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MPF pede inconstitucionalidade de decreto que alterou composição e funcionamento do Conama

MPF pede inconstitucionalidade de decreto que alterou composição e funcionamento do Conama

O Ministério Público Federal (MPF) propôs uma ação apontando a inconstitucionalidade do Decreto 9.806/2019, que alterou a composição e o funcionamento do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). Entre as mudanças, a norma publicada em maio reduziu o número de vagas destinadas à sociedade civil, enquanto, proporcionalmente, ampliou a presença do governo federal no colegiado. As ONGs ambientalistas tiveram seus mandatos cindidos à metade, e passaram a ser escolhidas por meio de sorteio. 

A Arguição de Descumprimento por Preceito Fundamental (ADPF) 623 deriva de uma representação feita à Procuradoria-Geral da República (PGR) pelos procuradores regionais da 3ª Região, José Leonidas Bellem de Lima e Fátima Borghi, em conjunto com entidades ambientalistas. Ajuizada em setembro último no Supremo Tribunal Federal (STF), encontra-se sob a relatoria da ministra Rosa Weber. O MPF indica diversos pontos da nova regulamentação que ferem preceitos constitucionais, sobretudo no que diz respeito aos princípios da participação popular direta da sociedade, da igualdade e da vedação do retrocesso socioambiental. Além disso, a norma poderá deixar desprotegidos os direitos fundamentais ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, à saúde e à vida.

O decreto, assinado conjuntamente pelo presidente da República e pelo ministro do Meio Ambiente, cortou de 11 para quatro o número de assentos reservados às organizações ambientalistas. Por outro lado, foi ampliada a presença do bloco governamental, que, agora com 17 assentos, passa a deter 74% dos votos no conselho. Além disso, foi excluída a representação de órgãos federais mais afetos à temática do meio ambiente e de outros direitos fundamentais conexos, de que são exemplos a Agência Nacional de Águas (ANA), o Instituto Chico Mendes da Biodiversidade (ICMBio) e o Ministério da Saúde não têm mais vaga no conselho. Ao mesmo tempo, deu-se assento cativo no Conama ao Ministério de Minas e Energia e ao Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (Mapa), pastas naturalmente estranhas aos propósitos de proteção e preservação ambientais. Apesar de sucessivas alterações ao longo de sua história, em nenhuma reforma anterior “o Conama sofreu retrocessos tão acentuados em termos de pluralidade e amplitude da participação popular e do controle social”, afirmam os procuradores regionais autores da representação à PGR.

Mandato e escolha por sorteio – A nova regulamentação também determina que a escolha das entidades ambientalistas para compor o Conama, antes feita democraticamente por meio de eleição, seja realizada por sorteio. O MPF argumenta que essa alteração atenta contra o direito de participação direta da sociedade na formulação das políticas públicas ambientais, retirando das ONGs seu poder de auto-organização e impedindo que elas escolham por critérios objetivos os representantes mais aptos para atuar no conselho. Com a mudança, os procuradores alertam que são grandes as chances de que entidades sem condições estruturais para representar o bloco sejam as selecionadas. Eles também observam que ao substituir o sufrágio pela pura aleatoriedade como técnica de seleção, o decreto não violou apenas o direito de autonomia de um segmento, mas acabou por condenar a população ao risco de ver totalmente neutralizada a sua capacidade de participação no Conama.

Outra alteração foi a duração do mandato das ONGs, que passou de dois para apenas um ano, sem direito a recondução. Os procuradores que assinaram a representação, com experiência de atuação naquele colegiado como representantes do Ministério Público Federal junto ao Conama desde 2012, afirmam que o prazo reduzido dificulta o desenvolvimento de um trabalho consistente no Conselho. “Um frenético giro na troca das cadeiras não propiciará em nada o aprimoramento dos trabalhos no Conama; ao contrário, impedirá um mais adequado aprofundamento no conhecimento da matéria”, sustentam. Para o MPF, a reforma do Conama ocorre em um contexto de eliminação na máxima extensão possível das instâncias de participação da sociedade civil na formação de ações do Poder Público e de um desmonte de todo o aparato organizacional do Estado brasileiro para proteção e preservação ambiental. O Conama representa uma interseção de ambas tendências.

