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Isolamento vertical se mostrou ineficaz e arriscado em outros países, diz médica da Fiocruz

Isolamento vertical se mostrou ineficaz e arriscado em outros países, diz médica da Fiocruz

Por Giulia Afiune, Agência Pública

Em entrevista exclusiva para a Agência Pública, a médica pneumologista, pesquisadora e docente da Fundação Oswaldo Cruz Margareth Dalcolmo afirma que se fizermos um esforço coletivo para um isolamento mais intenso agora, enquanto o número de casos de Covid-19 está crescendo, é possível que possamos começar a sair do isolamento, gradualmente, dentro de 2 ou 3 semanas.

“Neste momento, que é o momento muito agudo dessa epidemia, não há nenhuma outra maneira de impedir a transmissão. Não há nenhuma outra arma”, explica, reiterando que ainda não há nem remédios nem vacinas de eficácia comprovada contra o novo coronavírus. Ela alerta que quebrar o isolamento agora, como propõe o presidente Jair Bolsonaro, pode levar a um colapso do sistema de saúde e provocar mortes que seriam evitadas.

Margareth explicou ainda que manter em casa apenas idosos, o “isolamento vertical” que sugeriu Bolsonaro, foi considerada uma medida ineficaz e perigosa para combater o coronavírus em outros países. “O maior exemplo é a Inglaterra que voltou atrás, verificando que [o isolamento vertical] não ia resolver. Eles voltaram atrás pelo risco que isso incorreria diante de uma doença nova de alta transmissibilidade, cujos riscos não estão completamente determinados. Agora, dada a progressão da epidemia, a Inglaterra está propondo o isolamento mais radical.”

Durante a entrevista, Margareth explicou que já existe um coronavírus “brasileiro”, fruto de mutações do vírus importado. “Como a doença chegou ao Brasil pela classe média, ela é uma doença importada, e a transmissão sustentada ou comunitária começou com um espaço de tempo um pouco maior. Agora vai depender da velocidade com a qual ela vai se espalhar nas comunidades de grande aglomeração. Essa é a variável da qual dependemos agora”.

A entrevista foi realizada com apoio dos Aliados da Agência Pública, que também enviaram perguntas. (Conheça o programa)

Durante algumas semanas, o Ministério da Saúde deu recomendações a favor do distanciamento social e isolamento domiciliar. Agora, teve uma mudança de tom. O presidente está dizendo que “o Brasil não pode parar” e planejando a flexibilização da quarentena a partir do dia 7 de abril. Quais são os riscos do “isolamento vertical” proposto pelo Bolsonaro?

São coisas diferentes. O que o nosso presidente propôs foi uma quebra no isolamento social.

O risco que isso traz é que a doença que já chegou a essas áreas mais vulneráveis e pobres vai se disseminar com uma velocidade fora de controle. Ela vai lotar os serviços de saúde. O SUS, que é quem tem que dar resposta para 80% da população brasileira nessa grande epidemia atual, não tem condições de arcar e nós vamos ver um colapso generalizado, aumentando mais ainda a mortalidade que poderia ser evitada.

Nós estamos falando de um patógeno que é altamente transmissível e transmite com uma velocidade e uma intensidade maior do que a gripe comum. É considerado que uma pessoa pode transmitir para três ou quatro.

Realisticamente, vacina é uma coisa para se pensar para, no mínimo, daqui a dois anos. E da mesma maneira, não temos tratamento. Então assim, a única coisa a fazer, a meu juízo, é manter o isolamento social. Neste momento, que é o momento muito agudo dessa epidemia, não há nenhuma outra maneira de impedir a transmissão.

Então é preciso que nós separemos e isolemos as pessoas para interceptarmos essa cadeia de transmissão. Não há nenhuma outra arma.

Quebrar o isolamento domiciliar agora significa que haverá mortes que poderiam ser evitadas e não serão?

Sim. Mas isso não vai acontecer porque [a voz do presidente] foi uma voz que me pareceu muito isolada. Não é aquilo que foi secundado nem pelo Ministério da Saúde. Nosso Ministro ouviu a comunidade acadêmica, está trabalhando muito próximo de nós, e o Ministério da Saúde, formalmente, continua recomendando isolamento social.

E o que é o isolamento vertical?

Ele [Bolsonaro] está propondo que deixem apenas as pessoas idosas isoladas. Nós não concordamos com isso como medida de saúde pública porque outros países que pensaram em fazê-lo já voltaram atrás – é o que está ocorrendo agora no estado de Nova York.

