por Comunicação Arayara - Nívia Cerqueira | 14, dez, 2024 | Arayara na mídia |
No próximo dia 16 de dezembro, o Instituto Internacional ARAYARA lançará oficialmente o Monitor de Energia, plataforma online com estudos, dados, infográficos e legislações sobre a matriz energética do Brasil. Na ocasião será apresentado o estudo UTE Candiota 2050 – O futuro insustentável da produção de energia elétrica a partir do carvão mineral subsidiado. O evento será na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul.
A primeira fase da construção do Monitor de Energia será a consolidação do Observatório do Carvão Mineral, focado no acompanhamento e na análise da cadeia produtiva e do impacto ambiental deste combustível fóssil, o mais danoso para as mudanças climáticas e os eventos climáticos extremos. O objetivo é tornar públicas e transparentes as informações dos impactos socioambientais e econômicos da cadeia do carvão mineral, maior emissor de gases de efeito estufa na geração de energia. As usinas termelétricas ineficientes desta cadeia receberam em 2023 mais de R$ 1 bilhão de subsídios do Governo Federal, provenientes da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE).
Região sul na liderança da queima de carvão
O Rio Grande do Sul detém 90% das reservas de carvão mineral do Brasil, e a cidade de Candiota possui 40% destas reservas. Há décadas ocorre no município a queima de carvão na Usina de Candiota, e mais recentemente na Usina de Pampa Sul. Esta foi inaugurada em 2019, sendo o último empreendimento a carvão mineral financiado pelo BNDES. As duas usinas fazem do município de Candiota o maior emissor de gases do efeito estufa do Rio Grande do Sul.
A UTE (Usina Termelétrica) Candiota III já emitiu 21,5 milhões de toneladas de CO2 equivalente (tCO2e). As duas estão nas primeiras posições no ranking das 10 usinas que mais emitem gases de efeito estufa do Sistema Interligado Nacional de energia elétrica (SIN).
Entre abril e maio de 2024, chuvas extremas devastaram parte do Rio Grande do Sul, um efeito das mudanças climáticas causadas, entre outros motivos, pela exploração e utilização do carvão mineral para fins energéticos. O Instituto Internacional Arayara protocolou em julho uma Ação Civil Pública (ACP) no Rio Grande do Sul, onde a tragédia atingiu 469 cidades, a quase totalidade dos municípios gaúchos.
Conforme a Defesa Civil Estadual, mais de 2,3 milhões de pessoas foram impactadas. O volume de chuvas passou de 800 milímetros em mais de 60% do estado, deixando 56 mil pessoas em abrigos; 582 mil desalojadas, mais de 800 feridas, 42 desaparecidas e 172 mortas.
Na Ação, a ARAYARA cobra do governo gaúcho um plano de transição energética com foco no descomissionamento de termelétricas a carvão como Candiota III e que seja garantida a participação popular na construção deste instrumento, que faz parte do Programa ProClima 2050 do governo estadual. Para a ARAYARA , é preciso que o planejamento da desativação da UTE inclua a proteção dos trabalhadores da usina, da mina e da cidade como um todo.
O estudo que será apresentado dia 16 de dezembro de 2024 demonstra a ineficiência da Termelétrica Candiota III, que ficou fechada por cinco meses em 2024 por problemas técnico-operacionais. Mesmo sem funcionar, recebeu cerca de R$ 78 milhões em subsídios do governo federal, pagos pelos consumidores brasileiros na conta de luz. Os subsídios beneficiam a Companhia Riogrande – CRM, estatal gaúcha.
Trazendo argumentos e dados técnicos, o estudo detalha cenários até 2050 no município e se contrapõe aos subsídios previstos no artigo 23 do Projeto de Lei (PL) 576/21. Este PL que tramita no Senado Federal, trata das eólicas offshore, mas recebeu o “jabuti” do subsídio ao carvão mineral após forte lobby do setor.
O diretor-presidente da ARAYARA, Juliano Bueno de Araújo, considera o subsídio, além de injusto com os brasileiros, um descaso com a população de Candiota, pois não há planejamento nem a perspectiva de uma política sólida de Transição Energética Justa e Sustentável.
“O empreendimento terá o término da sua Comercialização de Energia no Ambiente Regulado (CCEAR) em 31 de dezembro de 2024. Portanto, mesmo com a aprovação do PL nº 576/2021, incluindo o subsídio, é importante se planejar o phase out (eliminação gradual) do carvão. Sem isso, Candiota pode ter o mesmo fim de Figueira, cidade paranaense onde em 2023 foi fechada a UTE Figueira”, destacou Araújo.
No lançamento do Observatório do Carvão na na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, o deputado estadual Matheus Gomes apresentará o PL 23/2023, que reconhece a situação de emergência climática no Rio Grande do Sul, e o PL 24/2023, que veda a concessão de novas licenças ambientais para mineração e exploração de carvão mineral no estado.
