Na noite de 24 de janeiro, ocorreu a 1ª Conferência Livre Intermunicipal de Meio Ambiente da Região Carbonífera de Santa Catarina (CLIMARCSC). Sob o tema “Futuro da região carbonífera: descarbonização, regeneração e educação para a preservação”, o evento destacou a necessidade urgente de transição energética na região, historicamente marcada pela intensa exploração de carvão mineral.
O evento , que faz parte da etapa inicial da 5ª Conferência Nacional do Meio Ambiente, contou com o apoio do Instituto Internacional ARAYARA, Observatório do Carvão e Campanha Fé, Paz e Clima, que têm sido grandes aliados na mobilização e promoção de práticas sustentáveis na região.
“A compreensão de que a transição energética é um processo inevitável e que precisamos de união na busca por soluções para regiões extremamente impactadas pelo carvão, como as cidades incluídas nessa conferência, é crescente e é urgente”, relatou Sara Ribeiro, gerente de Relações Institucionais da ARAYARA.
Impactos ambientais e sociais da mineração
Durante a conferência, foram expostos os graves impactos causados pela mineração de carvão, que afeta não apenas o meio ambiente, mas também a saúde pública e o bem-estar das populações locais. Entre os problemas destacados, José, um dos participantes, ressaltou a escassez de água potável em municípios como Criciúma, onde a poluição provocada pela mineração compromete rios e nascentes.
“O abandono de minas deixou um passivo ambiental significativo, com 900 bocas de minas abertas em todo o estado de Santa Catarina, gerando contaminação de recursos hídricos e um cenário crítico de degradação ambiental”, relatou o participante.
A poluição de águas, a contaminação do solo e o aumento de doenças como câncer e abortos espontâneos foram outros pontos abordados durante a conferência. O impacto social também foi destacado, com a necessidade de uma transição energética que leve em conta os trabalhadores da mineração, muitos dos quais se veem desamparados após o fechamento das minas.
Mitigação e recuperação ambiental
Diversas propostas foram discutidas durante a conferência. O eixo de “Mitigação e Preservação Ambiental” sugeriu, entre outras medidas, a regularização das propriedades agrícolas familiares no Cadastro Ambiental Rural (CAR) para promover a recomposição de áreas de preservação, com apoio financeiro do Governo Estadual. Além disso, também foi proposto o fechamento das minas de carvão e a responsabilização dos empresários pela recuperação das áreas degradadas.
Outro eixo importante foi o de “Investimento em Energias Renováveis”, com sugestões para incentivar o uso de sistemas de energia solar por meio de linhas de crédito acessíveis. A destinação de royalties da mineração para projetos de adaptação climática e capacitação da defesa civil também foi sugerida.
Desafios trabalhistas
Foi ressaltado que essa transição energética precisa considerar os direitos dos trabalhadores da mineração. “A ausência de um plano estruturado para promover a requalificação profissional e assegurar a sustentabilidade econômica das cidades dependentes da mineração foi apontada como um desafio crítico”, pontuou Ribeiro.
Também foram amplamente debatidas as dificuldades enfrentadas por trabalhadores demitidos de minas, como a Carbonífera Criciúma, que permanecem sem indenizações ou apoio adequado para sua transição profissional e social.
O engenheiro ambiental e gerente de Transição Energética da ARAYARA, John Wurdig, citou como referência de diagnóstico ambiental da área de mineração de carvão em SC o estudo O LEGADO TÓXICO DA ENGIE , que expõe o mapa da contaminação gerado pelo Complexo Termelétrico Jorge Lacerda e pelas Minas de Carvão que o abastecem.
Segundo Wurdig, a venda de usinas termelétricas, como o complexo Jorge Lacerda, sem um plano de transição para as comunidades locais e seus trabalhadores, também foi criticada. “É necessário direcionar os recursos de subsídios, como os da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), para apoiar uma transição justa e sustentável, ao invés de continuar beneficiando o setor de carvão, que luta por subsídios até 2050″, pontuou o engenheiro.
Propostas para uma região sustentável
A conferência também tratou de temas como a educação climática e a implementação de políticas públicas que incentivem a diversificação econômica. A criação de programas de capacitação profissional voltados para a economia verde, como energias renováveis, agroecologia e turismo sustentável, foi um dos pontos destacados como forma de preparar as futuras gerações para os desafios da transição energética.
Outro ponto abordado foi a importância da agricultura familiar, que sofre com os impactos das mudanças climáticas e a degradação ambiental causada pela mineração. A proposta de fortalecer a agroecologia visando promover uma alimentação mais saudável, assim como reduzir a pressão sobre os recursos naturais, foi considerada uma das principais soluções para enfrentar as mudanças climáticas no campo.
Chamado à ação
Com a falta de quórum, não foi eleito um delegado. Ainda assim, o evento encerrou com um apelo urgente para que ações concretas sejam tomadas no sentido de mitigar os danos causados pela mineração, promover a recuperação das áreas degradadas e garantir uma transição energética justa e inclusiva para os trabalhadores. O resgate do Conselho de Transição Energética Justa foi amplamente apoiado como um passo fundamental para garantir que as futuras políticas públicas considerem não apenas a preservação ambiental, mas também os aspectos sociais e econômicos das comunidades afetadas.
˜Mesmo com a ainda baixa participação das comunidades nesses espaços de discussão, muitas das vezes por medo de retaliações da indústria carvoeira, o tema da emergência climática é crucial para pensar cidades que tenham capacidade de superar suas poluições históricas, se regenerar e criar ambientes seguros, com muita educação ambiental e conscientização coletiva”, destacou Ribeiro.