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No Ipea, associação denuncia “assédio institucional como método de governo” e vai ao STF para criar jurisprudência

No Ipea, associação denuncia “assédio institucional como método de governo” e vai ao STF para criar jurisprudência

Foto: José Celso Cardoso Jr, presidente da Associação dos Funcionários do Ipea

Assédio institucional e estratégia de destruição do Estado Brasileiro. As duas expressões frequentam o dia a dia do funcionalismo federal desde quando se iniciou o mandato do Presidente Jair Bolsonaro. Ele procura afastar todo tipo de manifestação técnica, administrativa ou acadêmica nas áreas que impactam diretamente as suas bases política e econômica.

Os casos mais notórios estão Ministério do Meio Ambiente, onde o titular Ricardo Salles persegue servidores que aplicam multas contra crimes ambientais e favorece grupos econômicos que desmatam e garimpam em terras protegidas, como acontece agora na invasão às reservas indígenas Yanomami (em Roraima) e Munduruku (Mato Grosso).

Servidores de todos os órgãos públicos relatam casos em que passaram a sofrer, por parte de chefias bolsonatistas, ameaças de punições a estudos científicos, censura contra manifestações democráticas, constrangimentos de toda ordem e até ilegais ameaças de demissão para quem tem estabilidade no emprego garantida constitucionalmente.

É o que ocorre no Instituto de Pequisa Econômica Aplicada (Ipea), segundo a associação de funcionários do órgão. O Ipea é uma fundação do Ministério da Economia, que produz pesquisas sobre todas as áreas da administração para subsidiar políticas públicas, e que são disponibilizados para a sociedade.

“Há uma seleção dos temas e de qual abordagem a ser priorizada. Alguns funcionários temem ser censurados, mas a grande maioria teve autocensura diante da insegurança que a normativa trouxe. Os próprios servidores passaram a negar a entrevistas ou até a não ofererer o seu trabalho para publicação, com medo de sofrerem represálias do presidente do órgão, Carlos von Doellinger, ligado ao Ministro da Economia, Paulo Guedes”, denuncia o doutor em economia José Celso Cardoso Jr, presidente da Associação dos Funcionários do Ipea.

“Desde de 2016, com o impeachment da presidenta Dilma, o Ipea sofre um processo de esvaziamento de quadros, deterioração do orçamento e de escanteamento estratégico. Mais recentemente, o que vem acontecendo é um controle seletivo do que os servidores podem falar”, completa José Celso.

Ele afirma que “o que se está fazendo é impedir que o órgão que foi criado para criar conhecimento sobre todas as realidades que o Brasil enfrenta possa cumprir a sua missão institucional. É parte de um processo de controle da informação a artir da produção do conhecimento dos órgãos públicos como eles sempre fizeram.

Devido a esta situação, a Associação ajuizou no início de maio uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para questionar atos internos ao Ipea, que obrigam os servidores a submeterem à censura da assessoria de comunicação todo tipo de entrevista e até de participação em eventos acadêmicos. “Nunca na história do Ipea a comunicação teve esse papel˜, observa José Celso.

O STF determinou que fosse iniciada uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 834, e determinou que sua relatora fosse a ministra Cármen Lúcia. Em 10 de maio, ela instou Doellinguer a se manifestar.

Caso aceite a ADPF, a Ação vai criar jurisprudência, inclusive retroativamente, a todo o poder público federal e provavelmente vai iniciar uma discussão no Congresso nacional sobre a criação de uma lei que caracterize o assédio institucional, a exemplo do que já ocorre nos casos de assédio moral e sexual, que também são tipificados legalmente.

A associação reclama de dois atos assinados por Doellinguer. No primeiro, de 4 de março, ele ordena que “a divulgação de estudos e pesquisas somente pode ocorrer após sua conclusão e aprovação definitiva, devendo serem seguidos normas, protocolos e rotinas internas, inclusive quanto à interação com os órgãos de imprensa”. O segundo ato, de teor semelhante, é a Portaria 225, de outubro de 2018, vigente até hoje.

“Os servidores estão se censurando, e a autocensura é mais profunda e tem consequëncia sobre a qualidade do trabalho. Por isso decidimos impetrar uma ação: para lembrar os senhores ministros do Supremo que existe o peceito constitucional fundamental da liberdade de expressão de um modo geral, e que é mais importante ainda nos órgãos públicos que nasceram para difundir sem qualquer impedimento informações e conhecimentos”, explica José Celso.

Ele relata que “há casos recentes de trabalhos com conclusoes antagônicas sobre a política monetária, e apenas aquele trabalho que defende a política do governo vem a público. O outros trabalhos ou foram autocensrados ou foram censurados de forma menos evidente, mas que não tiveram tanto espaço quanto o seu equivalente antagônico”.

José Celso também chama a atenção para aquilo que ele qualifica de “assédio institucional como método de governo”.

Neste caso, diz José Celso, “o objeto não são indivíduos ou um servidor em particular, mas o coletivo de servidores públicos . Quando o Ministro da Economia Paulo Guedes chama os servidores de parasitas, ele não está indo contra um ou outro. Ele está dizendo que a categoria dos servidores é parasita. Isso é um ato de assédio moral institucional porque parte de um ministro que assumiu um cargo público importante, tem uma relação instotucional com seus subordina dos e que jurou defender a Constituição, o patrimômio público, ele atenta contra esses princípios que ele jurou defender”, explica.