O evento será transmitido pelo canal do Youtube da Arayara, disponivel em: www.youtube.com/@ArayaraOficial
Fonte: ESG Inside
por Comunicação Arayara | 18, out, 2024 | Petróleo e Gás |
Oiapoque é uma cidade que enfrenta vários problemas de infraestrutura. O último Censo divulgado (2010) mostrava que apenas 0,2% das vias públicas eram urbanizadas e somente 24,8% da população tem acesso ao esgotamento sanitário adequado. Nas áreas indígenas, o principal impacto percebido pela liderança é em relação à nova dinâmica aérea. Há dois anos, o aeródromo de Oiapoque começou a receber investimentos da Petrobras e transportar aeronaves com funcionários da empresa. Segundo ela, foi quando a população das Terras Indígenas Galibi do Oiapoque e Juminã começaram a ser afetados pela repentina movimentação. “Começou a assustar as famílias, principalmente as crianças que não estão acostumadas com esse tipo de barulho. As caças e os pássaros também se assustavam”, relata.
Preocupados com o que pode vir no futuro, os povos indígenas começaram a buscar parcerias fora de sua comunidade para se aprofundar no debate sobre a exploração de petróleo e da transição energética. Luene é atualmente uma das mobilizadoras locais em torno do Tratado de Não Proliferação de Combustíveis Fósseis, uma iniciativa global que advoga para a cooperação entre governos, sociedade civil e outras lideranças pela aceleração da transição energética justa.
O compromisso é voluntário e não-vinculante, mas, mesmo assim, apenas 14 nações assinaram, sendo apenas uma da América Latina – a Colômbia, que se juntou durante a COP28, em 2023.
No Brasil, várias entidades não governamentais apoiam o Tratado oficialmente, mas do poder público a adesão veio apenas da prefeitura de Belém. Para Luene, a posição do Governo Federal é contraditória. “O governo brasileiro diz que defende a Amazônia, mas ao fim do dia entrou para a Opep+ [Organização dos Países Exportadores de Petróleo]”, critica.
Para Andrés Gómez, coordenador para América Latina e Caribe do Tratado, a participação dos povos indígenas no movimento é fundamental. “As organizações e povos indígenas são quem habitam o território, mesmo antes do Estado. O apoio que podem gerar, em rede, é muito importante e isso também gera pressão em torno dos governos”, diz, citando também o caso da Colômbia, onde o povo Waorani tem pressionado o governo a parar a extração de petróleo em um parque nacional.
A presença de petrolíferas nas proximidades da Foz do Amazonas não é algo novo. A Petrobras, por exemplo, já tem atividades na região desde 1970. Dados públicos da Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP), expostos pela epbr em maio de 2023, apontam que ali já houve 95 perfurações, sendo que todas, até o momento, ocorreram em águas rasas, ou seja, de 400m ou menos de profundidade. Nesse caso, é inserida uma plataforma fixa, estrutura metálica presa ao fundo do mar.
Ao todo, conforme mostra o levantamento da epbr, 27 desses poços perfurados para pesquisas foram finalizados por causa de acidentes mecânicos. A maioria, por não ter encontrado petróleo, por dificuldades logísticas ou por indícios subcomerciais.
Agora, a Petrobras anseia ser a primeira explorar águas profundas na região. Para esse tipo de exploração, é preciso instalar sistemas flutuantes, amarrados ao solo submarino por correntes, cabos de aço ou poliéster. A oceanógrafa Kerlem Carvalho explica que a tecnologia de ponta é necessária porque as águas profundas possuem especificidades de salinidade, temperatura e, principalmente, de pressão que impactam na operação. “Quanto maior a profundidade da água, maior vai ser a pressão. E, no caso da segurança operacional dessas indústrias, traz um risco maior de ter falha de equipamento que vai perfurar esse local, se ele não for projetado adequadamente”, adverte, explicando que tubulações, cabos e outros itens ficam sob uma força muito grande, que é natural desse ambiente.
Carvalho atua como analista ambiental na organização da sociedade civil (OSC) sem fins lucrativos Instituto Internacional Arayara, e menciona que outro fator de preocupação é a maior dificuldade de que o serviço de emergência chegue a tempo em casos de acidentes de vazamento, por estar muito longe da costa.
Embora o histórico seja longo na região, as informações sobre a exploração de petróleo local nem sempre são de fácil entendimento. A começar pelo próprio termo usado pela Petrobras: Margem Equatorial, que no Brasil é o trecho de 2.200 quilômetros que vai da costa do Rio Grande do Norte ao Amapá. Já a Foz do Amazonas é uma das cinco grandes regiões da Margem, e inclui os territórios do Pará e Amapá que, mesmo parecendo distantes geograficamente, sofrem muita influência da foz, ou seja, do local onde o rio Amazonas deságua no Oceano Atlântico.
