+55 (41) 9 8445 0000 arayara@arayara.org
Direitos territoriais de povos tradicionais e crise climática são debatidos em audiência

Direitos territoriais de povos tradicionais e crise climática são debatidos em audiência

Na última terça-feira (26), a Comissão da Amazônia e dos Povos Originários e Tradicionais (CPOVOS) da Câmara dos Deputados realizou uma audiência pública para discutir os impactos da crise climática e a garantia de direitos nos territórios. O evento, promovido pela deputada Célia Xakriabá (Psol-MG), contou com a participação de representantes da sociedade civil, lideranças comunitárias e governamentais.

 

O Instituto Internacional Arayara, que atua ativamente na defesa dos direitos dos povos tradicionais, participou do evento, que foi organizado pelo The Climate Reality Project Brasil, em parceria com a Frente Parlamentar Mista Ambientalista e o Grupo de Trabalho de Juventudes.

 

O debate teve foco nos efeitos de eventos climáticos extremos, como o aumento do nível do mar, a acidificação dos oceanos e a desertificação de áreas vegetadas, que aprofundam desigualdades sociais, raciais e de gênero, afetando desproporcionalmente comunidades vulneráveis no Brasil.

 

Presidida pelo deputado Chico Alencar, a mesa destacou a necessidade de ações urgentes para enfrentar esses desafios e garantir direitos fundamentais às populações impactadas, com foco especial nos povos originários, tradicionais e periféricos.

 

Os territórios são solução para a crise climática

 

Em sua fala, a deputada Célia Xakriabá ressaltou a relevância dos territórios indígenas e tradicionais para o combate à crise climática: “Os territórios indígenas e de comunidades tradicionais representam muito mais do que o valor de um banco mundial; eles são o maior banco de estoque de carbono. Não podemos chegar à COP no Brasil, no próximo ano, sem reconhecer que esses territórios são uma saída essencial para barrar a crise climática.”

 

Xakriabá destacou que os territórios indígenas contribuem com 20% da solução climática global, enquanto os de povos tradicionais representam 30%, somando 50% do total. Segundo a deputada, ignorar essa contribuição equivale a descartar uma solução poderosa.

 

Ela também reforçou a importância de pautas como a demarcação de terras e a regularização fundiária, reconhecidas pela ONU, e criticou a falta de ação nesse sentido. “Não reconhecer esses territórios como uma alternativa tecnológica, social e ancestral é um erro grave. Quando se mata um rio, mata-se também o direito de beber. Isso é futuricídio.”

PEC : Natureza como sujeito de direito

 

Xakriabá também apresentou a proposta de uma PEC para reconhecer a natureza como sujeito de direito, inspirada nas constituições do Equador e da Bolívia. Segundo ela, a iniciativa visa proteger os biomas brasileiros, como a Caatinga, o Cerrado, a Amazônia, o Pampa e o Pantanal, e colocá-los no centro das estratégias de enfrentamento à crise climática.

 

“A audiência reforçou a urgência de medidas concretas para mitigar os impactos climáticos e proteger os direitos das comunidades tradicionais, alinhando o Brasil aos compromissos globais de preservação ambiental e justiça climática”, destacou Heloísa SanDiego, analista ambiental do Instituto Internacional Arayara.

 

Povos indígenas e mudanças climáticas

 

Em julho deste ano, foi lançado o Protocolo Indígena de Prevenção, Preparação, Resposta e Recuperação em Situação de Risco e Desastre durante o Acampamento Levante pela Terra, realizado entre 24 e 28 de junho, em Brasília. Este documento histórico é o primeiro do Brasil a integrar ações nas áreas de saúde, educação, assistência social, proteção, defesa civil e segurança, além de enfrentar diretamente o racismo ambiental.

 

Elaborado com a contribuição de lideranças indígenas de diversas regiões do país e com o apoio técnico do Instituto Internacional Arayara, o protocolo busca garantir a proteção integral dos povos indígenas em situações de risco ou desastre.

 

“O aumento dos desastres ambientais provocados pelo agravamento das mudanças climáticas exige a criação de políticas públicas mais robustas e instrumentos legais eficazes para adaptação e mitigação de danos”, destaca SanDiego.

Arayara na Mídia | Terra deve chegar ao fim do século 3,1ºC mais quente

Arayara na Mídia | Terra deve chegar ao fim do século 3,1ºC mais quente

O aumento de temperatura esperado para o fim do século será de 3,1°C caso as contribuições nacionais para reduzir emissões de CO2 não atinjam níveis mais ambiciosos

 

Por Paloma Oliveto para o Correio Braziliense 

A tragédia provocada pelas chuvas no Rio Grande do Sul é um dos efeitos das mudanças climáticas e seus impactos no cotidiano – (crédito: Marinha do Brasil )

 

O planeta se aproxima de chegar ao fim do século 3,1°C mais quente do que na era pré-industrial, alcançando temperaturas incompatíveis com a vida. O alerta é do relatório Lacuna das Emissões do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), lançado ontem em Cali, na Colômbia, durante a Conferência das Partes da Convenção sobre Biodiversidade (COP15). A pouco mais de um mês da COP29, do clima, sediada no Azerbaijão, o documento destaca que, tecnicamente, ainda é possível atingir a meta de  1,5°C. Mas, para isso, é preciso uma mobilização massiva, que leve ao corte de 42% das emissões globais até 2030 e 57% até 2035.

