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Exploração de petróleo na Foz do Amazonas gera tensão e ameaça ativistas ambientais

Exploração de petróleo na Foz do Amazonas gera tensão e ameaça ativistas ambientais

A Foz do Rio Amazonas, uma das áreas mais ricas em biodiversidade do Brasil, está no centro de uma intensa disputa ambiental. Em meio ao debate sobre a liberação do bloco petrolífero FZA-M-59, comunidades locais, pescadores e ambientalistas têm buscado apoio para tentar barrar a expansão da exploração predatória de petróleo na região.

Diante desse cenário, o Instituto Internacional ARAYARA, em parceria com lideranças locais e outras organizações, uniu forças para mobilizar pescadores, indígenas, ribeirinhos e quilombolas em seis municípios do Amapá. Entre os dias 11 e 22 de novembro, foram realizadas oficinas e encontros que buscaram amplificar as vozes das comunidades tradicionais ameaçadas pela expansão da indústria petrolífera. Essa coalizão de organizações dedicadas à defesa do meio ambiente também alertou sobre os potenciais impactos socioambientais que ameaçam a Costa Amazônica.

O avanço da indústria petrolífera

São intensas as pressões sobre a região Amazônica, tornando-se cada vez mais evidente que o preço a ser pago por quem decide interferir nesse caminho vai muito além da perda da biodiversidade. Durante a excursão, equipes e participantes do evento sentiram esse dilema na pele, enfrentando riscos durante as atividades programadas que aconteceram nas localidades de Oiapoque, Calçoene, Cunani, Amapá e Bailique.

Em uma oficina realizada no município de Calçoene, uma representante da ARAYARA, relatou momentos de tensão após um grupo favorável à exploração de petróleo aparecer repentinamente no local e interromper as atividades de maneira intimidatória.

Ela relatou ainda que em outra ocasião, durante uma oficina no município do Amapá, um político que se identificou como ex-delegado interferiu diretamente na apresentação conduzida por ela, onde eram discutidos dados sobre a pesca artesanal e os impactos da exploração petrolífera na região. Inclusive, o político tentou desqualificar os estudos apresentados, criando um clima hostil. 

Diante dos episódios de intimidação, que comprometeram os objetivos educativos das oficinas e colocaram em risco a segurança dos participantes, Fernanda Coelho, gerente do departamento jurídico da ARAYARA, enfatizou a responsabilidade dos parlamentares como representantes do Estado. Ela destacou que é dever desses agentes proteger o direito humano a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, conforme assegurado pelo Artigo 225 da Constituição Federal e pela Resolução 76/300 da ONU, em vez de agir em sentido contrário.

“Existem indícios de uma articulação destinada a obstruir as oficinas, incluindo a disseminação de informações falsas e tentativas de sabotar o evento”, afirmou Fernanda Coelho.

 

Informação e conscientização 

 

O Estudo Impactos do avanço do petróleo na pesca da Costa Amazônica, apresentado pela pesquisadora da ARAYARA, alertou as comunidades visitadas para os riscos de danos ambientais ao ecossistema complexo e sensível dos manguezais e dos recifes amazônicos, assim como a ameaça direta às comunidades que dependem dessa biodiversidade para sobreviver. 

 

A pesquisadora destacou que, além de apresentar dados, o estudo serve como um importante instrumento para as comunidades, ao evidenciar a relevância essencial da região para a pesca e para o modo de vida de milhares de pessoas diretamente conectadas a essa atividade. “Trabalhadores e trabalhadoras que já enfrentam diariamente os riscos do mar agora encaram novas preocupações, como a disputa por espaço marítimo e os conflitos em seus territórios”, alertou.

 

Os estudos apresentados durante as oficinas destacaram os graves impactos da exploração petrolífera, incluindo a poluição irreversível dos manguezais, da água e do ar. “Os pescados da Costa Amazônica, além de servirem como fonte de alimento, sustentam uma indústria pesqueira significativa, tanto no mercado interno quanto no global, gerando empregos diretos e indiretos ao longo de suas cadeias produtivas”, ressaltou.

 

Tensão nas comunidades locais 

 

“Porque não investir numa energia permanente, limpa e que temos tanto aqui na região?”, questionou o professor de uma comunidade ribeirinha do Bailique que participou de uma das oficinas.“Em pleno século 21 estão pensando na exploração de petróleo e combustível na Costa do Amapá, local que poderia estar sendo usado para o desenvolvimento de energia solar, eólica, com um potencial econômico enorme e um impacto ambiental muito menor”, afirmou. 

 

O professor também falou sobre a preocupação da comunidade onde vive com a possibilidade de haver mais uma exploração de grande escala na região Amazônica, local de grande importância, mas também de muita sensibilidade às mudanças climáticas e também humanas.

 

“Primeiro eles diziam que era só um ponto de exploração, atualmente, são mais de 50 pontos e isso não é dito na mídia”. De acordo o seu relato, ao longo dos anos, a comunidade tem se dado conta de que esses empreendimentos não trazem grandes benefícios. “Eles só enriquecem, enquanto que nós, que estamos aqui na base somos deixados de lado, herdando possíveis prejuízos ambientais, sociais e culturais, que só tendem a prejudicar ainda mais a convivência em comunidade”, declarou. 