Estou falando do ponto de vista técnico. Tecnicamente, nós vamos seguir a experiência dos países que nos antecederam e que, inclusive, pensaram em fazer isolamento vertical. E o maior exemplo disso é a Inglaterra que voltou atrás, verificando que [o isolamento vertical] não ia resolver. Eles voltaram atrás pelo risco que isso incorreria diante de uma doença nova de alta transmissibilidade, cujos riscos não estão completamente determinados. Agora, dada a progressão da epidemia, a Inglaterra está propondo o isolamento mais radical.

A economia terá que ter soluções alternativas, obviamente, como todo mundo está buscando, para resolver o problema durante esse período.

O isolamento vertical é muito eficaz quando se trata de uma epidemia menor. Mas numa doença com uma transmissibilidade tão alta quanto essa, é impossível. Os próprios epidemiologistas, grandes pensadores, já reviram essa posição agora. Todo conhecimento diante de uma situação tão nova é muito dinâmico. Tudo é revisto quase que permanentemente.

E o que é a “imunidade por rebanho” que a Inglaterra estava buscando?

A “imunidade por rebanho” significa que nós todos seremos infectados num determinado momento. Nós desenvolveremos anticorpos, teremos contato e não necessariamente desenvolveremos doença.

A imunidade de rebanho acontecerá, é esperado em qualquer doença nova transmissível, só que leva muito tempo. Você faz imunidade por rebanho quando você tem uma vacina, por exemplo. Se está todo mundo vacinado, existe a imunidade de rebanho, sim. Agora, numa doença nova com esse grau de transmissibilidade, nós não podemos ainda falar nisso.

Não está provado que o isolamento vertical gere esse resultado [imunidade por rebanho]. São coisas diferentes e independentes.

O Ministro da Saúde chegou a falar de algumas medidas mais graduais, menos radicais. Você concorda com isso?

Não, eu não concordo. Eu acho que haverá o bom senso dentro das famílias, instituições públicas, instituições privadas que concentram grande número de pessoas. No caso desses serviços considerados essenciais que precisam permanecer funcionando, tem que ter alternativas. Liberação parcial, alternativa de grupos de trabalho, essas são as medidas que eu vejo como sensatas. O resto é o isolamento social, sim.

A pergunta que mais recebemos dos nossos leitores foi: quando isso vai acabar? Vamos por partes: Em que estágio da curva epidemiológica nós estamos hoje?

Nós ainda estamos no estágio de crescimento. A epidemia cresce no Brasil, ela não alcançou o pico da curva epidêmica até o momento. Ela está crescendo, ela está se disseminando e é por isso que o mínimo de tempo previsto para um isolamento social mais radical é de pelo menos mais duas a três semanas, realisticamente falando. Os epidemiologistas calcularam que o pico da curva epidêmica se dê no Brasil até o meio do mês de abril. E, a partir daí, nós imaginamos que com essas medidas possamos começar a suavizar um pouco esse ponto agudo da curva epidêmica.

O Ministro da Saúde falou que o número de casos vai subir em abril, maio e junho, começar a desacelerar em julho e agosto, e cair mesmo em setembro. É por aí ou na Fiocruz vocês trabalham com um cenário diferente?

Depende de várias variáveis, da velocidade de propagação, do número de mortes que vai haver, da paralisação de serviços. Um prognóstico preciso depende de muitas variáveis.

O que significa controlar uma epidemia? É impedir que a propagação em larga escala continue. Eu acho que talvez em dois meses nós consigamos fazer isso e aí a doença passa a ter uma certa endemicidade. Não é mais uma epidemia, já há muita gente infectada desenvolvendo anticorpos, sem desenvolver doença. Esse é o esperado que ocorra.

Eu diria que o Ministro foi até bastante pessimista de imaginar que nós ainda teremos todos esses meses pela frente. Mas a própria China hoje já está monitorando e imaginando que possa haver uma segunda onda. A China não relaxou as normas de isolamento social até o momento. Ela está gradual e muito cuidadosamente fazendo isso porque se sabe, epidemiologicamente, que pode haver uma segunda onda.

Controlar a epidemia não quer dizer que o problema está resolvido. Continua a ter muitos casos, mas o número de mortes começa a diminuir e o impacto social e humano começa a diminuir também.

Já é possível avaliar se o isolamento que muitas pessoas adotaram na última semana teve efeito?

Não, a gente não tem essa informação. A gente não tem essa informação porque o número de casos oficial ainda está muito distante da realidade. Esse processo, esse timing entre o caso existir e ser notificado, ser confirmado, leva muitos dias.

Nós imaginávamos os dois mil casos [atuais], isso deve significar mais ou menos 10% da realidade. Sem dúvida, já deve ter ultrapassado dez vezes esse número no Brasil.

