O pescador e defensor climático Alexandre Anderson enfrentou uma situação de alto risco na última semana. Seu irmão, Anísio Souza foi executado a menos de mil metros de sua casa na quinta-feira, 12, em Magé, na baixada Fluminense. Ao saber do crime, Alexandre procurou imediatamente contato com o Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos (PPDH). Esperou mais de 9 horas para obter o primeiro retorno.
“Estamos chocados. Ficamos sem escolta. Expostos. Passaram duas viaturas em frente às nossas casas, mas sequer pararam. Estamos permanentemente em risco”, relatou Alexandre Anderson, atual presidente da AHOMAR (Associação Homens e Mulheres do Mar da Baía de Guanabara), organização comunitária que trabalha pela garantia dos interesses dos pescadores, incluindo os direitos a pescar nas áreas permitidas por lei sem sofrer intimidações e de seguir denunciando a poluição causada por empresas dos setor fóssil.
Alexandre Anderson enfrenta uma constante luta contra os incorporadores de terras, os interesses corporativos e as autoridades governamentais. Em função de seu ativismo, foi vítima de dois atentados. Outros membros da AHOMAR já foram assassinados.
Em fevereiro de 2020, ele participou de um encontro de Defensores Climáticos que aconteceu em Curitiba. Ao lado de Alexandre, estiveram presentes na capital paraense defensores climáticos de mais de 20 países de todos os continentes.
Diante desse passado recente a demora no atendimento PPDH soa ainda mais preocupante.
O crime
No início da noite de quinta-feira, 12, às 20h, na praia de Mauá, em Magé, o ex-pescador artesanal Anísio Souza foi executado. Abordado no portão em frente à sua casa, ao chegar do trabalho, com seu filho Cristian, de seis anos de idade, Souza foi alvejado com diversos tiros que atingiram sua cabeça. Segundo testemunhas, os tiros foram disparados por homens encapuzados que estavam em um Onix prata. Aos 47 anos, Anísio Souza deixa esposa e três filhos.
A violência e brutalidade do assassinato chocaram a comunidade pesqueira local. Os relatos dos moradores são de medo, insegurança e ausência do Estado.
Lado a lado os irmãos fizeram, por anos, o necessário enfrentamento pela defesa do meio ambiente e pela manutenção dos territórios pesqueiros.
Representantes das pescadoras e das marisqueiras criticaram a falta de apoio a todos os profissionais da cadeia da pesca afetados com o derramamento de petróleo no litoral brasileiro em 2019. Diana Maia, educadora do Conselho Pastoral dos Pescadores do Ceará, e Maria Eliene Pereira, da Articulação Nacional das Pescadoras, estiveram nesta terça-feira (3) na quinta audiência pública da comissão mista que examina a MP 908/2019, que criou um auxílio provisório aos pescadores.
Diana Maia criticou que a MP não alcança todos os pescadores dos estados afetados, pois o governo federal não tem concedido o registro de pescador profissional (Registro Geral de Atividade Pesqueira – RGP), que comprova a ocupação.
— Há vários anos não são emitidos novos RGPs. Além disso, vários pescadores que possuem o RGP não têm sido relacionados como recebedores ou os créditos não são feitos em suas contas. Como fica a situação dessas pessoas que sustentavam suas famílias com a pesca?
Por sua vez, Maria Eliene Pereira, marisqueira “há dezenas de anos”, denunciou que os manguezais e os estuários não foram afetados apenas pelos dois meses que o auxílio proposto cobre.
— Não sabemos o quanto os efeitos do petróleo perdurarão e poderão afetar a nossa saúde e a saúde de quem consumir o pescado. Nós vendíamos 70 kg de pescados e mariscos por mês e agora só vendemos 5 kg, após o derramamento do petróleo.
Ela frisou que é preciso saber quem foram os culpados pelo derramamento do petróleo. Segundo ela, o governo silenciou sobre o assunto.
A MP 908/2019
O auxílio criado pela MP 908/2019 é de R$ 1.996 (equivalente a dois salários mínimos em 2019) e contempla pescadores domiciliados nos municípios afetados pelo desastre ambiental. De acordo com o Ministério da Agricultura, em torno de 66 mil pescadores artesanais deverão receber o benefício, perfazendo um total de R$ 115,5 milhões em desembolsos.
