos, centenas de anos.”

 O Fracking e a indústria do Petróleo e Gás no Brasil 

Em sua fala na mesa da Audiência, Rodivaldo Costa, conselheiro da Petrobrás e Representante do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria do Petróleo (SINDIPETRO/BA), destacou a importância do setor para a economia da Bahia, que produz 35 mil barris de petróleo por dia, mas não defende o uso do fracking para a extração de combustível. “A gente ainda tem outros métodos e técnicas que podem ser desenvolvidas na indústria de Petróleo e Gás que podem gerar emprego, aumentar a arrecadação dos municípios. Mas vejo que o fraturamento hidráulico não é a melhor alternativa para a gente produzir os empregos que precisa. A indústria de Petróleo e Gás não precisa pagar esse preço tão caro”, afirmou.

No fim de 2023, o vereador Thor de Ninha (PT), autor da Audiência Pública em Alagoinhas, apresentou na Câmara Municipal o Projeto de Lei 107/2023, que proíbe a técnica do Fracking na cidade. Mas tanto gestores quanto moradores presentes na Audiência entendem a importância de se promover ações de conscientização sobre o tema também nos municípios vizinhos, pois a contaminação ambiental promovida por um poço de fracking não se restringe aos limites geográficos do local onde fora instalado. 

Benedito Vieira, presidente do Sindicato dos Empresários de Alagoinhas, destacou: “Ora, se nós criarmos uma lei municipal proibindo essa ação, mas houver uma lei estadual que permita? É muito importante esse alerta. Devemos unir forças para que isso não aconteça na Bahia, quiça no Brasil”. O presidente do sindicato dos empresários ainda indagou: “Saio daqui com um aprendizado que não sei se o período escolar me ensinou tanto; sou tecnólogo em gestão ambiental. Mas saio também com uma decepção. Como é que a Petrobrás ou a ANP autoriza fazer isso, cabendo a gente a reagir?”.

Em âmbito federal, já existe um Projeto de Lei que determina a proibição de exploração de gás via fraturação hidráulica no Brasil. Para ser aprovado, projeto precisa passar primeiro pelas Comissões responsáveis e ser apreciado, antes de ser encaminhado à Presidência da República. Enquanto isso, Agência Nacional do Petróleo e Gás (ANP) é quem normatiza ou não o uso da técnica, que ainda não foi implementada no Brasil.

Em Brasília, o deputado federal Jorge Solla (PT) é um dos articuladores da campanha Anti-Fracking. Compondo a mesa da Audiência Pública, Jorge Solla falou ao município da Bahia, estado que o elegeu: “Já está acontecendo? Pelo menos a concessão já foi dada, pela ANP. Se não começou, melhor ainda porque podemos nos antecipar. Se já começou, ainda temos como impedir que isso prospere. Mais do que nunca é um momento para nos debruçarmos sobre o assunto”.

Arayara e COESUS na luta contra o Fracking 

Há 12 anos a Coalizão Não Fracking Brasil, junto ao Instituto Internacional Arayara, trabalha para divulgar informações e debater com a população brasileira sobre os perigos desta técnica para o meio ambiente e à saúde das pessoas. 

Participação na Audiência Pública em Alagoinha é a primeira de uma série de mobilizações da Coalizão Não Fracking Brasil previstas para acontecer no estado da Bahia ao longo deste mês. Além de Alagoinhas, 58 outros municípios baianos correm risco caso o fraturamento hidráulico seja implementado para a extração de gás, impactando gravemente a saúde e a economia local. 

 

A Audiência Pública em Alagoinha está disponível na íntegra aqui:

Arayara se une mais uma vez à Caçapava na luta contra a instalação da maior termoelétrica da América Latina

Arayara se une mais uma vez à Caçapava na luta contra a instalação da maior termoelétrica da América Latina

Na última sexta-feira, 15 de março, a Câmara Municipal de Caçapava sediou mais uma Audiência Pública com o objetivo de dialogar com a população local os impactos da possível instalação de uma usina termoelétrica movida à “gás natural” na cidade, localizada na região metropolitana do Vale do Paraíba, em São Paulo.

