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Rumo à COP 30: seminário destaca protagonismo dos territórios e cobra justiça climática real

Evento no Congresso Nacional reforça papel da sociedade civil e do governo na construção de uma COP 30 inclusiva, crítica e comprometida com os direitos dos povos e do planeta

O Instituto Internacional ARAYARA participou, na tarde da última terça-feira (9/9), de um importante seminário realizado na Câmara dos Deputados, em Brasília. Intitulado Seminário Preparatório para a COP30, o evento foi promovido pelas Comissões de Legislação Participativa e de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS), com a organização do Grupo de Trabalho sobre Clima da Frente Parlamentar Mista Ambientalista.

Em resposta às tentativas de desmobilização internacional em torno da próxima conferência climática da ONU, o seminário reuniu parlamentares, representantes do governo, ativistas, cientistas, organizações da sociedade civil e lideranças de territórios periféricos e tradicionais para discutir os caminhos possíveis rumo a uma governança climática justa.

A iniciativa foi proposta pela Subcomissão Especial da COP30, de autoria das deputadas Talíria Petrone (PSOL-RJ) e Duda Salabert (PDT-MG), e do deputado Túlio Gadêlha (Rede-PE). O encontro também marcou o lançamento da cartilha do GT Clima, que apresenta a agenda temática do Brasil para a COP30.

Elaborada com o apoio de cerca de 50 organizações da sociedade civil, a cartilha busca aproximar o debate climático do parlamento e da sociedade, destacando temas prioritários como transição energética justa, justiça climática, racismo ambiental, adaptação, segurança alimentar e o papel estratégico dos territórios tradicionais.

Assista o seminário no canal da Câmara no YouTube:

 

Povos das águas no centro da ação climática

Um dos destaques do seminário foi a participação do Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA), representado por Eduardo Sfoglia, chefe da Assessoria Especial do órgão. Ele defendeu que os sistemas alimentares aquáticos sejam reconhecidos como soluções climáticas e que os povos das águas estejam no centro da ação climática global.

Segundo dados apresentados pelo MPA, a pesca representa apenas 0,5% das emissões globais, enquanto o setor alimenta diretamente 3 bilhões de pessoas e emprega 600 milhões em todo o mundo. No Brasil, são cerca de 2 milhões de pescadores artesanais, extrativistas e pequenos aquicultores — populações que estão na linha de frente dos impactos das mudanças climáticas. “A COP precisa ser centrada nas pessoas. Precisamos garantir investimentos que tornem a pesca e a aquicultura mais sustentáveis e resilientes”, afirmou Sfoglia, destacando a necessidade de até 30 bilhões de dólares anuais até 2030 para esse fim.

Conflito entre fósseis e direitos fundamentais

A mobilizadora Raíssa Felippe, do Instituto Internacional ARAYARA, apresentou trechos do estudo técnico “Do Mar à Mesa: como a exploração de petróleo ameaça à vida”, com foco nos impactos da atividade sísmica e da exploração offshore sobre comunidades pesqueiras e a biodiversidade marinha. Ela alertou para a sobreposição de blocos de exploração de petróleo com áreas de pesca artesanal e territórios de povos tradicionais, o que compromete diretamente a segurança alimentar e os direitos previstos no Decreto nº 6.040/2007 — que institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais.

Raíssa apresentou dados do Monitor Amazônia Livre de Petróleo e Gás sobre o 5º Ciclo da Oferta Permanente de Concessão (OPC) da ANP, disponíveis no portal leilaofossil.org . As informações revelam que 47 blocos de petróleo já foram arrematados na região da Foz do Amazonas, muitos deles sobrepostos a áreas costeiras sensíveis e territórios pesqueiros tradicionais.

O estudo foi entregue ao assessor Eduardo Sfoglia e à deputada Talíria Petrone, como forma de subsidiar o debate sobre os impactos socioambientais da expansão da exploração fóssil na Amazônia.

“Como o Brasil propõe negociações climáticas enquanto sua política energética doméstica segue priorizando os fósseis?”, questionou Raíssa, denunciando o conflito entre o discurso climático e a prática governamental.

Justiça climática começa com escuta dos territórios

A gerente de Relações Institucionais da ARAYARA também participou do debate, destacando que discutir a crise climática exige uma reconexão com a natureza e uma profunda reflexão sobre os verdadeiros significados de progresso e desenvolvimento.

Segundo ela, “a COP30 não pode ser um evento dissociado da realidade das pessoas”, enfatizando que 75% das emissões globais de gases de efeito estufa têm origem na queima de combustíveis fósseis — o que torna a pauta da transição energética justa absolutamente central.

Ribeiro reforçou que o Brasil precisa abandonar projetos baseados em combustíveis fósseis e assumir uma posição de liderança global, com ações concretas e alinhadas aos compromissos internacionais de descarbonização.

Mariana Galdino, do Instituto Decodifica, abordou a importância de localizar as pautas climáticas nos territórios e nos corpos mais afetados. A partir de dados que mostram que mulheres negras são desproporcionalmente atingidas pelos eventos climáticos extremos, ela destacou a necessidade de incluir a perspectiva de gênero e de enfrentamento ao racismo ambiental como pilares das negociações climáticas.

Escazú, Plano Clima e justiça estrutural

Entre os encaminhamentos e recomendações discutidos no seminário, destacam-se:

-Ratificação urgente do Acordo de Escazú, que fortalece a proteção de defensores ambientais e garante acesso à informação e à justiça ambiental;

-Diálogo transparente sobre o Plano Clima, com escuta qualificada e devolutiva real às contribuições da sociedade;

-Combate às desigualdades estruturais, com políticas de adaptação e mitigação orientadas pelos saberes locais e tradicionais;

-Reconhecimento das práticas dos povos indígenas, quilombolas e ribeirinhos como estratégias legítimas de cuidado com a terra e com o clima.

Clima e justiça social

Este foi o terceiro seminário promovido pelo GT Clima na Câmara dos Deputados, e consolidou-se como um espaço de articulação entre sociedade civil e legislativo. Um consenso emergiu entre os participantes: não haverá justiça climática sem justiça social, e não se pode construir uma agenda ambiental eficaz sem ouvir os povos e comunidades que mais sofrem com os efeitos da crise climática.

Os participantes manifestaram preocupação com tentativas de esvaziamento político da COP 30 e alertaram para a necessidade de garantir que a conferência seja realizada com legitimidade, territorialidade e abertura real à sociedade civil.

“Não aceitaremos uma COP que ignore os povos da floresta, das águas e das favelas. Belém está pronta, e os territórios também”, afirmou uma das participantes.

Para a gerente da ARAYARA, o seminário deixou claro que a COP 30 precisa ser mais que um evento diplomático. Deve ser um marco de escuta, transformação e justiça climática, que respeite os saberes dos povos e coloque o Brasil no caminho de uma transição energética de fato justa, com base na vida — e não no lucro.

Transição Energética

Durante o seminário, a deputada Talíria aproveitou para convidar as pessoas presentes a participarem da audiência pública que discutirá os subsídios ao carvão mineral para geração de energia no Brasil.

O debate acontecerá no dia 18 de setembro, às 10h, e será uma oportunidade fundamental para aprofundar a discussão sobre a necessidade de uma transição energética justa e sustentável no país.

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