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Luto do movimento ambientalista do Paraná

Luto do movimento ambientalista do Paraná

A companheira que nos deixa, Lídia Lucaski, tem longa trajetória de lutas na defesa do meio ambiente e o mérito incontestável desta premiação no seio da comunidade paranaense, com o reconhecimento de todos e todas que acompanham sua história à frente da Ong AMAR, mantida com independência.

Por Juliano Bueno de Araújo*

A antropóloga e ambientalista Lídia Lucaski dedicou toda a sua vida ao ativismo político, em prol da justiça social e da defesa do meio ambiente. Na juventude, participou ativamente do movimento estudantil paranaense contra a ditadura militar.

Indiciada por atividades subversivas, juntamente com outras lideranças estudantis, em Inquérito Policial Militar instaurado pela 5a. Região Militar do Exército, no início de 1969, refugiou-se no Rio de Janeiro.

Com a ajuda de rede de apoio a perseguidos pela ditadura, liderada por Branca Moreira Alves (mãe do deputado Márcio Moreira Alves, autor do célebre discurso que pregava o boicote ao desfile de 7 de setembro de 1968 e que detonou o Ato Institucional número 5), Lídia fugiu para o Uruguai, e em seguida obteve asilo político no Chile.

Antes do golpe militar que derrubou o presidente chileno Salvador Allende, foi obrigada a fugir, juntamente com outros companheiros, para a Bolívia.

Com o golpe militar na Bolívia, exilou-se no Peru, onde estudou Antropologia (Universidade de Lima). Naquele país, alistou-se como voluntária para ajudar as vítimas do terremoto de Áncash, em 1970, um dos desastres naturais mais devastadores do Peru, que matou cerca de 100 mil pessoas e deixou mais de 3 milhões de feridos.

Foi somente com a anistia no Brasil que Lídia pôde deixar o Peru, mas ao chegar à cidade de Araucária para encontrar seus familiares, viu-se diante de uma situação trágica: os níveis de aplicação de agrotóxicos e da poluição das fábricas recém-instaladas na região eram tão altos e descontrolados que muitas crianças nasciam com anencefalia e hidrocefalia. O grau da contaminação química em Araucária, já naquela época, era pior do que Cubatão, cidade que ficou mundialmente conhecida pela gravidade da poluição causada pelas fábricas.

Lídia juntou-se ao grupo de ambientalistas de Araucária que, em 1983, liderado pelo engenheiro agrônomo Reinaldo Onofre Skalisz, havia fundado a AMAR – Associação de Defesa do Meio Ambiente de Araucária, e a partir dali tornou-se uma das ambientalistas mais respeitáveis do Brasil. Também participou da fundação do Fórum Verde, em 1990, da FEPAM – Federação Paranaense das Entidades Ambientalistas, em 1992, e mais recentemente do Fórum do Movimento Ambientalista do Paraná, em 2010.

Atuou também defendendo os interesses da sociedade civil em importantes colegiados, câmaras técnicas e conselhos municipais e estaduais de meio ambiente. Lídia presidia a AMAR quando esta foi eleita pelas ONGs da Região Sul do Brasil para o CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente, para o período de 2011-2012.

Sua dedicação à causa ambiental nunca teve relação com qualquer modismo ecológico. Assim como a AMAR, Lídia sempre se pautou pela questão da sobrevivência humana e pelo respeito aos direitos da Natureza, e foi sempre com esse espírito que seus novos companheiros da AMAR a elegeram presidente daquela instituição que, por si só, é um marco na história paranaense. Combatente ambiental obsessiva, foi sucessivamente reeleita por quase 20 anos.

No comando da Amar, e sempre atuando de forma voluntária, praticamente sem nenhum apoio governamental ou da própria sociedade paranaense, Lídia estendeu a atuação da entidade não só no estado do Paraná, mas ao norte de Santa Catarina e sul de São Paulo, sempre atendendo aos pedidos da população carente atingida pelas terríveis consequências dos danos ambientais denunciados.

A dedicação incansável da presidente Lídia Lucaski fez da AMAR, com quase 36 anos de existência, uma de mais importantes ONGs ativistas do estado do Paraná e da região Sul do Brasil.

A AMAR foi autora de cerca de uma centena de ações civis públicas contra crimes ambientais, impetradas isolada ou conjuntamente com entidades congêneres ou com o Ministério Público, e de mais de três mil denúncias de crimes ambientais encaminhadas ao Ministério Público e a outros órgãos governamentais, sempre fundamentadas tecnicamente após vistoria no local do dano.

