Com baixa adesão no 5º Ciclo da Oferta Permanente de Concessão e importantes territórios preservados, ARAYARA celebra conquistas para o clima, biodiversidade e povos tradicionais
As ações da ARAYARA e de organizações da sociedade civil renderam conquistas expressivas no 5º Ciclo da Oferta Permanente de Concessão promovido pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Apesar da pressão do governo e da indústria petrolífera, apenas 34 dos 172 blocos ofertados foram arrematados — uma adesão de apenas 20%, considerada uma vitória significativa dos movimentos socioambientais. Em termos de extensão territorial, o resultado representa uma grande preservação: dos 145.597,817 km² que estavam em oferta, 117 mil km² permanecem salvos da exploração.

Em frente à ANP, a diretora executiva da ARAYARA, lideranças indígenas e organizações socioambientais protestam contra o 5º Ciclo da Oferta Permanente de Concessão. Foto:Enrico Marone/ ARAYARA
A bacia da Foz do Amazonas concentrou a maior parte dos blocos vendidos, com 19 áreas arrematadas, reacendendo o alerta ambiental, especialmente diante do debate em torno do Bloco 59 situado nessa mesma bacia. No entanto, o leilão também registrou avanços importantes em defesa do clima, dos oceanos, da biodiversidade e dos povos tradicionais.
Impacto climático evitado: 453 milhões de toneladas de CO₂
Graças à mobilização jurídica, política e comunicacional da ARAYARA, estima-se que cerca de 453,3 milhões de toneladas de CO₂ deixaram de ser emitidas com a não concessão de dezenas de blocos. O volume equivale a três vezes as emissões anuais do estado de São Paulo.
“Além do impacto climático evitado, a mobilização garantiu vitórias socioambientais em diversos territórios sensíveis, como terras indígenas, unidades de conservação e áreas marinhas estratégicas”, afirma Nicole Figueiredo de Oliveira, diretora executiva da ARAYARA.
Terras indígenas e assentamentos poupados
Apesar do foco na região da Foz do Amazonas — onde a União voltou a ofertar blocos pela primeira vez desde 2003 —, nenhuma área sobreposta às Terras Indígenas Tapayuna, Estação Parecis, Ponte de Pedra, Manoki e Santana (MT) ou à TI Cassupá e Salamãi (RO) foi arrematada.

Lideranças indígenas questionam a falta de consulta prévia, livre e informada às comunidades locais em processos de leilão de territórios, o que viola a Convenção 169 da OIT, ratificada pelo Brasil. Foto: Enrico Marone/ ARAYARA
Entre os 25 projetos de assentamento ameaçados, apenas um teve bloco vendido: o PA Ribeirão Grande III, no Mato Grosso.
“Essas áreas são vitais para a sobrevivência e os modos de vida tradicionais de diversas populações. Garantir que permaneçam livres de exploração é uma vitória coletiva”, destaca Kerlem, Coordenadora de Oceano e Águas da ARAYARA.
Fernando de Noronha salva pela terceira vez
Pelo terceiro ano, o bloco ofertado nas proximidades de Fernando de Noronha ficou sem comprador. O arquipélago, junto ao Atol das Rocas, é considerado uma das regiões marinhas mais importantes para a conservação no Brasil, porém pelas falas apresentadas por diretores da ANP nos próximos leilões haverá persistência na oferta destes blocos e portanto a Campanha #SALVENORONHA continuará indefinidamente até que a Agência retire em definitivo estes blocos.
Outras áreas sensíveis preservadas incluem o Monte Sirius e a ZCM-42, ambos localizados na Bacia Potiguar. Com isso, pelo menos 58 espécies ameaçadas, como tartarugas marinhas, o coral-vela (Mussismilia harttii) e o peixe-papagaio-cinzento (Sparisoma axillare), foram poupadas da pressão da indústria petrolífera.

