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Coronavírus e o bolso: “Ninguém que está vivo no Brasil hoje viu algo tão sério”

Coronavírus e o bolso: “Ninguém que está vivo no Brasil hoje viu algo tão sério”

Por Ciro Barros, Rafael Oliveira, Raphaela Ribeiro, Thiago Domenici, Agência Pública

João*, 50 anos, é garçom de uma rede de restaurantes que atende alguns hotéis em São Paulo. Há cinco anos na função, no início da semana passada foi avisado pela gerente de que deveria ficar em casa por tempo indeterminado. “Não fui demitido, mas afastado”, esclarece. A falta de clientes na cidade que é o epicentro da Covid-19 no país foi o motivo alegado pela gerente para mandar o garçom para casa. “A comunicação foi verbal, nada por escrito”, afirma. Casado e pai de três filhos, ele se diz preocupado com a situação financeira da família. “Minha esposa é diarista e também está parada”, explica. À espera do direcionamento da empresa sobre os próximos passos, João compreende que o coronavírus atingiu a economia de forma acachapante, mas que não pode ficar sem seus direitos. “Vou esperar mais um pouco antes de procurar um advogado.” Para ele, atravessar a quarentena sem entender o que lhe reserva o futuro no trabalho é um drama que não imaginou viver. “Eu tenho um irmão na mesma situação.”

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Leandro*, 55 anos, irmão de João, disse à Agência Pública que no hotel onde trabalha, em São Paulo, os funcionários mais idosos foram mandados para casa no início da semana passada. No caso dele, anteciparam suas férias de 30 dias diante da crise causada pelo coronavírus. No dia 25 de março, porém, recebeu uma proposta que o deixou desconfortável. “Posso receber metade do salário por 120 dias [R$ 720] pós-férias ou voltar a trabalhar depois correndo o risco de ser contaminado”, diz.

Segundo ele, o hotel onde trabalha tem hospedado médicos e enfermeiros envolvidos no combate ao coronavírus em serviços de saúde da cidade. Entre a necessidade do salário integral para pagar as contas e o risco à saúde, Leandro não sabe o que fazer. “É uma bomba na mão pra desarmar”, desabafa.

A situação dos irmãos se repete pelo mundo afora. As medidas de quarentena sugeridas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) devido ao avanço da pandemia do novo coronavírus trouxeram uma parada súbita à economia mundial pela restrição da movimentação de pessoas.

No Brasil, o estado de São Paulo e a capital do Rio de Janeiro impuseram desde o dia 24 de março um regime de quarentena: estão fechados estabelecimentos comerciais, exceto os que fazem parte do chamado comércio essencial (como supermercados, farmácias e postos de gasolina) – no Rio, um decreto publicado na última sexta-feira liberou o funcionamento de lojas de material de construção e de conveniência.

As medidas de isolamento social, defendidas por boa parte da comunidade médica e científica – também pela maioria da população em pesquisa de opinião – como necessárias para evitar uma alta vertiginosa nos contágios e um colapso no sistema de saúde do país, são criticadas por empresários e pelo presidente Jair Bolsonaro, situação que causa perplexidade mundo afora. “O Brasil está numa curva crescente de casos, com transmissão comunitária do vírus, e o número de infectados está dobrando a cada três dias”, informou em nota a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI). “Concordamos que devemos ter enorme preocupação com o impacto socioeconômico desta pandemia e a preocupação com os empregos e sustento das famílias. Entretanto, do ponto de vista científico-epidemiológico, o distanciamento social é fundamental para conter a disseminação do novo coronavírus, quando ele atinge a fase de transmissão comunitária.”

Um estudo publicado pelo Imperial College de Londres reforça o temor em abrandar a quarentena, como sugere o presidente Jair Bolsonaro. Segundo os cálculos da instituição, que vêm balizando ações da OMS mundo afora, caso o Brasil adote uma política de supressão, ou seja, de distanciamento social intenso e rigoroso, com redução de 75% nas taxas de contato interpessoal, o número de mortes pode ficar em 44 mil. Isolar só idosos e grupos de risco, como vem defendendo Bolsonaro sob a justificativa de reduzir impactos econômicos, pode levar a 529 mil mortes, segundo as projeções.