Então vai demorar um pouco até a gente conseguir saber se estamos realmente “achatando a curva”? Há uma previsão?

Certamente essa semana que nós já fizemos de isolamento já diminuiu a velocidade de transmissão. Isso é um fato, não há dúvidas disso. Nós esperávamos ter mais casos do que tivemos.

Como a doença chegou ao Brasil pela classe média, ela é uma doença importada, e a transmissão sustentada ou comunitária começou com um espaço de tempo um pouco maior. Agora, vai depender da velocidade com a qual ela vai se espalhar nas comunidades de grande aglomeração. Essa é a variável da qual dependemos agora.

Se mantermos a lentificação do processo de transmissão, nós conseguiremos que os serviços de saúde estejam preparados para receber os 20% de casos graves que vão exigir internação hospitalar. Caso contrário, nós vamos entrar em colapso como hoje já se verifica numa cidade rica, desenvolvida, com uma infraestrutura espetacular como Nova York. Nova York teve um colapso de serviço de saúde, um número de mortos enorme, um número de infectados enorme e os serviços de saúde não têm sequer o número de respiradores necessários para tantos casos graves.

Em termos de dados e projeções de ações do governo, faz sentido comparar o cenário do Brasil com algum outro país?

Não. Nós temos particularidades próprias. Nós não temos testagem massiva. O mundo ideal seria se nós tivéssemos 200 milhões de testes para testar a população toda. Mas isso não existe, isso não vai ter. Nossa situação não pode ser considerada semelhante à da Coreia, por exemplo, que testou todo mundo. Nós somos uma população muito maior, muito heterogênea, densidades demográficas muito diferentes. O Sudeste é muito diferente do Norte, e por aí vai.

Certo, mas existem lições que a gente pode aprender com esses países. O que a gente pode aprender com eles?

Nós aprendemos com todos os países que nos antecederam nessa epidemia. Nós aprendemos, sobretudo, com a Itália e a Espanha que demoraram a reconhecer o problema e onde a situação é essa tragédia humana que nós estamos verificando. A situação da Espanha também é muito dramática hoje.

O Brasil está tentando, a meu juízo, tomar medidas que não repitam esses modelos trágicos. É por essa razão que nós nos antecipamos no sentido de propor o isolamento social, de mobilizar a iniciativa privada no sentido de criar uma cultura nova.

Quando você verifica 4 bancos se unindo para comprar 5 ou 10 milhões de testes novos para doar ao Ministério da Saúde, é uma iniciativa extraordinária para nós, mas muito normal em qualquer lugar onde a solidariedade humana é claramente exigida como agora.

Há fábricas que não estão com sua produção a todo vapor que estão fabricando máscaras, há produtores da rede de cosméticos que em vez de perfume estão produzindo sabão líquido. E isso terá que chegar às comunidades mais desfavorecidas sob pena de elas não poderem seguir as recomendações que nós estamos dando.

E falando em comunidades menos favorecidas, muitas das orientações que são dadas não podem ser seguidas por essas pessoas, como ficar em casa, lavar as mãos, e manter uma distância de dois metros de outra pessoa. Se a pessoa tem que trabalhar, se ela não tem acesso a saneamento básico e se ela mora num apartamento que tem um cômodo por exemplo. Que medidas essas pessoas podem tomar para se protegerem dentro da realidade em que elas vivem?

Eu não posso dizer a essas pessoas que se tiver uma pessoa de idade, um avô ou uma avó que fique sozinha num cômodo, porque elas vão me responder “Aqui moram cinco no mesmo cômodo.” A gente não tem como fazer retórica de uma coisa que não tem aplicabilidade prática. Não há como fazer, essa é a resposta.

Dentro do possível, que recomendações essas pessoas podem seguir?

Mantenha normas de higiene muito rígidas. Hidratação e alimentação, o máximo possível, adequadas.

E o que o poder público pode fazer também para ajudar a prevenção nesses locais?

Eu tenho uma visão muito particular. Eu não acho que isso caiba ao poder público, nesse momento. O poder público não aguenta. O SUS sozinho não aguenta. Ou nós ajudamos com a iniciativa privada ou o colapso será mais grave e mais rápido.

Por que a Covid-19 não é só uma “gripezinha”?