Falta de paridade – Os procuradores regionais afirmam sempre ter havido um desequilíbrio de forças no Conama. De um lado, segundo eles, sempre se conferiu uma grande maioria de assentos a órgãos e entidades que ali estão para defender interesses próprios, que apesar de terem naturezas variadas (governamental, econômica e corporativa), tendem a se unir e a se antagonizar aos propósitos de proteção do meio ambiente e de outros bens relacionados. Do outro lado, portanto, restaria uma ínfima minoria de vagas às ONGs ambientalistas, representantes da sociedade civil tidos como os mais legitimados para a defesa exclusiva dos direitos fundamentais ali em jogo, o que as torna incapazes de fazer prevalecer sua posição, limitando até mesmo seu poder de influenciar nos procedimentos e no resultado das decisões colegiadas.

Nesse sentido, sustentam que, por estar o Conama “vinculado constitucional e legalmente ao cumprimento de sua finalidade de proteção ambiental”, deveria, portanto, ser conferida a maioria de assentos justamente a essas ONGs ambientalistas. A disparidade na composição do Conama reflete inclusive na qualidade protetiva das normas que edita. Exemplo disso é a Resolução 491, publicada pelo colegiado em novembro de 2018, e que estabeleceu novos padrões nacionais de qualidade do ar sem prazos de progressão e com valores iniciais muito mais permissivos que aqueles recomendados pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Essa norma também está sendo questionada no Supremo, por meio de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 6.148), proposta pela Procuradoria-Geral da República, e baseada em representação dos mesmos procuradores regionais, em conjunto com entidades ambientalistas. Naquela ocasião, já haviam apontado para o déficit democrático existente no Conama, com composição ainda anterior à da reforma.

Os autores da representação sustentam, por fim, que a não correção dessas disparidades (existentes também em colegiados participativos estaduais e locais) continuará dando ensejo a desastres ambientais e humanos como os de Mariana e Brumadinho, em Minas Gerais. Afirmam que a supressão da sociedade civil e a prevalência de interesses estranhos, e até mesmo avessos, à proteção ambiental tende a resultar na desconsideração de preceitos básicos do direito ambiental, como os princípios da prevenção e da precaução, que devem reger toda e qualquer decisão nessa área.

Íntegra da ADPF 623 (inicial)

Íntegra da representação

Fonte: Assessoria de Comunicação Social da Procuradoria Regional da República da 3ª Região

Taxação de energia solar: e agora?

Taxação de energia solar: e agora?

Após péssima repercussão da possível taxação da energia solar, sugerida pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), o governo federal manifestou-se contrário à ideia. Os presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado também disseram ser contra taxar a geração da energia fotovoltaica. Segundo eles, o Congresso votará medidas em regime de urgência para impedir a taxação.

A resolução normativa 482, da Aneel, prevê que a energia gerada e injetada na rede de distribuição seja apenas parcialmente compensada na conta de luz. Hoje, a compensação é total. Ou seja, baixa a compensação para 68%. Na prática, seria como criar uma taxa de 32% sobre a produção da energia limpa.

É importante lembrar, nesse contexto, que o investimento inicial para a geração de energia fotovoltaica é alto. Por isso, em 2018 o BNDES liberou uma linha de crédito para incentivar a adoção de painéis solares por pessoas físicas.

A Aneel alega que há alguns custos, diferente de quando os incentivos foram criados. Por outro lado, muitas empresas e produtores rurais que passaram a investir na energia solar afirmam que a taxação gera insegurança jurídica, já que a agência prometeu previsibilidade por 25 anos e os investimentos foram de longo prazo.