Se um possível colapso do Sistema Único de Saúde (SUS) ainda é percebido como distante por boa parte da população, apesar do alerta dos especialistas, as consequências econômicas já são sentidas mesmo antes de as medidas de circulação entrarem em vigor.

“Devemos perder um faturamento de R$ 50 bilhões”

O dia 18 de março marcou o fim de uma carreira de sete meses como auxiliar de cozinha para Ana Caroline Campos em um restaurante no bairro dos Jardins, na zona oeste de São Paulo. “No dia que o restaurante fechou, o chefe me chamou e disse que ia ter que me mandar embora”, conta. O restaurante fechou por tempo indeterminado e não poderia manter muitos funcionários. Moradora do Parque Regina, região periférica da zona sul de São Paulo, ela diz que mora com a mãe e com dois irmãos adolescentes. “A gente mora de aluguel e sou só eu e minha mãe para manter as despesas de aluguel, água, luz, mantimentos”, relata.

O setor de bares e restaurantes é um dos mais afetados pela restrição da circulação de pessoas e percebido como um dos mais potencialmente afetados pelas medidas de quarentena. A Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) estimou que, caso nenhuma medida econômica fosse adotada pelo governo, como o auxílio para arcar com salários e aluguéis, o setor poderia perder metade da força de trabalho em 40 dias – um total de 3 milhões de empregos a menos. “Somos 1 milhão de estabelecimentos, 65% não têm nem CNPJ, e 80% deles faturam menos de R$ 20 mil por mês e têm no máximo dois funcionários. Esses 80% geram cerca de 20% de faturamento do setor, da ordem de R$ 250 bilhões, mas são responsáveis por quase metade dos empregos”, enumera o presidente da Abrasel, Paulo Solmucci.

Ele cita um estudo do banco JP Morgan que estimou que bares e restaurantes no mundo suportam em média 16 dias sem receita. “No Brasil, esse prazo certamente é menor. O nosso setor é o mais vulnerável”, avalia. Segundo ele, o setor “já despenca” desde a semana entre os dias 15 e 21 de março. “Acho que ninguém que está vivo no Brasil hoje viu algo tão sério. Estimo que pelo menos uns 100 mil empregos já tenham sido eliminados e que devemos perder um faturamento da ordem de R$ 50 bilhões”, diz Solmucci.

Na última sexta-feira, 27, o governo federal anunciou uma linha de crédito emergencial de R$ 40 bilhões para que pequenas e médias empresas com faturamento entre R$ 360 mil e R$ 10 milhões financiem a folha de salários – o que, segundo o governo, poderá socorrer 12 milhões de pessoas e 1,4 milhão de empresas. O programa vai bancar até dois salários mínimos por empregado, e a empresa que aderir não poderá demitir por dois meses.

Há seis meses Jessé de Oliveira Júnior abriu um bar na Vila Madalena, na zona oeste de São Paulo, mas não poderá usufruir dessa linha de crédito, pois sua empresa não se enquadra no faturamento proposto. O empresário ainda estava em meio à penúria de início de negócios quando a crise chegou: fez investimentos iniciais para adequar o imóvel, contratou seis funcionários e estava operando no vermelho, esperando o início de lucro. “Do almoço, o movimento caiu bruscamente de uma semana para outra. Caiu de 80% a 90% o movimento. Aí as pessoas que tinham evento marcado à noite contataram a gente e foram cancelando.” Ele explica que na semana de 15 a 21 de março resolveram suspender as atividades temporariamente. “Ficamos preocupados com a saúde dos funcionários. Fizemos uma reunião, falamos para ficarem em casa durante 15 dias, e a gente vai avaliar como vai estar a situação”, relata. “Estamos com receita zero e as despesas estão mantidas: aluguel, salários, encargos. Estamos na expectativa de alguma medida para minimizar esse impacto”, diz ele, que garante pagar os salários dos funcionários neste mês de abril.