“Ele pratica assédio contra a organização que é uma entidade de direito publico e contra as as missões que essas organizações deveriam implementar ou defender. É um projeto de desmonte do Estado, que se dá por meio dessa prática discriminada e deliberada de assediar institucionalmente os servidores como categoria e as institutições e categrias públicas como parte da ossatura do Estado brasileiro”.

“Estamos ficando para trás”, alerta presidente da Associação Brasileira do Veículo Elétrico

“Estamos ficando para trás”, alerta presidente da Associação Brasileira do Veículo Elétrico

Não é boa a situação do Brasil em termos de descarbonização de sua frota automotiva. Segundo a Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE), em 2020 ocorreram no País apenas vendas marginais de 800 veículos elétricos, enquanto o mercado total, mesmo com as crises econômica e pandêmica, alcançou 3,16 milhões.

No campo dos veículos elétricos, o Brasil perdeu até para a Colômbia, um mercado 10 vezes menor do que o nosso País. A Costa Rica, que tem um mercado 100 vezes menor, vendeu quase o mesmo volume de veículos elétricos comercializados no Brasil em 2020. No setor de veículos elétricos pesados, a tristeza se repete. A América Latina inteira vendeu 2 mil ônibus e o Brasil mal chegou a 50.

“Estamos ficando para trás”, lamenta o bacharel em relações internacionais Adalberto Maluf, presidente da ABVE. “O formulador de política pública no Brasil tem uma cabeça antiga. O Brasil vem perdendo esse mercado para exportação numa velocidade muito grande”, completa Maluf, que atribiu a situação do País no campo dos veículos elétrícos à falta de políticas públicas para a indústria e os setores de pesquisa e desenvlvimento, educação.

Ele observa que a China é a líder da agenda da sustentabilidade no mundo.”É o país que mais aumenta a sua cobertura vegetal. Refloresta mais do que o restante do mundo junto, que tá indo em peso para energia renovável, geração distrubuída e a mobilidade elétrica”.

Em 2020, de acordo com Maluf, o gigante asiático fez subir em 43% o número de veículos elétricos comercializados no seu enorme mercado interno e anualmente já vende mais de 6%, trabalhando com a meta de 10%. Enquanto isso, a Alemanha saiu de 2% de vendas de veículos elétricos em janeiro de 2020 para 27% em dezembro. Em média, no ano passado, a Europa deu um salto de 3% para 11%, e em janeiro e fevereiro de 2021, alcançou índices acima de 20%.

Entretanto, Maluf chama atenção para o que ele considera um progresso nas vendas de automóveis híbridos no nosso País. “O Brasil está indo bem. Foram 19 mil veículos vendidos no ano passado, sendo que 13 mil foram híbridos flex fabricados no Brasil e a projeção para 2021 é chegar a quase 30 mil. Estamos crescendo com híbridos e desenvolvendo tecnologia própria para o flex. O biocombustível tem a a sua importância na descarbonização”.

E isso para não mencionar a inexistência de políticas gerais de mobilidade e ficar no superado transporte individual que beneficia as grandes montadoras multinacionais. Nos últimos 20 anos, esses oligopólios foram premiados com 69 bilhões de reais em renúncias fiscais, mas fecharam 200 mil postos de trabalho e viram sua participação no PIB cair de 5 para 3%.

Em nível global, acredita Maluf, “os setores elétrico e automotivo passam por pela maior transformação de sua história”e e caminham para serem digitais, descentralizados e descarbonizados.

Ele vê uma interferência negativa da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). “Quando o Brasil vem com uma proposta, como a Aneel fez há dois anos e que ressuscitou no início de 2021, de taxar 60% a geração distribuída, vai na contramão do mundo. O melhor seria que cada um gerasse a sua própria energia e que eu não precisasse gerar grandes estruturas de geração e e de transmissão”.

“A Aneel tenta proteger o investimento daqueles grades grupos internacionais. Mas, é esse o investimento que se quer? De grandes grupos financeiros internacionais, que vêm para o Brasil ganhar bilhões, pegando bilhões subsidiados para fazer grandes usinas, mesmo que sejam eólicas e solares?”, questiona Maluf, observando que “em 2021, com toda crise, o setor de geração de energia distribuída vai criar 150 mil empregos”.

“O governo precisa colocar as pessoas no centro das políticas urbanas e econômicas. Hoje, as políticas públicas associadas aos setores automotivo e elétrico são feitas pelos grandes investidores internacionais”, destaca.

Maluf também não vê incompatibilidades entre as políticas econômica, de um lado, e sociais e ambientais, de outro, conforme preconizam seguidamente e em coro todos os setores do governo brasileiro.

“O debate hoje não é aquele do passado, de desenvolvimento versus neio ambiente. Isso só está na cabeça do ministro do meio ambiente e da cúpula do governo. Países europeus nem tem nem mais ministério do meio ambiente. A nossa política vem sendo deteriorada e o estímulo do governo no quesito ambiental é desmate e garimpo, que são duas atividades do século passado”.

“Existe futuro para um grande país que virou urbano sem indústria? A cúpula do Ministério da Economia diz: “tudo bem se tivermos um modelo agroexportador”. Eles querem voltar ao Brasil Colônia. Eles acham que o agronegócio vai resolver tudo, mas não gera emprego. Não tem como um país grande, urbano, ter uma perspectiva de futuro sem uma indústria pujante, que olhe para tecnologias de baixo carbono”.