+55 (41) 9 8445 0000 arayara@arayara.org

Privatização da Eletrobras: jabuti, aumento na conta de luz e risco à soberania energética nacional

Manobra de privatização põe em cheque controle energético brasileiro da maior empresa de energia da América Latina, além de repassar gastos milionários aos consumidores.

A tendência de privatização de estatais é marca do governo Bolsonaro desde sua campanha e, há poucos meses das novas eleições, sua equipe econômica deixa o marco da privatização da maior empresa de energia da América Latina: a Eletrobras. Com um prejuízo inicialmente calculado de R$20 bilhões por ano aos consumidores, a manobra aposta em risco à soberania energética nacional, risco de apagões, de escassez hídrica – e abre mão de décadas de pesquisa e produção tecnológica na área energética, que poderia auxiliar na tão necessária transição energética justa brasileira. 

 

Segundo o próprio site, a Eletrobras detém “36 usinas hidrelétricas, 10 termelétricas a gás natural, óleo e carvão, duas termonucleares, 20 usinas eólicas e uma usina solar, próprias ou em parcerias, distribuídas por todo território nacional”. Esse número corresponde a uma capacidade de atender mais de 1/3 do consumo de eletricidade no país, além de ser responsável por 52% de toda água armazenada no Brasil – sendo 70% dessa água utilizada na agricultura brasileira. Ou seja, todo esse potencial econômico, ambiental e político agora está nas mãos da iniciativa privada. 

 

A discussão de privatização que se estendeu por anos – e se intensificou em 2021 – não foi suficiente para frear os interesses econômicos na primeira metade de 2022, consolidando, assim, o processo de privatização da empresa. Agora, a União deixa de ser o acionista majoritário na Eletrobras – deixando de possuir 72% das ações para apenas 45%. O que fortalece um cenário de insegurança à soberania energética nacional, como apontado por diversos especialistas.  

 

A primeira projeção concreta, feita pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), foi a de aumento das contas de luz, em uma média de 16% a 17% em todo território nacional. A Associação dos Grandes Consumidores de Energia e Consumidores Livres (Abrace), estima um aumento de R$ 20 bilhões ao ano, valor que será repassado a todo serviço e produto que precise do uso de energia elétrica. Logo, o preço do leite e da carne também aumentam, por exemplo, em 10% e 7% respectivamente. 

Especialistas também apontam que a privatização da Eletrobras pode promover a mercantilização dos recursos hídricos, chegando em um cenário de escassez. Outro ponto que impacta diretamente a população brasileira são os exemplos de precarização da energia elétrica que temos visto recentemente, como em caso de apagões, que acontece constantemente em locais como Amapá – cujo caso ficou famoso em 2020 -, Goiás, Acre, Rondônia e Roraima.

Existem danos futuros que são difíceis de medir. Por exemplo, é falsa a argumentação de que a empresa trazia prejuízo aos cofres públicos. Mesmo no ápice da pandemia da Covid-19, a Eletrobras fechou em lucro líquido de R$ 6,4 bilhões em 2020. Foi a sexta empresa mais lucrativa do país naquele ano. A Eletrobras possui uma geração de caixa de R$ 15 bilhões ao ano, gerou lucro de R$ 2,7 bilhões no primeiro trimestre de 2022, e acumula nos últimos quatro anos, um lucro de R$ 40 bilhões. Esse dinheiro agora deixa de chegar à União e ser revertido à sociedade brasileira. 

É importante também destacar que o Centro de Pesquisa de Energia Elétrica (Cepel) está totalmente abandonado agora com a nova lei. O fim dos investimentos no Centro, responsável pela criação das plataformas utilizadas pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) para supervisão do Sistema Interligado Nacional (SIN), significa o fim do desenvolvimento de tecnologias para a indústria energética brasileira e dependência ainda maior das do exterior. 

A Cepel é bancada quase unicamente pela estatal – sendo 83% do seu investimento em 2020 – e deixará de receber esses recursos em seis anos. Segundo o  Ministério de Minas e Energia (MME), neste tempo, a Cepel deve buscar alternativas de financiamento – uma atitude que demonstra o total despreparo e comprometimento do atual governo com a transição energética justa.