“Em 30 anos de aviação nunca vi essa situação”

O setor da aviação civil está entre os mais impactados do mundo pelo coronavírus. A Associação Internacional de Transportes Aéreos (IATA na sigla em inglês) estima que sejam necessários cerca de US$ 200 bilhões de apoio estatal e estima em US$ 113 bilhões a perda de receita neste ano. No Brasil, a Associação Brasileira de Empresas Aéreas (Abear) informou que há queda de 75% na demanda doméstica por voos e 95% na internacional em relação ao mesmo período em 2019. Entre as companhias brasileiras, a Gol está com 90% da frota parada e a Latam, com 75%. “Eu tenho 30 anos de atuação no setor da aviação e nunca vi nada parecido”, afirma a porta-voz do Sindicato Nacional de Aeroviários (SNA), Celma Balbino. Ela critica as negociações em curso com as companhias aéreas. “O impacto para nós é extremamente desastroso e preocupante. As empresas fizeram propostas de afastamento na metade deste mês e algumas chegaram a propor diminuição de 50% do valor dos salários dos trabalhadores nessa situação atual de crise.” Ela chama atenção para os serviços de pista, feito por empresas terceirizadas, que podem ir à falência com a paralisação. Uma Medida Provisória (MP) do governo de apoio à aviação civil já tramita no Congresso. Entre as medidas, estão a extensão do prazo para reembolso das passagens e o adiamento do pagamento das outorgas dos aeroportos concedidos.

Cláudio* faz parte de outro segmento da aviação: o dos aeronautas. Comissário de bordo de uma grande companhia aérea, ele está em licença remunerada. “A empresa anunciou que precisaria de 7 mil pessoas [em licença remunerada], que é mais ou menos 50% do quadro de funcionários e que, se não chegasse a esse número, seriam abertas outras medidas. Foi dado um prazo até o dia 20 de março. Analisei a situação, vi que São Paulo vai ser a base mais afetada para a minha empresa e que, se eu ficasse, ia ser um gasto desnecessário. Achei mais conveniente tirar esse mês de licença. As operações, que iam ser reduzidas para 30%, agora estão em 10%. O mês de abril vai ser bem difícil”, avalia. Segundo ele, há negociações em curso entre a companhia em que trabalha e o Sindicato Nacional de Aeronautas (SNA) para a redução do salário-base em 15% e redução das folgas e benefícios para quem não atingir as horas de voo previstas em contrato.

Ele aguarda uma definição e, com aeroclubes fechados em São Paulo, lamenta não poder concluir o curso que faz para se tornar piloto comercial.

“Fiquei procurando dois meses pra trabalhar menos de uma semana”, diz vendedora

Graciete Lima começou a trabalhar como vendedora de uma joalheria no shopping Cidade Jardim, na zona sul de São Paulo, no dia 13 de março. Três dias depois, no dia 16, viu o noticiário a respeito do novo coronavírus crescer. “Nem fui trabalhar [na quinta, dia 19] porque disseram que o shopping não iria nem abrir”, relata. Graciete espera em casa, com contrato e carteira assinada, o que vai acontecer. “Fiquei dois meses procurando emprego pra trabalhar menos de uma semana”, reclama.

Um levantamento feito pelo Sebrae indica que os setores de construção civil, moda, alimentação fora do lar e varejo tradicional (lojas físicas) estão entre os mais impactados pelas medidas de quarentena. O levantamento lista outros dez segmentos atingidos. Ao todo, segundo o Sebrae, 12,3 milhões de negócios que geram 21,5 milhões de empregos serão afetados.

O turismo é um desses segmentos. No Brasil, entidades do setor falam em uma possível perda de receita na ordem dos R$ 30 bilhões e 1 milhão de empregos em risco. Os números foram apresentados em um manifesto enviado ao governo federal. As associações afirmam que 80% dos hotéis e resorts, além de parques e atrações turísticas, estão fechados. O cenário preocupa empregados e empresários desses setores.

