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Em audiência pública da Câmara Federal, Instituto Arayara se posiciona contra termoelétricas a gás

O diretor Juliano Bueno de Araújo destaca isenções bilionárias para o setor, racismo energético e ambiental e prejuízos para os brasileiros

A Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara Federal realizou na última terça-feira, 31 de maio, uma audiência pública sobre a política de uso de termoelétricas movidas a gás natural, requerida pelo deputado Elias Vaz (PSB/GO). Estavam presentes representantes da sociedade civil, da indústria, setores relacionados à energia e agências reguladoras ANP e ANEEL (lista completa ao final do texto). A falta de resposta ao convite de participação por parte do empresário Carlos Suarez foi alvo de críticas do deputado Elias, que mencionou “esse comportamento é de gente mafiosa”. O apelidado “rei do gás” é um dos principais donos de autorizações para distribuir gás em oito estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

 

A audiência em questão teve como objetivo “discutir a política de uso das termoelétricas movidas a gás natural, a construção de novos gasodutos no Brasil, as formas de financiamento dos empreendimentos, as formas de exploração e concessão e os impactos das novas iniciativas sobre as tarifas que são cobradas dos consumidores”. As falas dos participantes foram marcadas pelo tom econômico, dando clara visibilidade às dificuldades de se sustentar a matriz energética de origem fóssil. 

 

Paulo Pedrosa, da Abrace, iniciou as apresentações na audiência pública e pontuou que o custo das térmicas da Eletrobrás, a partir de 2030, será entre R$ 19 a R$ 27 bilhões ao ano, os investimentos na nova malha de gasodutos será entre R$ 60 a R$ 89 milhões e o valor das linhas de transmissão será de R$ 600MM/ano. Todo esse montante será repassado ao consumidor, que sentirá a conta de luz subir 10%. “O que acontece no setor de energia? Escolhas são feitas sem se precificar o que se ganha e o que se perde”, afirmou. 

Pedrosa também ressaltou o peso da energia que recai em itens e serviços que não damos conta. Por exemplo, o preço em produtos do dia a dia chega a ser 35,9% do valor final de cadernos, 33,3% de carne e leite e 24,5% de vidro e cimento. 

 

 

Todos os participantes salientaram que o assunto é de extrema relevância, por se tratar do desenvolvimento econômico, do direito dos consumidores e dos custos enfrentados pela indústria, tudo está interligado.

 

Ao defender as termoelétricas no país, Ludmilla Cabral, coordenadora de Relações Institucionais e Governamentais da Associação Brasileira do Biogás. argumentou a possibilidade de se livrar das importações de combustíveis fósseis com a ampliação da utilização do biogás nacional e evitar oscilações de preço.

 

Energia e Meio ambiente

Os impactos ao meio ambiente foram deixados de lado nas falas da maioria dos palestrantes. Já o diretor do Instituto Internacional Arayara, Juliano Bueno de Araújo, fez questão de salientar os ônus ambientais e sociais dos projetos de termoelétricas movidas a combustíveis fósseis. Além dos eminentes problemas que a oferta permanente da ANP oferece, colocando à venda na prateleira 1068 blocos de exploração de petróleo e gás à preços insignificantes.

Araújo destacou os casos da implementação do complexo termoelétrico flutuante na Baía de Sepetiba, em processo de licenciamento pelo órgão estadual INEA sem estudos de impacto ambiental (obrigatórios para o porte do projeto), em que a empresa Karpowership, de origem turca, se habilitou e ganhou leilão da ANEEL em pouco tempo após abrir firma no Brasil com capital de apenas R$1 mil reais. Sobre as 12 termoelétricas previstas para a cidade de Macaé que colocam em risco o abastecimento de água da cidade e a termoelétrica de 1.7 GW no Maranhão, que sozinha vai emitir 95% de todos os GEEs de um município, descumprindo toda a legislação atmosférica. 

“Nós temos todas as soluções no nosso país, a questão do biogás, o aceleramento de fazendas solares e eólicas, gerando a poupança dos reservatórios hídricos, nos tiram de qualquer risco energético. Mas essa não é a política que foi adotada”, reforçou. 

Em sua fala, também destacou sobre a questão econômica, levantada por todos os convidados, e o racismo ambiental: “as empresas de petróleo e gás não pagam imposto de renda, com isenção de mais de R$ 800 bi a R$ 1 trilhão de reais”. Enquanto isso, segundo o diretor, hoje o racismo energético afeta cerca de 9 milhões de brasileiros, que pagam uma conta e deixam outras duas atrasadas só para não ter sua luz cortada.