 

A Audiência Pública em Caçapava foi solicitada pelas Frentes Parlamentares Ambientalistas da União e do estado de São Paulo, via seus representantes políticos. Do poder legislativo, estiveram presentes a vereadora Dandara Gissoni (PSD), a deputada estadual Mariana Souza (Bancada feminista do PSOL), a deputada estadual Marina Helou (Rede) e o deputado federal Nilto Tatto (PT).

 

Desde 2022, a população da cidade de Caçapava se une na tentativa de impedir a instalação da Usina Termoelétrica São Paulo, um empreendimento da empresa Natural Energia. Com capacidade de geração de 1,743 GW de energia, a termoelétrica se qualificaria como a maior termoelétrica da América Latina e, segundo pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), se instalada, a usina causaria o maior impacto ambiental da região desde a década de 1970. 

Participaram da Audiência  autoridades técnicas convidadas, entre  elas  representantes do Instituto Internacional Arayara, do Instituto de Defesa do Consumidor (IDEC) e do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), como também representantes da Frente Ambientalista do Vale do Paraíba, da organização EcoVital e do movimento social Banhado Resiste, de São José dos Campos.

 

Termoelétricas, combustíveis fósseis e conta de luz mais cara

Sendo as usinas hidrelétricas a principal fonte de energia atualmente no Brasil, cenários de estiagem e baixo nível de água, agravados com as mudanças climáticas, levam ao acionamento de usinas termoelétricas movidas a metano (CH4), popularmente conhecido como “gás natural”, 80 vezes mais agressivo do que o gás carbônico (CO2) no que tange ao efeito estufa. Por ser uma produção de energia mais cara, a conta final para o consumidor também encarece.

“Toda vez que se muda a bandeira tarifária aumenta o preço da energia e  isso acontece quando se aciona o funcionamento das Termoelétricas. As Audiências Públicas são importantes para a gente se apropriar das informações sobre energia. Essa mobilização precisa ser encampada pela população de Caçapava e de todo o Vale do Paraíba, e que todos entendam  que vai haver consequências ambiental e na saúde das pessoas se for instalada a Termoelétrica”, relatou o deputado federal Nilto Tatto (PT).

Wilson Cabral, representante do ITA, destacou o fato de que no Estudo de Impacto Ambiental (EIA) do mega projeto, o que se pede é um licenciamento para a usina funcionar em tempo integral, uma operação full. “Seriam 365 dias por ano extraindo um montante enorme de água e emitindo poluentes atmosféricos em retorno”, disse.

O próprio funcionamento de uma termoelétrica, ativada em situações de baixa potência das hidrelétricas, também agrava o estresse hídrico ao demandar grande quantidade de água para sua produção. Em Caçapava, a bacia hidrográfica que abastece a cidade é a do Alto do Paraíba do Sul, que também abastece outras regiões de grande densidade demográfica, como a baixada fluminense, no Rio de Janeiro. Todas essas localidades já enfrentam dificuldades de abastecimento de água ainda em um cenário sem a Termoelétrica São Paulo.

Falando na sessão, um morador da cidade explicitou o risco de falta de água que a população ficará exposta se o empreendimento for adiante.  “Eles vão instalar em nossas nascentes 4 poços de 80 metros de profundidade, que competirão com nossos poços de 12 metros de profundidade que abastecem as pessoas de nossa comunidade. Vai faltar água!”, alardeou.

Segundo Raquel Henrique, da ong EcoVital, “quem vai sentir mais os impactos do megaempreendimento são os produtores do entorno, que vão perceber que a água vai diminuir para a sua lavoura; os pecuaristas vão tirar menos leite; os animais endêmicos de todas as Unidades de Conservação vão começar a sofrer… Tudo isso, em cadeia, vai degradando a nossa qualidade de vida enquanto coletivo. Fora o impacto direto em nossa saúde”.