Ela começa com sintomas muito semelhantes a uma gripe comum. Mas num determinado número de pessoas – e, até agora, o que a epidemiologia tem mostrado é que esse grupo de pessoas são aquelas de mais idade e aquelas portadoras de doenças associadas ou prévias, como hipertensão arterial, diabetes descompensada, paciente imunossuprimido pelo uso de remédio ou com qualquer doença que diminua a imunidade, pacientes transplantados de órgão, paciente com HIV…

Quem morre de Covid-19 morre de pneumonia. A pneumonia que ela causa é muito grave e é diferente de uma pneumonia comum. Ela se caracteriza por um grau de inflamação muito mais grave evoluindo com fibrose precoce, evoluindo para síndrome de angústia respiratória do adulto, evoluindo para “sepsis”, necessitando ventilação mecânica porque o pulmão não funciona.

E com uma mortalidade muito alta nessas condições nesse grupo de pessoas que eu falei.

Sobre remédios, têm alguns estudos muito preliminares falando sobre remédios que já são conhecidos pra malária, ebola e HIV que podem negativar o coronavírus. Isso deve ser encarado como uma possível cura?

Não. A nossa posição brasileira foi de não recomendar nenhum tratamento. Há vários trabalhos publicados, há um número de papers publicado na literatura nesses últimos três meses que já ultrapassa 700. Desses, alguns são de avaliação, mas são estudos não randomizados, não controlados, não duplo-certos, com uma série de impedimentos. São cohorts, são séries de casos que testaram alguns antivirais, algumas medicações antimaláricas que são usadas em algumas doenças autoimunes. Mas as conclusões até o momento não permitem que nós recomendemos que haja esse ou aquele tratamento.

Nós optamos por esperar a publicação do grande estudo clínico que está sendo feito na China, o que deve ocorrer nos próximos dois meses, para verificação dessas associações medicamentosas. Essa é a nossa posição.

O quanto que o corte de recursos para pesquisa, para universidades e para o próprio SUS prejudicaram e fragilizar mais a gente para combater essa pandemia?

Agora nós estamos reivindicando recuperar alguns cortes havidos. Temos conseguido alguma coisa. Mas, sem dúvida nenhuma, os geneticistas e os virologistas brasileiros têm dado uma contribuição extraordinária. Desde as pesquisadoras de São Paulo que em três dias desvendaram o genoma que chegou ao Brasil, que era um genoma importado europeu.

E agora tem um grupo de pesquisadores multi-institucional envolvendo universidades de Minas Gerais, São Paulo, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Fiocruz, que está trabalhando no sentido de determinar o perfil epidemiológico e as mutações existentes.

Hoje nós já podemos dizer que o vírus que está circulando no Brasil já tem características brasileiras. Ou seja, ele já sofreu mutações que o adaptaram ao nosso país. O vírus brasileiro já tem cluster, ou conglomerados virais, que já o torna diferente daquele que circula na China ou mesmo nos países europeus.

Que cuidados as pessoas devem tomar com compras, alimentos que elas trazem de fora de casa e, até com pelos animais, cabelo e barba, para elas não se contaminarem?

Normas de higiene. Lavar com água e sabão as embalagens. Quando for pedir comida de entrega domiciliar, sempre ter cuidado de passar um paninho ou alguma coisa, de preferência descartável, nas embalagens que possa limpar aquela superfície, uma vez que o vírus pode se manter em superfícies durante algumas horas. Não está determinado por quantas horas, mas nós sabemos que pode viver algumas horas em superfícies lisas.

Tem muita gente que tem coronavírus e não sabe que tem, já que 80% dos infectados são assintomáticos. Tem algum teste caseiro que dê pra pessoa saber se tem coronavírus?

Não.

Então muita gente que não sabe se tem, principalmente jovens….

Nem vai saber. Portanto, a recomendação é igual para todos: sigam o isolamento social, não façam festa, não vão para bares. Esse é o momento em que todo mundo tem que colaborar. E cuidem dos seus velhos: pais, avós, padrinhos, tios, etc.

Cuidar significa ficar longe por enquanto, o máximo possível.

É, por enquanto, nada de abraços e nem beijinhos.

Muita gente perguntou sobre tomar vacina e doar sangue. Isso é seguro?

São duas coisas diferentes.

Para doar sangue, nenhum problema. As condições de biossegurança, tanto nos locais de doação, utilização de materiais, proteção da pessoa doadora, bem como da pessoa que vai receber sangue são 100% seguras. Portanto, nós conclamamos as pessoas que compareçam porque os bancos de sangue estão precisando muito de doador nesse momento. Rio de Janeiro, São Paulo, locais de grande atendimento e de grandes hospitais com grande demanda cirúrgica, inclusive, de terapia intensiva e para casos graves. Isso é uma coisa completamente segura.

Fila para tomar vacina é uma coisa é totalmente não recomendada. A nossa recomendação é que, quem vai tomar vacina vá, preferencialmente, usando máscara e que mantenha uma distância de um metro de uma pessoa para a outra enquanto espera.