O Instituto Internacional Arayara se movimenta para conter o aumento do custo energético, atuando com ações na esfera pública pela defesa de uma energia mais limpa, barata e acessível a todos. Vai continuar litigando, inclusive cobrou ao vivo as agências reguladoras pelos atrasos nos calendários dos projetos termelétricos que deveriam gerar a rescisão dos contratos.

Pensando no compromisso brasileiro com as NDCs (Contribuições Nacionalmente Determinadas), metas estipuladas pelo Acordo de Paris no qual o Brasil é signatário, é preciso visar a neutralidade de emissões de carbono. A viabilização das termoelétricas acarretaria em um aumento de 70% nas emissões brasileiras, descumprindo com os acordos internacionais, impactando os investimentos no país, além da qualidade de vida da sociedade.

Ao terminar sua fala, Juliano cumprimentou o caráter da audiência, reforçando os compromissos da Arayara, do Observatório do Petróleo e Gás e da COESUS, faz o pedido de que se instale uma CPI sobre a questão energética, já que existem interesses escusos em impor uma matriz energética suja. Citou também a volta do fantasma do fracking, método de extração de gás não convencional extremamente poluente, através do projeto “poço transparente”, que é inaceitável. O deputado Elias Vaz ressaltou a importância da discussão e afirmou que tal questão merece ser investigada numa possível CPI.

 

Assista a audiência na íntegra.

 

Repercussão na mídia:

“Setor elétrico quer revogar obrigação de se instalar termelétricas”

01/jun/2021, ISTOÉ Dinheiro Online

Representantes de entidades do setor elétrico voltaram a defender, hoje (31), a revogação da obrigação de instalação de usinas termelétricas na lei que autorizou a privatização da Eletrobras. Eles argumentam que a manutenção das térmicas pode gerar um aumento de R$ 52 bilhões no custo de geração de energia no país até 2036, com impactos forte na economia e no bolso dos consumidores.

A lei de conversão da medida provisória que autoriza a privatização da Eletrobras foi aprovada no ano passado com a inserção de um tema estranho ao discutido no projeto, conhecido como jabuti, que incluiu as usinas termelétricas como parte do processo. A legislação determina a contratação o fornecimento de 8 gigawatts (GW) de usinas termelétricas a gás natural nas regiões Nordeste, Norte, Centro-Oeste e Sudeste a partir de 2026.

O texto define ainda que a inserção dessas usinas a gás no Sistema Interligado Nacional (SIN) ocorrerá até 2030, e que elas operarão em tempo integral com capacidade mínima de 70% por pelo menos 15 anos.

O tema foi debatido na manhã desta terça-feira na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados.

O presidente do Instituto Acende Brasil, Cláudio Sales, citou um estudo elaborado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), ligada ao Ministério de Minas e Energia, que mostra que a inserção compulsória no Sistema Interligado Nacional (SIN) das usinas térmicas custaria R$ 192 bilhões até 2036. E que o custo de operação do sistema, no mesmo período, chegaria a R$ 145 bilhões.

Em um cenário sem essa exigência, o investimento necessário para gerar essa quantidade de energia cairia para R$ 173 bilhões e o de operação ficaria em R$ 93 bilhões, uma diferença de R$ 52 bilhões em relação ao cenário com as térmicas.

“E olha que nesse estudo não está sendo considerado o fato de que essas termelétricas estariam sendo localizadas em regiões onde não têm gás e já são regiões exportadoras de energia”, alertou Sales, citando como exemplo a Região Nordeste. “A inserção dessas usinas foge totalmente do que seria razoável do ponto de vista econômico, do que seria razoável na oferta de energia, e ela implica que essa usina seja acionada mesmo que não se precise dela”, disse.

O presidente executivo da Associação dos Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace), Paulo Pedrosa, lembrou que parte dessas usinas deve ficar em áreas sem infraestrutura adequada. Ele disse que a obrigação de contratação das térmicas vai levar obrigatoriamente à construção de gasodutos e de linhas de transmissão de energia para resolver o novo problema.

A associação apresentou uma estimativa de alguns desses impactos, que poderiam gerar um aumento de 10% na tarifa de energia do país, algo em torno de R$ 27 bilhões. O custo com a construção de gasodutos ficaria entre R$ 60 bilhões e R$ 89 bilhões, e as linhas de transmissão custariam cerca de R$ 600 milhões.

“Isso vai levar a obrigação de construção de gasoduto para levar o gás até essas regiões, a construção de termelétricas propriamente ditas, e depois a de linhas de transmissão para trazer a energia de volta. Essa energia deslocará energia de outras fontes, pois os projetos de energia renovável vão ter que esperar para entrar no sistema porque o espaço do mercado estará ocupado pelas térmicas”, explicou.

