O destino da termelétrica a carvão Candiota 3, que interrompeu a operação no começo deste ano devido ao término do seu contrato de fornecimento de energia, continua indefinido. As opções colocadas na mesa atualmente para a prorrogação da vida útil da usina abrangem ações dentro do Congresso Nacional ou a realização de uma Medida Provisória (MP) pelo governo federal, porém não se descarta a possibilidade de que a unidade seja definitivamente desativada.
Inicialmente, os defensores da térmica tinham a esperança que o Projeto de Lei (PL) 576, que tratava da energia eólica offshore (no mar), mas continha um artigo que estendia o prazo da geração da usina gaúcha, resolvesse a questão. No entanto, o item que beneficiava o empreendimento foi vetado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Agora, os vetos no PL serão analisados pelo Congresso Nacional.
O presidente da Associação Brasileira do Carbono Sustentável (ABCS), Fernando Zancan, recorda que o recesso parlamentar acabou neste mês e agora o Congresso começa a se organizar. Ele ressalta que a ABCS está levantando informações e números para demonstrar à sociedade a importância do carvão tanto no campo energético como no econômico. “A avaliação não foi correta (do veto), temos que ter as térmicas como seguro (para operação do setor elétrico) e o mais barato é através do carvão”, frisa o dirigente.
Zancan espera que a apreciação dos vetos no Congresso seja feita o mais rapidamente possível, contudo ele calcula que isso ocorra apenas depois do Carnaval. O representante da ABCS assinala que o ideal é resolver a questão, independentemente da forma, seja a queda dos vetos ou uma MP. Porém, ele enfatiza que não pode ser uma iniciativa muito demorada e recorda que uma MP tem um rito de 120 dias.
Em meio a essas alternativas, o diretor de Comunicação do Sindicato dos Mineiros de Candiota, Hermelindo Ferreira, admite que a situação é obscura. “Não se tem certeza do que vai acontecer no futuro”, aponta o dirigente. Ele relata que, na área da mineração, ainda não houve demissões, contudo na operação da usina já aconteceram cerca de 15 desligamentos.
Conforme a Âmbar Energia, empresa responsável por Candiota 3, a usina gera 500 empregos diretos, entre funcionários e terceirizados, e contribui com mais de R$ 80 milhões por ano em tributos. Com capacidade instalada de 350 MW, fornece 9% da energia consumida no Rio Grande do Sul, suficiente para atender a 1 milhão de pessoas. Em nota, a companhia informa que “busca medidas para minimizar o significativo impacto socioeconômico decorrente da interrupção da operação da usina Candiota 3, enquanto uma solução definitiva não for encontrada”.
Ambientalistas e mineiros se encontram para debater a situação
Um fato inédito envolvendo a discussão em torno da usina Candiota 3 aconteceu na semana passada quando ambientalistas do Instituto Internacional Arayara se reuniram, em Brasília, com integrantes dos sindicatos dos Mineiros de Candiota e dos Eletricitários do Rio Grande do Sul (Senergisul). “Foi a primeira vez na história que conseguimos uma aproximação como essa”, celebra o engenheiro ambiental do Instituto Internacional Arayara, John Fernando de Farias Wurdig.
Entre as convergências dos grupos está a questão da necessidade de ter um cuidado social com as pessoas que vivem na região. Já a principal divergência está no tempo de abandono do uso do carvão. Enquanto mineiros defendem a manutenção de Candiota 3 até 2043 (data que coincide com o fim do contrato da outra térmica que opera no município, a Pampa Sul), o pós-doutor em Energias e diretor do Arayara, Juliano Bueno de Araújo, diz que o objetivo é encerrar a utilização do mineral até 2030.
Para amenizar o impacto dessa medida na cidade, ele sugere investimentos de R$ 3 bilhões, oriundos da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) – um encargo do setor elétrico presente nas contas de luz. “Assim efetivando um pacto federativo para o phase out (interrupção) do carvão em Candiota”, reforça.
Esses recursos seriam empregados em um programa de recuperação ambiental das áreas de mineração do município, aposentadorias antecipadas de profissionais que atuam nessa área, subsídios para a comunidade afetada e investimentos em infraestruturas de projetos sustentáveis.
Por sua vez, o diretor de Comunicação do Sindicato dos Mineiros de Candiota, Hermelindo Ferreira, argumenta que, apesar de muitas vezes ficarem em lados opostos, os mineiros não são contra ambientalistas e vice-versa. Ele afirma que, com uma visão de negociador sindical, quanto mais próximas as pessoas estiverem, menores serão os problemas e conflitos.
No entanto, para ele a solução não é simplesmente aposentar os mineiros. “O que a gente faz com a cidade, que pode submergir dentro de um processo de desaparecimento da economia? Eu nasci nessa região, tenho meu filho para criar aqui, família, conhecidos, não posso colocar um dinheiro no bolso, olhar para as pessoas e dizer tchau”, afirma o dirigente.
Já Wurdig assinala que o desenvolvimento de uma transição energética na região, com a inclusão dos trabalhadores, devia ter sido iniciado há, pelo menos, cinco anos. O integrante do Arayara destaca que Candiota 3 é uma usina problemática. Ele revela que, em dezembro, a termelétrica recebeu uma multa ambiental do Ibama de cerca de R$ 500 mil. Segundo Wurdig, isso demonstra os problemas operacionais desse empreendimento.
Sobre a possibilidade da derrubada dos vetos do PL 576 que beneficiaria a térmica gaúcha, o engenheiro ambiental considera que seja uma hipótese difícil de ser concretizada. Além disso, o integrante do Arayara comenta que, se os vetos caírem, o governo federal deve tratar da questão judicialmente para manter a decisão.
“Porque tem todo o arcabouço legal, principalmente, do Acordo de Paris e a questão do Ministério da Fazenda, contrário devido ao encarecimento da conta de luz”, indica Wurdig. Os representantes do Arayara também estão buscando uma reunião com a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, para solicitar uma manifestação da pasta sobre a situação de Candiota 3.
Políticos vão a Brasília tratar do futuro empreendimento
No dia 12 de fevereiro, o prefeito de Candiota, Luiz Carlos Folador (MDB), deverá participar, com o governador Eduardo Leite e deputados gaúchos, de uma reunião com o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, em Brasília, para tratar da termelétrica a carvão. O objetivo é garantir a manutenção da operação da usina até 2043.
“A cidade está atônita, o pessoal está apreensivo e inseguro, a situação está bem delicada”, afirma o prefeito. Ele acrescenta que há proprietários vendendo imóveis e empresas segurando investimentos na cidade. Folador ressalta ainda que a parada da usina já tem efeitos na arrecadação do município, com uma perda quanto ao Imposto sobre Serviços (ISS) de, em média, de R$ 300 mil por mês.