A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) afirma que a mudança no sistema de compensação de créditos deve aumentar a taxação do produtor rural que produz energia própria em até 60%.

O Brasil precisa proibir essa taxação! Precisamos investir e incentivar cada vez mais o uso das energias renováveis!

Ana Maria Primavesi, pioneira da agroecologia, morre aos 99 anos, e deixa legado precioso de amor à terra

Ana Maria Primavesi, pioneira da agroecologia, morre aos 99 anos, e deixa legado precioso de amor à terra

“Um jatobá que tomba, centenário!”, assim a geógrafa, amiga e admiradora Virginia Mendonça Knabben resumiu sua morte em texto que viralizou na internet. O carinho e a reverência que rendia à agrônoma são facilmente notados na forma como se referia a ela, sempre: “jatobá sagrado da agricultura, árvore mestra, a matriz de todos nós”. E também nas iniciativas que realizou para a divulgação da trajetória preciosa da especialista que, durante 80 anos, ensinou muitos brasileiros a amarem a terra e a natureza, com os ensinamentos da agroecologia. Em 2016, Virgínia lançou a biografia Ana Maria Primavesi, histórias de vida e agroecologia e, em outubro do ano passado, um site exclusivo.

Em entrevista à revista Globo Rural, a especialista conta sobre o encontro com Ana Maria: “Depois que descobri a doutora Ana e a agroecologia, é como se, para mim, encontrasse uma missão. A biografia dela foi a minha estreia e é como se eu tivesse um compromisso de fazer com que o trabalho que essa mulher desenvolveu e pelo qual tanto lutou na vida não morresse. Ela mudou a minha vida”.

No texto que se tornou viral, a pesquisadora destacou a garra de Ana Maria: “Descansa uma mente notável, uma mulher de força incomum e um ser humano raro. Afastada de suas atividades desde que passou a morar em São Paulo com a filha Carin, Ana recolheu-se”, conta Virgínia. “Quase centenária, era uma alma jovem num corpo envelhecido que, mesmo se tivesse uma vitalidade para mais 200 anos, não acompanharia uma mente como a dela”. Ana Maria morreu devido a insuficiência cardíaca.

Ana Maria Primavesi é uma das principais referências de agricultura sustentável e do manejo ecológico no país e no mundo. Muito cedo ela compreendeu que é essencial respeitar a natureza – e a amou como poucos -, que não é necessário derrubar a floresta para plantar e que os alimentos podem conviver e usufruir da companhia da biodiversidade.

Os estudos sobre solo e agroecologia no Brasil foram profundamente alterados com Ana Maria. Seu trabalho é um divisor de águas. Sua determinação e seu conhecimento profundo da terra rendiam respostas óbvias como esta a questões sobre a possibilidade de se desenvolver agricultura orgânica em larga escala “Durante cinco mil anos, a agricultura foi orgânica e a humanidade comeu. Se continuarmos assim (atuando em larga escala), o solo vai ser destruído e a gente vai comer o quê?”. Óbvio.

Os estudos e a guerra

Nasceu na Áustria em 1920 – como Annemarie Baronesa Conrad – e estudou agronomia na Universidade Boku, em Viena, num tempo em que era raro as mulheres frequentarem universidades. Mas Ana Maria não chamou a atenção no cenário acadêmico apenas por ser mulher e estar no meio de tantos homens, mas principalmente por “seu talento natural para compreender o invisível”: a vida microscópica da terra. E, assim, adquiriu visão de cientista para decifrar a terra e produzir alimentos sem ferir a natureza. Por isso, foi pioneira em agroecologia ou agricultura ecológica.

Impossível falar dessa prática sustentável e não lembrar dela. Impossível não reverenciá-la e amá-la. Por isso foi tão reconhecida, homenageada e premiada. Sua visão simples e amorosa da natureza impedia que compreendesse os motivos de tanta admiração. E, por isso, declarava: “Eu não entendo porque as pessoas gostam tanto de mim. As pessoas me adoram tanto e eu não sei por quê. Como podemos ser premiados por fazermos o que é o certo?”.