Além disso, Lídia Lucaski, juntamente com outros ambientalistas paranaenses como Juliano Bueno de Araújo, Pedro Guimarães, Osvaldo Cardoso, Henrique Schimidlin, Paulo Pizzi, Cloves Borges e Teresa Urban participaram da fundação da UNEAP – União de Entidades Ambientalistas do Paraná.

Por sua coragem e atuação política coerente e obstinada, e por seu trabalho apaixonado e incansável em defesa da justiça ambiental, Lídia Lucaski é, seguramente, uma das mais importantes ambientalistas brasileiras, uma pessoa que incontestavelmente desperta o orgulho das comunidades a quem ela sempre atendeu nas horas mais difíceis, que traz inspiração a todos os ambientalistas deste estado e para com quem a sociedade paranaense tem uma grande dívida de gratidão.

*Juliano Bueno de Araújo é diretor-presidente do Instituto Internacional Arayara, secretário do Fórum do Movimento Ambientalista do Paraná, e conselheiro do CMMA – Conselho municipal de Meio Ambiente de Curitiba e do CEMA – Conselho Estadual do Meio Ambiente do Paraná.

Expansão da Indústria do Gás: Crescimento Econômico à Custa do Planeta?

Expansão da Indústria do Gás: Crescimento Econômico à Custa do Planeta?

Iniciativa privada e governo brasileiro dão passos para estimular a produção do gás natural e seu fornecimento à indústria nacional. O aquecimento deste mercado, porém, também envolve aquecer mais o clima, que já dá muitos sinais de estresse e esgotamento.

Muitas movimentações têm sido realizadas com o objetivo de expandir a produção e impulsionar o comércio do gás natural no Brasil. Em comparação ao petróleo, o gás fóssil apresenta menos oferta no mercado, por ser uma indústria que ainda demanda investimentos altos, como a construção de gasodutos para o transporte dessa energia e de terminais de resfriamento, a fim de manuseá-lo em sua forma líquida.

Assim, as produtoras de gás preferem alocar parte do gás extraído para promover a extração de petróleo, como no pré-sal. O valor de mercado do gás, para as indústrias consumidoras desse insumo, torna-se alto. A fim de baixar esse preço, governo e iniciativa privada articulam soluções – tanto impulsionando uma maior produção e oferta, incentivando que empresas como Petrobras comercializem mais gás ao invés de usá-lo para reinjeção nos poços de petróleo, quanto estimulando no mercado a demanda pelo produto, garantindo que haverá um cenário com mais gás disponível.

Uma dessas soluções é a proposta da Abrace Energia, associação de grandes consumidores de energia, para que sejam realizados leilões regulados de venda de gás natural pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), em semelhança aos promovidos pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) para a contratação de energia elétrica.

A Nova Lei do Gás (14.134/2021) prevê leilões de gás e programas de venda também por outros agentes, não governamentais, mas em 2022 o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) editou uma resolução que transfere para a ANP a responsabilidade de organizar e executar leilões.

No âmbito do governo, muitas ações têm sido propostas para impulsionar o gás. O Ministério de Minas e Energia (MME) anunciou, em abril, a criação de um comitê de monitoramento de obras e projetos de gás em andamento. O Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) divulgou, também em abril, um estudo sobre o mercado de gás de olho em melhores condições de fornecimento do produto para a indústria nacional.

Em paralelo ao estímulo à produção interna, o Brasil estuda ainda o financiamento da fase final da construção do gasoduto que permitiria a importação do gás de fracking da região de Vaca Muerta, na Argentina, em uma tentativa de contornar as baixas que vêm enfrentando na importação de gás natural da Bolívia, onde há a previsão de desabastecimento até 2030. Todas essas são medidas que atrasam a Transição Energética do país, uma vez que impulsionam uma fonte fóssil em detrimento das renováveis, e estimulam o mercado e as indústrias que consomem este ativo fóssil, deixando-as mais longe de uma descarbonização de suas atividades.

A queima de combustíveis fósseis é o fator que mais contribui para a desregulação do clima. Estimular essa produção e esse comércio é impulsionar também o desencadeamento de mais desastres climáticos que custam muito mais para reparar do que o lucro em curto prazo que advém dessas atividades. O Instituto Internacional Arayara reforça a urgência de se incluir uma perspectiva de zero carbono nos debates de energia no Brasil e na América Latina, se quisermos avançar economicamente com sustentabilidade socioambiental, resguardando o planeta e as populações mais vulneráveis às mudanças climáticas.