Reportagem originalmente publicada na Agência Pública

Brasil reduz a aplicação da lei ambiental em meio ao coronavírus

Brasil reduz a aplicação da lei ambiental em meio ao coronavírus

O Brasil vai reduzir os esforços de combate aos crimes ambientais durante a epidemia do coronavírus, disse um funcionário da agência ambiental Ibama à Reuters, apesar das preocupações de que a redução da proteção possa levar a um pico no desmatamento.

O diretor de Proteção Ambiental do Ibama, Olivaldi Azevedo, disse que a epidemia lhe deixou pouca escolha, a não ser enviar menos pessoal para o campo por causa do vírus altamente contagioso.

Ele estimou que um terço dos agentes de campo do Ibama tem perto de 60 anos ou tem condições médicas que os colocam em maior risco de sintomas graves do vírus.

O Ibama não contrata novos agentes há anos por causa dos cortes no orçamento do governo e suas fileiras estão envelhecendo rapidamente.

“Não há como pegar essas pessoas que estão em risco e expô-las ao vírus”, disse Azevedo. “Não há escolha entre uma coisa e a outra. É uma obrigação.”

Duas fontes do Ibama, que não estavam autorizadas a falar à mídia, disseram que os agentes de campo estão preocupados com sua própria saúde e com o risco de disseminar o coronavírus para as regiões rurais onde operam.

Os especialistas em desmatamento disseram que, embora as preocupações com a saúde devam ser uma prioridade máxima, a política pode ter graves consequências ambientais.

“Enfraquecer a fiscalização significa definitivamente um maior risco de desmatamento por razões óbvias”, disse o economista ambiental Sergio Margulis, autor de um artigo sobre “Causas do Desmatamento da Amazônia Brasileira”.

O risco adicional vem na esteira do aumento do desmatamento e de um pico de incêndios na floresta amazônica brasileira depois que o presidente de direita Jair Bolsonaro tomou posse em janeiro de 2019, provocando um clamor global de que ele estava incentivando madeireiros ilegais, fazendeiros e especuladores de terras.

O Brasil abriga cerca de 60% da Amazônia, a maior floresta tropical do mundo, que absorve grandes quantidades de gases de efeito estufa que causam a mudança climática.

Bolsonaro tem defendido planos de desenvolvimento para a região amazônica argumentando que eles são a melhor maneira de tirar mais brasileiros da pobreza. Mas o pico do desmatamento ameaça fazer descarrilar um acordo de livre comércio sul-americano com a Europa e prejudicar as exportações.

ESSENCIAL, MAS COM FALTA DE PESSOAL
Em um decreto na semana passada, Bolsonaro definiu a fiscalização ambiental como um serviço essencial durante a pandemia de coronavírus, permitindo ao Ibama continuar a enviar agentes para o campo.

Mas Azevedo disse que até mesmo serviços essenciais, como saúde e polícia, devem ser cortados para proteger os trabalhadores em situação de risco.

A assessoria de imprensa de Bolsonaro dirigiu perguntas ao Ministério do Meio Ambiente. O Ministério do Meio Ambiente, que supervisiona o Ibama, não respondeu imediatamente ao pedido de comentários.

As operações mais importantes serão priorizadas, enquanto algumas áreas precisarão ser cortadas, disse Azevedo, acrescentando que proteger a Amazônia é uma prioridade.

“Não haverá redução dos agentes de fiscalização na Amazônia”, disse ele, prevendo que algumas partes da floresta tropical podem até mesmo ver o desmatamento caindo.

Fontes do Ibama disseram que a pandemia apresentou mais desafios logísticos, uma vez que muitos hotéis e restaurantes estão fechados e os vôos foram cancelados em massa.

Azevedo disse que enquanto os agentes ainda podem optar por voar, o Ibama está alocando veículos e priorizando o transporte terrestre para reduzir o risco de contágio.

Alguns agentes dirigem durante dias para chegar às suas missões na Amazônia, disse uma das fontes.

Os pesquisadores concordam que a redução da fiscalização permite mais desmatamento. No entanto, uma recessão profunda desencadeada pela pandemia pode criar um aumento do desemprego, o que pode impulsionar a atividade criminosa, mas também deprimir os preços da madeira e da terra adquiridas ilegalmente.

Paulo Barreto, pesquisador sênior do Imazon, instituto amazônico sem fins lucrativos, disse que é impossível prever a reação dos criminosos, que são difíceis de estudar. Os preços das commodities continuam altos e o enfraquecimento da moeda real brasileira significa que os agricultores estão vendo maiores lucros para suas exportações. A demanda para limpar novas terras para a agricultura, portanto, continua forte, disse ele.

