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Exploração de Petróleo e Gás no Mato Grosso do Sul ameaça povos indígenas, ecossistemas e o setor do agronegócio

Técnica do fraturamento hidráulico (fracking) pode gerar bilhões em prejuízos e comprometer exportações agrícolas

Quase quatro meses após o 5º Ciclo da Oferta Permanente de Concessão (OPC), promovido pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), os impactos da expansão da fronteira de petróleo e gás seguem provocando preocupação em regiões de alta sensibilidade ambiental e social. Além de chamar atenção para a concentração da maior parte dos 172 blocos ofertados na bacia da Foz do Amazonas, o Instituto Internacional ARAYARA também destaca um novo foco de preocupação: o avanço da fronteira de exploração de petróleo e gás no Mato Grosso do Sul.

De acordo com dados do Monitor Amazônia Livre de Petróleo e Gás, 23 blocos de exploração estão localizados em território sul-mato-grossense. Desses, quatro já foram contratados pela Eneva S.A. — arrematados em 2021 — e outros 19 estão em fase de estudo para futuros leilões.

Especialistas da área ambiental, lideranças indígenas, pesquisadores e representantes do setor agroexportador têm se posicionado contra a expansão da fronteira fóssil. Eles denunciam retrocessos na política energética e alertam para o uso da técnica de fraturamento hidráulico, conhecida como fracking, que tem sido associada a uma série de danos ambientais e sociais em outros países.

Empresas como Cheniere e TotalEnergies — grandes fornecedoras de gás importado para o Brasil — já admitem o uso da técnica de fraturamento hidráulico (fracking) em seus processos. Parte desse gás chega à Amazônia, por meio de distribuidoras como a New Fortress Energy, instalada em Barcarena (PA), aprofundando a dependência do país em relação a essa prática controversa.

“É um retrocesso grave. Em vez de priorizar energias limpas e seguras, o Brasil aposta em fontes ultrapassadas e perigosas, colocando em risco ecossistemas inteiros e as comunidades que dependem deles”, afirma Nicole Oliveira, diretora executiva da ARAYARA e doutora em Direito Internacional.

Áreas protegidas e territórios indígenas ameaçados

Dados revelados pela ARAYARA também indicam que 10 dos blocos previstos se sobrepõem diretamente a nove Unidades de Conservação. Um dos blocos atinge ainda a área de influência direta da Terra Indígena Ofayé-Xavante, em Brasilândia (MS).

Segundo o gerente de Geociências da instituição, George Mendes, esses projetos violam direitos constitucionais de povos originários e ameaçam ecossistemas de alto valor ambiental.

“É uma ameaça direta à biodiversidade e às populações tradicionais. Além disso, a região faz parte da Bacia Sedimentar do Paraná, onde a principal técnica de extração viável seria o fracking — altamente destrutivo e ainda sem regulamentação adequada no Brasil”, explica.

Mendes pontua que apesar das evidências de risco, o Governo Federal mantém o programa Poço Transparente, criado para testar a aplicação da técnica no país. Embora o projeto ainda não tenha sido executado, ambientalistas alertam que isso abre caminho para a futura liberação do fracking em larga escala.

Fracking: riscos para o meio ambiente, a saúde e o agro

A técnica do fraturamento hidráulico, amplamente utilizada nos Estados Unidos e Argentina, é associada à contaminação de aquíferos, aumento de abalos sísmicos, emissão de gases de efeito estufa, além de riscos diretos à saúde pública e à agricultura.

O uso intensivo de água e o descarte de resíduos tóxicos levantam preocupações especialmente no contexto brasileiro, onde parte dos blocos está sobre áreas agrícolas, terras indígenas e aquíferos estratégicos, como no caso da Bacia Parecis (MT), uma das principais regiões produtoras de soja do país.

Juliano Bueno, diretor técnico da ARAYARA, doutor em riscos ambientais e conselheiro do Conama ressalta que além dos impactos diretos ao meio ambiente e à saúde, a presença do fracking em áreas produtoras pode comprometer licenças fitossanitárias e selos de exportação, afetando diretamente a competitividade do agronegócio brasileiro nos mercados europeu e asiático.

“Estamos falando de uma técnica que pode comprometer a segurança hídrica, gerar perdas bilionárias ao setor agroexportador e ainda colocar em risco a reputação ambiental do Brasil no comércio internacional”, alerta.

Mobilização nacional contra o fracking

Desde 2014, a Coalizão Não Fracking Brasil (COESUS), coordenada pela ARAYARA, atua em defesa da proibição do fracking no país. Com mais de 1.800 atividades de mobilização e campanhas em 17 estados, o movimento já conseguiu instituir moratórias técnicas e leis municipais em mais de 520 cidades brasileiras.

Segundo Bueno, a própria ANP já admitiu desconhecer os impactos do fracking no solo brasileiro. “Não podemos repetir os erros de outros países”, reforça  Bueno.

A pressão contra o fracking tem ganhado força também no Legislativo. A Assembleia Legislativa da Bahia no início deste ano um projeto de lei que proíbe a técnica, seguindo o exemplo de Paraná, Santa Catarina e outros estados onde iniciativas semelhantes estão em tramitação.

Atualmente, mais de 250 deputados estaduais e federais, 1.500 vereadores e 700 prefeitos já manifestaram apoio à proibição do fracking no Brasil. Por outro lado, o Governo Federal e a ANP seguem defendendo os leilões como estratégias para atrair investimentos e gerar empregos, apesar de especialistas contestarem essa narrativa.

“ O discurso de progresso não pode mascarar os impactos irreversíveis ao meio ambiente, à saúde e à economia nacional.  “O Rio de Janeiro é o estado mais explorado pela indústria do petróleo, e ainda assim enfrenta altos índices de desigualdade e violência. Que tipo de desenvolvimento é esse?”, questiona Bueno.

Foto: reprodução/ Flickr

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