Pois é, ela “tinha toda razão”, como bem observou Virgínia. “Para a doutora Ana, era natural trabalhar com o solo vivo, tentando reproduzir ao máximo o que a natureza já faz. Era óbvio”. Mais uma vez.

Enquanto estudava, a Segunda Grande Guerra pulsava e tirava a vida de jovens como seus dois irmãos, além de ferir seu pai gravemente, o que a levou a assumir grandes responsabilidades em casa. Não só: Virgínia conta que Ana Maria salvou seu pai da execução “sem a ajuda de um advogado”. Nesse contexto – que ainda incluía um momento politico obscuro, em que Hitler se empenhava em influenciar os jovens a desistirem dos estudos – , estudar era uma enorme valentia.

Ela se formou e seguiu direto para o curso de doutorado. Seu amor pela terra associado ao talento, à coragem e à orientação de professores especiais foram determinantes para definir sua linda trajetória. Ela já entendia que a agricultura era uma prática agressiva, mas que era possível produzir alimentos sem destruir a natureza.

Quando a guerra acabou, a Europa estava destruída. Ana Maria tinha 25 anos, estava formada e casada com o engenheiro agrônomo Artur Primavesi, e ambos decidiram morar no Brasil. Portanto, foi em solo brasileiro que ela aplicou tudo o que aprendeu e se dedicou à agricultura, sempre dando assistência para o marido, ao mesmo tempo em que cuidava dos filhos e os via crescer e se independer.

A linguagem simples da terra

Aqui, ela também encontrou um ambiente bastante belicoso, em outro sentido. Ao falar de proteção do meio ambiente para cientistas focados na agricultura com o objetivo de obter escala e desenvolvimento econômico, ela conquistou inimigos. Foi, por isso, acusada de não honrar a ciência. Mas, para quem viveu as agruras resultantes da guerra, nada poderia demovê-la de seus ideais. Não se tratava de egocentrismo, mas de convicção fortemente embasada por sua formação e por seu amor à terra. “Tenho certeza do que estou falando”, dizia.

Não lhe interessava defender as leis dos homens e do mercado, mas as leis da natureza. Portanto, não havia outra possibilidade de atuar que não a protegesse. Entre as ideias de manejo que defendia e ensinava estão a rotação de culturas, que ajuda no controle de pragas e doenças, e o uso de quebra-vento, barreira vegetal usada que protege as plantas contra a ação do vento. 

Virginia conta, em um dos textos que escreveu ao longo de seu convívio com Ana Maria, que a cientista era ousada e lançava mão de recursos fáceis e encantadores para se fazer entender por qualquer público. “Falava de colêmbolos, bactérias e nematóides, de “compounds” entre os elementos químicos e deficiências minerais, e emendava nesse contexto as historinhas mais queridas das formigas de Sorocaba que ‘dançam’, do boi que comia as correspondências do governo em Fernando de Noronha ou da “dona cobra”, uma cascavel que vinha cumprimentar os visitantes de sua fazenda em Itaí balançando seu chocalho”.

Ana Maria sabia popularizar seu conhecimento sem vulgariza-lo. Simplificava a linguagem acadêmica para que todos pudessem compreende-la e defender a terra “com ternura”. Para tornar suas apresentações ainda atraentes e amorosas, se utilizava da técnica fotográfica Kirlian, descoberta acidentalmente em 1939 e que revela a aura ou um “halo luminoso” em torno de qualquer objeto.

Assim, as imagens que complementavam suas falas revelavam a energia das plantas saudáveis, mas também seu estado alterado pelos “efeitos maléficos das pulverizações de agrotóxicos e das deficiências minerais provocadas pela adubação química“.

