O ano passado representou um momento decisivo para a descarbonização global, o que é positivo para todas as tecnologias de carbono zero. Anúncios recentes de metas de emissões líquidas zero de países como a China, o Japão, Coréia do Sul e Canadá, juntamente com a retomada do compromisso dos Estados Unidos com o Acordo de Paris, mostram que, agora, não tem mais como desacelerar as políticas para enfrentar o aquecimento global.
O hidrogênio verde é um dos principais beneficiados, já que assume a frente de outros métodos de produção de gás. Na verdade, a produção de baixo carbono baseada na eletrólise agora representa 67% do oleoduto geral de hidrogênio. O interesse pelo hidrogênio verde está disparando inclusive entre as principais empresas de petróleo e gás.
O Pacote de Recuperação Verde da União Europeia, anunciado no ano passado, destina 150 bilhões de euros para o hidrogênio verde.
Como resultado direto, a Europa está atualmente impulsionando o crescimento, representando 79% do gasoduto geral de hidrogênio com baixo teor de carbono. No entanto, com 17 países (incluindo Japão, Coréia do Sul e Canadá) tendo anunciado alguma estratégia para o hidrogênio e a tendência global para metas líquidas zero, esse domínio provavelmente será temporário.
“O hidrogênio verde é o combustível mais limpo do mundo, já que não emite gases poluentes, nem durante sua combustão e nem durante o processo de produção. A descarbonização do planeta é a saída apontada por todos nós, cientistas, para chegarmos em 2030, 2050, mantendo um crescimento da temperatura global em menos de 2%, emitindo no máximo 1,6 toneladas de carbono por segundo – contra os 5,2 toneladas emitidas no mundo hoje”, explica o diretor técnico do Instituto Internacional Arayara, Juliano Bueno de Araújo, que é engenheiro e possui doutorado em Riscos e Emergências Ambientais.
Entenda melhor como funciona
O hidrogênio verde poderia praticamente eliminar as emissões usando energia renovável para alimentar a eletrólise da água. Com a eletrólise, tudo que você precisa para produzir grandes quantidades de hidrogênio é água, um grande eletrolisador e suprimentos de eletricidade.
Se a eletricidade vem de fontes renováveis, como eólica, solar ou hídrica, o hidrogênio é efetivamente verde. As únicas emissões de carbono são daquelas referentes à infraestrutura de geração.
Finalmente, a principal vantagem do hidrogênio é que ele atua como uma forma versátil de energia armazenável. O chamado ‘Power-to-X’ – que transforma eletricidade em hidrogênio verde – é crucial para maximizar a eficiência de fontes de energia renováveis como a eólica e solar.
Teoricamente, existem muitas coisas úteis que você pode fazer com o hidrogênio verde, como adicionar ao gás natural e queimar em usinas termelétricas ou de aquecimento urbano. Outra forma de utilizar é como um precursor para outros transportadores de energia, da amônia aos hidrocarbonetos sintéticos, ou para alimentar células de combustível diretamente em carros e navios, por exemplo.
O hidrogênio verde também pode simplesmente substituir o hidrogênio industrial que é feito todos os anos a partir do gás natural.
É extremamente versátil, permitindo não só descarbonizar áreas como transporte e aquecimento, onde as energias renováveis têm potencial, mas também descarbonizar processos industriais que não podem ser convertidos em eletricidade.
“As mudanças climáticas requerem atenção urgente. Se continuarmos a produzir CO2 nos níveis atuais, em dez anos iremos ultrapassar o limite tolerável e, assim, teremos que arcar com consequências climáticas devastadoras, aumentando os custos alimentares e a disponibilidade hídrica para o consumo humano e de animais a números alarmantes”, complementa o diretor da Arayara.
O possível protagonismo do Brasil
Você conhece as vantagens que o Brasil oferece para o desenvolvimento do hidrogênio verde?
Em termos gerais, para produzir hidrogênio verde a partir da eletrólise, são necessárias água doce e uma fonte de energia renovável. O Brasil possui recursos naturais, fontes de água significativas e potencial solar, eólico e de biomassa inexplorado que podem ser usados no processo de eletrólise. Nosso país também tem potencial para produzir hidrogênio a partir do etanol, com uma indústria consolidada de etanol de cana.