De acordo com o Arayara, encontrar os dados públicos também não é uma tarefa simples. São mais de 70 fontes onde essas informações estão dispersas e geralmente com linguagem técnica.
Pensando nessas dificuldades, o Instituto, em parceria com o Observatório do Clima, lançou o “Monitor Amazônia Livre de Petróleo e Gás” há um ano. A plataforma está disponível em português, inglês e espanhol e tem o objetivo de democratizar o acesso aos dados.
No site, qualquer um pode conferir os dados atualizados de onde estão os blocos petrolíferos, qual o status (em exploração ou produção, em estudo ou área reservada, em oferta ou solicitação) e mais detalhes sobre a empresa operadora e se está em um território indígena, dentre outros fatores.
O Instituto Arayara foi uma das organizações à frente dos protestos da Amazônia Livre de Petróleo na Cúpula de Belém. Para Vinicius Nora, gerente de Oceanos e Clima da OSC, o principal resultado é ver que pesquisadores e movimentos sociais estão podendo se apropriar mais da discussão com o Monitor.
Ele comemora também que, em junho deste ano, a ANP decidiu remover 15 blocos da lista de áreas disponíveis para exploração e produção no país, devido a restrições socioambientais, como a proximidade a terras indígenas e unidades de conservação. “Essa sobreposição nós mesmos já tínhamos identificado no Monitor e, por conta disso, entramos com ações judiciais para tentar impedir a oferta dessas áreas”, recorda.
Apesar de não ter tido sucesso direto na Justiça, ele acredita que a mudança percebida agora pela ANP é reflexo da pressão civil. Em 2024, o edital de leilão de blocos passa por uma revisão e é a primeira vez, em sete anos, que o Brasil não terá uma nova licitação para concessão de áreas para exploração de petróleo.
Nora acompanha cada passo das decisões em torno da exploração na Foz do Amazonas e considera que as consultas prévias às comunidades da região podem travar o processo, porque podem aflorar as preocupações que os povos já possuem sobre o tema. “Por outro lado, mudanças políticas no Ibama e MMA, por exemplo, podem também mudar o andar das decisões, porque a pressão está muito grande em prol da exploração e o rumo pode mudar a qualquer momento”, pondera.
Além do Instituto Arayara, outras instituições vêm fazendo campanha por uma Amazônia livre de combustíveis fósseis nas redes sociais, nos seus territórios e fazendo pressão a autoridades políticas, dentre elas o Instituto ClimaInfo, a Associação das Mulheres Indígenas em Mutirão (Amim) e as ONGs Greenpeace Brasil e WWF-Brasil. Mais de 20 organizações do Amapá e Pará assinaram carta aberta no ano passado para declarar apoio à decisão do Ibama e até o momento 18 organizações e instituições nacionais, assim como oito parlamentares, assinaram o Tratado de Não Proliferação de Combustíveis Fósseis.
Geógrafa e mestre em Biodiversidade Tropical, Funi explica que, para começar a entender essa dinâmica, é preciso ter monitoramento constante por pelo menos três anos. “A gente não conhece as correntes superficiais mais profundas para essa região da foz. Até a maré, precisamos de mais pontos para entender. Temos a maior variação de maré do planeta, chegando a 12 metros, mas ela tem comportamentos diferentes ao longo da costa”
A pesquisadora é uma das autoras do Plano Foz de monitoramento da costa oceânica do estado e da foz do rio Amazonas, uma iniciativa que busca financiamento e que propõe a implementação de redes de medições para investigar questões como a hidrodinâmica, salinidade, corrente marítima, o vento e a temperatura, dentre outros aspectos. O Plano envolve pesquisadores, técnicos e professores de instituições como a Universidade Federal do Pará (UFPA), Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA), Universidade de Brasília (UNB) e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).
“A foz é muito pouco estudada. Tem um desafio logístico muito grande, requer um recurso muito maior do que em outras regiões”, contextualiza. “Mas, sem dados, tudo que for feito vai gastar mais tempo, energia e dinheiro e não vai conseguir ter o preparo da maneira correta”, conclui.
A pesquisadora observa que pouco mudou desde que o Ibama indeferiu o pedido da Petrobras. “O que teve de avanço é que vamos atualizar as cartas de sensibilidade de derramamento de óleo. Estamos iniciando as tratativas agora”.
Os documentos, conhecidos como Cartas SAO, mapeiam a vulnerabilidade de uma região a um eventual derramamento de óleo, e incluem informações como sensibilidade dos ecossistemas marinhos e costeiros, recursos biológicos e usos humanos dos espaços. As cartas atuais foram entregues em 2016, por pesquisadores do Museu Paraense Emílio Goeldi, INPA e UFPA, e mostram que, em um cenário pessimista, os ambientes ficam muito vulneráveis, por uma gama de características próprias do local, como a presença abundante de manguezais, que seriam extremamente difíceis de limpar em caso de vazamento.