A Justiça Federal, através da 9ª Vara Federal de Porto Alegre, determinou nesta sexta-feira, 21, a suspensão imediata do processo de licenciamento ambiental do projeto Mina Guaíba. Segundo a juíza Clarides Rahmeier, que concedeu a liminar, os procedimentos só poderão seguir após análise conclusiva pela Fundação Nacional do Índio (Funai) do componente indígena. A liminar atende à solicitação feita através de Ação Civil Pública movida pelo Instituto Internacional Arayara que, com seus técnicos e advogados balizaram os erros cometidos pela Copelmi e Fepam, e pela Associação Indígena Poty Guarani, protocolada em outubro de 2019. A ACP tem o apoio e a participação da 350.org e do Observatório do Carvão Mineral.
O Estudo e o Relatório de Impacto Ambiental (EIA-RIMA) do projeto ignorou a presença de aldeias indígenas na área diretamente afetada pela mina Guaíba. O erro foi cometido tanto pelo órgão ambiental licenciador, Fepam, quanto pelo empreendedor, Copelmi. A legislação vigente é muito clara e objetiva: os licenciamentos devem ter consulta prévia, livre e informada dos povos indígenas e tradicionais. No caso da mina Guaíba, foram excluídos os indígenas da Aldeia (TeKoá) Guajayvi.
A Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) afirma que sempre que uma medida ou ato administrativo ou legislativo do Estado possa ocasionar dano ou ameaça de dano a direitos, o povo afetado deve ser consultado previamente para oferecer seu consentimento. A OIT 169 determina, no artigo 6°, que os povos devem ser consultados mediante procedimentos apropriados através de suas instituições representativas. Completa o artigo que a consulta há de ser feita de boa-fé.
Além de não terem sido consultados, os indígenas da Aldeia Guajayvi podem ser removidos à força. Além disso, caso a mina seja licenciada, eles teriam conviver com explosões e abalos sísmicos diuturnamente, durante cerca de 30 anos; com emissões de gases tóxicos e contaminantes na atmosfera; respirariam materiais particulados carregados de mercúrio; conviveriam com alterações e degradação toda a paisagem cênica do entorno de seu território; haveria dificuldades de obtenção de água potável e de qualidade. Ou seja, mazelas irreparáveis e incontroláveis permeariam a vida na aldeia.
O projeto de mineração de carvão, areia e cascalho, localizado nos municípios de Eldorado do Sul e Charqueadas, apresenta sérios riscos aos indígenas e a mais de 4,5 milhões de pessoas que vivem no entorno, incluindo Porto Alegre e região metropolitana.
A juíza que concedeu a liminar salientou que “o componente indígena deve ser incluído no Estudo de Impacto Ambiental e respectivo Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima), antes de eventual emissão de Licença Prévia pela Fundação de Proteção Ambiental (Fepam)”. Cabe recurso da decisão ao TRF4.
Intimado, o Ministério Público Federal (MPF) manifestou-se favoravelmente ao pedido da liminar. Disse o Procurador da República, Pedro Nicolau Moura Sacco, em seu despacho: “Sem qualquer contato com os indígenas, tampouco houve algum movimento por parte da FEPAM e da Copelmi no sentido da realização da consulta prévia da Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho sobre direitos dos povos indígenas e tribais”.
Renan Andrade, gestor ambiental da 350.org que atua no Rio Grande do Sul, considera a concessão da liminar uma vitória importante. “Essa é uma vitória da justiça, das leis e dos povos indígenas. A mina Guaíba, se instalada, será um verdadeiro desastre e colocará em risco a vida de mais de 4,5 milhões de pessoas, seja pela exposição ao material particulado 2.5 (pm 2.5), seja pelos materiais cancerígenos que são liberados com a exploração do carvão. Seguiremos na batalha para impedir a implantação desse desastre chamado mina Guaíba”, disse.
Para Juliano Bueno de Araújo, diretor de campanhas da 350.org, da Arayara e do Observatório do Carvão Mineral “os indígenas que vivem na região já estão sendo afetados pela Mina Guaíba, quando os responsáveis pelo projeto tentam apagar sua existência e passar por cima da consulta obrigatória que deveriam fazer, mas a comunidade não vai deixar que isso aconteça”.
Já Nicole Oliveira, diretora da 350.org na América Latina, da Arayara e do Observatório do Carvão Mineral, refletiu sobre os impactos da mina: “Apesar dos alertas de diversos pesquisadores sobre os efeitos negativos da mina e de a população dizer ‘não’ ao projeto, a Copelmi insiste em levar adiante esse projeto falido” .