A limpeza e venda ilegal de terras é inerentemente especulativa, por isso Barreto disse que os criminosos ainda podem desflorestar com a esperança de impunidade, para depois sentarem-se na terra até poderem vender.

O desmatamento já aumentou 71% em relação ao ano anterior em janeiro e fevereiro, de acordo com dados preliminares do governo, e os pesquisadores estarão atentos aos dados de março e abril.

“Meu palpite é que o desmatamento não vai diminuir”, disse Carlos Nobre, um cientista de sistemas de terra da Universidade de São Paulo.

Reportagem de Jake Spring; Editorial de Richard Chang/Reuters

Do desmatamento ao comércio de animais silvestres, crise climática contribui para o surgimento de pandemias

Do desmatamento ao comércio de animais silvestres, crise climática contribui para o surgimento de pandemias

O que o desmatamento tem a ver com a aceleração no ritmo das epidemias e pandemias, como a atual de coronavírus? Tudo. E quem diz isso não faz parte de nenhum grupo ecologista radical. A afirmação está, por exemplo, em artigo publicado pelo Fórum Econômico Mundial, entidade que reúne uma vez por ano os líderes empresariais e políticos do mundo em Davos (Suíça). Segundo pesquisa, 31% dos 12.012 surtos em todo mundo entre os anos de 1980 e 2013 estão ligados diretamente a ambientes que foram devastados.

O cálculo é que 65% das doenças que surgiram nas últimas quatro décadas sejam zoonoses. Animais silvestres, seja por caça, comércio ou perda de habitat, entraram em contato com o homem, passando doenças que antes estavam restritas à selva. Foi assim com o ébola, zika, Aids e agora com o coronavírus.

A origem mais aceita cientificamente é que o Covid-19 contaminou humanos a partir do mercado de Wuhan, na China, que comercializava animais (vivos ou mortos) como morcegos, cobras, civetas, entre outros animais silvestres. E essa é uma história que se repete. O surto de ébola de 2014 na África Ocidental se deu por contato com macacos. Já as mortes pelo nipah em Bangladesh, em 2004, aconteceram pela proximidade com fluídos de morcegos chamados de “raposas voadoras”. Esses dois vírus têm letalidade bem maior que o coronavírus e são classificados como “bombas-relógio” que também podem causar pandemias.

Por outro lado, o aquecimento global está derretendo geleiras que preservaram vírus antigos que estavam encapsulados e eram desconhecidos até agora. “Esses desequilíbrios e desregulações criam fenômenos que depois a ciência tem que se preocupar e correr para resolver”, afirma Ricardo Abramovay, professor sênior do Programa de Ciência Ambiental da USP.

A crise climática torna-se ainda mais urgente.

Fonte: RODRIGO BERTOLOTTODE ECOA, EM SÃO PAULO

“Erramos”: um mês após campanha para não parar, Milão tem 4,4 mil mortos

“Erramos”: um mês após campanha para não parar, Milão tem 4,4 mil mortos

O prefeito de Milão, Giuseppe Sala, reconheceu, nesta quinta-feira (26/3), que errou ao apoiar a campanha “Milão não para“, que, lançada há exatamente um mês, estimulou os moradores da cidade a continuar as atividades econômicas e sociais, mesmo com a pandemia do novo coronavírus

No início da divulgação da hashtag na internet, em 26 de fevereiro, a Lombardia, região setentrional da Itália, tinha 258 pessoas infectadas pelo vírus, e o país inteiro contabilizava 12 mortes.

Hoje, Milão é a província da Itália mais atingida pela Covid-19, registrando 32.346 casos de pessoas contaminadas e 4.474 óbitos, de acordo com balanço da Defesa Civil divulgado nesta quinta-feira, 26 de março. Em termos quantitativos, a cidade abriga 40,1% da população italiana acometida pela doença, representando 54,4% das mortes no país.

Veja mais notícias sobre o #Coronavírus: https://www.arayara.org/tag/coronavirus/


“Muitos se referem àquele vídeo que circulava com o título #MilãoNãoPara. Eram 27 de fevereiro, o vídeo estava explodindo nas redes, e todos o divulgaram, inclusive eu. Certo ou errado? Provavelmente errado”, reconheceu Giuseppe Sala, em entrevista a uma emissora italiana. “Ninguém ainda havia entendido a virulência do vírus, e aquele era o espírito. Trabalho sete dias por semana para fazer minha parte, e aceito as críticas”, afirmou. 