O gerente executivo de Infraestrutura da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Wagner Cardoso, disse que a entidade endossa as críticas à obrigatoriedade das térmicas. Na visão da entidade, o governo tem adotado políticas setoriais equivocadas para determinados setores, sem considerar o impacto em toda a economia.

Segundo Cardoso, “o custo maior da energia impacta violentamente nos custos de produção industrial”, diminuindo a competitividade das empresas brasileiras. Ele disse que a queda na participação do setor no Produto Interno Bruto (PIB) do país, hoje em cerca de 11%, pode ser parcialmente creditada ao aumento com o custo de energia, que vem crescendo desde 1995.

“Hoje a energia é um entrave para o desenvolvimento da indústria, e a explicação é de que a gente tem politicas setoriais equivocadas, impacto crescente de subsídios setoriais e impostos que explicam boa parte dessa situação. Essa é uma escolha errada, na hora errada”, disse.

O presidente da Associação Brasileira dos Investidores em Autoprodução de Energia (Abiape), Mário Menel, lembrou que “a medida não atende ao planejamento previsto para a operação desse tipo de usina, que deve se localizar próxima a um centro de gás, com estruturas para o transporte e linhas de transmissão para a energia. E devem ainda trabalhar de forma flexível, sem a necessidade de produzir constantemente”. Mas, segundo Menel, não é o que está previsto na proposta, que vai impor a construção de toda essa infraestrutura.

“Ninguém é contra a construção de novos gasodutos no Brasil. Eles são bem-vindos, mas dentro de uma ótica econômica”, disse, acrescentando que “o planejamento setorial deve ser respeitado na sua integridade, sob pena de termos perda de qualidade da governança do setor elétrico”.

O representante do Instituto Internacional Arayara, Juliano Araújo, disse que além de prejudicar a economia, a inserção das térmicas vai trazer diversos impactos ambientais, entre eles ao aumento não volume de gases do efeito estufa na atmosfera, como o CO2.

Ele afirmou ainda que, anteriormente, já haviam tentado inserir a obrigação das termelétricas em outros projetos relacionados ao setor, como o que tratou do novo mercado do gás e o do risco hidrológico.

Em março, ao lado de 22 organizações, a entidade assinou um manifesto contra a inserção de um “jabuti” para a criação de um fundo para bancar gasodutos no projeto de Lei 414/2021, que altera regras do setor elétrico.

Araújo pediu a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar as térmicas, que, segundo ele, a inserção no projeto da Eletrobras atendeu a interesses obscuros.

“A associação Arayara pede que obviamente se instale uma CPI sobre a questão da energia, já que há elementos que, para não dizer ilícitos, são ocultos ou com interesses escusos no sentido de impor uma matriz energética suja, que já vem sendo substituída no mundo inteiro”, disse.

O deputado Eliaz Vaz (PSB-GO), autor do pedido de audiência, disse concordar com a criação de uma CPI e que ia levar a sugestão para a bancada partidária. O deputado lembrou que a obrigatoriedade das termelétricas foi colocada no relatório do projeto pouco antes da votação e que não houve discussão aprofundada com os parlamentares.

“Eu não sabia disso [da obrigatoriedade das termelétricas], fiquei sabendo só quando foi apresentado o relatório. Só fiquei sabendo na última hora. Quem articulou não discutiu com a sociedade. Acho que essa situação aqui merece, necessariamente, uma investigação de uma CPI”, defendeu o deputado. “Não podemos dar isso como uma situação já consolidada. É uma legislação que pode alterar do ponto de vista negativo a situação econômica e de crescimento do país” afirmou.

 

 

Lista dos participantes:

 

– JULIANO BUENO DE ARAÚJO

Diretor-Presidente do Instituto Internacional Arayara

– CLAUDIO J. D. SALES 

Presidente do Instituto Acende Brasil

– PAULO PEDROSA

Presidente Executivo da Associação dos Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres – Abrace

– MARIO LUIZ MENEL

Presidente da Associação Brasileira dos Investidores em Autoprodução de Energia (Abiape)

– ANTON SCHWYTER

Coordenador do Programa de Energia e Sustentabilidade do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC)

– LUDMILLA CABRAL

Coordenadora de Relações Institucionais e Governamentais da Associação Brasileira do Biogás (Abiogás)

– TAMAR ROITMAN

Gerente Executiva da Associação Brasileira do Biogás

– WAGNER FERREIRA CARDOSO

Gerente Executivo de Infraestrutura da Confederação Nacional da Indústria (CNI)

– HELIO DA CUNHA BISSAGIO 

Superintendente de Infraestrutura e Movimentação da Agência Nacional de Petróleo – ANP

– ALESSANDRO D’AFONSECA CANTARINO

Superintendente de Regulação dos Serviços de Geração Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL)

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