Leilão do Pré-Sal: A empresa pública Pré-Sal Petróleo S.A (PPSA) ofertará 78,5 mi de barris de petróleo na quarta-feira. Especialistas alertam para as contradições do governo brasileiro em meio à emergência climática.
Na próxima quinta-feira, 26 de junho, às 9h, o governo federal, por meio da Pré-Sal Petróleo S.A. (PPSA), realizará o 5º Leilão de Petróleo da União, o maior já promovido no país em volume de óleo ofertado. Serão colocados à venda 78,5 milhões de barris de petróleo, com entregas previstas entre julho de 2025 e fevereiro de 2027. O evento ocorre uma semana após a Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP) conceder 34 blocos para exploração de petróleo e gás no âmbito do 5º Ciclo da Oferta Permanente de Concessão – inclusive 19 dos 47 blocos ofertados na Foz do Amazonas, área considerada de alta sensibilidade ambiental por especialistas.
A comercialização ocorrerá de forma online, por meio da Plataforma de Leilões da B3 (Brasil, Bolsa, Balcão) — o sistema digital da bolsa de valores oficial do país, que permite a participação remota das empresas interessadas.
A PPSA é uma empresa pública vinculada ao Ministério de Minas e Energia. Criada em 2013, sua função é administrar os contratos de petróleo e gás da União no regime de partilha de produção, garantindo que os interesses públicos sejam respeitados na exploração de recursos do pré-sal.
O diretor técnico e presidente do Instituto Internacional ARAYARA, Juliano Bueno, questiona a narrativa do governo federal de que a arrecadação provinda da exploração de petróleo deve beneficiar a população. “O governo afirma que os royalties do petróleo trarão desenvolvimento, saúde e educação. Mas basta olhar para Macaé, que arrecadou bilhões com a exploração, para ver que essa riqueza não foi democratizada. A cidade seguiu marcada por desigualdades, falta de infraestrutura e dependência econômica do setor. Já passou da hora de o Brasil investir em uma transição energética justa. Fortalecer a indústria fóssil é cavar a própria cova — não haverá futuro se continuarmos insistindo neste modelo de produção energética”, afirma Bueno, que também é doutor em riscos e emergências climáticas. De acordo com o diretor da Arayara, a COP30 “tem tudo para ser a quarta COP do Petróleo”.
O que será leiloado
As cargas leiloadas são oriundas de cinco campos de petróleo do pré-sal: Mero, Búzios, Sépia, Itapu e Bacalhau. Os chamados “campos” são áreas demarcadas no mar onde se concentram jazidas de petróleo, geralmente em alto-mar, em regiões profundas e ultraprofundas da costa brasileira. Esses campos integram o pré-sal, uma camada geológica localizada a mais de 7 mil metros de profundidade sob o fundo do oceano, nas bacias de Santos e Campos, com alto potencial de produção.
O leilão será dividido em sete lotes, com destaque para os quatro lotes do campo de Mero, que concentram a maior parte do volume ofertado. As entregas acontecerão diretamente nas plataformas flutuantes chamadas FPSOs (Floating Production, Storage and Offloading), que são navios equipados para extrair, armazenar e transferir petróleo em alto-mar. O modelo de contrato será do tipo FOB (Free on Board), ou seja, a União entrega o petróleo na plataforma e o comprador assume os custos e responsabilidades a partir daí.
Fonte: Infográfico Lançamento Edital – 5º Leilão de Petróleo / Pré-Sal Petróleo S.A
Quem poderá participar?
A PPSA habilitou 10 empresas para participar, individualmente ou em grupo, do 5º Leilão de Petróleo da União. São elas: CNOOC, Equinor, ExxonMobil, Galp, Petrobras, PetroChina, PRIO, Refinaria de Mataripe (Acelen), Shell e TotalEnergies. Entre elas, seis já atuam no regime de partilha do pré-sal, exceto a PRIO e a Refinaria de Mataripe (Acelen).
Impactos da exploração do petróleo
Apesar do potencial econômico, a exploração do pré-sal impõe graves riscos ambientais e sociais. Entre os principais impactos estão:
- Ameaças à biodiversidade marinha, inclusive espécies ameaçadas de extinção;
- Estudos sísmicos submarinos, que utilizam explosões de ar comprimido e afetam a audição e a navegação de baleias, golfinhos e peixes;
- Conflitos com comunidades pesqueiras, que têm suas áreas de pesca tradicionais restringidas por zonas de exclusão;
- Riscos de vazamentos de petróleo, que são difíceis de conter em alto-mar e podem causar danos irreversíveis aos ecossistemas costeiros.
Além dos impactos diretos, a queima de combustíveis fósseis — como o petróleo — é a principal responsável pelas emissões de gases de efeito estufa (GEE) que provocam o aquecimento global.
O Acordo de Paris, assinado por 196 países — incluindo o Brasil —, estabelece como meta limitar o aquecimento global a bem menos de 2 °C, com esforços adicionais para contê-lo em 1,5 °C. Para que isso seja possível, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) aponta que as emissões globais de gases de efeito estufa precisam cair pelo menos 43% até 2030 (em comparação com os níveis de 2019) e alcançar emissões líquidas zero até 2050. Contudo, os atuais planos de produção e expansão do uso de petróleo contrariam essas metas e ampliam os riscos da emergência climática.
Contradições do país que sediará a COP30
O megaleilão de petróleo acontece cinco meses antes da realização da COP30, a conferência mundial do clima, que será sediada em Belém do Pará, no Brasil. A iniciativa tem provocado críticas de ambientalistas, pesquisadores e movimentos sociais, que denunciam a incoerência entre o discurso climático do governo e a prática de ampliar a exploração de combustíveis fósseis.
A diretora executiva da ARAYARA, Nicole Oliveira, reforça a gravidade do momento:
“Estamos diante de uma contradição perigosa. O Brasil quer se apresentar como líder climático na COP30, mas promove o maior leilão de petróleo da história da União. Isso vai na contramão da ciência, dos compromissos internacionais e da justiça climática”, afirmou.
A ARAYARA avalia medidas e estratégias de mobilização nacional e internacional para questionar a coerência ambiental e climática do leilão, além de alertar a sociedade sobre seus impactos.