E ela ainda contava uma história pessoal muito linda relacionada ao jatobá, espécie encontrada na Amazônia, na Mata Atlântica, no Pantanal e no Cerrado, e que tem inúmeras propriedades. Ela dizia que a seiva dessa árvore era tão rica em minerais que ela a dava a seus filhos como suplementação mineral, que nunca precisaram tomar vitaminas. Com um detalhe: antes de retira-la, ela pedia permissão à árvore. Dá pra entender melhor porque Virgínia se refere a Ana Maria como jatobá.

Claro que tais recursos de linguagem eram rechaçados pelos colegas e catedráticos como “uma afronta à ciência”, mas os agricultores – aqueles que trabalhavam nas plantações, de fato – a compreendiam muito bem. Ela os encantava com suas narrativas. Quem não se encantaria? Foi assim que me senti do começo ao fim da pesquisa que fiz a respeito de sua trajetória e enquanto escrevia este texto.

“Nosso jatobá sagrado, cuja seiva alimentou saberes e por sob a copa nos abrigamos no acolhimento de compreendermos de onde viemos e para onde vamos, tomba, quase centenário. Ele abre uma clareira imensa que proporcionará ao sol debruçar-se sobre uma nova etapa, a da perpetuação da vida. E dos saberes que ela disseminou”, escreveu Virgínia.

Não lamentemos, portanto, sua morte. Celebremos a vida longa e produtiva desta mulher excepcional, honremos o legado precioso que nos deixou e que pode ajudar o mundo a impedir o avanço da destruição que tem caracterizado esta época.

Livros técnicos, contos e animação

Ávida por passar seu conhecimento, Ana Maria escreveu inúmeros livros, entre eles o que se tornou mais famoso: Manejo ecológico do solo, lançado em 1979. E, para nossa felicidade, sua obra vem sendo reeditada pela Editora Expressão Popular, com uma série que leva seu nome (para conhecer e comprar, acesse o site). A série é composta por livros técnicos – como o citado acima -, mas também por sua biografia, escrita por Virgínia Knabben, e um livro de contosA Convenção dos Ventos – Agroecologia em Contos.

Mas a cientista que amava a terra, não se limitou à literatura para passar seu conhecimento. Na década de 50, ao perceber a dificuldade da maioria das pessoas para compreender a dinâmica da vida no solo, escreveu uma história sobre essa microvida e a transformou em um desenho animado de longa-metragemA vida no solo.

Nele, defendeu sua ideia de que “o solo é a base de tudo” e apresentou os fenômenos biológicos, físicos e químicos de forma bem humorada. “O solo vivo é tão transbordante de vida que acaba por nos mostrar como somos (ou fomos) míopes em enxergá-lo como mero substrato para as plantas crescerem”, diz a apresentação em seu site.

Essa foi a primeira animação sobre o tema no mundo. E sua intenção era fazer mais um filme para explicar como recuperar o solo. Infelizmente, naquela época, Ana Maria não conseguiu os recursos necessários e a ideia se perdeu.

Agora, assista A Vida no Solo, de Ana Maria Primavesi, abaixo:

Fonte: Conexão Planeta

Pesquisas comprovam que a mineração de carvão não entrega o milagre econômico que promete

No artigo “A Questão Mineral e os Índices do IDH-M e desigualdade (GINI) nos estados do Pará e Minas Gerais: uma abordagem comparativa”, os pesquisadores Loyslene de Freitas Mota e Tiago Soares Barcelos, engenheira civil e Doutor em Geografia Humana respectivamente, destacam que a atividade minerária não vem apresentando melhoras significativas para as cidades onde há exploração e para as populações que vivem no seu entorno, “apresentando alta externalidade negativa e criando uma economia de enclave que este setor apresenta nos municípios estudados”.