 

Royalties, perda de empregos e passivos ambientais

A região de Caçapava já sediou outras lutas ambientais em sua história, como a luta contra o chumbo e contra outra tentativa de instalação de uma usina termoelétrica na cidade. Segundo a vereadora Dandara Gissoni (PSD), a principal articuladora na Câmara de Caçapava contra a instalação da Usina Termoelétrica São Paulo, a cidade já é herdeira de vários passivos ambientais, e não quer como herança mais um “que vai prejudicar nossa saúde, nossos netos, o meio ambiente”.

Como participante da delegação brasileira na última Conferência das Partes das Nações Unidas em Dubai, a COP 28, a vereadora destacou o fato de internacionalmente Caçapava já ser conhecida. “Quando vou à Brasília ou à Alesp, poucas pessoas sabem onde fica Caçapava, mas muitas autoridades que estiveram na COP em Dubai sabiam, porém usam a cidade como exemplo para tratar de danos ambientais, como se já fosse uma causa ganha a instalação dessa Termoelétrica”, lamentou. “Por isso aproveito essa oportunidade para pedir aos deputados da base aliada do governo Lula que lutem para impedir esse empreendimento, pois não só prejudica nossa cidade como todo o país, indo na contramão do mundo e de todos os protocolos internacionais do clima nos quais o Brasil é signatário.”

 

O que dizem as empresas?

Uma das máximas usadas pelas empresas para justificar a instalação de mega empreendimentos como a UTE-São Paulo é  a da geração de empregos. Mas, segundo Wilson Cabral (ITA), o número é ínfimo: “São em média 40 empregos gerados por um complexo de termoelétrica, ao passo que se pode gerar desemprego, no caso do turismo. Quando você polui uma região, o turismo perde com isso”, aponta. Ainda segundo o especialista, “sim, a prefeitura recebe royalties relacionados a essa exploração, mas os royalties não pagam o prejuízo ambiental que a cidade, direta ou indiretamente, terá”. 

Em sua fala na sessão, o Instituto de Defesa do Consumidor (IDEC), representado pela gerente de Programas e Projetos, Georgia Carapetkov, destacou que Caçapava enfrenta clássico caso de racismo ambiental: “Quais serão as pessoas que sofrerão mais pela falta de água? Pessoas da classe média alta ou as mais vulnerabilizadas? Mais uma vez os mais pobres pagando a conta, ao invés desta conta ser dividida.”

 

Acordos ambientais e transição energética justa no Brasil

Lutando no caso ao lado das organizações e movimentos sociais da Frente Ambientalista do Vale do Paraíba, o Instituto Internacional Arayara realizou um estudo sobre os impactos socioambientais que a usina traria à região. Segundo o estudo, a operação plena da UTE-São Paulo geraria algo em torno de 6 milhões de toneladas de CO2 equivalente por ano. Em sua fala na Audiência Pública em Caçapava, Urias de Moura, engenheiro ambiental do Instituto, destacou que “esse valor é 2 mil vezes maior do que a maior emissão já gerada por toda a cidade de Caçapava no período entre 2000 e 2022”.

Arayara reafirma seu posicionamento contra à instalação de mais usinas termoelétricas a “gás natural”, pois acredita que isso pode ocasionar uma dependência prolongada dessa fonte de energia, quando o Brasil poderia estar diversificando sua matriz energética e incentivando mais a produção via fontes renováveis. Ainda segundo Urias, “investir em energia renovável pode alavancar a economia brasileira, gerando mais empregos e modernizando estruturas de produção e distribuição antigas”.

Em fevereiro deste ano, a Arayara integrou a Ação Civil Pública (ACP) contra o empreendimento, como amicus curie no processo movido pelo Ministério Público Federal (MPF). A ação apontou falhas da empresa em sua tentativa de adquirir o licenciamento ambiental do projeto. O Juiz da 3ª Vara Federal de São José dos Campos concedeu liminar favorável ao pedido e o licenciamento ambiental está atualmente suspenso.

 

 

 


Crédito das Fotos:  Douglas F. – Frente Ambientalista do Vale SP