Dados do Hydrogen Council, apontam que a produção e exportação do hidrogênio deverá responder, em 2050, por 20% de toda a demanda de energia global, gerando um mercado de US$ 2,5 trilhões. Como o Brasil tem cerca de 80% da sua matriz elétrica renovável, pode se tornar um dos grandes protagonistas desse mercado.
Hoje, o país tem um dos menores custos marginais para geração de energias renováveis e isso é fundamental para barateamento do processo de eletrólise. Fontes como solar, eólica, biomassa, biogás e etanol entram no rol de opções para geração de hidrogênio verde.
O principal objetivo do uso do hidrogênio é descarbonizar a economia e, por isso, faz sentido usar o tipo de hidrogênio que oferece o maior benefício ambiental.
Hidrogênio verde avança na América Latina
Vários países contribuem para o crescente interesse pelo hidrogênio verde em toda a região da América Latina, incluindo Brasil, Chile, Bolívia e Uruguai.
Na Bolívia, o Ministro de Hidrocarbonetos e Energias, Franklin Molina, informou a promoção de um plano estratégico para a geração de hidrogênio verde.
Poucos detalhes do plano foram divulgados, mas um comunicado do ministério afirma que seu objetivo é aumentar o potencial energético da Bolívia e contribuir para a redução de suas emissões de gases de efeito estufa, incluindo um planejamento para a introdução do hidrogênio verde.
A previsão é que se construa um pólo de energia alternativa em que o hidrogênio seja um componente, também promovendo a geração de renováveis, solar, eólica, hídrica, geotérmica e biomassa.
Um grupo chileno também está trabalhando em um fundo de 300 milhões de dólares para impulsionar o desenvolvimento do hidrogênio verde como uma ferramenta na transição para uma energia mais limpa.
A Fundación Chile, uma organização público-privada sem fins lucrativos focada no desenvolvimento sustentável, está arrecadando fundos para investir em projetos de hidrogênio verde que estão a dois ou três anos de serem lucrativos. O lançamento está previsto para o próximo ano.
Povos indígenas das regiões Sul e Sudeste do Brasil ocuparam a cúpula do Congresso Nacional, na tarde desta terça-feira (8), em protesto contra o Projeto de Lei (PL) 490/2007, que abre as terras indígenas para a exploração econômica predatória e inviabiliza, na prática, novas demarcações. Os indígenas exigem que o PL 490 seja retirado de forma definitiva da pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJC) da Câmara dos Deputados.
O projeto, elaborado pela bancada ruralista, foi incluído na pauta da sessão da CCJC que iniciou às 13h desta terça. Os povos afirmam que não encerrarão a ocupação até que o PL 490/2007 seja retirado definitivamente de pauta.
Kretã Kaingang, coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), alerta para os riscos que o PL 490 trará aos povos indígenas. “O projeto permite que o governo tire da posse de povos indígenas áreas oficializadas há décadas, escancara as Terras Indígenas a empreendimentos predatórios, como o garimpo, e, na prática, vai inviabilizar as demarcações, totalmente paralisadas pelo governo Bolsonaro”.
“Dissemos que voltaríamos com vida, ou daríamos nossa vida pelo nosso povo. E hoje esse dia chegou! Estamos aqui porque não temos mais escolha”, afirma Kretã Kaingang, da coordenação executiva da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). “O PL 490 escancara as terras indígenas a empreendimentos predatórios, como o garimpo, e, na prática, vai inviabilizar as demarcações, totalmente paralisadas pelo governo Bolsonaro”.
Cerca de 70 indígenas dos povos Terena, Kaingang, Tupi Guarani, Guarani Mbya, Guarani Nhandeva, de São Paulo e do Paraná, participam da ocupação no Congresso e permanecem mobilizados na capital federal durante esta semana. Todos os integrantes da delegação já foram imunizados com a segunda dose da vacina contra a covid-19.
Ontem (7), os indígenas já haviam realizado uma manifestação na entrada do anexo 2 da Câmara dos Deputados e um ato com cantos e rituais em frente ao Supremo Tribunal (STF), em manifestação contra o marco temporal e em defesa de seus direitos originários.