A comissão mista é presidida pelo deputado Raimundo Costa (PL-BA) e tem o senador Rogério Carvalho (PT-SE) como relator. Foram apresentadas 178 emendas de senadores e deputados. Uma delas inclui no benefício as profissionais marisqueiras, como Maria Eliene, fora do texto enviado pelo governo ao Congresso. Outra emenda aumenta o auxílio para R$ 3.992,00, aproximadamente quatro salários mínimos.
Um pescador foi baleado por uma bala de borracha na cabeça na noite de sábado (8). Edilson Aderaldo Marques Filho estava embarcado com o irmão. Os dois estavam perto de um terminal de gás.
A esposa de Edilson diz que eles foram perseguidos por militares até a Ilha de Paquetá, aos tiros. Ferido, ele teria sido detido e levado para Ilha do Governador.
A Marinha alega que ele invadiu área de segurança militar, próximo à Ilha do Boqueirão em Magé, na Baixada Fluminense, e não atendeu a uma ordem de parada.
A vítima foi levada para o Hospital Adão Pereira Nunes, em Saracuruna. O estado de saúde é estável, segundo a Secretaria de Saúde.
Perguntamos: a defesa das áreas de petróleo e gás justifica violência?
A violência contra ambientalistas, populações indígenas, ribeirinhos e servidores públicos vem se intensificando de forma assustadora. As ameaças e ataques são dirigidos a todos que, de uma forma ou de outra, atuam no combate à grilagem, aos desmatamentos ilegais, à biopirataria, ao genocídio de comunidades indígenas. Não se trata mais de bravatas de um candidato multado ao cometer um ilícito, de um ministro condenado por crime ambiental ameaçando punir servidores por exercerem suas funções ou mesmo de senadores incitando a violência contra agentes públicos através de discursos eleitoreiros e mentirosos. Hoje, qualquer grileiro, jagunço ou mesmo um obscuro autoproclamado “antropólogo de direita” se dá ao direito de confrontar e ameaçar agentes públicos com a “autoridade” a eles concedida pelos discursos oficiais.
Os recentes acontecimentos envolvendo fiscais do Ibama em Roraima e no Pará são claramente resultado de todo esse processo. Entidades públicas como o Ibama, ICMBio e Funai são justamente aquelas que, em função de suas atribuições, se colocam como empecilho aos interesses de grupos econômicos interessados apenas no lucro fácil e imediato, mesmo que isto signifique a destruição da floresta, a contaminação das águas e a violência contra comunidades indígenas e outras populações tradicionais.
No dia 23/01, a Ascema Nacional emitiu uma nota de repúdio às declarações de um senador do Estado do Pará que se referia aos agentes ambientais federais do Ibama como “servidores bandidos e malandros”. Esclarecemos na oportunidade que a ação que originou a acusação tinha o objetivo de coibir a invasão de terras com restrições legais para sua ocupação, já bastante degradada. Mesmo com tais esclarecimentos, nenhuma autoridade se deu ao trabalho de rever suas afirmações.
Uma semana depois, em 31/01, uma pessoa foi morta durante uma operação de combate ao desmatamento em Rorainópolis/RR. Lamentável e triste! Ninguém pode aceitar que situações como essas continuem ocorrendo. Não é admissível, entretanto, a utilização dessa tragédia para alimentar discursos eleitoreiros e mentirosos com o claro objetivo de inviabilizar a atuação dos órgãos ambientais na região. Qual o interesse escondido por trás das acusações feitas ao Ibama quando todos os envolvidos tinham conhecimento do que de fato ocorreu? Porque a pressa de autoridades públicas, e até mesmo da Centro das Indústrias do Pará, em apontar o dedo para o Ibama?
