Empresa descumpriu prazo para início da operação das UTEs contratadas em leilão emergencial e quer se eximir de responsabilidade e sanções junto à Aneel
Mais de 20 organizações da sociedade civil com atuação direta junto ao setor de energia se manifestaram a favor da manutenção das penalidades e da rescisão dos contratos com a Karpowership Brasil por descumprimento das regras do edital do leilão de energia de reserva, realizado em outubro de 2021. As usinas termelétricas da licitação emergencial – justificada pela crise hídrica – deveriam ter entrado em operação no dia 1.º de maio de 2022, sob pena de pesadas multas por atraso e de rescisão contratual, caso o prazo não fosse atendido.
A manifestação das organizações ocorre em paralelo à análise pela diretoria colegiada da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) do requerimento administrativo interposto pela Karpowership Brasil, solicitando o reconhecimento de excludente de responsabilidade pelo descumprimento de cronograma de implantação das UTEs Karkey 13, Karkey 19, Porsud I e Porsud II, que estão sendo instaladas na Baía de Sepetiba, no Rio de Janeiro. O tema está na pauta da reunião ordinária da Aneel desta terça-feira (9/8).
No dia 26 de julho, a diretoria da Aneel negou pedido semelhante feito pela Termelétrica Viana S.A. (Tevisa), que requeria excludente de responsabilidade pelo atraso na implantação da UTE Viana I.
Em carta aberta dirigida ao ministro de Minas e Energia, Adolfo Sachsida, as instituições apontam que isentar a Karpowership do cumprimento das regras do leilão e de normas que regulamentam o setor elétrico violaria o princípio de isonomia. Ou seja, o regramento deve ser respeitado por todas as empresas do setor e o tratamento dado a essas concessionárias deve ser igualitário. Outro ponto levantado é o contrassenso de prorrogar prazo para um empreendimento contratado sob regime de urgência.
Por conta da relevância ecológica da Baía de Sepetiba, que é circundada de áreas de proteção ambiental e reúne cerca de 3,5 mil pescadores artesanais, há ações judiciais e administrativas questionando o empreendimento da Karpowership que, em um primeiro momento foi desobrigado, mas por decisão da Justiça Estadual do Rio de Janeiro, terá que apresentar estudos de impacto ambiental (EIA-RIMA). Foi determinada, ainda, a suspensão das obras de instalação das UTEs, que funcionam sobre embarcações.
Íntegra da carta aberta:
Brasília, 8 de agosto de 2022.
Ao Sr. Ministro de Minas e Energia,
Adolfo Sachsida
As organizações da sociedade civil vêm por meio da presente carta solicitar ao Sr. Ministro de Minas e Energia, Adolfo Sachsida, a manutenção das penalidades e a rescisão dos contratos com a Karpowership Brasil por descumprimento de prazos e regras do edital do leilão de energia de reserva, realizado em outubro de 2021. As usinas termelétricas do leilão emergencial deveriam ter entrado em operação no dia 1.º de maio de 2022, sob pena de rescisão contratual caso o prazo não fosse atendido.
A KPS ingressou com pedido de “excludente de responsabilidade” para se eximir de qualquer sanção e dar continuidade à instalação do empreendimento. O referido pedido será analisado na reunião ordinária da Agência Nacional de Energia Elétrica – Aneel, que ocorre nesta terça-feira, 9 de agosto. Entendemos que a ANEEL não pode modificar as regras gerais estabelecidas pela MP 1.055 e Portaria nº 24/MME. Qualquer decisão que não seja a aplicação das penalidades e a rescisão dos contratos viola diretamente as determinações desses dispositivos.
Além de ferir as normas, que devem ser iguais para todas as empresas do setor elétrico, uma eventual prorrogação no prazo para a KPS iniciar a operação das termelétricas seria um contrassenso em relação à alegada emergência energética, que foi a justificativa apresentada pelo Governo Federal para realizar o Procedimento Competitivo Simplificado (PCS). O próprio edital previa multa por atraso na entrada em operação comercial, justamente, em razão da suposta urgência.
Vale destacar que todas justificativas apresentadas pela KPS para requerer o excludente de responsabilidade se pautam em situações inerentes aos riscos empresariais, de relacionamento com fornecedores/parceiros comerciais, que são problemas exclusivos da empresa. Ao solicitar a exclusão de responsabilidade, a KPS tenta transferir a culpa a terceiros.
Apontamos como descabida, também, a alegação da KPS de que houve demora na expedição das licenças e autorizações necessárias pelos órgãos ambientais, pois o que se observou, na verdade, foi justamente o contrário: uma celeridade no processo de licenciamento nunca antes vista, mesmo com todas as falhas na realização de estudos, consultas prévias à população e descumprimento de prazos estabelecidos pelo órgão ambiental (INEA).
Para complementar o que foi exposto, a empresa sempre soube da necessidade de apresentar EIA/RIMA para a instalação das UTEs na Baía de Sepetiba (por conta da existência de sentença transitada em julgado na ACP nº 0031558-46.2004.8.19.0001) e mesmo assim pediu sua inexigibilidade, o que foi acatado pelo órgão ambiental e posteriormente revertido pela Justiça Estadual do Rio de Janeiro.
Assinam:
ARAYARA.org
Associação Alternativa Terrazul
Associação Brasileira dos Geradores e Investidores em Energia da Biomassa
ABIESOL – Associação Brasileira dos Investidores em Energia Solar
ABUEEL – Associação Brasileira dos Usuários Domésticos de Energia Elétrica
APRINE – Associação Paranaense dos Produtores Independentes de Energia Elétrica
ASPINE – Associação Paulista dos Produtores Independentes de Energia Elétrica
Cáritas
Ceará no Clima
ClimaInfo
COESUS – Coalizão Não Fracking Brasil pelo Clima, Água e Vida
CONFREM – Comissão Nacional de Fortalecimento das Reservas Extrativistas Costeiras e Marinhas
Fé, Paz e Clima
Fórum de Pescadores em Defesa da Baía de Sepetiba
Frente Nacional dos Consumidores de Energia
Fundación ARAYARA
Futuro Zero Carbono
IBC – Instituto Boto Cinza
IDEC – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor
IEMA – Instituto de Energia e Meio Ambiente
iCS – Instituto Clima e Sociedade
INESC – Instituto de Estudos Socieconômicos
Instituto Pólis
Instituto Verdeluz
Oceana Brasil
OCM – Observatório do Carvão Mineral
OPG – Observatório do Petróleo e Gás
Reapi – Rede Ambientalista do Piauí
Rede Grumin de Mulheres Indígenas