Estudante de turismo, Carlos Henrique Calixto, 22 anos, foi demitido no último dia 20 de março. Carlos trabalhou durante um ano e três meses no Quality Hotel, na zona oeste de São Paulo. No dia da sua demissão, somente sete dos 130 quartos disponíveis estavam ocupados. “É um hotel muito business. O movimento vinha oscilando. O turismo sentiu no começo, mas ninguém considera o turismo como importante no país.”

Dona de uma pequena pousada em Monte Verde (MG), um distrito da cidade de Camanducaia e tradicional destino de inverno, Silvana Pinto Silva vê um dos feriados importantes do ano, a Páscoa, ameaçado pela quarentena. “O impacto para o segmento de turismo e, no meu caso, a hospedagem é praticamente total. Estamos às portas de um início de temporada [de inverno], estamos numa cidade turística onde o grande foco são os meses de outono e inverno”, diz. “Como ainda não está muito definido o período que vamos ficar nessa situação, praticamente 90% das reservas estão sendo reagendadas para um período futuro”, afirma. Mas ela se mantém otimista. “Teremos que usar o restante dos meses com ótimas promoções, as pessoas vão estar ávidas por viajar”, avalia.

Renda básica: “Será que me enquadro?”

Samuel Ramos Souza, 32 anos, é trabalhador informal desde março de 2019, quando foi demitido de um restaurante japonês no qual era cozinheiro. Sem registro em carteira desde então, passou a fazer serviços de jardinagem para a empresa de um amigo, em condomínios da região de Carapicuíba, Osasco e Cotia, na Grande São Paulo. “É um bico para não ficar parado”, explica ele, que pretendia voltar ao trabalho formal como cozinheiro quando a crise trazida pelo coronavírus chegou. “Mais da metade dos condomínios que a gente atendia não querem o serviço agora”, relata. A situação tem deixado o jardineiro angustiado. Pai de dois filhos, Samuel está se separando e teme não ter o dinheiro necessário para pagar a pensão das crianças e o aluguel da casa onde mora. “Não sei como vou fazer. Preciso dar um jeito urgente”, desabafa.

Samuel soube pela televisão que a Câmara dos Deputados aprovou na quinta-feira um auxílio emergencial que prevê concessão, durante três meses, de R$ 600 a trabalhadores informais e de R$ 1.200 para mães responsáveis pelo sustento da família – inicialmente, o governo federal tinha proposto R$ 200. Para passar a valer, a MP precisa passar pelo Senado e ser sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro – o custo aproximado aos cofres públicos é de R$ 14,5 bilhões.

“Será que me enquadro?”, perguntou Samuel durante a entrevista.
De acordo com a regras, sim. Além de não ter emprego com carteira assinada, o jardineiro se enquadra no critério de renda – até meio salário mínimo (R$ 522,50) por pessoa ou renda familiar mensal total de até três salários mínimos (R$ 3.135,00).

Revolta com a MP 927

Após idas e vindas, o trecho da MP 927 que tratava da suspensão de contrato de trabalho por quatro meses sem pagamento de salário foi revogado após duras críticas ao governo e revolta nas redes sociais.
O polêmico artigo 18, por exemplo, definia o “direcionamento do trabalhador à qualificação” e permitia o afastamento por até quatro meses sem receber salário para que ele participasse de um curso voltado para a qualificação profissional. Porém, outros pontos incomodam as centrais sindicais. “A edição dessa Medida Provisória mostra que nós não temos governo no momento mais dramático da história do país”, afirmou Sérgio Nobre, presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT).

A CUT e outras centrais sindicais exigem a revogação completa da MP 927, baseando-se em uma nota técnica do Dieese, além da criação de uma comissão tripartite para o enfrentamento da crise econômica com representantes de trabalhadores, dos empresários e do Congresso Nacional. A CUT pede ainda a reconversão industrial, ou seja, a possibilidade de readaptar uma indústria de outra área, como a de autopeças, por exemplo, para a produção de equipamentos de saúde. “Falta álcool, falta máscara, falta tudo. Nós precisamos garantir o reabastecimento para os trabalhadores”, afirma Nobre.