Mais recentemente, no dia 16/02, nova tentativa de intimidação e “carteirada” perpetrada por um cidadão que, mesmo sem vínculos com nenhum órgão público, sem nenhuma autoridade formal sobre os servidores, tenta intimidar e inviabilizar a ação de fiscais argumentando que lá estava “para fazer cumprir a ordem ministerial do senhor ministro Ricardo Salles com o qual me encontrei na última terça-feira, dia 11 de fevereiro (…)”. Esse senhor que é tão somente professor de uma faculdade evangélica privada do interior do estado de Goiás, sentiu-se autorizado a ameaçar e tentar inviabilizar a ação de agentes federais no combate à grilagem e ao desmatamento.
Todas essas situações são indubitavelmente o resultado de, no mínimo, um ano de ataques das mais altas autoridades do país que tentam desconstruir o papel exercido pelos trabalhadores da área ambiental como representantes do Estado brasileiro e enfraquecer as instituições e a legislação ambiental existentes, sempre utilizando um clima hostil e persecutório em relação aos servidores. Chegamos a uma situação inusitada em que se invertem os fatos, colocando infratores ambientais, jagunços, grileiros como “cidadãos de bem” e servidores públicos como se fossem “bandidos”, “criminosos” ou “parasitas”. Uma situação que pode levar a novas tragédias, posto que são incentivadas e legitimadas por autoridades constituídas, sob um silencio ensurdecedor de parte da sociedade!
Reiteramos nossa inconformidade e indignação frente às atitudes dessas autoridades que têm nos atacado.
Exigimos o fim desses ataques e ameaças e conclamamos toda a sociedade brasileira a refletir:
A QUEM SERVEM ESSAS PESSOAS QUE INCITAM O CRIME AMBIENTAL, A GRILAGEM E
Em outubro, durante o maior vazamento de óleo da história do Brasil, uma foto correu o mundo pelo impacto que gerou. O registro, feito pelo fotógrafo pernambucano Léo Malafaia, trazia Everton Miguel dos Anjos, de apenas 13 anos de idade, saindo do mar coberto de óleo. O menino queria ajudar a mãe, que trabalhava em um quiosque na beira da praia de Itapuama, no Cabo de Santo Agostinho. Essa e outras duas fotos de Léo foram levadas pela Arayara, 350.org e COESUS para uma exposição que as entidades promovem na Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2019 (COP-25), que acontece em Madri (Espanha). Confira, a seguir, um pouco do sentimento de Malafaia sobre o vazamento e seus registros.
Como foi o teu primeiro contato com as praias sujas pelo óleo? E quais praias tu fotografaste? Estava a serviço da Folha de Pernambuco. O primeiro contato foi o mais intenso, primeiro pelo volume de óleo que chegou nas praias, e, segundo, pela presença massiva de voluntários trabalhando. Isso aconteceu no dia 21 de outubro, nas praias do Paiva, Itapuama e Pedra do Xaréu. Retornei para essas mesmas praias no dia 22, para acompanhar a chegada da Marinha e do Exército. Esperava-se uma quantidade razoável de agentes, porém, encontramos 60 homens, o equivalente a 1,2% do efetivo disponibilizado pelo presidente em exercício, Hamilton Mourão, que era de 5.000. No dia 23, o óleo chegou na Praia do Janga, em Paulista/PE. Foi quando percebi os sintomas relatados por tantos outros voluntários: dor de cabeça, tontura e náuseas. Fiquei pouco tempo no Janga, mas a situação era muito semelhante a que encontrei no litoral sul. Além de Pernambuco, fotografei as praias de Maragogi e Japaratinga, no estado de Alagoas.
Falaste que as praias pareciam um cenário de guerra. O que viste por lá? Tinha poder público, ONGs, voluntários, imprensa? Era muito similar ao que assistimos em filmes, e, em cenas de guerra. Havia uma presença do estado, mas esta era ínfima e desencontrada. Isso porque não havia um protocolo a ser seguido. Da mesma forma, não havia informações suficientes e equipamentos de proteção adequados. O que vi foi um número muito grande de voluntários, moradores locais e de ONGs atuando onde o poder público deveria atuar.
O que as pessoas que estavam lá ajudando a limpar as praias relatavam? De modo geral, o sentimento era de revolta. As pessoas não estavam com medo da contaminação e, acredito, naquele momento, não se pensava muito nisso. O desejo maior era o de limpar, ao menos, superficialmente o local onde muitos de nós, pernambucanos, crescemos. É a nossa história manchada de óleo e fomos nós, pernambucanos e nordestinos, que nos arriscamos e tentamos limpar sujeira do mar, no braço.