 

Violência contra ativistas


O Brasil ocupa o segundo lugar no ranking mundial de assassinatos de defensores ambientais, segundo relatório da Global Witness. Em 2022, 25 ativistas foram mortos no país. Apesar de uma redução em relação ao ano anterior, quando 34 mortes foram registradas, a violência contra aqueles que protegem o meio ambiente permanece uma grave realidade.

No panorama global, 196 defensores da terra e do meio ambiente foram assassinados em 2022, com a Colômbia liderando o ranking. No Brasil, a violência está intrinsecamente ligada a problemas estruturais, como a concentração fundiária, o desmatamento desenfreado e a falta de reconhecimento legal dos territórios indígenas e quilombolas. Além dos homicídios, ativistas brasileiros enfrentam perseguições constantes, campanhas de difamação e processos judiciais abusivos, conhecidos como SLAPP (litigância estratégica contra a participação pública).

Na Amazônia, por exemplo, foram identificados 11 assassinatos de indígenas apenas em 2022. Globalmente, os povos indígenas estão entre os mais ameaçados: 36% dos ativistas assassinados pertenciam a essa categoria, somando 39 vítimas. Pequenos agricultores (22%) e afrodescendentes (7%) também aparecem entre os alvos frequentes.

“Infelizmente, o Brasil continua no topo desse ranking,” lamenta Nicole de Oliveira, diretora executiva da ARAYARA. “Essa situação já se arrasta há anos e, até agora, não foi enfrentada de maneira efetiva pelo governo. Casos emblemáticos, como os assassinatos de Bruno Pereira e Dom Phillips, ganharam repercussão internacional, mas muitos defensores permanecem invisíveis em suas lutas e mortes. É ainda mais alarmante que o Brasil sequer tenha ratificado o Acordo de Escazú, que busca proteger os direitos dos ativistas,criticou.

Oliveira também destacou os riscos enfrentados pelos defensores ambientais durante o lançamento do relatório da Global Climate Legal Defense (CliDef), As Vidas Perigosas dos Defensores do Clima, na Climate Week deste ano. “A indústria de combustíveis fósseis tenta silenciar os que protegem territórios ameaçados. Eu mesma enfrento processos criminais por defender o meio ambiente e as comunidades afetadas,” revelou.

Recomendações do MPF

 

O Ministério Público Federal (MPF) recomendou ao Ibama que exija complementações aos estudos da Petrobras antes de decidir sobre a licença para o bloco FZA-M-59. Entre as pendências está a revisão do Plano de Emergência Individual (PEI), que atualmente não contempla adequadamente fenômenos meteorológicos extremos nem apresenta garantias de resposta eficaz a acidentes.

 

A diretora da ARAYARA explica que a disputa pelo futuro da Foz do Amazonas vai além da questão ambiental: é também uma luta pelos direitos humanos e pela proteção de um dos ecossistemas mais ricos e importantes do mundo. Segundo Oliveira, ações de intimidação são estratégias para desacreditar os movimentos ambientais e intimidar lideranças comunitárias.

 

“Enquanto o Brasil permanece em destaque nas estatísticas globais de violência ambiental, a negligência governamental e o avanço da exploração fóssil predatória continuam colocando em risco tanto os defensores da natureza quanto os ecossistemas que tentam proteger”, declara Oliveira.

Congresso aprova marco da eólica offshore com incentivo ao carvão

Congresso aprova marco da eólica offshore com incentivo ao carvão

Câmara ressuscitou “jabutis” da privatização da Eletrobras e assegurou a contratação, até 2050, de termelétricas movidas a gás e carvão. Governo estuda veto

Originalmente publicado em O Eco, por Ellen Nemitz em 19/12/2024. 

O urgente projeto de tornar o setor elétrico brasileiro mais verde sofreu um importante revés no Congresso Nacional. O Projeto de Lei n. 576/2021, que traz uma esperada regulamentação da outorga de autorizações para aproveitamento de potencial energético offshore (em alto mar), foi aprovado com um grande “jabuti” – o incentivo às termelétricas à carvão e gás até 2050.

O Marco Regulatório das Eólicas em Alto-Mar, de autoria do senador Jean-Paul Prates (PT/RN), delimita regras para o aproveitamento das águas marinhas brasileiras para a instalação de usinas de captação da energia dos ventos na costa. O texto veda, por exemplo, a instalação das plantas em rotas de navegação, áreas protegidas pela legislação ambiental e áreas tombadas como paisagem cultural e natural, além de restringir o conflito de interesses econômicos em regiões já utilizadas pela indústria offshore de petróleo e gás.

No entanto, a redação final aprovada pelo Senado na última quinta-feira (12), e que segue para sanção presidencial, é um substitutivo na Câmara dos Deputados que reedita os jabutis da privatização da Eletrobras pela Lei 14.182/2021 e insere obrigatoriedades em relação à produção de energia termelétrica de fontes sujas, como gás e carvão.

O texto assegura a contratação de reserva de capacidade de termelétricas com efetividade até 31 de dezembro de 2050, além da contratação de energia oriunda de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), de hidrogênio líquido gerado a partir de etanol e da produção de parques eólicos. A matéria passou pela Comissão de Serviços de Infraestrutura (CI) no início do mês, onde recebeu relatoria favorável do senador Weverton Rocha (PDT-MA), e foi a votação em plenário a toque de caixa.