Pressionado, o governo propôs nova MP, em que reduziu de quatro para dois meses o período de suspensão de contratos de trabalho para empresas que tenham sido obrigadas a fechar em função do cumprimento das medidas restritivas. Segundo o ministro da Economia, Paulo Guedes, todas as medidas econômicas do governo somadas superam os R$ 700 bilhões em três meses.

* Os nomes foram trocados a pedido dos entrevistados.

Onde há proteção social, recessões não aumentam a mortalidade por impacto do coronavírus

Onde há proteção social, recessões não aumentam a mortalidade por impacto do coronavírus

Estudos mostram que, em países desenvolvidos e áreas com mais investimento no Brasil, crises econômicas não resultam em mais mortes

Um dos argumentos para afrouxar imediatamente as medidas de confinamento impostas pela pandemia de coronavírus é que o aprofundamento de uma posterior recessão, conforme afirmou o presidente Jair Bolsonaro em uma transmissão via internet na quinta-feira (26), poderia levar a um número ainda maior de mortes do que o provocado pela doença.

Mas a evidência científica mostra que não existe vínculo direto entre crises econômicas e aumento na mortalidade mesmo quando terminam em disparada do desemprego. Nos países desenvolvidos, chega a ser o contrário: pesquisas demonstram que depressões resultam em queda na mortalidade, enquanto em países em desenvolvimento o impacto costuma variar conforme as condições de vida da população analisada. No Brasil, um estudo indica que a recessão verificada entre 2014 e 2016 foi nociva principalmente para homens negros, mas não em cidades onde havia bons níveis de investimento público em saúde e proteção social. Ou seja, quando os governos fazem o seu trabalho, ninguém precisa morrer.

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Publicado em 2009, o artigo científico “Vida e Morte Durante a Grande Depressão” ganhou destaque na edição de setembro daquele ano na respeitada revista americana Science. O estudo elaborado por cientistas da Universidade de Michigan demonstrou que a megacrise de 1929 resultou em uma melhora nas condições de saúde no período imediatamente posterior de 1930 a 1933 nos Estados Unidos. Houve redução generalizada na mortalidade de homens,  mulheres, brancos e não-brancos neste período, o que resultou em aumento médio de seis anos na expectativa de vida. Apenas os suicídios cresceram, mas, como responderam por menos de 2% do total de mortes, e todas as outras causas registraram queda, o resultado final foi mais tempo de vida.

Não foi um fenômeno isolado. Após a recessão de 2008, o cenário se repetiu em 27 países europeus analisados por outro estudo publicado há dois anos. A conclusão do pesquisador José Tapia Granados é que cada ponto percentual de desemprego resultou em redução de 0,5% na taxa de mortalidade dos europeus. Outro trabalho, centrado nos EUA e divulgado em 2017 pela universidade canadense McGill, encontrou a mesma relação entre aumento de desocupação e recuo no índice de mortes em áreas metropolitanas.

— A relação entre recessões e taxas de mortalidade mais baixas é tão forte quanto a evidência de que fumar faz mal à saúde — declarou Granados à revista científica Nature em janeiro do ano passado.

Ainda não está claro por que apertos econômicos muitas vezes poupam vidas. Uma das hipóteses é que períodos de prosperidade estimulem o consumo de álcool e tabaco, menos sono e mais estresse profissional, além de acidentes de trabalho e de transporte. Períodos de baixa econômica, em contraste, poderiam favorecer mais tempo para descansar, dormir, fazer atividade física e até cuidar de outras pessoas com saúde frágil.

Isso não quer dizer que crises sejam desejáveis. Estão associadas à deterioração na saúde mental e, em países em desenvolvimento como o Brasil, podem aumentar a mortalidade em populações mais vulneráveis pela falta de estruturas de apoio. Também há provas disso. 