O vídeo da campanha viralizou na internet em meio aos inúmeros casos de contaminação do vírus no país e após o governo ter decidido confinar 11 cidades do norte italiano, onde haviam sido registrados os primeiros casos de transmissão interna da doença. A produção exibida exaltava os “milagres” feitos “todos os dias” pelos cidadãos de Milão e seus “ritmos impensáveis” e “resultados econômicos importantes”. “Porque, a cada dia, não temos medo. Milão não para”, afirmava o conteúdo expresso no vídeo.

Itália

A Itália registrou 662 mortes em decorrência do coronavírus nas últimas 24 horas, 21 a menos que entre terça e quarta-feira, quando foram apontados 41 óbitos. O número total de mortos no país europeu chegou a 8.215. O total de pessoas contaminadas passou de 74.386 para 80.589 nesta quinta-feira. A contagem de pacientes que contraíram a Covid-19 e foram curados saltou de 9.632 para 10.361.

Fonte: Correio Braziliense

Coronavírus: não desmame seus bebês

Coronavírus: não desmame seus bebês

Baseada em discussões técnicas realizadas com profissionais, a Rede Brasileira de Bancos de Leite Humano da Fiocruz, considerando que a Organização Mundial da Saúde (OMS) orienta a manutenção da amamentação por falta de elementos que comprovem que o leite materno possa disseminar o novo coronavírus, até o momento desta publicação; e que o Centers for Disease Control and Prevention (CDC), o Royal College of Obstetricians and Gynaecologists (RCOG) de Londres; a SBP, o IMIP, o IS-SP, a Abenfo e a IBFAN destacam que os benefícios da amamentação superam quaisquer riscos potenciais de transmissão do vírus através do leite materno, recomenda que:

– A amamentação seja mantida em caso de infecção pelo Covid-19, desde que a mãe deseje amamentar e esteja em condições clínicas adequadas para fazê-lo;

– A mãe infectada seja orientada para observar as medidas apresentadas a seguir, com o propósito de reduzir o risco de transmissão do vírus através de gotículas respiratórias durante o contato com a criança, incluindo a amamentação:

1. Lavar as mãos por pelo menos 20 segundos antes de tocar o bebê ou antes de retirar o leite materno (extração manual ou na bomba extratora);

2. Usar máscara facial (cobrindo completamente nariz e boca) durante as mamadas e evitar falar ou tossir durante a amamentação;

3. A máscara deve ser imediatamente trocada em caso de tosse ou espirro ou a cada nova mamada;

4. Em caso de opção pela extração do leite, devem ser observadas as orientações disponíveis neste documento;

5. Seguir rigorosamente as recomendações para limpeza das bombas de extração de leite após cada uso;

6. Deve-se considerar a possibilidade de solicitar a ajuda de alguém que esteja saudável para oferecer o leite materno em copinho, xícara ou colher ao bebê;

7. É necessário que a pessoa que vá oferecer ao bebê aprenda a fazer isso com a ajuda de um profissional de saúde.

Opinião: graças à sua inépcia política e cognitiva, Bolsonaro está isolado

Opinião: graças à sua inépcia política e cognitiva, Bolsonaro está isolado

Era inevitável: os desvarios de Jair Bolsonaro finalmente expuseram seu governo à perspectiva real de colapso. Este pode preceder ou ser concomitante ao da Saúde pública. Com um presidente da República que não comanda e age aos faniquitos, sob o barulho diário das panelas, não se pode esperar coisa boa.

Graças à sua inépcia política e cognitiva, Bolsonaro está isolado, sob açoite constante de todas as forças políticas e institucionais do país. Um presidente aquartelado é um presidente que produz problemas e obstrui soluções. Estamos diante de uma crise inédita e complexa, que exige ampla coordenação e colaboração – duas palavras que inexistem no léxico de Bolsonaro.

A erosão da autoridade moral e política do presidente da República, numa crise gravíssima, tem consequências perniciosas para o Brasil. Manieta o combate à pandemia, custa vidas, custa dinheiro, custa governabilidade. A bagunça que vemos hoje custará vidas, emprego e renda amanhã. Ilude-se, ou desconhece a natureza da política, quem pensa que o Brasil pode atravessar exitosamente uma crise dessa magnitude sem um presidente funcional. No melhor dos cenários, o custo Bolsonaro será amortecido por uma atuação acertada, impecável dos governadores. Mas esse custo existirá.
O isolamento de Bolsonaro não é um exagero. Ninguém com influência política respeita o presidente da República. Nem no Congresso, nem no Judiciário, nem entre governadores. Ele não consegue criar seu partido; não tem base no Congresso. Aliados calam-se ou rompem com ele, como Caiado fez hoje. (Quase) Ninguém sequer o defende. Não há robôs suficientes no Twitter para mudar esse cenário.