No mesmo sentido, a pesquisadora Heloísa Pinna Bernardo, Doutora em Contabilidade e Mestra em Controladoria e Contabilidade, constatou, entre outras coisas: geração de subempregos e má distribuição de renda. Além disso, segundo Heloísa, as taxas de crescimento das regiões de base mineral são inferiores às das regiões nas quais a mineração é inexpressiva.

Mina Guaíba

Nas cidades de Charqueadas e Eldorado do Sul, que ficam na região metropolitana de Porto Alegre, um desses projetos gigantescos e que se apresentam como a salvação da economia das cidades do entorno da região – e até mesmo do estado – é a Mina Guaíba, de responsabilidade da Copelmi.

Nesse caso, específico, porém, a vida dos mineradores não deve ser fácil. O Instituto Arayara, em parceria com a Associação Indígena Poty Guarani e com a Colônia de Pescadores Z5, protocolou duas Ações Civis Públicas pedindo a suspensão do processo de licenciamento da mina. O MPF recomentou à Justiça que acate o pedido da ACP e suspenda o licenciamento de forma imediata.

“O parecer do MPF reforça o que temos denunciado sobre a Mina Guaíba: a legislação não foi respeitada. Isso por si só já seria uma condicionante para anulação total do processo de licenciamento ambiental. Mas além disso, o EIA/RIMA que a empresa apresentou contém inúmeras falhas e omissões graves. Temos diversos pareces técnicos apontando as falhas e, assim, esperamos que a FEPAM, que tem em seu quadro de analistas profissionais gabaritados, não conceda nenhuma licença à empresa”, afirma Renan Andrade Pereira, organizador do Programa Fé, Paz e Clima da 350.org, no Brasil.

Pereira destaca, ainda, que já se deparou com inúmeros casos similares ao dos gaúchos em diferentes lugares do Brasil. “Nasci em Minas Gerais e tive a oportunidade de percorrer o Brasil vendo de perto diversos crimes ambientais. Acabei conhecendo muitas comunidades atingidas pelo setor da mineração. A história é sempre a mesma: eles prometem emprego, qualidade de vida, desenvolvimento, prosperidade… mas eles trabalham, na verdade, com um tripé nada sustentável: violação dos direitos humanos; violação dos direitos ambientais; e violação dos direitos trabalhistas. É desse jeito em Minas Gerais, em Santa Catarina, no Maranhão, no Espírito Santo e no Piauí. No Rio Grande do Sul é igual. Na Mina Guaíba vai ser igual se ela for licenciada, basta ver a forma como a empresa quer licenciar o empreendimento, violando direitos antes mesmo de começar a operar”, diz o Especialista em Gestão Ambiental.

Comissão de Mudanças Climáticas sugere mutirão para julgar desmatamentos ilegais

A Comissão Mista Permanente sobre Mudanças Climáticas aprovou nesta terça-feira (17) o relatório das atividades de 2019, com uma indicação ao Poder Judiciário para a realização de um mutirão para julgar ações civis públicas instauradas contra responsáveis por desmatamentos ilegais.

Na avaliação do presidente do colegiado, senador Zequinha Marinho (PSC-PA), os objetivos da comissão foram cumpridos ao longo do ano. “Acredito que a gente tenha conseguido alcançar nossos objetivos: discutir com grande parte daqueles que entendem com amplitude e profundidade o tema ‘mudanças climáticas’, fazer comparações, ouvir gente que defende de um extremo ao outro.”

O relator da comissão, deputado Edilázio Júnior (PSD-MA), destacou a realização de audiências públicas sobre o combate às queimadas e ao desmatamento na Amazônia, a regularização fundiária como instrumento para reduzir a tensão social no campo e o mercado de carbono.

O deputado lembrou ainda que o mercado de carbono foi justamente um dos temas centrais das discussões na 25ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima, a COP-25, que ocorreu no início de dezembro em Madri, na Espanha, e da qual participaram integrantes da comissão.

“Essa proposta determina uma cota máxima de gases de efeito estufa que as nações podem emitir, contudo, possibilita a negociação de cotas”, explicou Júnior.