De acordo com o gerente de projetos do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA), Ricardo Lacerda Baitello, esta versão do “jabuti” é ainda mais preocupante, porque, embora reduza a obrigatoriedade de contratação de 8 GW para 4,25 GW, aumenta as chances de sucesso nos leilões futuros ao ajustar o preço teto, tornando o investimento mais atraente para empresas – um dos motivos que fizeram leilões anteriores serem fracassados foi o fato de o texto da Lei de Privatização da Eletrobras prever a instalação das usinas em regiões do país sem infraestrutura de gasodutos, uma estratégia para fomentar o desenvolvimento, mas que encarece os custos dos empreendimentos. “Outro fator é a extensão da vida útil das térmicas a carvão, que já estava em 2040 e vai para 2050″, acrescenta Baitello.

De acordo com estimativa feita pela Frente Nacional dos Consumidores de Energia, a mudança proposta pela matéria pode representar um aumento de 9% no custo da energia e uma despesa anual de R$21 bilhões em subsídios até 2050. Além disso, o Instituto Arayara, que classificou o substitutivo como “o maior retrocesso para a transição energética justa e sustentável no Brasil”, destaca que as emendas pró-gás natural e carvão mineral adicionadas ao projeto têm o potencial de gerar 274,4 milhões de toneladas de CO2 equivalente ao longo dos próximos 25 anos – um volume comparável às emissões anuais combinadas do setor de transportes e da produção de combustíveis fósseis no Brasil. “Esse retrocesso ambiental ameaça neutralizar os avanços obtidos com a redução do desmatamento da Amazônia entre 2022 e 2023, comprometendo os esforços do país no combate às mudanças climáticas”, afirma a nota do Arayara.

Na votação, o texto substitutivo teve 40 votos favoráveis e 28 contrários. De acordo com a Coalizão Energia Limpa, em análise prévia à aprovação do texto em plenário, os senadores governistas Otto Alencar (PSD/BA) e Jaques Wagner (PT/BA) haviam sinalizado que a decisão ainda pode ser revertida por veto presidencial, mas que o caminho é bastante incerto. Baitello também avalia que é difícil prever, neste momento, se o governo vai vetar os jabutis e aprovar o marco regulatório em sua versão original.

O Instituto Arayara destaca ainda que esta não é a primeira tentativa da indústria do carvão de fazer lobby em prol da energia suja dentro de projetos que deveriam tratar da transição para uma matriz mais sustentável, e que a aprovação do substitutivo com os jabutis entra em contradição com outro projeto votado na mesma semana: o PL 327/2021, que institui o Programa de Aceleração da Transição Energética (PATEN), cujo objetivo é justamente incentivar a substituição de matrizes poluentes por fontes renováveis.

O panorama da energia eólica offshore
Atualmente o Ibama tem mais de 100 pedidos de licenciamento ambiental protocolados, em um dos filões econômicos mais visados pela indústria de olho no potencial eólico do país. A produção de hidrogênio verde – tipo de combustível catalisado pela energia renovável dos ventos – é o carro-chefe de boa parte dos empreendimentos e consta nos projetos de transição energética do governo brasileiro.

Vale lembrar, contudo, que a mera aprovação de um marco regulatório, embora muito aguardada pelos setores que acompanham a transição energética, não garante a sustentabilidade do setor. Devido à complexidade destes empreendimentos, os quais impactam diretamente um delicado ecossistema marinho, é necessário que os estudos técnicos e relatórios de impacto ambiental (EIA/RIMA), previstos no PL 576/2021, sejam levados a cabo pelas empresas e devidamente exigidos pelos órgãos ambientais competentes, como já mostrou esta reportagem de ((o))eco.

“A gente precisaria de um processo mais amplo. No IEMA a gente tem discutido a possibilidade de revisão deste processo no qual muita pressão é colocada sobre o licenciamento, sobre um órgão ambiental [o Ibama] para fazer a discussão com a sociedade e os [setores e pessoas] impactados. A gente defende uma revisão para um processo mais estrutural em que se possa discutir os projetos antes de eles serem leiloados ou arrematados”, explica Ricardo Baitello.

 

 

Dois times, duas medidas

Dois times, duas medidas

Na semana passada, o Brasil apresentou sua nova meta climática, a famosa NDC, na Conferência do Clima que está ocorrendo em Baku, no Azerbaijão. A delegação está sendo liderada pelo vice-presidente Geraldo Alckmin, na ausência do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o que levanta questionamentos sobre o compromisso do governo com a agenda climática. Apesar de ter reduzido com sucesso o desmatamento na Amazônia, este é também o governo que defende a exploração de petróleo na Margem Equatorial. E a regra é clara: o atleta não pode jogar cada tempo do jogo por um dos times.