Como vivemos uma baderna institucional, ignora-se a gravidade de alguns fatos políticos. O vice-presidente desautorizou o presidente. Mourão disse: “A posição do nosso governo, por enquanto, é uma só: o isolamento e o distanciamento social”. Ele falou com aval das principais lideranças de Brasília. Querem que Bolsonaro sinta a brasa do impeachment e crie juízo. Será?

O ministro da Saúde, com ajuda política de muita gente influente, ficou no cargo. Mandetta, ao contrário do que muitos dizem, não é um quadro altamente qualificado. Errou no planejamento para a crise, tardou a agir, especialmente quanto à mobilização para a compra de testes e respiradores, e não ofereceu informações claras sobre os processos de tomada de decisão da pasta. Não aprendeu com as lições da China, de Hong Kong e da Coreia do Sul, por exemplo. Menospreza a necessidade de testar todos os casos suspeitos, entre outras diretrizes da OMS.

Mas, em governo de Bolsonaro, Mandetta parece um iluminado. Apesar de suas limitações, é um médico e conhece o SUS. Falou hoje como político, buscando conciliar o pronunciamento do presidente com as ações de sua pasta. Virou uma gororoba. Mas Mandetta segue nessa caçamba cambaleante, sem ouvir os berros do motorista.

Um exemplo da gororoba: o anúncio da liberação da cloroquina para tratamentos de pacientes com covid-19 em estado grave. Os burocratas da pasta limitaram-se a fornecer informações genéricas sobre a medida. Não explicaram como o Ministério da Saúde chegou à conclusão de que vale a pena estabelecer o novo protocolo. Não explicaram o que sustenta essa decisão e por que ela foi tomada agora. Trata-se de um padrão do Ministério da Saúde nessa crise: não explicar o processo de tomada de decisão.

Debate horizontal
Enquanto o Brasil perdia um dia precioso na guerra contra o covid-19, aprisionado pelos disparates de Bolsonaro, os diretores da OMS ressaltavam, mais uma vez, que lockdowns servem para ganhar tempo – tempo que deve ser usado para testar, isolar e tratar as pessoas doentes, sem que os sistemas de saúde entrem em colapso.

O ataque a ela envolve uma combinação difícil de medidas fortes de saúde pública e de apoio econômico a pessoas e empresas.

O fronte da saúde pública precisa mapear a presença do inimigo. Sem saber onde ele está, é impossível combatê-lo com sucesso no longo prazo. Distanciamento social é necessário, mas insuficiente.

Só se faz isso mediante testes e investigação de contatos suspeitos. Assim se identificam áreas de batalha – de forte contágio e número de casos (hotspots). Ao se fazer isso, mitiga-se o estrago que o inimigo faz. Torna-se possível tratar os doentes e isolar os casos suspeitos.

É uma guerra com muitas batalhas. Esse processo de testar, isolar e tratar leva tempo. Haverá novas ondas – surtos – do vírus. Trabalha-se para que cada onda seja menor.

Essa primeira onda, ou batalha, é a mais difícil. Quem age mais rápido e de modo decisivo na frente da saúde pública tem mais chances de sucesso no curto prazo.

O sucesso no curto prazo permite a retomada das atividades não essenciais do país. Esse ponto é de extrema relevância. Não há vitória se não houver ataque (testes e mapeamento das áreas/pessoas de risco). Apenas defesa (distanciamento social e tratar casos graves) não resolve.

O que seria o curto prazo aqui? 15 dias? Um mês? Não sabemos. Depende do ataque. Por isso não se discute a volta imediata à vida normal.
De qualquer modo, Bolsonaro interditou esse debate. Reduziu algo complexo à questão binária entre vidas x economia. Seguiu as palavras de Trump nas duas últimas coletivas.

É necessário compreender que essa guerra não termina quando sairmos de casa. Não teremos vencido o vírus. Teremos, espera-se, vencido a primeira e mais difícil batalha, impedindo o colapso do sistema de saúde, da economia e do nosso modo de vida.

Idealmente, teremos que conviver com hábitos novos por um bom tempo. Medição de temperatura em locais de aglomeração, uso, sim, de máscaras em muitos casos e algum nível de menor interação social.
É um problema extremamente complexo, multifacetado, que mobiliza as mais brilhantes mentes do mundo. Políticos ignorantes e autoritários são os principais aliados do vírus.

Fiquem em casa.

Diego Escosteguy
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