Em maio, a Associação dos Empregados da Eletrobras (AEEL) divulgou um informe com 60 motivos pelos quais os processos de privatização da Eletrobras são danosos para a sociedade brasileira. 

O documento afirma que a “Eletrobras é a espinha dorsal” do sistema elétrico brasileiro, considerado mais robusto do que muitos países desenvolvidos no que tange à extensão da rede. Já a professora Clarice Ferraz (diretora do Instituto Ilumina e pesquisadora do GEE/IE-UFRJ) assina o documento falando que  “a privatização da Eletrobras é a sabotagem de um projeto de transição energética justa para o Brasil”.

 

Termelétricas a gás do jabuti da privatização terão seu primeiro leilão no dia 30 de Setembro

O reflexo da privatização da Eletrobras também recai sobre as novas termelétricas anunciadas para contratação de energia nas próximas décadas, o que irá aumentar ainda mais o custo da conta de energia, além de demandar investimentos em estruturas e muita água. Outra questão central é a dificuldade no cumprimento das NDCs Brasileiras, já que as emissões de gases de efeito estufa GEE aumentarão consideravelmente.

A lei de privatização da Eletrobras prevê a contratação de 8 GW de termelétricas a gás, boa parte em regiões sem acesso ao combustível. Ao todo, 37 projetos foram cadastrados na licitação que se dará em certame no próximo dia 30, e se dedicará a contratar 1 GW na região Norte, para início de suprimento em 31 de dezembro de 2026; e 300 MW no Maranhão e 700 MW no Piauí, para 31 de dezembro de 2027.

Compartilhe

Share on whatsapp
WhatsApp
Share on facebook
Facebook
Share on twitter
Twitter
Share on linkedin
LinkedIn

Enviar Comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Redes Sociais

Posts Recentes

Receba as atualizações mais recentes

Faça parte da nossa rede

Sem spam, notificações apenas sobre novidades, campanhas, atualizações.

Leia também

Posts relacionados

ARAYARA na Mídia: Kolumne: Warum unser Geld ein unterschätzter Hebel für den Klimaschutz ist

Nicht nur Fliegen oder Fleischkonsum zählen: Auch die Wahl der Bank ist entscheidend fürs Klima. Eine neue Studie zeigt, wie stark Banken fossile Projekte finanzieren – und wie groß unser Einfluss ist. vom Recherche-Kollektiv Klima & Wandel: Elena Matera Die Klima- und Umwelt-Kolumne erscheint alle zwei Wochen – kritisch, nahbar, lösungsorientiert! Hier schreiben Elena Matera und Lisbeth Schröder im Wechsel. Ich zahle so gut

Leia Mais »

Relatório internacional aponta estatal argentina como principal destino de investimentos em combustíveis fósseis

Documento foi produzido pelas organizações ambientais Instituto Internacional Arayara e Urgewald, em parceria com as ONGs latinas Conexiones Climaticas, Amazon Watch e FARN Por: Avenida Comunicação O relatório Urgewald, divulgado no dia (29/09), traz dados inéditos sobre o financiamento da expansão de combustíveis fósseis na América Latina e no Caribe (ALC). O estudo, intitulado O Rastro do Dinheiro por Trás

Leia Mais »

Diálogo entre ARAYARA e Chile Sustentable reforça caminhos para uma transição energética justa

Durante a X Semana da Energia, a diretora da ONG Chile Sustentable, Sara Larraín, apresentou o painel “Desafíos socioterritoriales de la transición en ALC”, onde destacou os complexos desafios que a América Latina e Caribe enfrentam para avançar em uma transição energética justa e inclusiva. Aproveitando o encontro, representantes do Instituto Internacional ARAYARA conversaram com Sara para conhecer mais de

Leia Mais »

ARAYARA na Mídia: COP30 tem número estagnado de países com hospedagem garantida a um mês da cúpula em Belém

A exatos 30 dias do início da COP30, a quantidade de delegações com hospedagem garantida em Belém é insuficiente para validar as decisões da primeira conferência das Nações Unidas sobre mudanças climáticas a ser realizada no Brasil. O governo federal afirma que 87 países têm reservas na cidade. O número, divulgado desde a última terça-feira (7), é o mesmo que

Leia Mais »