Aos fatos: a nova Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) do Brasil, divulgada na noite da última sexta-feira, dia 8 de novembro, em Brasília, prevê uma redução das emissões líquidas de gases de efeito estufa entre 59% e 67% até 2035, em comparação com os níveis de 2005. Esse compromisso foi anunciado discretamente, apenas por meio de uma nota no site oficial do Planalto, sem entrevistas ou explicações detalhadas. É como se o treinador de um time terminasse a partida sem passar pela coletiva de imprensa. A falta de transparência e de informações específicas têm gerado dúvidas na sociedade civil

“O Brasil segue ampliando projetos baseados em combustíveis fósseis, o que contraria os objetivos de redução”, diz Nicole Oliveira

Nesta semana, o Observatório do Clima circulou uma nota, na COP, apontando uma disparidade entre o discurso do governo e as ações necessárias para alcançar a meta de limitar o aquecimento global a 1,5°C, conforme previsto no Acordo de Paris. Para a organização, as metas brasileiras precisam de um alcance mais robusto para contribuir de maneira significativa no esforço climático global. (Verdade seja dita, as metas dos países desenvolvidos são igualmente fracas, como também apontou o OC).

A diretora executiva do Instituto Internacional Arayara, Nicole Figueiredo de Oliveira, classificou como decepcionante a nova NDC apresentada pelo Brasil, ressaltando que o plano nem sequer inclui a meta de desmatamento zero. “Nos preocupa também a expansão projetada pelo Ministério de Minas e Energia no PDE 2034 de 13 gigawatts de novas termelétricas. Além de estabelecer uma meta muito aquém da ambição necessária, o Brasil continua ampliando projetos baseados em combustíveis fósseis, o que contraria os objetivos de redução de emissões e transição para uma economia de baixo carbono”, ressaltou Oliveira.

Incertezas do Plano Clima e outras contradições

Plano Clima do governo federal, que será a principal estratégia para a implementação das metas até 2035, ainda está em desenvolvimento, com conclusão prevista para 2025. A falta de detalhes e de planejamento específico levanta preocupações sobre a capacidade de executar as metas com eficiência. O governo tem apostado em instrumentos financeiros como o Fundo Clima, do BNDES, e Títulos Soberanos Sustentáveis, do Tesouro Nacional, para financiar as metas, mas a dependência de recursos externos pode limitar a eficácia das ações.

Outra contradição notável é a concessão de licenças para a exploração de petróleo na Amazônia. O Instituto Internacional Arayara, juntamente com a Fundação Urgewald, se reuniram recentemente com os gestores e financiadores estrangeiros do Fundo Amazônia. Foi sugerido que as futuras contribuições de países como Noruega e Alemanha sejam feitas com a condição de haver uma mudança nas políticas ambientais do governo brasileiro, assumindo um compromisso de não expandir a fronteira de petróleo e gás neste bioma. Segundo estudos da Arayara, 101 projetos financiados pelo Fundo Amazônia estão em áreas de projetos de exploração de petróleo e gás, sendo 77 deles na Amazônia Legal, ameaçando diretamente a preservação e colocando em risco os avanços ambientais do fundo.

As metas anunciadas pelo Brasil na COP-29 representam um desafio crucial: a necessidade de alinhar discurso e prática com políticas concretas e inclusivas. “Para assumir uma posição de liderança ambiental global, o país precisará demonstrar mais do que compromissos ambiciosos; será necessário implementar medidas que realmente atendam à preservação e às demandas das comunidades tradicionais”, completou Nicole Oliveira. Se o governo quiser mesmo se comprometer com a proteção da Amazônia, ele precisa parar de pressionar o Ibama para liberar novas licenças de exploração petrolífera na região. Não se vence uma partida jogando pelos dois times.

Fonte: Central da COP

COP16: Brasil apoia frente parlamentar em defesa de um futuro livre dos combustíveis fósseis

COP16: Brasil apoia frente parlamentar em defesa de um futuro livre dos combustíveis fósseis

Na manhã desta sexta-feira (25), o Instituto Internacional Arayara uniu-se a uma coalizão de parlamentares latino-americanos para conter a expansão da exploração de petróleo na Amazônia, durante a primeira audiência pública da Frente Parlamentar Global pelo Futuro Livre de Combustíveis Fósseis. O evento faz parte da programação da COP16, que acontece até o dia 1º de novembro em Cali, na Colômbia.

Com o tema “Situação Atual da Exploração de Petróleo e Gás no Bioma Amazônico”, a audiência teve como objetivo delinear estratégias para reduzir a dependência de combustíveis fósseis e promover uma transição justa para energias renováveis.

Mobilização Global Contra a Exploração Fóssil

A Frente Parlamentar Global pelo Futuro Livre de Combustíveis Fósseis reúne mais de 800 legisladores de 95 países e tem como objetivo conter a expansão do petróleo, gás e carvão, além de fomentar o financiamento de iniciativas climáticas. Durante o evento, uma carta aberta de parlamentares de 11 países da América foi apresentada à ministra colombiana Susana Muhamad. O documento solicita novos compromissos concretos e tratados internacionais, complementando os acordos já estabelecidos pelo Acordo de Paris. Entre as propostas, destacam-se:

-Eliminação gradual e justa dos combustíveis fósseis;

-Adoção de políticas que assegurem 100% de acesso global às energias renováveis;

-Destinação de orçamentos nacionais para apoiar a transição energética limpa em nível mundial.