Fonte: Agência Câmara

MPF dá parecer favorável à suspensão imediata do licenciamento da Mina Guaíba

O Ministério Público Federal, através do Procurador da República, Pedro Nicolau Moura Sacco, manifestou-se favoravelmente ao pedido de suspensão imediata do processo de licenciamento da Mina Guaíba, requerido à Justiça Federal através de uma Ação Civil Pública (ACP) assinada pelo Instituto Arayara em parceria com Associação Indígena Poty Guarani, em outubro de 2019.

O Estudo e o Relatório de Impacto Ambiental (EIA-RIMA) do projeto ignorou a presença de aldeias indígenas na área diretamente afetada pela Mina Guaíba. O erro foi cometido tanto pelo órgão ambiental licenciador, Fepam, quanto pelo empreendedor, Copelmi. A legislação vigente é muito clara e objetiva: os licenciamentos devem ter consulta prévia, livre e informada dos povos indígenas e tradicionais. No caso da Mina Guaíba, foram excluídos os indígenas da Associação Indígena Poty Guarani, a Aldeia (TeKoá) Guajayvi.

O MPF questionou a FUNAI sobre o processo de licenciamento e a autarquia afirmou que não foi consultada nem pela Fepam, nem pela Copelmi; e afirma, ainda, que tomou conhecimento do empreendimento através de ofícios encaminhados pelo Conselho Estadual dos Povos Indígenas (CEPI) e pela Procuradoria da República no Rio Grande do Sul.

Diz o Procurador: “Sem qualquer contato com os indígenas, tampouco houve algum movimento por parte da FEPAM e da Copelmi no sentido da realização da consulta prévia da Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho sobre direitos dos povos indígenas e tribais”.

Ações civis públicas pedem suspensão do licenciamento da Mina Guaíba

Sacco também questionou a Fepam sobre os procedimentos adotados: “Além de informar a FUNAI da lacuna do EIA-RIMA apresentado pela Copelmi, o MPF buscou esclarecer a FEPAM acerca da necessidade de elaboração do componente indígena do Estudo. No começo de setembro passado, este subscritor entregou ofício e documentos a respeito das duas citadas comunidades indígenas em mãos à Diretora-Presidente da fundação, em encontro na Procuradoria da República em Porto Alegre, do qual também participaram membros da equipe técnica responsável pelo licenciamento da Mina Guaíba”.

Para Pedro Nicolau Moura Sacco, o EIA do projeto Mina Guaíba deveria contar com o chamado Componente Indígena, em vista da presença de duas comunidades Mbyá-Guarani a menos de 8 quilômetros das áreas de influência direta e do empreendimento. “Empreendedor e órgão licenciador, ora réus, foram informados a respeito e ainda não tomaram medidas para o início da elaboração desse documento”, acrescentou em seu parecer o Procurador.

Ao fim, Procurador dá seu parecer: “Ante todo o exposto, o Ministério Público Federal manifesta-se favoravelmente ao pedido dos autores de tutela cautelar para suspensão imediata do processo de licenciamento do projeto Mina Guaíba, pois há prova inequívoca da verossimilhança do direito, isto é, da necessidade de inclusão de Componente Indígena no EIA-RIMA e de realização de consulta prévia livre e informada às comunidades indígenas afetadas. Também é evidente o risco ao direito da comunidade Mbyá-Guarani Guaijayvi pela continuidade do processo de licenciamento.”

Juliano Bueno, diretor do Instituto Arayara, celebrou a decisão do MPF: “Os povos indígenas devem ser ouvidos e respeitados. É o que determina a lei. E o MPF referenda isso. O momento é delicado para os povos indígenas, por isso lançamos na COP25 um documentário que levou a voz deles ao mundo. No documentário está incluída a voz do Cacique Santiago, que terá sua aldeia afetada em caso de aprovação do licenciamento desse monstro chamado Mina Guaíba”.