Por Profa. Dra. Olga Falceto
Professora aposentada da Faculdade de Medicina da UFRGS
Coordenadora de Ensino do Instituto da Família
Sou médica e professora universitária. Sou avó de 7 netos. Por eles e pelas outras crianças tenho extrema preocupação com as mudanças climáticas que já aumentaram em mais de um grau a temperatura média mundial. Em Porto Alegre nos últimos dez anos cada verão vimos sentindo uma novidade: o efeito de pequenos ciclones. Recém tivemos novamente essa experiência.
Já está bem estabelecido que temperaturas extremas afetam a saúde de forma intensa: aumentam as mortes de velhos e crianças, os suicídios e surtos, as brigas e a violência.
O impacto é ainda mais grave quando se examina a poluição do ar. O material particulado 2.5 (PM 2.5), tão pequeno que não pode ser visualizado, penetra nos pulmões e na corrente sanguínea e causa morte em populações mais sensíveis com risco pulmonar ou cardiovascular. Também causa doenças crônicas, inclusive câncer. Seu efeito está bem documentado com evidencias na literatura médica.
Poluição do ar e aumento da temperatura se combinam no chamado efeito estufa que aumenta o teor de CO2 e outros gases a ponto que, em países como a China, com frequência é necessário usar máscaras para sair à rua.
Poluição do ar e aumento da temperatura são resultado de fábricas, meios de transporte e mineração entre outros. Trazem também o envenenamento do solo e da água pelos químicos que eliminam.
Os países avançados já decidiram que em 50 anos ou menos só usarão energia limpa renovável. Mesmo a China está diminuindo todos os poluentes e em especial diminuindo o uso de carvão mineral que era fundamental em sua indústria.
E qual a consequência dessas decisões? Estão querendo transferir para nós essa produção, são grandes financiadores da Mina Guaíba que está querendo se instalar em Charqueadas e Eldorado do Sul.
Essa mina em seus 23 anos de exploração explodirá nosso solo com a potência de 2 bombas de Hiroshima. Serão muitas explosões por dia para extrair o carvão mineral. E para onde irá o pó, já que ela estará situada a apenas 16 km do centro de Porto Alegre?
Afora isso, a mineradora não detalhou no EIA-RIMA a composição do carvão mineral da área, sabidamente uma compactação ao longo dos tempos, de quase todos os elementos químicos da tabela periódica, inclusive os mais tóxicos e radioativos. Estes provavelmente serão lavados para dentro do rio Jacuí em uma de suas muitas inundações, afetando a nossa água do Lago Guaíba.
Também planejam esgotar o aquífero subjacente à área para chegar ao carvão e com isso acabarão com potencial reserva de água para Porto Alegre e prejudicarão toda a agricultura e pecuária ao redor. Além disso comprometerão a fauna e flora do Parque Estadual do Jacuí que serve de filtro natural de nossa água.
Todos esses fatores afetarão a saúde dos habitantes da região metropolitana de Porto Alegre, mas o mais agudo e diário é sem dúvida o nível de PM 2.5 no ar que já é de risco moderado em alguns dias conforme mostram os monitores de poluição do ar colocados em 5 unidades básicas de saúde da cidade pelo grupo Porto Ar Alegre.
As mudanças climáticas já estão prejudicando a saúde de crianças no mundo todo e vão determinar o bem-estar da próxima geração, a menos que o mundo cumpra as metas do Acordo de Paris de limitar o aquecimento a abaixo de 2 °C. O novo paradigma em saúde, a Saúde Planetária (para além da saúde pública e saúde global) chama a uma reestruturação radical de nossa forma de produzir e consumir. Está centrado na ideia de pensar global e agir localmente. A poluição do ar já existente em Porto Alegre e os riscos trazidos pela mina de carvão mineral Guaíba que quer se instalar aqui ao lado são dois importantes problemas a enfrentar. A saúde da região está em risco. E quem quererá morar na cidade coberta de pó escuro em que vamos nos transformar?