Qual a situação, hoje, nos locais afetados pelo vazamento de óleo? À época do incidente, e não por acaso, o governo federal correu para anunciar que o litoral estava seguro. E de fato, por um tempo, as declarações surtiram efeito. Mas diferente de alguns meses atrás, o que acompanho hoje é a crescente preocupação com a contaminação das praias e do pescado. Naturalmente, o consumo de frutos do mar caiu e já é possível, também, sentir uma queda no turismo. Em novembro, amostras de peixes apresentaram níveis de contaminação por óleo. Resta, infelizmente, esperar para ver o que o futuro nos reserva.
Qual a foto tua que mais acreditas que mostre o que de fato aconteceu? A foto de Everton, sem dúvida, sintetiza bem o drama social e ambiental que o nordeste enfrenta. É o retrato do descaso, recorrente, dos governos com a nossa gente.
Acredito que estas fotografias estão carregadas com a força necessária para permitir que o esforço e, sobretudo, o risco assumido por tanta gente, não tenha sido em vão.
A foto do Everton correu o mundo e virou pauta na imprensa do Brasil e do mundo. Quando fizeste aquela foto, qual a tua sensação? O que pensaste ao olhar aquela cena, aquele menino saindo do mar coberto de óleo? Acima de tudo, é uma criança. Era o dever maior do Estado zelar por sua segurança e seu bem-estar. Mas não foi o que aconteceu. Assim como ele, havia outras tantas espalhadas pelas praias que fotografei, e, certamente, em outras praias do nordeste, lutando para salvar o seu sustento e o sustento da sua família. Everton representou – para mim – voluntários, pescadores e moradores, numa fotografia e imagem longe da que – até então – era romantizada pelos brasileiros nas redes sociais. Ela é, sim, um retrato cruel do que a falta de políticas públicas voltadas para o meio ambiente pode causar.
Acreditas que a imprensa tenha um papel especial em casos de desastres como esse? Queria que falasse um pouco desse papel. Se a história está nos mostrando algo é que casos como: os rompimentos das barragens de Brumadinho e Mariana, as queimadas na Amazônia e o vazamento de petróleo na costa brasileira, não foram desastres naturais. Elas são crimes ambientais. A imprensa tem papel fundamental na exposição dos casos como tal. Além disso, é nosso papel pressionar os responsáveis pelo gerenciamento das crises e pela rápida elucidação dos casos. As pessoas – ainda – nos cobram e aguardam respostas, devemos isso a elas.
E como é ver teu trabalho sendo exposto na COP-25 e retratando o maior vazamento de óleo do Brasil? É imperativa e urgente uma resposta à crise ambiental no Brasil. Toda essa comoção em torno do meu trabalho e do trabalho de outros excelentes fotógrafos nordestinos deve culminar em ações concretas de lideranças políticas. Acredito que estas fotografias estão carregadas com a força necessária para permitir que o esforço e, sobretudo, o risco assumido por tanta gente, não tenha sido em vão.
O derramamento de óleo que atingiu o litoral do Nordeste e do Espírito Santo chegou ao Rio de Janeiro. O Grupo de Acompanhamento e Avaliação (GAA), formado pela Marinha do Brasil (MB), Agência Nacional de Petróleo (ANP) e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), informou por nota, neste sábado, que foram detectados e removidos ontem pequenos fragmentos do material – cerca de 300 gramas – na Praia de Grussaí, em São João da Barra, no litoral norte fluminense.
“O material foi analisado pelo Instituto de Estudo do Mar Almirante Paulo Moreira (IEAPM) e constatado como compatível com o óleo encontrado no litoral da região Nordeste e Espírito Santo”, afirmou o grupo no texto.
No comunicado, a Marinha acrescenta que o Ibama passa a fazer parte da força-tarefa de monitoramento na região. “Um grupamento de militares da MB já se encontra no local efetuando monitoramento e limpeza. Servidores do Ibama se juntarão a essa equipe no dia de hoje sábado, 23.”
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