Um estudo publicado em novembro por pesquisadores brasileiros e estrangeiros na revista científica inglesa The Lancet revela que a crise econômica teve impacto negativo na saúde entre 2014 e 2016. A descoberta foi o oposto do verificado nos países desenvolvidos: cada ponto percentual a mais de desemprego resultou em um aumento de 0,5 na taxa de mortes por 100 mil habitantes. 

Mas há um ponto fundamental nessa divergência, conforme explica o texto do trabalho: “em cidades com alto investimento em saúde e programas de proteção social, não foram observados aumentos significativos na mortalidade relacionada à recessão”.  As principais vítimas da crise, nas regiões onde os governos não investiram o suficiente para criar uma rede de apoio, foram homens, negros ou pardos, e na faixa de 30 a 59 anos.

Como as recessões impactam a saúde

Países desenvolvidos

  • Após a depressão de 1929, nos EUA, expectativa de vida aumentou em seis anos
  • Na Europa e nos EUA, após recessão de 2008, cada ponto percentual de desemprego resultou em 0,5% menos mortalidade

Brasil

  • Na crise de 2014-2016, cada ponto percentual a mais de desemprego, em média, aumentou em 0,5 o número de mortes por 100 mil habitantes
  • Nos municípios onde havia bom investimento em saúde e proteção social, não houve aumento de mortalidade
  • A população branca, mulheres, adolescentes e idosos não sofreram impacto
  • O aumento de mortalidade se concentrou em homens, negros ou pardos, e na faixa de 30 a 59 anos

Fonte: GaúchaZH

Líderes da UE concordam em considerar o clima no plano de recuperação de coronavírus

Líderes da UE concordam em considerar o clima no plano de recuperação de coronavírus


Os líderes da União Europeia concordaram que o plano de recuperação econômica do coronavírus do bloco deve atender ao seu objetivo de combater as mudanças climáticas.

Após uma videoconferência de seis horas, os 27 líderes da UE concordaram em coordenar um plano de recuperação econômica do coronavírus.

Embora os detalhes do plano em si ainda precisem ser elaborados, uma declaração disse que eles concordaram que deveria ser consistente com a “transição verde”, a frase que a UE usa para descrever o objetivo de reduzir as emissões que aquecem o planeta.

A comissão executiva da UE quer que seus 27 estados membros se inscrevam em uma cúpula em junho para planejar neutralizar todo o gás de efeito estufa do bloco até 2050. Até agora, a Polônia é o único ponto de destaque.

Investidores e grupos ambientais estão buscando garantias de que, como as conseqüências econômicas do coronavírus sugam financiamento e energia política, Bruxelas não perderá de vista seus objetivos de mudança climática.

A Polônia alertou que a pandemia tornará mais difíceis os objetivos climáticos da UE.

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Uma coalizão global de mais de 300 grupos de campanhas de mudanças climáticas instou os governos na quinta-feira a usar qualquer pacote de resgate econômico de coronavírus para ajudar a acelerar a transição para um futuro de baixo carbono.

“As escolhas que estão sendo feitas agora moldarão nossa sociedade por anos, se não décadas,” disse May Boeve, diretor executivo do 350.org, um grupo de campanha climática global que se originou nos campus universitários dos EUA.

Com os governos despejando dinheiro na economia em níveis nunca vistos desde a Segunda Guerra Mundial, muitos políticos, economistas e ativistas dizem que as medidas devem ser usadas para acelerar a mudança do carvão, petróleo e gás que aquece o planeta.

A crise do coronavírus provou que os governos podem agir em resposta a uma crise – uma lição que eles devem usar para combater as mudanças climáticas, disse Andrew Parry, chefe de investimentos sustentáveis ​​da Newton Investment Management.

“Embora a resposta imediata das autoridades tenha sido justamente limitar as conseqüências sociais da crise atual, é uma oportunidade para garantir um futuro mais saudável e resiliente para o meio ambiente que não deve ser desperdiçado.”

Fonte: Reuters

Médicos revelam outro possível sintoma de infecção por coronavírus

Médicos revelam outro possível sintoma de infecção por coronavírus

Médicos da Academia Americana de Oftalmologia (AAO, na sigla em inglês), na Califórnia, alertaram que um dos sintomas de coronavírus em algumas pessoas pode ser conjuntivite

Os especialistas se basearam em dados da China, segundo os quais um em 30 pacientes com COVID-19 foi diagnosticado com conjuntivite.