Em Fernando de Noronha, a ARAYARA promoveu uma capacitação para a comunidade local, alertando sobre os riscos da exploração de petróleo na região. Foto: Rodrigo Thomé / ARAYARA
Amazônia Legal: 53 mil km² protegidos
Na Amazônia Legal, 53,1 mil km² de áreas leiloadas foram preservadas graças à mobilização da sociedade civil. Unidades de Conservação como o Parque Natural Municipal O Semeador (MT), o Parque Estadual de Abaitará e o Parque Municipal de Pimenta Bueno (RO) permanecem livres da exploração.
Além da proteção de ecossistemas estratégicos, também foram preservadas seis espécies da fauna ameaçada, como o macaco-aranha-da-cara-preta, o tatu-açú e a águia-cinzenta, além de 16 espécies da flora endêmica e ameaçada, entre elas Cedrela odorata, Vismia cavalcantei e Apuleia leiocarpa.
Leilão esvaziado e resistência fortalecida
Dos 118 blocos considerados litigiosos, apenas 23 foram vendidos, o que representa um índice de sucesso de 80,5% para os movimentos socioambientais. A Bacia Potiguar, uma das mais críticas ambientalmente, não teve nenhum bloco arrematado.
Apesar disso, a área concedida na Foz do Amazonas quadruplicou, saltando de 5,7 mil km² para 21,9 mil km², com a venda de 19 dos 47 blocos ofertados.
Pressão internacional e denúncias à ONU
A ARAYARA também ampliou sua atuação no campo internacional. Poucos dias antes do leilão, a organização protocolou duas denúncias internacionais contra o Estado brasileiro, em nome do povo indígena Manoki, junto ao Relator da ONU para os Direitos dos Povos Indígenas e à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), denunciando a ausência de consulta prévia e violações graves de direitos, em desacordo com a Convenção 169 da OIT.

Capacitação do povo Manoki (MT) sobre os impactos do Leilão do Juízo Final, promovida pela ARAYARA por meio do programa Fé, Paz e Clima, em parceria com o Conselho Indigenista Missionário (CIMI). Foto: Joubert Marques/ ARAYARA.
“Após intensa mobilização da sociedade civil e cinco ações judiciais, houve um esvaziamento parcial do leilão. Mas as aquisições na Foz do Amazonas e no Alto Xingu mostram que o governo escolheu avançar sobre biomas ultra sensíveis e territórios indígenas”, avalia Juliano Bueno de Araújo, diretor técnico e PhD em Energia do Instituto.
A COP30 do petróleo
Araújo também criticou a incoerência entre o discurso ambiental do governo e suas ações práticas:
“Infelizmente, tudo indica que teremos uma COP30 do petróleo no Brasil. O governo Lula tenta vender a ideia de uma liderança climática, mas, na prática, avança sobre territórios sensíveis e ignora os alertas científicos. Pode até achar que saiu ganhando, mas quem perde são o clima, os povos da floresta e das águas.”

Manifestação denuncia a contradição do governo, que sediará a COP30 e se coloca como líder da transição energética, enquanto amplia a exploração de combustíveis fósseis. Foto: Enrico Marone/ ARAYARA
O 5º Ciclo da Oferta Permanente de Concessão foi marcado por protestos de lideranças indígenas e organizações ambientalistas, ganhando ampla repercussão na imprensa nacional e internacional. O tema foi destaque em veículos dos principais continentes — da América Latina à Europa, passando pela Ásia, Oriente Médio, África e até a Indonésia — refletindo a crescente pressão global contra a expansão da exploração de petróleo em áreas socioambientalmente sensíveis.
Todas as informações estão presentes nos monitores Oceano e Amazônia Livre de Petróleo e Gás, plataformas digitais de geociências e foram revisadas por especialistas e doutores do OPG Observatório do Petróleo e Gás e do Instituto Internacional ARAYARA e Organismos internacionais.
Fotos: Enrico Marone/ ARAYARA