Com as políticas atuais de contenção dos gases de efeito estufa, o mundo alcançará um aumento considerado catastrófico na temperatura. Mesmo que os compromissos já assumidos nas COPs anteriores fossem cumpridos — e não estão —, o planeta chegaria a 2100 entre 2,6°C-2,8°C mais quente do que o século 19.

No próximo ano, na COP de Belém, no Brasil, haverá uma nova rodada das chamadas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) – compromissos que cada país signatário do Acordo de Paris apresenta na conferência, para ajudar a reduzir as emissões. A ONU adverte que essas metas terão de ser mais ambiciosas do que nunca. “O relatório de hoje (ontem) sobre a Lacuna de Emissões é claro: estamos brincando com fogo; não podemos mais ganhar tempo”, ressaltou o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, em uma mensagem em vídeo. “Estamos sem tempo. Fechar a lacuna de emissões significa fechar a lacuna de ambição, a lacuna de implementação e a lacuna financeira. Começando na COP29.”

As projeções científicas apresentadas no relatório, de um mundo 2,6 °C mais quente, baseiam-se no cenário de implementação total das NDCs e têm uma probabilidade de 66% de acontecerem. O problema é que nem essas promessas estão sendo cumpridas; nenhum país está no caminho de alcançar as contribuições apresentadas em 2022, a atualização mais recente. Se todas fossem batidas, ainda seria necessário acrescentar contribuições de zero líquido para limitar o aquecimento a 1,9 °C. O relatório, porém, ressalta que há pouca confiança, hoje, nas estratégias que têm como objetivo contrabalancear as emissões com a captura de carbono.

“A lacuna de emissões não é uma noção abstrata”, reforçou Guterres. “Há uma ligação direta entre o aumento das emissões e desastres climáticos cada vez mais frequentes e intensos. Em todo o mundo, as pessoas estão pagando um preço terrível. Emissões recordes significam temperaturas recordes do mar sobrecarregando furacões monstruosos; calor recorde está transformando florestas em caixas de pólvora e cidades em saunas; chuvas recordes estão resultando em inundações bíblicas.”

Alexandre Prado, líder em Mudanças Climáticas do WWF-Brasil, destaca tragédias climáticas brasileiras recentes. “A tragédia no Sul, a maior seca da história e as queimadas na Amazônia e no Pantanal nos mostraram que da forma como está, já era”, avalia. Prado lembra que a origem das mudanças climáticas são os combustíveis fósseis, cuja queima resulta na formação dos gases de efeito estufa. “Sabemos o que fazer, sabemos como fazer e sabemos das dificuldades e desafios, mas temos que ter lideranças para enfrentá-los.”

Para limitar o aumento da temperatura, o relatório da ONU destaca que as emissões devem cair 28% até 2030 e 37% dos níveis de 2019 até 2035. “Precisamos de mobilização global em uma escala e ritmo nunca vistos antes — começando agora mesmo. Peço a todas as nações: chega de conversa fiada”, discursou Inger Andersen, diretora-executiva do Pnuma. A COP29 é considerada uma conferência intermediária, pois as novas NDCs serão assumidas na 30ª edição. Andersen afirmou que o encontro em Baku, no Azerbaijão, é a oportunidade para elevar, agora, o nível de ambição para “entrar em um caminho de 1,5°C”.

O relatório destaca que, em vez de redução nas emissões, desde 2019, o que se vê é um aumento na liberação de gases de efeito estufa, chegando ao recorde de 57,1 gigatoneladas no ano passado. O atraso no cumprimento das metas significa que, até 2035, será preciso cortar, anualmente, 7,5% do CO2.

Embora muito pouco provável, o cenário do Acordo de Paris, de 1,5°C acima dos índices pré-industriais, é tecnicamente possível. Para isso, os países devem cortar até 31 gigatoneladas de CO2 equivalente em 2030  –  ou 52% do que foi emitido em 2023, e 41 gigatoneladas até 2035. O custo previsto desses cortes é estimado em menos de US$ 200 por tonelada de carbono.

Segundo o relatório, o aumento da implantação de tecnologias solares fotovoltaicas e energia eólica poderia fornecer 27% do potencial total de redução em 2030 e 38% em 2035. A ação sobre florestas pode contribuir com 20% nos dois anos. Outras opções promissoras incluem medidas de eficiência, eletrificação e troca de combustível nos setores de edifícios, transporte e indústria.