Outro estudo, citado pelos médicos americanos, diz que 19 de 1.099 (0,8%) pacientes com coronavírus na China também apresentaram conjuntivite. Os dados foram recolhidos em 30 hospitais de todo o país asiático.

Os autores do artigo lembram que a COVID-19 não é a única causa da doença ocular. No entanto, os oftalmologistas devem ficar atentos e suspeitar de uma possível infecção por coronavírus.

De acordo com os últimos dados, 615 mil pessoas já foram infectadas em todo o mundo e mais de 28,7 mil morreram.

Fonte: Sputnik Brasil

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Cidades dos EUA que usaram isolamento social contra gripe espanhola tiveram recuperação econômica mais rápida, diz estudo

Cidades dos EUA que usaram isolamento social contra gripe espanhola tiveram recuperação econômica mais rápida, diz estudo

Preocupado em evitar uma forte retração econômica, o presidente Jair Bolsonaro contraria a orientação de epidemiologistas e tenta convencer a maioria dos brasileiros a abandonar a quarentena contra o novo coronavírus. Na sua avaliação, apenas os mais idosos e portadores de outras doenças deveriam ficar em casa.

Médicos e economistas críticos a essa proposta têm argumentado, no entanto, que essa estratégia levaria à rápida expansão da doença no Brasil — o que também provocaria danos à economia, além de um número maior de mortes.

Um estudo sobre os efeitos da epidemia de gripe espanhola sobre cidades americanas em 1918 indica que, ao menos um século atrás, medidas preventivas de isolamento social foram positivas não apenas para prevenir mortes, mas também amenizar o impacto da pandemia sobre a economia.

Ao analisar como se deu a recuperação econômica em 43 cidades americanas após o fim do surto de gripe espanhola, seus autores concluíram que a atividade voltou a crescer mais rápido onde as autoridades municipais adotaram medidas para conter a expansão da epidemia, em comparação com locais que não atuaram para reduzir o contágio.

A pesquisa publicada na útima quinta-feira (26/03) é assinada pelos economistas Sergio Correa, do Banco Central americano, Stephan Luck, do Banco Central de Nova York, e Emil Verner, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts.

Segundo eles, diversas cidades americanas adotaram em 1918 estratégias de distanciamento social similares às que têm sido usadas hoje ao redor do mundo contra o coronavírus, como “fechamento de escolas, teatros e igrejas” e “a proibição de reuniões de massa”.

Além disso, também aplicaram outras ações como “uso obrigatório de máscara, isolamento de pessoas infectadas, tornar a gripe uma doença notificável e medidas públicas de desinfecção e higiene”.

A adoção dessas políticas contra a gripe espanhola, no entanto, não foi uniforme em todo país. “As autoridades da cidade de Filadélfia intervieram apenas muito tarde e até permitiram a realização de grandes reuniões públicas, como o Liberty Loan Parade (um desfile patriótico para angariar fundos para os esforços militares americanos na 1ª Guerra Mundial), amplamente frequentado”, diz o estudo.

“Como consequência, a Filadélfia teve um aumento considerável na mortalidade relacionada à gripe espanhola durante o outono de 1918. As autoridades da cidade de Saint Louis, por outro lado, intervieram rapidamente, e a taxa final de mortalidade foi substancialmente mais baixa.”

Recuperação mais rápida da indústria e dos bancos

Ao comparar a forma como 43 cidades usaram essas medidas, os economistas notaram que ações preventivas precoces e com mais intensidade não agravaram a crise econômica.

“Pelo contrário, cidades que intervieram antes e mais agressivamente experimentam um aumento relativo do emprego na indústria, da produção industrial e dos ativos bancários em 1919, após o fim da pandemia”, dizem os autores.

Para essa análise, foram cruzados dados como a duração das medidas adotadas, as mortes por gripe espanhola registradas nestas cidades e seus indicadores econômicos.

