Representantes da organização foram impedidos de acompanhar e fizeram manifestação em frente ao local do evento
A sessão do 3º Ciclo da Oferta Permanente de Concessão (OPC) organizada pela Agência Nacional do Petróleo e Gás (ANP) hoje, dia 13 de abril, no Hotel Windsor Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, negociou 59 blocos dos 379 ofertados para exploração de petróleo e gás. Um total de 13 empresas apresentaram propostas para uma área de 1.130.040 quilômetros quadrados, quase o equivalente à cidade do Rio de Janeiro.
Na bacia de Santos, no oceano, localizam-se oito blocos, próximos a Santa Catarina, Paraná e São Paulo. E a maior parte fica em terra: dois blocos no Espírito Santo, quatro no Recôncavo Baiano, 14 em Alagoas e 25 no Rio Grande do Norte. Ao todo, 13 empresas levaram áreas para explorar.
Os representantes do Instituto ARAYARA tentaram acompanhar presencialmente o certame, mas foram impedidos pela ANP de fazer o credenciamento. Eles tinham sido orientados pela própria agência que não haveria inscrição prévia. Durante toda manhã, ambientalistas do Instituto ARAYARA, do Observatório do Clima, do Observatório do Petróleo e Gás, da Coalizão Não Fracking Brasil (Coesus), Coalização Gás e Energia e Comissão Nacional de Fortalecimento das Reservas Extrativistas, Povos e Comunidades Tradicionais Extrativistas, Costeiras e Marinhas (Confrem) fizeram uma manifestação na frente do local para chamar a atenção da sociedade sobre o que significa o aumento da exploração de combustíveis fósseis. As negociações representam um grande retrocesso frente às NDCs brasileiras e as metas exigidas pelo IPCC (Painel Intergovernamental Sobre Mudanças Climáticas).
Conforme a diretora executiva da ARAYARA, a qualquer momento pode haver um novo ciclo com oferta de novos blocos. ‘É uma irresponsabilidade a forma que estão sendo avaliados esses blocos, ignorando uma série de questões legais. Existe uma expansão franca do petróleo e do gás e isso faz com que o Brasil aumente suas emissões. O cálculo do aumento de emissões nunca foi apresentado pelo governo. Só se fala no valor de aquisição que foi ínfimo para a maioria dos blocos’, avaliou Nicole Figueiredo de Oliveira.
Nicole ressaltou que o trabalho da organização prossegue. “A nossa luta vai continuar, nós vamos litigar tudo que pudermos a respeito das comunidades e povos tradicionais e a respeito das áreas de biodiversidade que devem ser protegidas, como APAs, RPPNs, UCs”, argumentou, referindo-se a Áreas de Proteção Ambiental, Reservas Particular de Patrimônio Natural e Unidades de Conservação (UCs).
O coordenador técnico da ARAYARA, John Wurdig, alertou que há blocos em áreas de sensibilidade ambiental próximas à UCs e com a presença de populações tradicionais. No Espírito Santo, por exemplo, foram ofertados poços terrestres maduros. Além de ferir a legislação ambiental federal, incluindo a lei nº 11.428/2006, Lei da Mata Atlântica, a ANP também ignora um parecer do Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema) de 2018, que aponta impossibilidade de colocar tais blocos à venda, por estarem localizados sobre zonas de amortecimento de UCs e territórios de comunidades quilombolas.
“O caso do Espírito Santo é bem sério. Houve uma falha grave da ANP, que ignorou a existência de fragilidades ambientais e sociais da região e a localidade já sofreu com o vazamento de petróleo recentemente”, afirmou Wurdig. O parecer do Iema destaca a proximidade com a Área de Proteção Ambiental (APA) de Conceição da Barra, a Floresta Nacional (Flona) do Rio Preto, o Parque Estadual de Itaúnas e três UCs no norte do estado.
A região Nordeste será a mais impactada na perfuração de poços. No Rio Grande do Norte, uma área de oito blocos, que corresponde a 222,76 quilômetros quadrados, encravada na Caatinga, foi negociada por 448 mil, a 56 mil cada bloco. Tudo isso sem consulta às comunidades que serão impactadas, o que fere a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário. Esse parecer, por si só, já deveria inviabilizar a legalidade deste leilão. Para a diretora executiva do Instituto ARAYARA, Nicole de Oliveira, esse é mais um exemplo típico de racismo ambiental, no qual se escolhem lugares onde a população será afetada, sem considerar o contexto e as distintas culturas tradicionais que ali vivem.
Manifestação teve apoio do Sindipetro
Enquanto rodava a sessão, os ativistas protestavam em frente ao hotel. Estiveram presentes para fazer coro à manifestação os representantes do Sindipetro (Sindicato dos Petroleiros) do Rio de Janeiro. Os sindicalistas afirmam que é necessário investir em uma transição energética justa. Para eles, a Petrobras deve deixar de ser uma empresa de petróleo para se tornar uma empresa de energia. Nesse sentido, defendem que seja montado um plano para aproveitamento de recursos energéticos menos poluentes.
Com pesar, eles não vislumbram uma boa perspectiva de futuro, visto que não conseguem o básico: um diálogo efetivo. “Com o cenário político atual, o diálogo sobre uma transição energética justa inexiste,” lamenta Rodrigo Esteves, um dos diretores do Sindipetro. “Nós gostaríamos que ambientalistas e petroleiros pudessem se unir por um bem comum” sentencia Antony Devalle.
Oferta Permanente
O 3º ciclo foi considerado o mais “bem-sucedido” pelo governo federal. Houve blocos negociados a R$ 50 mil. Foram arrecadados R$ 422.422.152,22 em bônus de assinatura. Mais 800 novos blocos entraram para a oferta permanente, somando em quase 1.800 blocos.
Em resumo: TotalEnergies, ofertou R$ 275 milhões para dois blocos na Bacia de Santos; a britânica Shell, que entregou R$ 140 milhões para seis blocos também na Bacia de Santos; a americana Petro-Victory, pagará R$ 1 milhão por 19 blocos na Bacia Potiguar e a brasileira Origem Energia adquiriu 14 blocos na Bacia Sergipe-Alagoas por R$ 1 milhão e quatro blocos na Bacia Tucano Sul, por R$ 1,2 milhão.
Fotos: Renata Sembay – Instituto ARAYARA