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Cegos pela poeira do carvão, mas de olho em 2022

Cegos pela poeira do carvão, mas de olho em 2022

Foto: Reprodução

É de comover o mais duro dos corações o palavrório de autoridades públicas e de representantes bem pagos de empresas ultrapoluidoras quando enchem a boca para falar uma expressão vazia de sentido e cheia de segundos interesses: transição justa.

A cena – patética – reproduziu-se em quase duas horas de uma reunião online da Comissão de Economia da Assembleia Legislativa de Santa Catarina, que debateu com urgência formal um plano do governo do Estado para atender as empresas da cadeia de produção do carvão mineral.

A indústria carbonífera degrada profundamente o Estado há pelo menos uns 70 anos – mas só agora Vossas Excelências resolvem tratar da “urgência” do assunto. Não havia na reunião um convidado sequer das populações impactadas pelas crateras de aparência lunar, pelas inúmeras vítimas das doenças respiratórias causadas pela extração do carvão, nem pela ingestão da água putrefata dos rios onde antes a vida se manifestava.

Mas, a Comissão fez questão de convidar os representantes da Engie, a empresa dona da usina termelétrica Jorge Lacerda, um monstrengo instalado em Santa Catarina, ultrapassado e anti-econômico, que sobrevive há anos dos subsídios fartos que escorrem anualmente dos cofres arrombados do Ministério das Minas e Energia (MME).

Ah, estava lá também uma técnica de enorme presteza e capacidade a defender que o Estado brasileiro cumpra célere o seu papel de sustentar Jorge Lacerda e todas as usinas a carvão que permanecem no século 17. O discurso era o de sempre: “temos de manter empregos”, “os subsídios se estendem até 2027” etc.

Sim, anualmente, esses dinossauros elétricos engolem quase 800 milhões de reais em subsídios – e só disso sobrevivem, porque o carvão brasileiro tem baixo poder calorífico e, afinal, quem precisa ser eficiente se os subsídios são bons, fartos e contam que parlamentares ávidos por entrar no circuito do dinheiro sujo de carvão e sabe-se lá de que mais.

Enfim, a indústria do carvão mineral – que pouco se importa com trabalhadores que morrem das doenças laborais e só deles se lembra na hora de esconderem-se atrás do discurso de uma suposta necessidade de lhes manter o emprego -, em verdade é uma espécie de buraco negro estelar, a sugar recursos financeiros, vidas humans, água dos rios e o azul dos céus.
É um fim em si mesmo.

E Vossas Excelências? Aquelas que esquecem de convidar o povo para reuniões na casa supostamente do povo?

Cegos pela poeira carbonífera mortal que emana à noite das chaminés, já estão de olhos bem abertos nas eleições de 2022!

Reunião na Alesc discute o futuro do carvão em Santa Catarina

Reunião na Alesc discute o futuro do carvão em Santa Catarina

Na tarde desta segunda-feira (14), a Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc) realizou uma reunião para apresentar a conclusão do grupo de trabalho criado pelo Ministério de Minas e Energia (MME) sobre o futuro do complexo termelétrico Jorge Lacerda, em Capivari de Baixo, e do carvão mineral no estado.

A reunião, proposta pela Comissão de Economia, Minas e Energia da Alesc, foi pouco divulgada, contou com apoiadores da indústria carbonífera e representantes de organizações da sociedade civil.

O coordenador do Observatório do Carvão Mineral, Juliano Bueno de Araújo, e a diretora do Instituto Internacional Arayara, Nicole Figueiredo de Oliveira, foram os poucos representantes da sociedade civil que puderam falar sobre a importância de se discutir a transição energética de Santa Catarina em consonância do que acontece no mundo: pensar em formas de energia limpa e no desenvolvimento sustentável. ⠀

“O Observatório do Carvão Mineral atua na colaboração para termos uma transição justa, energética, social e econômica, onde fatores como clima, meio ambiente e todo o passivo ambiental trágico deixado pelas carboníferas e pela própria operação de carvão em Santa Catarina, seja resolvida no grande plano estadual, em um novo marco legal. Que a Alesc apresente um plano de transição justa e um fundo estadual que viabilize a saída do estado de Santa Catarina como produtor de base energética dependente do carvão, passando a transitar um novo modelo energético que gere um grande volume de empregos”, ressaltou Juliano, que apontou como alternativa o hidrogênio verde.

“A proposta é trazer uma usina de hidrogênio verde – e não de hidrogênio cinza baseado no carvão. O setor energético de PCHs, solar e eólica do estado, bem como de biogás do setor agrícola, tem tido conversas conosco para realizar um grande investimento que vai gerar muitos empregos, impostos para o estado, dentro deste que é um momento de transição”.

O coordenador do OCM também destacou que o momento é de entender que a geração de energia a carvão vem se tornando obsoleta e que empresários já visam o futuro.

“Ninguém está falando para encerrarem a Jorge Lacerda amanhã, mas há um prazo para isso, e essa é uma realidade. Subsidiar um modelo energético antigo do século 19 significa para Santa Catarina e para os futuros empresários do Estado grandes perdas. Manter esse modelo energético significa, hoje, uma perda de para empresários catarinenses que aguardam a vinda de uma grande usina de hidrogênio verde como um modelo que vai sustentar os próximos 100, 200 anos como polo exportador energético”, concluiu.

Os graves impactos do carvão em Santa Catarina

A diretora do Instituto Internacional Arayara, Nicole Figueiredo de Oliveira, destacou que uma pesquisa de campo realizada pelos técnicos da organização mostram dados alarmantes.

“O Instituto Internacional Arayara vem realizando, nos últimos 10 meses, um trabalho de levantamento de campo dos impactos sociais, econômicos e ambientais do complexo Jorge Lacerda, e das minas que já estiveram e estão em operação em SC. Os resultados preliminares dos nossos estudos apresentaram dados e informações preocupantes, com a contaminação do solo, da água, dos lençóis freáticos, que encontram-se em uso para atividade econômica, humana e animal”, ressaltou.

“O departamento técnico do Instituto Internacional Arayara, seus geólogos, engenheiros químicos, geógrafos, economistas, advogados e pareceristas estão, neste momento, debruçados na avaliação econômica do tamanho do dano presente, da população diretamente afetada, bem como outras análises de mercado que apresentem todos os termos de ajustes de conduta, bem como multas não pagas pelo complexo Jorge Lacerda e carboníferas em operação em Santa Catarina”, informou.

O relatório final do grupo de trabalho do MME deve ser concluído em 13 de julho, quando encerra o prazo de 180 dias para finalizarem os trabalhos, segundo informou Agnes da Costa, representante da pasta.

Embora sem conclusões, algumas questões ficaram postas. O MME confirmou que o encargo setorial CDE (Conta do Desenvolvimento Energético) deve mesmo acabar em 2027. Também ressaltou que o governo federal estipulou 2050 como o prazo para a neutralidade de carbono.

Durante o encontro, o secretário estadual de Desenvolvimento Econômico, Luciano Bulignon, afirmou que o Governo do Estado encaminhará um projeto de lei para criar o Plano Catarinense de Transição Carbonífera. A proposta deve ser encaminhada para a Alesc nos próximos dias.

Sobre as definições e o futuro de Jorge Lacerda, nada foi definido. A Engie Brasil continua assegurando que pretende se desfazer do complexo com a “missão de sair da geração do carvão”.