“Essa iniciativa mostra que a mobilização por uma política energética sustentável e respeitosa com o meio ambiente e as comunidades indígenas continua ativa, buscando reduzir a exploração predatória e estimular uma transição justa e duradoura para energias renováveis”, declarou o diretor-presidente da Arayara, Juliano Bueno de Araújo.

Amazônia livre dos fósseis

Presidida pelo deputado colombiano Juan Carlos Lozada, a mesa de abertura da primeira Audiência Pública: “Situação Atual da Exploração de Petróleo e Gás no Bioma Amazônico” da Frente Parlamentar Global pelo Futuro Livre de Combustíveis Fósseis contou com a participação da Deputada Federal Célia Xakriabá (PSOL-MG), do Ministro de Minas e Energia da Colômbia, Andrés Camacho, e das deputadas Jahiren Noriega, do Equador, e Ruth Luque, do Peru.

O evento foi organizado em três blocos temáticos e reuniu especialistas e comunidades indígenas para discutir questões críticas envolvendo a Amazônia. O primeiro bloco abordou os impactos da indústria de petróleo e gás na região, com foco nas consequências ambientais e sociais da exploração de combustíveis fósseis, além das vozes indígenas impactadas. O segundo bloco tratou dos planos de expansão da indústria de petróleo e gás na Amazônia. No terceiro, foram discutidas as obrigações extraterritoriais e os impactos das empresas petrolíferas transnacionais na Amazônia.

“Defendemos a interrupção e a saída gradual dos combustíveis fósseis na Amazônia”, declarou o gerente-geral da ARAYARA, Vinícius Nora, durante sua participação no segundo painel. O biólogo apresentou estudos do “Monitor Oceano”, uma ferramenta lançada em agosto pelo Instituto Internacional Arayara em parceria com outras organizações, que monitora os impactos da exploração de combustíveis fósseis nos ecossistemas marinhos brasileiros.

“Nossa luta contra a indústria fóssil nesse bioma é fundamental para a regulação do clima global. Com esta ferramenta, conseguimos evidenciar os impactos dessa exploração na biodiversidade e nas comunidades costeiras”, pontuou Nora.

Litígios e defesa da Amazônia

O Instituto Internacional Arayara, a maior ONG de litigância ambiental da América Latina, junto com a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), moveu ações judiciais contra 77 blocos de exploração ofertados no leilão da ANP em 2023. Dados do Monitor Oceano contribuíram para a exclusão de 14 blocos de petróleo na costa amazônica da lista de ofertas da Agência Nacional do Petróleo (ANP), e algumas empresas desistiram de aquisições.

Recentemente, a ANP aprovou novas versões do edital de licitações para a Oferta Permanente de Concessão (OPC), com a publicação final prevista para janeiro de 2025, oferecendo 404 blocos exploratórios em 12 bacias sedimentares, sendo 54 deles em terra e 350 no mar.

ARAYARA NA MÍDIA | Projeto de exploração de petróleo na Amazônia brasileira expõe disputas de interesses

ARAYARA NA MÍDIA | Projeto de exploração de petróleo na Amazônia brasileira expõe disputas de interesses

Aumenta a pressão do mercado para que a Petrobras seja autorizada a fazer estudos de exploração na foz do rio Amazonas. Por outro lado, a sociedade civil se organiza e tenta impedir que a região seja alvo da atividade petroleira.

 

Matéria de Alice Martins Morais para o climatetrackerlatam.org publicada em 18/10/2024.

Enquanto mantém um discurso de liderança na diplomacia ambiental, o Brasil enfrenta uma contradição dentro do seu próprio território. O país produz mais de 3 milhões de barris de petróleo por dia, é o nono maior produtor no planeta e o primeiro da América Latina. E a petroleira estatal Petrobras quer expandir ainda mais as perfurações, desta vez na Amazônia. A exploração seria bem próxima do estado do Pará, cuja capital, Belém, será sede da Conferência das Nações Unidas, a COP30, em 2025.

Passaram-se 16 meses desde que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) indeferiu o pedido inicial da Petrobras de começar a perfurar poços para pesquisar se realmente há potencial de extração no local. A decisão foi baseada em diversas justificativas, como a falta de estrutura de atendimento à fauna em um eventual acidente. Isso porque, mesmo que apenas para pesquisa, as medidas de precaução devem ser praticamente as mesmas que no cenário de produção, já que os riscos são similares.

Essa é a segunda negativa para atividades de perfuração na região. Em 2018, o Ibama negou a emissão de licença para cinco blocos sob controle da empresa Total. Apesar da decisão técnica,  a Petrobras não desistiu de obter a autorização. Desde então, a empresa continua insistindo com o órgão e, em paralelo, realizando expedições científicas para subsidiar seus argumentos. Em maio de 2023, a empresa protocolou um pedido de reconsideração da decisão, na qual se prontificou a ampliar seus esforços, inclusive investindo na base de estabilização de fauna na cidade de Oiapoque, para atuar em conjunto com a base já existente em Belém.

Diversas organizações organizaram protestos durante a programação do Diálogos Amazônicos, em 2023, em Belém. Créditos: Divulgação / Instituto Internacional Arayara.

