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Arayara se une mais uma vez à Caçapava na luta contra a instalação da maior termoelétrica da América Latina

Na última sexta-feira, 15 de março, a Câmara Municipal de Caçapava sediou mais uma Audiência Pública com o objetivo de dialogar com a população local os impactos da possível instalação de uma usina termoelétrica movida à “gás natural” na cidade, localizada na região metropolitana do Vale do Paraíba, em São Paulo.

 

A Audiência Pública em Caçapava foi solicitada pelas Frentes Parlamentares Ambientalistas da União e do estado de São Paulo, via seus representantes políticos. Do poder legislativo, estiveram presentes a vereadora Dandara Gissoni (PSD), a deputada estadual Mariana Souza (Bancada feminista do PSOL), a deputada estadual Marina Helou (Rede) e o deputado federal Nilto Tatto (PT).

 

Desde 2022, a população da cidade de Caçapava se une na tentativa de impedir a instalação da Usina Termoelétrica São Paulo, um empreendimento da empresa Natural Energia. Com capacidade de geração de 1,743 GW de energia, a termoelétrica se qualificaria como a maior termoelétrica da América Latina e, segundo pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), se instalada, a usina causaria o maior impacto ambiental da região desde a década de 1970. 

Participaram da Audiência  autoridades técnicas convidadas, entre  elas  representantes do Instituto Internacional Arayara, do Instituto de Defesa do Consumidor (IDEC) e do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), como também representantes da Frente Ambientalista do Vale do Paraíba, da organização EcoVital e do movimento social Banhado Resiste, de São José dos Campos.

 

Termoelétricas, combustíveis fósseis e conta de luz mais cara

Sendo as usinas hidrelétricas a principal fonte de energia atualmente no Brasil, cenários de estiagem e baixo nível de água, agravados com as mudanças climáticas, levam ao acionamento de usinas termoelétricas movidas a metano (CH4), popularmente conhecido como “gás natural”, 80 vezes mais agressivo do que o gás carbônico (CO2) no que tange ao efeito estufa. Por ser uma produção de energia mais cara, a conta final para o consumidor também encarece.

“Toda vez que se muda a bandeira tarifária aumenta o preço da energia e  isso acontece quando se aciona o funcionamento das Termoelétricas. As Audiências Públicas são importantes para a gente se apropriar das informações sobre energia. Essa mobilização precisa ser encampada pela população de Caçapava e de todo o Vale do Paraíba, e que todos entendam  que vai haver consequências ambiental e na saúde das pessoas se for instalada a Termoelétrica”, relatou o deputado federal Nilto Tatto (PT).

Wilson Cabral, representante do ITA, destacou o fato de que no Estudo de Impacto Ambiental (EIA) do mega projeto, o que se pede é um licenciamento para a usina funcionar em tempo integral, uma operação full. “Seriam 365 dias por ano extraindo um montante enorme de água e emitindo poluentes atmosféricos em retorno”, disse.

O próprio funcionamento de uma termoelétrica, ativada em situações de baixa potência das hidrelétricas, também agrava o estresse hídrico ao demandar grande quantidade de água para sua produção. Em Caçapava, a bacia hidrográfica que abastece a cidade é a do Alto do Paraíba do Sul, que também abastece outras regiões de grande densidade demográfica, como a baixada fluminense, no Rio de Janeiro. Todas essas localidades já enfrentam dificuldades de abastecimento de água ainda em um cenário sem a Termoelétrica São Paulo.

Falando na sessão, um morador da cidade explicitou o risco de falta de água que a população ficará exposta se o empreendimento for adiante.  “Eles vão instalar em nossas nascentes 4 poços de 80 metros de profundidade, que competirão com nossos poços de 12 metros de profundidade que abastecem as pessoas de nossa comunidade. Vai faltar água!”, alardeou.

Segundo Raquel Henrique, da ong EcoVital, “quem vai sentir mais os impactos do megaempreendimento são os produtores do entorno, que vão perceber que a água vai diminuir para a sua lavoura; os pecuaristas vão tirar menos leite; os animais endêmicos de todas as Unidades de Conservação vão começar a sofrer… Tudo isso, em cadeia, vai degradando a nossa qualidade de vida enquanto coletivo. Fora o impacto direto em nossa saúde”.

