+55 (41) 9 8445 0000 arayara@arayara.org

No Ipea, associação denuncia “assédio institucional como método de governo” e vai ao STF para criar jurisprudência

Foto: José Celso Cardoso Jr, presidente da Associação dos Funcionários do Ipea

Assédio institucional e estratégia de destruição do Estado Brasileiro. As duas expressões frequentam o dia a dia do funcionalismo federal desde quando se iniciou o mandato do Presidente Jair Bolsonaro. Ele procura afastar todo tipo de manifestação técnica, administrativa ou acadêmica nas áreas que impactam diretamente as suas bases política e econômica.

Os casos mais notórios estão Ministério do Meio Ambiente, onde o titular Ricardo Salles persegue servidores que aplicam multas contra crimes ambientais e favorece grupos econômicos que desmatam e garimpam em terras protegidas, como acontece agora na invasão às reservas indígenas Yanomami (em Roraima) e Munduruku (Mato Grosso).

Servidores de todos os órgãos públicos relatam casos em que passaram a sofrer, por parte de chefias bolsonatistas, ameaças de punições a estudos científicos, censura contra manifestações democráticas, constrangimentos de toda ordem e até ilegais ameaças de demissão para quem tem estabilidade no emprego garantida constitucionalmente.

É o que ocorre no Instituto de Pequisa Econômica Aplicada (Ipea), segundo a associação de funcionários do órgão. O Ipea é uma fundação do Ministério da Economia, que produz pesquisas sobre todas as áreas da administração para subsidiar políticas públicas, e que são disponibilizados para a sociedade.

“Há uma seleção dos temas e de qual abordagem a ser priorizada. Alguns funcionários temem ser censurados, mas a grande maioria teve autocensura diante da insegurança que a normativa trouxe. Os próprios servidores passaram a negar a entrevistas ou até a não ofererer o seu trabalho para publicação, com medo de sofrerem represálias do presidente do órgão, Carlos von Doellinger, ligado ao Ministro da Economia, Paulo Guedes”, denuncia o doutor em economia José Celso Cardoso Jr, presidente da Associação dos Funcionários do Ipea.

“Desde de 2016, com o impeachment da presidenta Dilma, o Ipea sofre um processo de esvaziamento de quadros, deterioração do orçamento e de escanteamento estratégico. Mais recentemente, o que vem acontecendo é um controle seletivo do que os servidores podem falar”, completa José Celso.

Ele afirma que “o que se está fazendo é impedir que o órgão que foi criado para criar conhecimento sobre todas as realidades que o Brasil enfrenta possa cumprir a sua missão institucional. É parte de um processo de controle da informação a artir da produção do conhecimento dos órgãos públicos como eles sempre fizeram.

Devido a esta situação, a Associação ajuizou no início de maio uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para questionar atos internos ao Ipea, que obrigam os servidores a submeterem à censura da assessoria de comunicação todo tipo de entrevista e até de participação em eventos acadêmicos. “Nunca na história do Ipea a comunicação teve esse papel˜, observa José Celso.

O STF determinou que fosse iniciada uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 834, e determinou que sua relatora fosse a ministra Cármen Lúcia. Em 10 de maio, ela instou Doellinguer a se manifestar.

Caso aceite a ADPF, a Ação vai criar jurisprudência, inclusive retroativamente, a todo o poder público federal e provavelmente vai iniciar uma discussão no Congresso nacional sobre a criação de uma lei que caracterize o assédio institucional, a exemplo do que já ocorre nos casos de assédio moral e sexual, que também são tipificados legalmente.

A associação reclama de dois atos assinados por Doellinguer. No primeiro, de 4 de março, ele ordena que “a divulgação de estudos e pesquisas somente pode ocorrer após sua conclusão e aprovação definitiva, devendo serem seguidos normas, protocolos e rotinas internas, inclusive quanto à interação com os órgãos de imprensa”. O segundo ato, de teor semelhante, é a Portaria 225, de outubro de 2018, vigente até hoje.