Ainda não se sabe ao certo quando o Ibama deve dar uma nova resposta, em cima do pedido de reconsideração da petroleira. Em nota, o Instituto informou que “a análise do processo está em andamento” e que “a equipe técnica continua avaliando as informações para elaborar um novo parecer técnico”, após “as complementações relativas ao Plano de Proteção e Atendimento à Fauna Oleada (PPAF) pela Petrobras”, concluído em 02 de agosto de 2024.

No entanto, a pressão é grande. O próprio Governo Federal vem se dividindo sobre o tópico. O Ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e a presidente da Petrobras, Magda Chambriard, defendem a perfuração o quanto antes, alegando que o país vai precisar importar o combustível a partir de 2030 se não for por esse caminho.

Já a Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, afirmou em diversas ocasiões que a decisão do Ibama será puramente técnica. O presidente do Instituto, Rodrigo Agostinho, por sua vez, declarou em junho, em entrevista ao O Globo, que “o brasileiro não vai ficar sem gasolina por causa disso” e trouxe como um dos pontos de complexidade a falta de estudos na região.

Esperança por desenvolvimento e medo pelos riscos separam a população

A população do Amapá também se divide em opiniões. É o que observa Luene Karipuna, liderança indígena residente em Oiapoque, no Amapá, município no extremo Norte do Brasil, o mais próximo do local onde se planeja a exploração do petróleo. A cidade fica a 160km do bloco F-59, como é chamada a área da bacia sedimentar, no meio do oceano Atlântico, que está em discussão.

“Há um sentimento de que a pobreza vai acabar se começar a exploração de petróleo e tem até mesmo um discurso de que é preciso explorar esse petróleo para poder fazer a transição energética”, enfatiza. Ela nota que essa opinião é defendida por muitos moradores da zona urbana.

Oiapoque é uma cidade que enfrenta vários problemas de infraestrutura. O último Censo divulgado (2010) mostrava que apenas 0,2% das vias públicas eram  urbanizadas e somente 24,8% da população tem acesso ao esgotamento sanitário adequado. Nas áreas indígenas, o principal impacto percebido pela liderança é em relação à nova dinâmica aérea. Há dois anos, o aeródromo de Oiapoque começou a receber investimentos da Petrobras e transportar aeronaves com funcionários da empresa. Segundo ela, foi quando a população das Terras Indígenas Galibi do Oiapoque e Juminã começaram a ser afetados pela repentina movimentação. “Começou a assustar as famílias, principalmente as crianças que não estão acostumadas com esse tipo de barulho. As caças e os pássaros também se assustavam”, relata.

Preocupados com o que pode vir no futuro, os povos indígenas começaram a buscar parcerias fora de sua comunidade para se aprofundar no debate sobre a exploração de petróleo e da transição energética. Luene é atualmente uma das mobilizadoras locais em torno do Tratado de Não Proliferação de Combustíveis Fósseis, uma iniciativa global que advoga para a cooperação entre governos, sociedade civil e outras lideranças pela aceleração da transição energética justa.

O compromisso é voluntário e não-vinculante, mas, mesmo assim, apenas 14 nações assinaram, sendo apenas uma da América Latina – a Colômbia, que se juntou durante a COP28, em 2023.

No Brasil, várias entidades não governamentais apoiam o Tratado oficialmente, mas do poder público a adesão veio apenas da prefeitura de Belém. Para Luene, a posição do Governo Federal é contraditória. “O governo brasileiro diz que defende a Amazônia, mas ao fim do dia entrou para a Opep+ [Organização dos Países Exportadores de Petróleo]”, critica.

Para Andrés Gómez, coordenador para América Latina e Caribe do Tratado, a participação dos povos indígenas no movimento é fundamental. “As organizações e povos indígenas são quem habitam o território, mesmo antes do Estado. O apoio que podem gerar, em rede, é muito importante e isso também gera pressão em torno dos governos”, diz, citando também o caso da Colômbia, onde o povo Waorani tem pressionado o governo a parar a extração de petróleo em um parque nacional.

Conferências podem trazer visibilidade à discussão

De acordo com Luene, os povos indígenas não costumam ter espaço na mesa para dialogar com os tomadores de poder, mas as conferências internacionais são uma janela para preencher essa lacuna e trazer visibilidade à pauta. Na Cúpula da Amazônia, realizada em 2023, em Belém, o Tratado de Não Proliferação de Combustíveis Fósseis articulou em torno do assunto – aliás, foi quando a cidade anfitriã assinou o compromisso.

Luene Karipuna, em ação do Greenpeace em março de 2024 – Créditos Marizilda Cruppe / Greenpeace

A Cúpula reuniu presidentes e ministros dos países pan-amazônicos (Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela). Além dos encontros oficiais, a programação contou com 27 mil pessoas em atividades prévias da sociedade civil e, nesses espaços, emergiu o movimento “Amazônia livre de petróleo”, no qual diversas representações protestaram contra a perfuração na Foz do Amazonas, reforçando que a discussão não poderia ser deixada de lado.. “Esses momentos são importantes para nos conectarmos e unirmos forças. A gente percebe que tem outros grupos, em outros países, lutando pelas mesmas coisas”, afirma Luene.