Os povos também se manifestam contra medidas legislativas como o PL 191/2020, de autoria do governo Bolsonaro, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215, e outras propostas que estão sob risco de votação nesta semana. É o caso do PL 2633/2020, conhecido como o PL da Grilagem, e do PL 984/2019, que pretende cortar o Parque Nacional do Iguaçu e outras Unidades de Conservação com estradas.
“Enquanto esses projetos não saírem de pauta, nós não vamos sair de Brasília”, assegura o cacique Darã Tupi Guarani Nhandeva, da coordenação da ArpinSudeste.
Além das pautas no Congresso Nacional, os povos indígenas também vieram a Brasília com a intenção de acompanhar a votação do Recurso Extraordinário (RE) 1.017.365, que trata das demarcações de terras e teve repercussão geral reconhecida pela Corte. Isso significa que a decisão tomada neste julgamento terá consequências para todos os povos indígenas do Brasil.
Sobre o PL 490/2007
O PL 490/2007 está na pauta da CCJ da Câmara, e deve ser votado nesta terça-feira (8). O projeto já havia sido posto em pauta há duas semanas, mas sua votação foi adiada devido à intensa mobilização dos povos e apoiadores da causa indígena. Na ocasião, as lideranças se reuniram com a presidente da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados, Bia Kicis (PSL/DF), para pedir que o projeto não retorne à pauta de votação da Comissão.
O projeto prevê a restrição das demarcações de terras indígenas com base na tese do marco temporal, abre terras demarcadas para atividades como garimpo, mineração, agronegócio e construção de hidrelétricas e outras grandes obras, e propõe até que a União se aproprie e disponibilize para a reforma agrária terras em que tenha havido “alteração dos traços culturais” da comunidade indígena.
A Assessoria Jurídica do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) produziu uma nota técnica em que analisa o Projeto de Lei (PL) 490/2007, em tramitação na Câmara dos Deputados. Além de uma grande quantidade de dispositivos inconstitucionais, a análise aponta que o PL 490 afronta decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Na avaliação da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB) e do Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (Opi), o Projeto de Lei promove contato forçado com povos indígenas isolados, permitindo a atuação de extremistas religiosos e a abertura econômica das terras indígenas.
Sobre o Recurso Extraordinário (RE) 1.017.365
Previsto para ocorrer entre 11 e 18/6, em formato virtual, o julgamento vai fixar a interpretação sobre o regime jurídico das Terras Indígenas e os direitos dos povos indígenas sobre suas terras.
Na oportunidade a Corte vai analisar o Recurso Extraordinário com repercussão geral (RE-RG) 1.017.365, que é um pedido de reintegração de posse movido pelo Instituto do Meio a Ambiente de Santa Catarina (IMA) contra a Fundação Nacional do Índio (Funai) e indígenas do povo Xokleng, envolvendo uma área reivindicada – e já identificada – como parte de seu território tradicional.
No território Ibirama-Laklanõ, que foi reduzido ao longo do século XX, vivem os povos Xokleng, Guarani e Kaingang. Os indígenas nunca deixaram de reivindicar a área, que foi identificada pelos estudos antropológicos da Funai e declarada pelo Ministério da Justiça como parte da sua terra tradicional.
Em 2019, o STF deu status de “repercussão geral” ao processo, o que significa que a decisão sobre ele servirá de diretriz para a gestão federal e todas as instâncias da Justiça no que diz respeito aos procedimentos demarcatórios.
No julgamento previsto para iniciar nesta sexta, 11, os ministros também irão analisar a determinação do ministro Edson Fachin, de maio do ano passado, de suspender os efeitos do Parecer 001/2017 da Advocacia-Geral da União (AGU). A norma oficializou o chamado “marco temporal”, entre outros pontos, e vem sendo usada pelo governo federal para paralisar e tentar reverter as demarcações.
O “marco temporal” é uma interpretação defendida por ruralistas e setores interessados na exploração das TIs que restringe os direitos constitucionais dos povos indígenas. De acordo com ela, essas populações só teriam direito à terra se estivessem sob sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. Alternativamente, se não estivessem na terra, precisariam estar em disputa judicial ou em conflito material comprovado pela área na mesma data.
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