“Os servidores estão se censurando, e a autocensura é mais profunda e tem consequëncia sobre a qualidade do trabalho. Por isso decidimos impetrar uma ação: para lembrar os senhores ministros do Supremo que existe o peceito constitucional fundamental da liberdade de expressão de um modo geral, e que é mais importante ainda nos órgãos públicos que nasceram para difundir sem qualquer impedimento informações e conhecimentos”, explica José Celso.

Ele relata que “há casos recentes de trabalhos com conclusoes antagônicas sobre a política monetária, e apenas aquele trabalho que defende a política do governo vem a público. O outros trabalhos ou foram autocensrados ou foram censurados de forma menos evidente, mas que não tiveram tanto espaço quanto o seu equivalente antagônico”.

José Celso também chama a atenção para aquilo que ele qualifica de “assédio institucional como método de governo”.

Neste caso, diz José Celso, “o objeto não são indivíduos ou um servidor em particular, mas o coletivo de servidores públicos . Quando o Ministro da Economia Paulo Guedes chama os servidores de parasitas, ele não está indo contra um ou outro. Ele está dizendo que a categoria dos servidores é parasita. Isso é um ato de assédio moral institucional porque parte de um ministro que assumiu um cargo público importante, tem uma relação instotucional com seus subordina dos e que jurou defender a Constituição, o patrimômio público, ele atenta contra esses princípios que ele jurou defender”, explica.

“Ele pratica assédio contra a organização que é uma entidade de direito publico e contra as as missões que essas organizações deveriam implementar ou defender. É um projeto de desmonte do Estado, que se dá por meio dessa prática discriminada e deliberada de assediar institucionalmente os servidores como categoria e as institutições e categrias públicas como parte da ossatura do Estado brasileiro”.

Compartilhe

Share on whatsapp
WhatsApp
Share on facebook
Facebook
Share on twitter
Twitter
Share on linkedin
LinkedIn

Enviar Comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Redes Sociais

Posts Recentes

Receba as atualizações mais recentes

Faça parte da nossa rede

Sem spam, notificações apenas sobre novidades, campanhas, atualizações.

Leia também

Posts relacionados

ARAYARA na Mídia: Lula precisa vetar prorrogação dos subsídios às usinas a carvão

Não há justificativa técnica, econômica, social ou ambiental para manter esses incentivos É urgente que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva corrija o erro mais flagrante cometido pelo Congresso com a aprovação da Medida Provisória 1.304: a prorrogação dos incentivos às usinas termelétricas a carvão até 2040. Não há justificativa técnica, econômica, social ou ambiental para manter os subsídios. O carvão

Leia Mais »

ARAYARA na Mídia: Críticos de Foz do Amazonas veem contradição de Lula e usam COP30 para buscar apoio contra petróleo

Ministério Público, indígenas e ONGs defendem compromisso mais ambicioso pelo fim dos fósseis Exploração da Margem Equatorial foi alvo de protestos desta terça (11) durante reunião diplomática Belém (PA) e Rio de Janeiro Durante discursos na COP30 (a conferência sobre mudança climática das Nações Unidas), o presidente Lula (PT) defendeu o fim dos combustíveis fósseis. Grupos que defendem a medida

Leia Mais »

ARAYARA na Mídia: Arayara pede a Lula veto a projeto pró-carvão

Instituto Arayara alerta que projeto ameaça compromissos climáticos do Brasil na COP30 ao ampliar subsídios a termelétricas a carvão De acordo com o presidente da Arayara, Juliano Bueno de Araújo, estudos realizados pelo Instituto e pelo Observatório do Carvão Mineral indicam que, se aprovado, o projeto pode adicionar, no mínimo, R$ 2,5 bilhões por ano à conta de energia dos brasileiros, atingindo entre R$ 76

Leia Mais »

ARAYARA na Mídia: O que é agenda formal? E a de ação? Entenda o funcionamento da COP30 e o impasse que trava quatro pautas

Clima em Belém, que é de ‘otimismo cauteloso’, é resultado das prerrogativas que norteiam o funcionamento das discussões e dividem as negociações em dois grupos O impasse sobre quatro itens que ficaram de fora da agenda formal da COP30 movimentou consultas da presidência da conferência com as delegações dos países participantes. O clima em Belém, que é de “otimismo cauteloso”, é

Leia Mais »