 

Royalties, perda de empregos e passivos ambientais

A região de Caçapava já sediou outras lutas ambientais em sua história, como a luta contra o chumbo e contra outra tentativa de instalação de uma usina termoelétrica na cidade. Segundo a vereadora Dandara Gissoni (PSD), a principal articuladora na Câmara de Caçapava contra a instalação da Usina Termoelétrica São Paulo, a cidade já é herdeira de vários passivos ambientais, e não quer como herança mais um “que vai prejudicar nossa saúde, nossos netos, o meio ambiente”.

Como participante da delegação brasileira na última Conferência das Partes das Nações Unidas em Dubai, a COP 28, a vereadora destacou o fato de internacionalmente Caçapava já ser conhecida. “Quando vou à Brasília ou à Alesp, poucas pessoas sabem onde fica Caçapava, mas muitas autoridades que estiveram na COP em Dubai sabiam, porém usam a cidade como exemplo para tratar de danos ambientais, como se já fosse uma causa ganha a instalação dessa Termoelétrica”, lamentou. “Por isso aproveito essa oportunidade para pedir aos deputados da base aliada do governo Lula que lutem para impedir esse empreendimento, pois não só prejudica nossa cidade como todo o país, indo na contramão do mundo e de todos os protocolos internacionais do clima nos quais o Brasil é signatário.”

 

O que dizem as empresas?

Uma das máximas usadas pelas empresas para justificar a instalação de mega empreendimentos como a UTE-São Paulo é  a da geração de empregos. Mas, segundo Wilson Cabral (ITA), o número é ínfimo: “São em média 40 empregos gerados por um complexo de termoelétrica, ao passo que se pode gerar desemprego, no caso do turismo. Quando você polui uma região, o turismo perde com isso”, aponta. Ainda segundo o especialista, “sim, a prefeitura recebe royalties relacionados a essa exploração, mas os royalties não pagam o prejuízo ambiental que a cidade, direta ou indiretamente, terá”. 

Em sua fala na sessão, o Instituto de Defesa do Consumidor (IDEC), representado pela gerente de Programas e Projetos, Georgia Carapetkov, destacou que Caçapava enfrenta clássico caso de racismo ambiental: “Quais serão as pessoas que sofrerão mais pela falta de água? Pessoas da classe média alta ou as mais vulnerabilizadas? Mais uma vez os mais pobres pagando a conta, ao invés desta conta ser dividida.”

 

Acordos ambientais e transição energética justa no Brasil

Lutando no caso ao lado das organizações e movimentos sociais da Frente Ambientalista do Vale do Paraíba, o Instituto Internacional Arayara realizou um estudo sobre os impactos socioambientais que a usina traria à região. Segundo o estudo, a operação plena da UTE-São Paulo geraria algo em torno de 6 milhões de toneladas de CO2 equivalente por ano. Em sua fala na Audiência Pública em Caçapava, Urias de Moura, engenheiro ambiental do Instituto, destacou que “esse valor é 2 mil vezes maior do que a maior emissão já gerada por toda a cidade de Caçapava no período entre 2000 e 2022”.

Arayara reafirma seu posicionamento contra à instalação de mais usinas termoelétricas a “gás natural”, pois acredita que isso pode ocasionar uma dependência prolongada dessa fonte de energia, quando o Brasil poderia estar diversificando sua matriz energética e incentivando mais a produção via fontes renováveis. Ainda segundo Urias, “investir em energia renovável pode alavancar a economia brasileira, gerando mais empregos e modernizando estruturas de produção e distribuição antigas”.

Em fevereiro deste ano, a Arayara integrou a Ação Civil Pública (ACP) contra o empreendimento, como amicus curie no processo movido pelo Ministério Público Federal (MPF). A ação apontou falhas da empresa em sua tentativa de adquirir o licenciamento ambiental do projeto. O Juiz da 3ª Vara Federal de São José dos Campos concedeu liminar favorável ao pedido e o licenciamento ambiental está atualmente suspenso.

 

 

 


Crédito das Fotos:  Douglas F. – Frente Ambientalista do Vale SP

 

 

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