Desfile na Filadélfia em 28 de setembro de 1918
Image captionDesfile na Filadélfia em 1918 foi realizado apesar de alertas de que representava risco de disseminação da gripe espanhola

Ações preventivas adotadas dez dias antes da chegada da doença contribuíram para um aumento de 5% no emprego industrial das cidades no período posterior à pandemia de 1918, por exemplo.

Da mesma forma, implementar essas medidas preventivas por mais 50 dias resultaram em um crescimento de 6,5% do emprego na indústria após o fim da pandemia.

Segundo os autores, medidas preventivas que restringem a interação social realmente deprimem a atividade econômica. Mas eles ressaltam que a expansão da epidemia quando essas medidas não são adotadas também impacta negativamente a economia, já que as famílias reduzem por conta própria seu consumo e trabalho para diminuir a chance de contrair a doença.

“Assim, enquanto as medidas preventivas diminuem a atividade econômica, elas (ao mesmo tempo) podem resolver problemas de coordenação associados ao combate à transmissão de doenças e mitigar a ruptura econômica relacionada à pandemia”, observam os economistas.

Ações para reduzir a expansão da doença “podem reduzir a mortalidade e, ao mesmo tempo, serem economicamente benéficas”.

O que o estudo sinaliza para a pandemia de 2020?

Os autores do estudo afirmam que “há lições importantes da gripe de 1918 para a pandemia atual de covid-19 (nome da doença causada pelo coronavírus)”. Eles reconhecem, porém, que há alguns limites na comparação do contexto atual com o de um século atrás.

Estimativas indicam que a taxa de mortalidade da gripe espanhola é maior que a da covid-19, especialmente entre trabalhadores mais jovens, o que sugere que o impacto econômico da pademia de 1918 pode ter sido maior.

Além disso, elementos importantes da economia atual — como o avanço de tecnologias de comunicação, o crescimento do setor de serviços e a grande complexidade da cadeia mundial de fornecedores — não estavam presentes em 1918 e, por isso, não são capturados na análise econômica da pandemia de gripe espanhola.

Profissionais de saúde durante a gripe espanhola em St. Louis
Image captionAs autoridades da cidade de Saint Louis intervieram rapidamente e reduziram a taxa de mortalidade

O pesquisador Marcelo Medeiros, professor visitante na Universidade de Princeton, nos Estados Unidos, também aponta limitações no estudo para entender a crise do coronavírus no Brasil, já que a economia do país de hoje é muito diferente da americana em 1918.

“Estamos vivendo uma crise sem precedentes. Por isso, nada do passado serve de referência exata para o nosso futuro. A gente ainda sequer conhece os detalhes dessa epidemia, que pode progredir em várias direções diferentes”, pondera.

Feita essa ressalta, Medeiros considera que devemos “prestar atenção no recado que o estudo dá”, em especial para analisar como diferentes países estarão posicionados para se recuperar após a pandemia.

“O país que tomar a decisão de se proteger bem agora, controlar a epidemia o máximo possível, vai ter uma vantagem em termos globais. Ao sair mais rápido e menos abalado da crise, vai entrar numa posição de vantagem na economia internacional”, afirma ele.

Medeiros cita como exemplo a Alemanha, que já anunciou medidas contra crise que somam mais de 30% do seu PIB.

“A Alemanha está agindo massivamente para combater a epidemia e os efeitos da recessão causada por ela. Está claramente com uma estratégia de avançar em posições na geopolítica global, no seu poder econômico, saindo de uma crise em boas condições”, avalia.

Para Medeiros, é um processo semelhante com o que ocorreu com os Estados Unidos após a 2ª Guerra Mundial (1939-1945), conflito que devastou especialmente as potências europeias.

“Em alguma medida a gente já observou isso no passado. Foi o que aconteceu quando os Estados Unidos saíram da 2ª Guerra sem destruição do seu capital físico. Eles se tornaram rapidamente a maior potência mundial”, compara.

Fonte: BBC