A liderança analisa que, daqui até a COP30, o movimento precisa se articular cada vez mais para aproveitar a visibilidade e, quem sabe, impedir de vez a exploração no território. “Eu percebo que muitas pessoas falam de forma superficial sobre a Amazônia, mas desconhecem as pessoas que moram na região, e a COP30 vai dar essa oportunidade de sensibilizar”, conclui.

Histórico de 50 anos do setor na Amazônia

A presença de petrolíferas nas proximidades da Foz do Amazonas não é algo novo. A Petrobras, por exemplo, já tem atividades na região desde 1970. Dados públicos da Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP), expostos pela epbr em maio de 2023, apontam que ali já houve 95 perfurações, sendo que todas, até o momento, ocorreram em águas rasas, ou seja, de 400m ou menos de profundidade. Nesse caso, é inserida uma plataforma fixa, estrutura metálica presa ao fundo do mar.

Ao todo, conforme mostra o levantamento da epbr, 27 desses poços perfurados para pesquisas foram finalizados por causa de acidentes mecânicos. A maioria, por não ter encontrado petróleo, por dificuldades logísticas ou por indícios subcomerciais.

Agora, a Petrobras anseia ser a primeira explorar águas profundas na região. Para esse tipo de exploração, é preciso instalar sistemas flutuantes, amarrados ao solo submarino por correntes, cabos de aço ou poliéster.  A oceanógrafa Kerlem Carvalho explica que a tecnologia de ponta é necessária porque as águas profundas possuem especificidades de salinidade, temperatura e, principalmente, de pressão que impactam na operação. “Quanto maior a profundidade da água, maior vai ser a pressão. E, no caso da segurança operacional dessas indústrias, traz um risco maior de ter falha de equipamento que vai perfurar esse local, se ele não for projetado adequadamente”, adverte, explicando que tubulações, cabos e outros itens ficam sob uma força muito grande, que é natural desse ambiente.

Carvalho atua como analista ambiental  na organização da sociedade civil (OSC) sem fins lucrativos Instituto Internacional Arayara, e menciona que outro fator de preocupação é a maior dificuldade de que o serviço de emergência chegue a tempo em casos de acidentes de vazamento, por estar muito longe da costa.

Plataforma pretende democratizar acesso a dados públicos

Embora o histórico seja longo na região, as informações sobre a exploração de petróleo local nem sempre são de fácil entendimento. A começar pelo próprio termo usado pela Petrobras: Margem Equatorial, que no Brasil é o trecho de 2.200 quilômetros que vai da costa do Rio Grande do Norte ao Amapá. Já a Foz do Amazonas é uma das cinco grandes regiões da Margem, e inclui os territórios do Pará e Amapá que, mesmo parecendo distantes geograficamente, sofrem muita influência da foz, ou seja, do local onde o rio Amazonas deságua no Oceano Atlântico.

De acordo com o Arayara, encontrar os dados públicos também não é uma tarefa simples. São mais de 70 fontes onde essas informações estão dispersas e geralmente com linguagem técnica.

Pensando nessas dificuldades, o Instituto, em parceria com o Observatório do Clima, lançou o “Monitor Amazônia Livre de Petróleo e Gás” há um ano. A plataforma está disponível em português, inglês e espanhol e tem o objetivo de democratizar o acesso aos dados.

No site, qualquer um pode conferir os dados atualizados de onde estão os blocos petrolíferos, qual o status (em exploração ou produção, em estudo ou área reservada, em oferta ou solicitação) e mais detalhes sobre a empresa operadora e se está em um território indígena, dentre outros fatores.

O Instituto Arayara foi uma das organizações à frente dos protestos da Amazônia Livre de Petróleo na Cúpula de Belém. Para Vinicius Nora, gerente de Oceanos e Clima da OSC, o principal resultado é ver que pesquisadores e movimentos sociais estão podendo se apropriar mais da discussão com o Monitor.

Ele comemora também que, em junho deste ano, a ANP decidiu remover 15 blocos da lista de áreas disponíveis para exploração e produção no país, devido a restrições socioambientais, como a proximidade a terras indígenas e unidades de conservação. “Essa sobreposição nós mesmos já tínhamos identificado no Monitor e, por conta disso, entramos com ações judiciais para tentar impedir a oferta dessas áreas”, recorda.

Apesar de não ter tido sucesso direto na Justiça, ele acredita que a mudança percebida agora pela ANP é reflexo da pressão civil. Em 2024, o edital de leilão de blocos passa por uma revisão e é a primeira vez, em sete anos, que o Brasil não terá uma nova licitação para concessão de áreas para exploração de petróleo.

Nora acompanha cada passo das decisões em torno da exploração na Foz do Amazonas e considera que as consultas prévias às comunidades da região podem travar o processo, porque podem aflorar as preocupações que os povos já possuem sobre o tema. “Por outro lado, mudanças políticas no Ibama e MMA, por exemplo, podem também mudar o andar das decisões, porque a pressão está muito grande em prol da exploração e o rumo pode mudar a qualquer momento”, pondera.