“Apesar de estar em situação mais favorável, segundo a análise apresentada, o Brasil pode não conseguir alcançar suas metas climáticas nas NDCs, se não mudar as políticas atuais, o mesmo acontecendo com países como Estados Unidos e União Europeia”, reforça Juliano Bueno de Araújo, doutor em Riscos e Emergências Ambientais e diretor técnico do Instituto Internacional Arayara. “As ações implementadas são consideradas insuficientes e a transição para uma economia sustentável está lenta. Sem uma revisão e intensificação das estratégias, esses países comprometem seu futuro ambiental e sua posição no combate às mudanças climáticas.”

Colaborou Isabella Almeida 

Arayara apresenta Protocolo Indígena de Resposta a Desastres em encontro da PNGATI

Arayara apresenta Protocolo Indígena de Resposta a Desastres em encontro da PNGATI

Instituto Internacional Arayara participou, junto a organizações indígenas, ministérios e órgãos federais, da 20ª Reunião do Comitê Gestor da PNGATI

Após ter sido apresentado à ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, e de seu conteúdo ter sido convertido em Projeto  de Lei – o PL 3099/2024, da deputada federal Juliana Cardoso (PT-SP) –, o Protocolo dos Povos Indígenas de Adaptação, Resposta e Recuperação em Situações de Risco e Desastres Ambientais, Climáticos e Sanitários, construído por povos indígenas no 2º Levante Pela Terra com o apoio do Instituto Internacional Arayara, foi levado à 20ª Reunião do Comitê Gestor da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas (PNGATI). 

O encontro, realizado na sede da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI), em Brasília, reuniu representantes do governo federal e de organizações indígenas e indigenistas com o objetivo de planejar as ações e aprimorar a Política que dá autonomia aos indígenas para restaurar seus territórios e geri-los conforme seus costumes.

O segundo dia da 20ª Reunião do Comitê Gestor foi marcado pelo debate de pautas relacionadas às mudanças climáticas, como a seca na Amazônia. O Plano Clima, sendo atualmente elaborado pelo governo federal com contribuições da sociedade civil, também foi debatido no que tange aos seus Planos de Adaptação e os povos indígenas.

Proteção de comunidades em foco

Na ocasião, a coordenadora do Departamento de Comunidades do Instituto Internacional Arayara, Heloisa SanDiego, apresentou, junto à Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (ArpinSul), o instrumento criado por povos indígenas para orientar o governo e a sociedade civil no atendimento digno dessas populações em situações extremas, como eventos climáticos: o Protocolo dos Povos Indígenas de Adaptação, Resposta e Recuperação em Situações de Risco e Desastres Ambientais, Climáticos e Sanitários.

“A questão climática pautou muito as discussões da 20ª Reunião do CG PNGATI. Não somente a seca no Amazonas foi abordada, mas outros locais que estão sofrendo da mesma forma foram avaliados, como a questão do Pantanal e do Cerrado. Foi bem completo”, avalia SanDiego. A coordenadora comunicou que, na ocasião, o Instituto Internacional Arayara foi convidado a integrar uma das seis Câmaras Técnicas da PNGATI, grupos que versam sobre temas importantes para a implementação da Política. 

Origem do Protocolo

O Protocolo Indígena foi criado durante a segunda edição do Acampamento Levante pela Terra, que aconteceu em Brasília, em julho deste ano. Um evento significativo que reuniu mais de 500 indígenas de diversos povos em resposta ao despreparo governamental diante das investidas contra as Terras Indígenas, violações de direitos humanos e desastres ambientais, como os ocorridos recentemente no Rio Grande do Sul. 

Sustentado por nove marcos de referência, incluindo a Constituição Federal de 1988, a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e o Acordo de Escazú, o ‘Protocolo dos Povos Indígenas de Adaptação, Resposta e Recuperação em Situações de Risco e Desastres Ambientais, Climáticos e Sanitários’ preenche uma lacuna crítica na proteção dos direitos fundamentais dos povos indígenas. Até sua criação, não existia um protocolo específico para atender as necessidades das comunidades indígenas nessas circunstâncias.

Sobre a Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas (PNGATI)

A PNGATI foi instalada pelo Decreto 7.747, em 2012, com o objetivo de proteger, recuperar, conservar e usar de modo sustentável os recursos naturais das terras e territórios indígenas. As diretrizes são fundamentais à garantia dos direitos territoriais indígenas ao expressarem o reconhecimento da autonomia sociocultural e a valorização do protagonismo dos povos indígenas por parte do Estado brasileiro.

Em 2019, deixou de existir para ser reinstalado em 2023, por meio do Decreto 11.512/2023, no âmbito do MPI.