Além do Instituto Arayara, outras instituições vêm fazendo campanha por uma Amazônia livre de combustíveis fósseis nas redes sociais, nos seus territórios e fazendo pressão a autoridades políticas, dentre elas o Instituto ClimaInfo, a Associação das Mulheres Indígenas em Mutirão (Amim) e as ONGs Greenpeace Brasil e WWF-Brasil. Mais de 20 organizações do Amapá e Pará assinaram carta aberta no ano passado para declarar apoio à decisão do Ibama e até o momento 18 organizações e instituições nacionais, assim como oito parlamentares, assinaram o Tratado de Não Proliferação de Combustíveis Fósseis.

Marcha contra-petroleo durante os Dialogos Amazonicos. Creditos: Renata Sembay – ARAYARA.ORG

Petrobras realiza expedições na região

Enquanto aguarda nova decisão do Ibama, a Petrobras continua sua atuação na Foz do Amazonas, principalmente com atividades relacionadas ao seu Centro de Pesquisas (Cenpes). A bióloga Talita Pereira lidera os projetos com foco ambiental e explicou, em palestra realizada em maio deste ano em Belém, que a meta é ter uma maior compreensão da biodiversidade e a composição geológica dessa área, dentre outros fatores. Além disso, Pereira disse que há uma expectativa de fazer mais parcerias com instituições de pesquisas da região e que a empresa tem investido com recursos humanos e financeiros para contribuir com o conhecimento científico da região.

Desde o ano passado, a Petrobras vem realizando expedições científicas, em parceria com a Marinha do Brasil e Ministério da Ciência Tecnologia e Inovação (MCTI) e Serviço Geológico do Brasil (SGB), além de grupos de pesquisa de universidades. “A gente tem a possibilidade, através de embarcações, de trazer o recurso que é necessário para essa atuação, para conseguir preencher uma lacuna de conhecimento importante”, declarou Pereira. Climate Tracker solicitou atualizações sobre os resultados dessas pesquisas, mas não teve retorno até o fechamento do texto.

Dentre os 13 projetos de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação até então em andamento, Pereira detalhou que o CENPES também tem focado no desenvolvimento de tecnologias remotas e digitais, como drones e veículos autônomos para atuarem na resposta a possíveis emergências. “A gente sabe das vulnerabilidades e das dificuldades. Até aqui o Plano de Emergência e Fauna já conta com várias embarcações, cem profissionais… existe um esforço muito grande de disponibilização de equipamentos e recursos para tentar suprir eventuais questões. Tenho certeza que temos toda a tecnologia necessária para uma operação segura, mas obviamente que há riscos que a gente precisa se precaver, trabalhando na linha da prevenção”, complementou.

Biodiversidade ainda é pouco conhecida

A biodiversidade da Foz do Amazonas ainda é pouco conhecida e, por isso, é um fator que preocupa ao se falar de exploração de petróleo na região. Claudia Funi, pesquisadora do Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Amapá (IEPA), chama a atenção para o fato de que há pouquíssimos lugares no mundo que sejam tão dinâmicos quanto esse trecho. Por isso, as modelagens que funcionam em outros locais não conseguem se adaptar à realidade local. “Nos dados mais conservadores, são mais de 200 milhões de litros de água por segundo que a foz despeja no oceano. É a maior carga de água doce que um sistema despeja no oceano no planeta todo. Nada chega perto”, enfatiza.

Claudia Funi em evento de apresentação do Plano Foz no Dia do Oceano, em Macapá – Créditos Agência Amapá

Geógrafa e mestre em Biodiversidade Tropical, Funi explica que, para começar a entender essa dinâmica, é preciso ter monitoramento constante por pelo menos três anos. “A gente não conhece as correntes superficiais mais profundas para essa região da foz. Até a maré, precisamos de mais pontos para entender. Temos a maior variação de maré do planeta, chegando a 12 metros, mas ela tem comportamentos diferentes ao longo da costa”

A pesquisadora é uma das autoras do Plano Foz de monitoramento da costa oceânica do estado e da foz do rio Amazonas, uma iniciativa que busca financiamento e que propõe a implementação de redes de medições para investigar questões como a hidrodinâmica, salinidade, corrente marítima, o vento e a temperatura, dentre outros aspectos. O Plano envolve pesquisadores, técnicos e professores de instituições como a Universidade Federal do Pará (UFPA), Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA), Universidade de Brasília (UNB) e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).

“A foz é muito pouco estudada. Tem um desafio logístico muito grande, requer um recurso muito maior do que em outras regiões”, contextualiza. “Mas, sem dados, tudo que for feito vai gastar mais tempo, energia e dinheiro e não vai conseguir ter o preparo da maneira correta”, conclui.

A pesquisadora observa que pouco mudou desde que o Ibama indeferiu o pedido da Petrobras. “O que teve de avanço é que vamos atualizar as cartas de sensibilidade de derramamento de óleo. Estamos iniciando as tratativas agora”.

Os documentos, conhecidos como Cartas SAO, mapeiam a vulnerabilidade de uma região a um eventual derramamento de óleo, e incluem informações como sensibilidade dos ecossistemas marinhos e costeiros, recursos biológicos e usos humanos dos espaços. As cartas atuais foram entregues em 2016, por pesquisadores do Museu Paraense Emílio Goeldi, INPA e UFPA, e mostram que, em um cenário pessimista, os ambientes ficam muito vulneráveis, por uma gama de características próprias do local, como a presença abundante de manguezais, que seriam extremamente difíceis de limpar em caso de vazamento.